William Waack: A conspiração contra a terceira via

Regras do jogo eleitoral, sistema de governo e eleitorado difuso ajudam Lula-Bolsonaro

O que conspira contra candidaturas de terceira via é muito mais do que a ausência, até aqui, de nomes fortes entre os candidatos e a hipocrisia/artimanhas de líderes partidários. O que conspira é a combinação das regras da eleição proporcional com o aumento do poder do Legislativo no sistema de governo, e a essencial formação de bancadas nutridas. Situação agravada por um eleitorado que não diferencia “esquerda” ou “direita”.

O voto para deputado federal é “pessoal”, mas vai para a legenda do candidato no imenso distrito (o Estado) no qual disputa a eleição. Os donos do partido precisam de puxadores de voto, pois o que interessa na distribuição das cadeiras é o quociente partidário. “Puxadores” de votos são cada vez mais (sub)celebridades, representantes de corporações (igrejas, por exemplo) e, óbvio, a força do nome de um presidenciável em determinada região. Por isso um mesmo partido se interessa em apoiar Lula numa parte do País e Bolsonaro em outra.

É perfeitamente lógico, portanto, que as grandes agremiações se submetam às questões regionais, pois delas dependem a formação das bancadas e a consequente distribuição das ferramentas de poder num sistema no qual o Executivo se enfraqueceu consideravelmente. Nesse sentido, os nomes de Lula ou Bolsonaro ajudam aqui e atrapalham ali, mas os da terceira via, até aqui, não ajudam em lugar algum a engordar o quociente partidário.

Para os operadores da política, ser derrotado nas próximas eleições é ficar com poucos deputados – daí também as federações unidas pelo acesso aos fundos Partidário e eleitoral, e nem tanto para ter um candidato à Presidência. O “centrão”, que abrange as siglas “clássicas” dessa parte do espectro, mas também fatias de PSDB, MDB e União Brasil, é o retrato sem retoques do resultado das regras do jogo mais a “evolução” do sistema de governo. E, goste-se ou não, está ali nesse “centro” o espelho da “alma” do eleitor brasileiro.

Cuja demanda majoritária, indicam as pesquisas qualitativas, é “de direita”. Sem que ser “de direita” consiga nas pesquisas ser associado claramente a qualquer definição clássica da ciência política. O “público-alvo” a ser conquistado pela terceira via é uma proporção do eleitorado (uns 30% ou até mais). Mas isso é apenas um número, difuso e disperso, que não está, até aqui, agregado a um nome, a uma legenda e, muito menos, a uma plataforma “política”.

Regras do jogo, partidos fracos (em termos de programas e ideologias), piora do sistema de governo (que já era ruim) fazem da “polarização” entre Lula e Bolsonaro a continuação do que já temos. Que é paralisia e estagnação. (O Estado de S. Paulo – 07/04/2022)

WILLIAM WAACK, JORNALISTA E APRESENTADOR DO JORNAL DA CNN

Leia também

Lula rouba a cena e faz do 1º de Maio um palanque eleitoral

NAS ENTRELINHASAs centrais sindicais nem se deram conta dos...

O padrão a ser buscado

É preciso ampliar e replicar o sucesso das escolas...

Parados no tempo

Não avançaremos se a lógica política continuar a ser...

Vamos valorizar a sociedade civil

Os recentes cortes promovidos pelo Governo Federal, atingindo em...

Petrobrás na contramão do futuro do planeta

Na contramão do compromisso firmado pelo Brasil na COP...

Informativo

Receba as notícias do Cidadania no seu celular!