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Preço na indústria cai em junho após quatro meses de alta

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Os preços na indústria caíram 1,14% em junho conforme revelado, nesta quarta-feira (31), pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia) por meio do IPP (Índice de Preços ao Produtor). Já o acumulado do ano ficou em 2,76%.

Nos últimos 12 meses, a varição dos preços ficou em 3,75%. As principais quedas foram registradas no refino de petróleo e produtos de álcool (-7,24%), papel e celulose (-4,65%) calçados e artigos de couro (-3,56%) e fumo (-2,91%).

A indústria de alimentos registrou uma queda de 0,88% após três altas consecutivas. Com o resultado, o acumulado teve recuo de 2,09% para 1,20%. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a variação foi de 0,56%. O menor resultado desde maio de 2018 quando foi observado variação de 2,12% (Com informações do IBGE e agências de notícias)

Pesquisa do IBGE revela que taxa de desemprego no segundo trimestre foi de 12%

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O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revelou, nesta quarta-feira (31), por meio da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – Contínua) que o País registrou leve queda do desemprego de 0,7% no trimestre encerrado em Julho de 2019 ficando em 12%. No período anterior – que compreende os meses de janeiro, fevereiro e março – a taxa de desocupação foi de 12,7%.

A taxa de subutilização da mão de obra também apresentou queda e ficou em 24,8%. No trimestre anterior a taxa chegou a 25%. Quando comparado aos mesmos período no ano passado a subutilização foram, respectivamente, 12,4% e 25,5%.

Atualmente no País existem 12,8 milhões de pessoas sem trabalho e 287,4 milhões que trabalham menos horas do que poderiam. Já o rendimento real habitual apresentou queda de 1,3% saindo de R$ 2.321 no primeiro trimestre de 2019 para R$ 2.290 no segundo.

Ao analisar o número de desalentados, ou seja, pessoas que desistiram de procurar trabalho, se manteve o recorde no percentual da força de trabalho com 4,4%, ou, 4,9 milhões de pessoas. (Com informações do IBGE e agências de notícias).

Justiça decreta prisão de assassino de Miguel Donha

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A Justiça do Paraná decretou, no último dia 23 de julho, a prisão de Azemir João de Barros, conhecido como Alzemir Manfron, condenado a 16 anos e sete meses de prisão pelo assassinato do então pré-candidato a prefeito de Almirante Tamandaré Miguel Donha. O mandato de prisão foi expedido pela juíza Marina Lorena Pasqualotto, da Vara de Execução em Meio Fechado e Semiaberto de Rio Branco do Sul. Após quase 20 anos do crime, a polícia do Paraná está na captura do condenado pelo crime. Miguel Donha era bancário de profissão, político por essência e pertencente aos quadros do PPS, hoje Cidadania.

A morte de Miguel Donha chocou o Paraná no início de 2000. Assassinado no dia 22 de janeiro daquele ano, Donha era o principal nome da oposição para a disputa das eleições para prefeito do município, que fica localizado na Grande Curitiba. Na época a prefeitura era comandada por César Manfron, candidato à reeleição e irmão do condenado pelo crime. Na noite do crime, Donha e sua mulher, Iara, retornavam de um casamento quando foram abordados por dois homens no portão da chácara do casal. Ambos foram levados até Rio Branco do Sul e, no trajeto, Iara foi abandonada pela dupla. Em seguida, os criminosos dispararam contra as pernas de Donha, que teve uma artéria perfurada e não resistiu.

Três semanas após o crime, a polícia prendeu o mecânico Edson Farias, acusado de ser o autor dos disparos. Edson identificou seu comparsa apenas como Zé e disse que havia sido contratado por um motorista da prefeitura, Antônio Martins Vidal, o Tico Pompílio, para dar um “susto” em Donha. Em troca do serviço, Edson receberia R$ 300 e um cargo na prefeitura. O irmão do prefeito foi citado nas investigações como mandante do crime. Edson, Tico Pompílio e um cunhado do motorista foram assassinados no decorrer do processo. O motorista da prefeitura seria apenas o contratante do crime, restando à Promotoria a tarefa de identificar os verdadeiros mandantes.

Em 2017, Alzemir Manfron, irmão do ex-prefeito de Almirante Tamandaré Antonio Cesar Manfron de Barros, foi condenado por mandar matar Miguel Donha. Ele foi condenado a 16 anos, sete meses e 15 dias de prisão. Houve recurso da defesa e agora a Justiça determinou a prisão do acusado. Antes, em 2014, José Geraldo, seu cúmplice, foi condenado com a pena de 13 anos e 7 meses de reclusão. Porém, está foragido.

Luiz Carlos Azedo: Sarcófago do passado

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Nas entrelinhas

“Quando um governo começa a promover rupturas com a sociedade civil e impor diretrizes verticais às políticas públicas, como vem ocorrendo, gera tensões sociais e políticas desnecessárias”

Das muitas faces do fascismo como regime político, a que determina a essência de sua natureza é o terrorismo de Estado. A existência de um partido de massas organizado e militarizado, com um braço armado, que foi a característica principal dos partidos de Benito Mussolini, na Itália, e de Adolf Hitler, na Alemanha, não seria suficiente para a caracterização do regime se não houvesse implementado, de forma sistemática, o terrorismo de Estado.

A supressão de liberdades e garantias individuais e a perseguição sistemática de oposicionistas são suficientes para caracterizar um regime autoritário, seja de direita, seja de esquerda, como na Hungria e na Venezuela, respectivamente. O fascismo aberto se instala, porém, quando a repressão policial é acionada de forma sistemática contra a população em geral, a pretexto de manter a ordem pública, e a perseguição seletiva aos oposicionistas se estabelece com objetivo de eliminar fisicamente os adversários, por meio de prisões, sequestros, torturas e assassinatos.

Foi o que aconteceu, por exemplo, nos regimes militares que se instalaram na América Latina nas décadas de 1950 (Guatemala e Paraguai), 1960 (Argentina, Brasil, Bolívia, República Dominicana, Nicarágua e Peru) e 1970 (Uruguai e Chile), com forte apoio dos Estados Unidos, em razão da guerra fria com a União Soviética e demais países da então chamada Cortina de Ferro. A maioria desses países transitou para a democracia e se manteve na órbita do Ocidente, a partir do governo de Jimmy Carter, o presidente norte-americano que adotou a defesa dos direitos humanos como vértice de sua política externa, no fim dos anos 1970.

No Brasil, o processo de democratização foi uma longa transição, iniciada nessa época, com a “anistia geral, ampla e recíproca” aprovada pelo Congresso em 1979, depois de muita negociação entre os militares e a oposição. A redemocratização do país foi concluída em 1985, quando os militares deixaram o poder, com a eleição de Tancredo Neves pelo colégio eleitoral e a convocação de uma Constituinte pelo presidente José Sarney, o vice que assumiu devido à morte do presidente eleito.

A chave desse processo foi, de um lado, a volta dos exilados e a libertação dos presos políticos; de outro, a impunidade dos torturadores e assassinos que, nos porões do regime militar, fizeram o serviço sujo para os generais que ocuparam o poder. Esse é nó górdio da democracia brasileira, assunto pacificado entre as Forças Armadas, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) pela Constituição de 1988. Todas as tentativas de rever a Lei da Anistia fracassaram, inclusive nos governos Lula e Dilma; agora, com sinal trocado, para o bem da democracia, não deve ser diferente.

Fantasmas

No lamentável episódio dos comentários do presidente da República, Jair Bolsonaro, sobre o sequestro e o assassinato do líder estudantil Fernando Santa Cruz, pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, o mais grave não é o desrespeito para com a família do desaparecido e a insensibilidade do presidente Bolsonaro diante de um tema tão delicado (a perda de um parente próximo), é a defesa que fez do terrorismo de Estado praticado durante o regime militar, na contramão de tudo o que já foi feito para cicatrizar essa ferida purulenta. Revelou um viés autoritário que confronta a Constituição de 1988, suas instituições e compromisso claro com os direitos humanos. A rigor, confrontou o decoro e a responsabilidade do próprio cargo que exerce por vontade popular: a Presidência da República.

Não cabe ao presidente Bolsonaro, no âmbito das suas atribuições, fazer a exegese da Lei da Anistia, muito menos da Constituição que jurou cumprir e defender ao tomar posse, assunto sobre o qual quem se pronuncia é o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Sua insistência em revisitar, no sarcófago da ditadura, os fantasmas de um passado que não deve ser resgatado como modelo político, embora jamais deva ser esquecido, revela uma personalidade que se coloca acima do Estado democrático de direito, confundindo as próprias idiossincrasias com as prerrogativas do cargo.

Grosso modo, o atual governo tem características bonapartistas, por se colocar acima das classes sociais e se sustentar no “partido das armas”. Mas foi eleito num processo democrático, legitimamente, e a oposição precisa aprender a conviver com isso, sem abrir mão do direito ao dissenso e de lutar pelo poder. Entretanto, o presidente Bolsonaro também precisa aprender a respeitar as regras do jogo democrático e valorizar mais os consensos construídos ao longo de décadas para garantir a coesão da sociedade.

Quando um governo começa a promover rupturas com a sociedade civil e impor diretrizes verticais às políticas públicas, como vem ocorrendo em diversas áreas, gera tensões sociais e políticas desnecessárias, que podem dificultar e até agravar a solução dos verdadeiros problemas do país. (Correio Braziliense – 31/07/19)

Merval Pereira: Presidente em transe

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Ter um presidente sem superego, sem limites e controles, não é fácil. É um teste para nossa democracia, que tem que impor os limites. Nem se fale na insensibilidade, na falta de respeito com os mortos de um período negro de nossa história.

Ou na atitude pouco civilizada de justificar o massacre de 57 presos da penitenciária de Altamira(PA), numa briga de gangues,comos crimes que cometeram. Perguntado sobre sua reação ao massacre, o presidente respondeu: “Pergunte às vítimas deles o que acham”.

Ao dar uma explicação, que não lhe foi pedida, com aparente sentimento de raiva, sobre a morte do pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, o presidente Bolsonaro mostrou que pode ser irresponsável mesmo fora do palanque.

Primeiro sugeriu, e depois afirmou, que ele foi “justiçado” por seu próprio grupo guerrilheiro. Documentos oficiais do governo brasileiro, entre eles o relatório da Comissão da Verdade e um atestado de óbito dado pelo Ministério dos Direitos Humanos de seu governo, indicam que Fernando Santa Cruz, então com 26 anos, militante da Ação Popular Marxista-Leninista (APML), foi preso no Rio e levado para uma instituição militar.

É dado como desaparecido até hoje, e há versões de que seu corpo possa ter sido incinerado. Bolsonaro, no dia seguinte, voltou ao tema, e confidenciou que sua fala “foi coisa minha, coisa pessoal”, provavelmente para se livrar de ter que explicar ao Supremo Tribunal Federal (STF) onde obteve tal informação.

O fato é que Bolsonaro está levando o governo brasileiro como se estivesse em uma mesa de botequim, ou no Twitter, ou em outro meio digital desses onde cada um dá seu pitaco sem precisar provar nada, de usar a lógica, o bom senso.

Geralmente entusiasmados pela bebida, ou pelo anonimato, essas pessoas deixam de lado seu superego, e falam sobre qualquer assunto, dão palpite sobre tudo. Geralmente com ódio, o mesmo ódio que estava embutido na provocação inicial.

O presidente Bolsonaro tem estado em transe nos últimos dias. Acusa, repete a acusação, ataca pessoalmente aqueles que considera inimigos, joga pressão em cima das instituições e cria situações embaraçosas. Vergonha alheia é o que os cidadãos minimamente civilizados devem sentir pelo seu presidente.

Mas o pior de tudo é que essa vergonha nos atinge como cidadãos, como país. Coloca-nos à parte da comunidade internacional, nos iguala a países onde não existe democracia, onde é normal o nepotismo, o achincalhe é uma arma política. Filipinas de Duterte é exemplar desse estado de coisas.

Mas também no país mais democrático do mundo, os Estados Unidos, sob a administração de Donald Trump, a grosseria verbal no Twitter passou a ser uma estratégia de aproximar-se do seu eleitorado e tentar desmoralizar as instituições que impõem limites ao Executivo. E ainda teremos o primeiro-ministro da Inglaterra, Boris Johnson.

Foi-se o tempo em que tivemos líderes de direita como Ronald Reagan ou Margaret Thatcher. É um fenômeno da atualidade que está levando o mundo para um caminho muito perigoso, com o descrédito das instituições e tentativa de aumento de poder pessoal dos mandatários. Como na Rússia de Putin, outro autocrata por quem Bolsonaro diz ter “profundo respeito”.

Bolsonaro cria um ambiente que não combina com uma corrida para novos caminhos que sua política econômica indica. Como a correta política de desburocratização, que ontem deu mais um passo importante com as normas regulamentadoras e de consolidação da legislação trabalhista.

As reformas estruturais, fundamentais para um recomeço de crescimento econômico, não podem ficar ameaçadas por arroubos personalistas de quem continua no palanque, obcecado por demolir. (O Globo – 31/07/19)

Vera Magalhães: Freios e contrapesos

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Peço desculpas ao leitor acostumado às colunas das quartas-feiras, em que costumo “quebrar” os textos em várias notas, de cunho mais informativo. A escalada da retórica autoritária e sem compromisso com fatos e com a verdade do presidente da República, desde há algumas semanas, me obriga a fazer deste texto uma continuação da minha coluna de domingo, em que alertei para o crescimento do cordão dos puxa-saco que cerca Jair Bolsonaro e dos riscos que isso traz para o debate público e para o próprio ambiente democrático.

Duas perguntas têm sido repetidas nas conversas que tenho com políticos, outros formadores de opinião, leitores, ouvintes, familiares, ministros do Supremo e toda uma gama de pessoas preocupadas com as diatribes bolsonaristas: 1) qual o limite para o que ele pode dizer?, e 2) como fazê-lo parar? Nos dois casos tenho respondido, entre constrangida e preocupada: não dá para saber.

Dizer que tudo bem usar helicóptero para levar a parentada cafona ao casamento do filho futuro embaixador nos Estados Unidos parecia um recorde. Quebrado no mesmo dia com a ameaça a um jornalista, dizendo que ele poderia pegar “cana”. Superado dois dias depois pela indignidade dirigida ao presidente da OAB. Reiterada duas vezes e superada por relativização (comemoração?) pelo assassinato de um cacique indígena e o massacre de 57 presos – que, não custa ser pleonástica, estavam sob custódia do Estado.

Portanto, não é possível dizer qual o limite para um presidente que não tem a menor noção do decoro que o cargo exige dele, nem das obrigações que recaem sobre seus ombros desde que jurou seguir a Constituição – que veda, um a um, esses comportamentos que ele exibe enquanto corta o cabelo.

E quem vai enumerar esses limites e alertar para os riscos de manter essa corda institucional assim esticada? Deveriam ser os militares. Foi este o grande trunfo, alardeado por mim, inclusive, na primeira hora, da nomeação de tantos generais para o primeiro escalão: eles incutiriam em Bolsonaro a noção de republicanismo que ele nunca teve, nem quando era capitão, nem como deputado.

Talvez por isso tenham sido eles, os militares, os primeiros alvos da máquina de moer reputações do bolsonarismo montada sob os auspícios do guru da Virgínia, Olavo de Carvalho, com direito a honrarias do próprio presidente, de seus assessores palacianos e da família.

Agora, entre acuados e desmoralizados, os militares pensam duas vezes antes de contrapor os absurdos que saem diariamente da boca presidencial. Sem os militares em cena, cabe ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal a missão de fazer valer o sistema de freios e contrapesos da democracia, limitando por meio dos instrumentos de que dispõem a tentação onipotente de Bolsonaro. O Congresso já derrubou dois decretos do presidente, tornou o Orçamento mais impositivo e articula em frentes diferentes novas derrotas ao presidente, em temas como a portaria do Ministério da Justiça sobre deportações e a restrição radical à edição de medidas provisórias.

No STF, cresce a disposição de acatar a interpelação do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, para que Bolsonaro seja instado a dizer o que sabe do desaparecimento de seu pai ou se retratar. Seria uma linha riscada no chão, como a dizer de forma didática e eloquente ao presidente que existe um limite que ele não pode extrapolar: o princípio da moralidade, consignado na Constituição, que obriga a que a palavra do presidente tenha lastro na verdade fática e histórica e no mínimo de humanidade dirigida àqueles que governa, mesmo aqueles que ousam dele divergir. Afinal, estamos numa democracia.

Secretários estaduais sugerem reforma tributária alternativa

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Estados preparam reforma tributária alternativa

Proposta altera texto que está em tramitação na Câmara. Governos querem garantir autonomia para arrecadar impostos e manutenção de políticas de incentivo regional. Unificação de ICMS e ISS também está em análise

MARCELLO CORREA – O Globo

BRASÍLIA- Secretários estaduais de Fazenda apresentarão hoje um projeto alternativo de reforma tributária. O texto é baseado na proposta de emenda à Constituição (PEC) que tramita na Câmara dos Deputados e prevê a substituição de cinco impostos por apenas um tributo, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) ou Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). As sugestões dos estados buscam diminuir incertezas em relação à arrecadação e à política de incentivos fiscais.

A proposta que está na Câmara é inspirada no trabalho do economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCif). O IBS ou IVA substituiria os seguintes impostos: IPI, PIS, Cofins (federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal). Como inclui tributos regionais, a divisão de recursos seria feita por um conselho formado por União, estados e municípios. Além disso, o modelo de incentivos tributários seria extinto.

O risco de perda de arrecadação e as incertezas em relação às políticas de incentivo regional foram os pontos que mais preocuparam os estados. O texto elaborado por eles busca resolver isso definindo que a administração do novo tributo será feita pelos estados e explicitando que parte dos recursos financiará fundos de desenvolvimento.

Segundo o secretário de Fazenda do Piauí, Rafael Fonteles, coordenador do Conselho Nacional dos Secretários de Fazenda (Consefaz), as modificações sugeridas geraram convergência para que estados sejam incluídos na reforma tributária. A própria equipe econômica do governo não pretende incluir os estados em sua proposta por temer que resistências poderiam inviabilizar a aprovação.

— A autonomia e o fundo de desenvolvimento regional geraram a convergência. Além da compreensão dos secretários de que há uma necessidade, que não pode ser mais adiada, de simplificação tributária para gerar mais crescimento econômico —afirmou Fonteles.

MINIRREFORMA

O avanço de outras reformas no Congresso, especialmente a da Previdência, sinalizou que é possível uma proposta que contemple estados.

— Você está vendo o Congresso deliberando sobre diversas matérias antes muito complicadas de avançar, está vendo uma tramitação célere.

Os estados não podiam ficar sem sua proposta, ou pelo menos uma alteração à proposta do CCif — disse Fonteles.

Os estados consideram ainda propor uma espécie de minirreforma tributária, englobando apenas impostos regionais (ICMS e ISS).Esses tributos seriam substituídos por um único imposto, que vem sendo chamado de “IVA dual”.

A alternativa, no entanto, só avançaria se o governo decidir apresentar uma proposta que englobe apenas impostos federais, acrescentou Fonteles.

Contingenciamento atinge ministérios da Cidadania e Educação

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Cidadania e Educação sofrem os maiores cortes

Contingenciamento adicional de R$ 1,442 bi anunciado semana passada atinge também Saúde, Economia, Turismo e outros quatro ministérios

Lorenna Rodrigues / BRASÍLIA – O Estado de S. Paulo

O governo publicou na noite de ontem edição extra do Diário Oficial da União que distribui entre os órgãos do Executivo o contingenciamento de R$ 1,442 bilhão, anunciado na semana passada. O ministério mais atingido foi o da Cidadania, que teve mais R$ 619 milhões congelados. No total, a pasta tem contingenciados R$ 1,3 bilhão de um orçamento total de R$ 4,9 bilhões no ano.

Em seguida, a maior tesourada foi na Educação, com R$ 348,5 milhões contingenciados. O ministério tem R$ 6,1 bilhões contingenciados de um orçamento de R$ 25 bilhões – os cortes na Educação foram alvos de protestos no início do ano. O Ministério da Economia teve mais R$ 282,6 milhões contingenciados e o do Turismo outros R$ 100 milhões. Também foram atingidos os Ministérios da Ciência e Tecnologia (R$ 59,8 milhões), Agricultura (R$ 54,7 milhões), Relações Exteriores (R$ 32,8 milhões) e Meio Ambiente (R$ 10,1 milhões) Saúde (R$ 6,9 milhões).

Por outro lado, em meio à crise nas penitenciárias, foram liberados R$ 60 milhões para o Ministério da Justiça e outros R$ 5 milhões para o da Família e Direitos Humanos. Outros R$ 809 milhões da reserva orçamentária foram utilizados para fechar as contas e evitar um contingenciamento ainda maior.

Adicionais. O bloqueio adicional de R$ 1,442 bilhão no Orçamento se somou aos R$ 29,7 bilhões divulgados em março. O chamado contingenciamento é feito para o governo atingir o déficit primário (despesas maiores do que receitas, sem contar as despesas com juros) de até R$ 139 bilhões em 2019.

Há a possibilidade de o governo desbloquear esses recursos até o fim do ano. Para isso, porém, depende do ingresso de receitas adicionais. Esses recursos podem ser obtidos de forma extraordinária (com venda da ativos) ou por meio de crescimento maior da economia, o que causaria o aumento na arrecadação.

Documentos oficiais comprovaram crimes cometidos pela ditadura, diz O Globo

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Após questionar morte do pai do presidente da OAB, Bolsonaro chama de “balela” registros formais do Estado sobre repressão

JULIANA DAL PIVA E JUSSARA SOARES – O Globo

BRASÍLIA E RIO

Um dia depois de negar que o desaparecimento do ex-militante Fernando Santa Cruz, em 1974, tenha sido responsabilidade do regime militar, ao contrário do que confirmam documentos oficiais, o presidente Jair Bolsonaro voltou ontem a minimizar registros formais do Estado sobre a repressão durante a ditadura. O presidente contestou o trabalho da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que apurou entre 2012 e 2014 violações dos direitos humanos no regime.

— A questão de 1964… não existem documentos de matou, não matou, isso aí é balela. Você quer documento para isso (desaparecimento de Fernando Santa Cruz), meu Deus do céu. Documento é quando você casa, você se divorcia. Eles têm documentos dizendo o contrário? — perguntou Bolsonaro.

Ontem, O GLOBO e a Época revelaram um registro secreto da Aeronáutica datado de 1978 sobre a prisão de Fernando Santa Cruz em 1974 e um atestado de óbito, da semana passada, da Comissão de Mortos e Desaparecidos, do Ministério dos Direitos Humanos, afirmando que Santa Cruz foi morto quando estava sob domínio do Estado.

ARQUIVOS OFICIAIS

O caso de Santa Cruz, porém, não foi o único de crimes contra os direitos humanos durante a ditadura comprovados com documentos oficiais nas últimas décadas. Diversos outros arquivos oficiais revelaram a situação das vítimas fatais da ditadura. Um dos mais extensos é o do Serviço Nacional de Informações (SNI), órgão de inteligência que assessorava diretamente a Presidência da República durante a ditadura, e disponível para consulta desde 2012.

Nesse arquivo está, por exemplo, a foto que comprova que o engenheiro Raul Amaro Nin Ferreira, preso por agentes do Dops, no Rio, em 1° de agosto de 1971, estava com sua integridade física e saúde preservadas quando entrou na carceragem. Depois de preso, foi levado no dia seguinte para o DOI-Codi, no quartel da Polícia do Exército, na Tijuca. Torturado durante dias, morreu no Hospital Central do Exército. Os militares devolveram o corpo à família 11 dias depois.

— Na imagem, ele está visivelmente surpreso, assustado com a prisão arbitrária e, com certeza, não fazia ideia do que estava lhe esperando: câmaras de tortura organizadas no quartel da Polícia do Exército e o leito de morte no Hospital Central do Exército (HCE). Em muitos outros casos, nem se viu o corpo —lamentou Pedro Ferreira, irmão de Raul, ao receber a imagem, inédita na ocasião.

Vários outros casos, nas últimas três décadas, tiveram sua história revelada e comprovada a partir das iniciativas do governo federal e leis aprovadas no Congresso para investigar abusos cometidos pelo regime militar.

A primeira delas veio em 1995 por meio da Lei 9.140, chamada lei dos desaparecidos políticos. As famílias de muitos desaparecidos ficaram, por anos, sem certidão de óbito, impossibilitadas de resolver questões como divisões de herança, acesso a contas bancárias, entre outros. A lei veio para reconhecer as vítimas e ajudar nessas questões. No ato da promulgação, foram reconhecidos 136 desaparecidos. Fernando Santa Cruz era o número 41.

A primeira comissão instalada foi a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos para reconhecer as demais vítimas que morreram sob tortura ou circunstâncias que envolviam agentes da ditadura. Essa comissão, criada por lei, segue em atuação até hoje e tem como responsabilidade localizar e identificar corpos de desaparecidos que ainda não foram devolvidos às famílias. A comissão reconheceu 479 vítimas entre mortos e desaparecidos.

A segunda foi a Comissão de Anistia, criada por lei em 2002 e que atende aos pedidos de pessoas que sofreram tortura, mas sobreviveram. Para os familiares de mortos e desaparecidos, porém, restava a demanda de identificar os agentes públicos responsáveis pelos crimes. Mesmo que não fossem aos tribunais devido à Lei de Anistia, as famílias argumentavam pelo “direito à verdade”. Assim, em 2012, foi criada a Comissão Nacional da Verdade (CNV) que tinha poder para investigar os crimes cometidos por agentes da ditadura — algo que a Cemdp não tinha poder pra fazer.

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (31/07/2019)

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MANCHETES

O Globo

Bolsonaro: ‘Sou assim mesmo, não tem estratégia’
Trump quer livre comércio com o Brasil
Paraguai vive risco de impeachment com crise de Itaipu

O Estado de S. Paulo

Trump defende livre-comércio entre EUA e Brasil
Auxiliares querem menos exposição de Bolsonaro
Cidadania e Educação sofrem os maiores cortes
‘Combate à lavagem ficaria prejudicado’

Folha de S. Paulo

Ato de Bolsonaro pode atrasar aval a acordo UE-Mercosul
Após motim, detentos são transferidos a outros estados
Entorno do presidente busca a lógica de suas falas
Brasil vai a reunião com negacionistas do clima pela 1a. vez

EDITORIAIS

O Globo

Bolsonaro ainda não assumiu a Presidência

Afirmações em desacordo com o cargo que ocupa formalmente prejudicam o governo e o país


Integrante da bancada do baixo clero durante 28 anos, o deputado e ex-capitão Jair Bolsonaro notabilizou-se pelo histrionismo. Sempre defendeu a ditadura militar e sua violência contra opositores, e trabalhou em favor de demandas corporativistas dos militares. Mas soube aproveitar ventos favoráveis para se tornar um candidato viável em 2018.

Teve a seu favor o cansaço com o lulo petismo e a esquerda em geral, assim como a impossibilidade de outras forças políticas lançarem um candidato competitivo de centro.

Outra sorte foi disputar o segundo turno com o representante do PT, Fernando Haddad. Assim, Bolsonaro ganhou uma eleição plebiscitária, atraindo muito eleitor mais pela rejeição à esquerdado que por apoio à sua agenda na totalidade.

Eleito, pensava-se que Bolsonaro abandonaria o figurino do baixo clero, o histrionismo dos tempos de Câmara, entendendo o seu papel. Não é o que se vê. O presidente mantém o comportamento de baixo clero, e configurava-se o que se temia: ele é uma das maiores ameaças ao próprio governo.

Há pouco, microfones captaram um comentário preconceituoso seu sobre os governadores nordestinos, os “paraíba”, em especial Flávio Dino,do PC do B do Maranhão. Em viagem à Bahia, pelo menos esforçou-se numa tentativa de reduzir o dano, até com chapéu de couro na cabeça.

O recuo de nada adiantou. Agora, ao criticar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e seu presidente, Felipe Santa Cruz, por não ter sido possível quebrar os sigilos do defensor da pessoa que o esfaqueou — é prerrogativa legal e estatutária da OAB defender imunidades dos associados —, o presidente resolveu comentar o desaparecimento do pai de Felipe, Fernando Santa Cruz, militante da Ação Popular (AP).

Apesar de ser um caso já rastreado, Bolsonaro disse que se Felipe quisesse saber o que houve com o pai, lhe perguntasse. Na versão insustentável de Bolsonaro, Fernando foi “justiçado” por companheiros. Não importa para o presidente que na semana passada o próprio governo tenha emitido o atestado de óbito do pai do presidente da OAB, vítima de “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro”.

Ao atacar a Comissão da Verdade, em que tramitam os casos de torturas, mortes e desaparecimentos, Bolsonaro tachou de “balela” documentos como os que lastreiam a certidão de óbito.

Se houvesse assumido de fato a Presidência, hoje Bolsonaro estaria preocupado com o fim do recesso do Congresso, na semana que vem, quando será retomado o debate sobre a reforma da Previdência, para que seja votada em segundo turno na Câmara. Estes, sim, são assuntos que deveriam preocupar Bolsonaro, cujo futuro político está sendo jogado nesta e nas demais reformas. Decide-se também a estabilidade do país.

Exploração de terras indígenas é causa de atrito com o Congresso

Supremo começa a arbitrar choques decorrentes da intenção de se abrir reservas a investimentos

Jair Bolsonaro está conduzindo seu plano para a exploração econômica de terras indígenas ao limite de um conflito institucional com o Congresso. Requisitada em caráter de urgência, a arbitragem do Supremo Tribunal Federal está prevista para ocorrer na sessão de amanhã.

Na segunda-feira ele argumentou em defesa da abertura das terras indígenas à exploração econômica, para expansão da agricultura, da mineração e do garimpo, entre outras atividades: “O Brasil vive de commodities. Daqui a pouco, o homem do campo vai perder a paciência e vai cuidar da vida dele. Vai vender aterra, aplicar (o dinheiro) aqui ou lá fora, e cuidar da vida dele. A gente vai viver do quê? O que nós temos aqui além de commodities?” Ele parece empenhado em cumprir supostos compromissos que teria assumido durante a campanha eleitoral. São legítimos, passíveis de mudanças legais, mas o presidente precisa se manter nos limites da legalidade constitucional.

Depois de 28 anos na vida parlamentar, Bolsonaro não pode alegar desconhecimento da Constituição, cujo Capítulo VIII, sob o título “Dos Índios”, reconhece os “direitos originários” dos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam e dá-lhes posse permanente, com “usufruto exclusivo” das riquezas. Determina à União a demarcação das terras, qualificando-as como “inalienáveis e indisponíveis”, e fixando os direitos dos índios sobre elas como “imprescritíveis”.No entanto, Bolsonaro insiste em testar os limites institucionais, sob estímulo da ala mais radical do lobby ruralista, que influi em decisões do governo, mas não reúne votos suficientes para se impor dentro da bancada parlamentar setorial.

Já no primeiro dia de governo, transferiu a demarcação e registro de terras indígenas, assim como a Funai, para o Ministério da Agricultura. Fez isso numa Medida Provisória (n° 870), que reestruturou ministérios. Em maio, o Congresso aprovou a MP, mas repôs a atividade de demarcação na Funai e devolveu-a ao Ministério da Justiça, onde estava. Insatisfeito, dias depois Bolsonaro editou outra Medida Provisória (n° 886), desfazendo a decisão do Congresso.

A oposição judicializou o conflito. O ministro do STF Luís Roberto Barroso suspendeu o ato de Bolsonaro, liminarmente, lembrando a expressa proibição constitucional de reedição de normas vencidas no Congresso na mesma sessão legislativa. E pediu urgência no julgamento .

O caso mostra que não basta a vontade presidencial. Mudanças sempre são possíveis, mas é preciso respeitar a Constituição.

O Estado de S. Paulo

Custo elevado tolhe expansão do crédito

O estoque de operações de crédito do Sistema Financeiro Nacional atingiu R$ 3,3 trilhões em junho, com crescimento nominal de 0,4% no mês e de 5,1% em 12 meses. Ainda mais cresceram as concessões de crédito: 11,6% no mês e 11,9% em 12 meses. O que não mudou é a relação entre o crédito às pessoas físicas e jurídicas e o Produto Interno Bruto (PIB), estável em 47,2% nos meses de abril, maio e junho e apenas levemente superior à de 47% observada em junho de 2018.

O custo dos empréstimos ajuda a explicar por que famílias e empresas evitam o endividamento bancário. Às vésperas de reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC), em que a redução do juro básico é tida como provável pela maioria dos economistas, são escassos os sinais de queda dos juros cobrados pelos bancos e dos spreads (diferença entre o custo de captação e o custo de aplicação dos recursos).
Entre junho de 2018 e junho de 2019, enquanto a taxa básica de juros se mantinha em 6,5% ao ano, a inflação oficial em 12 meses caía de 4,39% para 3,37% e a atividade econômica pouco evoluía, o juro médio de operações com recursos livres realizadas com pessoas físicas subia 0,1 ponto porcentual, para 53,2% ao ano (e o spread subia 2,8 pontos porcentuais).

O peso das pessoas físicas no crédito bancário é crescente – e interessa aos bancos porque os juros são maiores. As famílias ocupam, assim, o espaço que era das empresas. Entre dezembro de 2017 e junho de 2019, o saldo de crédito das pessoas jurídicas diminuiu em termos nominais, para R$ 1,4 trilhão, enquanto o das pessoas físicas cresceu 13%, chegando próximo de R$ 1,9 trilhão. Em vez de ser instrumento apropriado para o desenvolvimento econômico, o crédito acaba sendo tomado como remédio, principalmente em operações caríssimas como o cheque especial.

O alto custo do crédito tem empurrado empresas com melhores perspectivas para o mercado de capitais, no qual podem emitir debêntures ou se capitalizar vendendo ações. O BC parece alimentar algum otimismo quanto à recuperação do crédito, embora o chefe do departamento de estatísticas do banco, Fernando Rocha, admita que o custo dos empréstimos ainda é muito elevado. Em parte isso se deve, segundo Rocha, à substituição do BNDES por outros bancos como fornecedores de crédito às empresas.

A política da raiva

O destampatório de Jair Bolsonaro nos últimos dias – especialmente virulento mesmo para os padrões do presidente – contribui para ampliar o seu isolamento político. Afinal, grande parte do eleitorado que sufragou o nome de Bolsonaro nas urnas no ano passado não o fez para que ele, uma vez na Presidência, passasse seus dias a alimentar violentos antagonismos com diversos setores da sociedade, dificultando consideravelmente a governabilidade. Mesmo entre os políticos que se elegeram na onda do bolsonarismo já há os que procuram manter uma distância prudente do presidente, pois temem ser identificados com a irresponsabilidade que tem caracterizado o comportamento de Bolsonaro.

Se entusiasmam os devotos mais fiéis da seita bolsonarista, as diatribes do presidente colaboram para anuviar ainda mais o sombrio horizonte político e econômico do País. O homem encarregado pelas urnas de dirigir os destinos nacionais choca diariamente a maioria dos brasileiros com declarações absurdas, baseadas em nada além de devaneios e despejadas sem qualquer respeito pelas normas da democracia e mesmo da civilidade. Tal comportamento irrefletido torna imprevisível tudo o que emana do gabinete presidencial. Hoje, sob esse comando irracional, é impossível dizer para onde vai o País.

Não à toa, as forças políticas no Congresso há algum tempo parecem se organizar para fazer avançar as reformas das quais o Brasil depende para evitar o colapso fiscal e ter alguma chance de retomar o crescimento econômico. Para o setor produtivo, o mais importante no momento é que o País reencontre o caminho da recuperação, colocando em segundo plano o destempero do presidente Bolsonaro, por mais infame que seja em algumas ocasiões.

Não é possível conceber, contudo, que um governo possa continuar indefinidamente na dependência dos humores do Congresso e, muito menos, da instabilidade emocional do presidente, que a cada dia se mostra menos preparado para o cargo que exerce. E esse despreparo não se manifesta apenas por sua patente e muitas vezes assumida ignorância a respeito dos principais desafios da administração do País. O maior sinal de que Bolsonaro não é vocacionado para a Presidência da República é sua incapacidade de aceitar os limites institucionais do regime democrático.

Em mais de uma ocasião, Bolsonaro agiu como se sua vontade pessoal fosse superior à Constituição, assinando decretos e medidas provisórias eivadas de ilegalidades. O presidente parece considerar que sua eleição transformou automaticamente em lei suas promessas de campanha e seus arroubos retóricos, bastando somente traduzi-los em linguagem jurídica.

Os bolsonaristas mais radicais, contudo, acreditam que Bolsonaro foi eleito justamente para questionar os pilares do sistema democrático, que para eles está inteiramente corrompido. Nessa campanha de saneamento nacional vale tudo, inclusive fraudar o passado, como fez recentemente o presidente ao atribuir a morte de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, um dissidente do regime militar, ao grupo de esquerda do qual ele fazia parte, embora o próprio Estado brasileiro admita, em documentos oficiais, que esse dissidente desapareceu depois de ter sido preso pela polícia política.

Para Bolsonaro, contudo, esses documentos são, simplesmente, “balela”. O presidente segue assim o padrão de duvidar de tudo o que contraria sua visão de mundo, mesmo que tenha sido produzido por autoridades de dentro de seu próprio governo ou por especialistas sem qualquer vinculação partidária.

Assim, o presidente Bolsonaro tenta usar sua autoridade de chefe de Estado para transformar em letra morta a base factual da história brasileira, o que tornaria legítima qualquer opinião acerca do passado, mesmo as mais estapafúrdias e aquelas que se prestam a alimentar laivos liberticidas. Esse lamentável episódio não foi apenas um ataque isolado à memória de um dissidente político, mas uma demonstração cabal de que Bolsonaro não se sente constrangido por nenhuma das normas de convivência democrática. Um governo com esse espírito, que não respeita o passado, não anuncia um bom futuro.

Mais um massacre

Mais um massacre – desta vez no presídio Centro de Recuperação Regional de Altamira (CRRALT), no Pará, segunda-feira, que deixou 57 mortos – expõe a tragédia que vive há muitos anos o sistema penitenciário brasileiro. O poder público a tudo assiste impotente, limitando-se a tomar medidas paliativas, que em nada melhoram a situação calamitosa das prisões superlotadas. Ela é que cria as condições para que se amplie e se reforce cada vez mais o controle que organizações criminosas exercem sobre as prisões. E é a disputa de poder entre essas facções que provoca os massacres, num ciclo de violência que parece não ter fim.

Repetiu-se em Altamira o roteiro de mortes e cenas macabras que virou a marca dos massacres que sacodem regularmente os presídios. Desta vez, o massacre foi resultado de uma disputa entre o Comando Classe A (CCA) – organização criminosa que surgiu no Pará há 11 anos e domina a região de Altamira – e o Comando Vermelho (CV), com base no Rio de Janeiro. Os líderes do CCA atearam fogo a uma cela, e o incêndio logo se espalhou pelo pavilhão ocupado por integrantes do CV. Morreram asfixiados 41 presos e outros 16 foram decapitados.

O incêndio se propagou rapidamente por causa das instalações do presídio descritas como “péssimas” por relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicado justamente um dia antes. A penitenciária foi construída precariamente, adaptada a contêineres. Igualmente péssimas são as demais condições: superlotação – 342 presos para 163 vagas, mais que o dobro – e apenas 33 agentes penitenciários, que não têm condições de controlar a massa de presos. Não admira que seja tão fácil o controle da penitenciária pelas organizações criminosas.

Os presos fazem ali o que querem. Promovem rebelião, como em setembro de 2018, quando 7 presos morreram, 3 ficaram feridos e 16 tentaram fugir. Ou acertos de contas. Como reconheceu o secretário para Assuntos Penitenciários do Pará, Jarbas Vasconcelos, o CCA cumpriu à risca, disciplinadamente, seu objetivo de atacar somente o CV, liberando mesmo dois agentes penitenciários que haviam sido tomados como reféns.

O Centro de Recuperação Regional de Altamira é uma amostra da maior parte dos presídios do País. E a reação do poder público a mais esse trágico episódio é também um resumo do que se faz nesses casos. O ministro da Justiça, Sergio Moro, ligou para o governador Helder Barbalho (MDB), apresentou sua solidariedade e prometeu ajuda, no caso a transferência para presídios federais dos líderes das facções em luta. Quanto ao governo do Estado, seria surpreendente se adotasse alguma medida capaz de mudar substancialmente a situação.

É por isso que a situação nos presídios, salvo poucas exceções, como a criação dos presídios federais de segurança máxima, continua a se deteriorar. Os massacres e as rebeliões se sucedem. Nos últimos dois anos e meio, o saldo de mortos nesses episódios foi de 227. Boa parte deles no Norte e no Nordeste, em presídios de Manaus, Boa Vista e Rio Grande do Norte. Os mortos se contam às dezenas em cada caso. A esse total se devem acrescentar os 57 de Altamira.

Com os massacres, as cenas de selvageria se tornam cada vez mais frequentes – das decapitações até casos de canibalismo -, numa regressão ao primi-tivismo que enche o País de vergonha. Essa situação só pode mudar se e quando os governos estaduais – aos quais cabe cuidar do sistema penitenciário – e a União decidirem empreender uma ação conjunta de grande escala, para reduzir o déficit de vagas nos presídios e retomar o seu controle efetivo, há muito nas mãos de organizações criminosas. É esse o caldo de cultura que alimenta os massacres e as rebeliões, num circo de horrores.

As organizações comandam o crime – a começar pelo tráfico de drogas, há muito seu principal negócio – de dentro das prisões, onde agem livremente. E sob a proteção do Estado. Até quando isso vai continuar?

De volta ao realismo comercial?

Brasil e Estados Unidos, as duas maiores economias americanas, poderão enfim ligar-se por um acordo comercial, se as boas palavras de um e de outro lado tiverem algum valor prático. “Vamos trabalhar por um acordo de livre comércio com o Brasil”, disse na Casa Branca o presidente Donald Trump, num contato com jornalistas. O objetivo é firmar o acordo mais ambicioso e abrangente, disse em Brasília o secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo. Este será quase certamente o grande assunto do secretário de Comércio dos Estados Unidos, Wilbur Ross, no encontro programado para hoje, em Brasília, com o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes. O secretário americano já se encontrou em São Paulo com dirigentes de empresas do Brasil e dos Estados Unidos e a ideia de um pacto comercial foi explorada.

O governo brasileiro só poderá negociar um acordo de livre comércio com os Estados Unidos em companhia dos demais sócios do Mercosul, Argentina, Paraguai e Uruguai. O bloco é uma união aduaneira e nenhum de seus membros pode firmar isoladamente um acordo daquele tipo. No caso do recém-concluído acordo com a União Europeia, os dois lados atuaram coletivamente.

A busca de um pacto comercial com os Estados Unidos foi anunciada pelo presidente Mauricio Macri, da Argentina, poucos dias depois de concluída a negociação do Mercosul com a União Europeia. A pauta diplomática do bloco sul-americano incluiria também o avanço em conversações do Japão, Canadá e Coreia. A Argentina ocupava, naquele momento, a presidência rotativa do Mercosul. O Brasil deveria assumir o posto logo depois.

Se a negociação com os Estados Unidos prosperar, os governos do Mercosul retomarão, em novas condições, uma agenda interrompida há pouco mais de 15 anos, quando os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner torpedearam o projeto da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Sob liderança do petismo e do kirchnerismo, o Mercosul só manteve – e com muitos entraves – uma negociação com um grande mercado de primeiro mundo, a União Europeia.

Por um longo período, a diplomacia do bloco, subordinada a um terceiro-mundismo requentado, concentrou-se na busca de entendimentos Sul-Sul, dando prioridade a mercados modestos e pouco desenvolvidos. Enquanto isso, grandes parceiros emergentes, como China, Rússia e África do Sul, estavam mais interessados em fechar negócios com o mundo mais avançado e rico.

Além de negligenciar os entendimentos com parceiros mais desenvolvidos, o Mercosul ainda regrediu como bloco. Manteve o status formal de união aduaneira, mas nunca chegou a implantar plenamente as condições – menos ambiciosas – de área de livre comércio. Barreiras intrabloco foram mantidas e nunca se consolidou uma efetiva integração produtiva entre os sócios.

Enormes oportunidades foram perdidas. A China tornou-se o maior mercado para mercadorias brasileiras, mas apenas primárias, como produtos agrícolas e minerais. Os manufaturados nunca chegaram a representar 5% das vendas brasileiras. Os Estados Unidos permaneceram, individualmente, como segundo maior parceiro, mas com um comércio muito mais diversificado. Ano após ano, os manufaturados têm proporcionado cerca de 50% -e até mais – da receita obtida no mercado americano. Os governos petistas mostraram-se incapazes, por limitação ideológica, de buscar o máximo proveito em cada relação.

Liquidada a Alca, os EUA fecharam acordos comerciais com países da América do Sul e da América Central. Já eram associados ao México e ao Canadá no Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta). O Mercosul ficou para trás.

Se houver realismo e competência diplomática, o Mercosul poderá avançar, depois de muito atraso, no rumo da integração internacional. Mas o governo brasileiro terá de se mostrar capaz de distinguir entre interesse econômico e alinhamento. Se falhar, errará como o PT, mas com sinal trocado.

Folha de S. Paulo

Espiral de infâmias

Em série de declarações, como o ataque sórdido ao pai do presidente da OAB, Bolsonaro escancara despreparo, leviandade e inclinações autoritárias


Numa escalada sem precedentes de insultos às normas de convívio democrático, aos fatos históricos, às evidências científicas e aos direitos humanos, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) aguçou nos últimos dias as tensões e incertezas em torno de sua administração.

Se no início de mandato declarações e medidas estapafúrdias ainda podiam, com boa vontade, ser vistas como tentativa de satisfazer o eleitorado mais fiel e ideológico, o que se verifica agora é um padrão de atitudes que ofendem o Estado de Direito, reforçam preconceitos e aprofundam as divisões políticas.

Além de expor o despreparo do chefe do Executivo para desempenhar suas funções num quadro de coexistência com as diferenças, a insistência na agressão e na boçalidade revela uma personalidade sombria que parece se reconhecer, com júbilo, nas trevas dos porões da ditadura militar.

As insinuações sórdidas acerca do pai do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz —morto, segundo as investigações, sob aguarda do poder autoritário—, são um exemplo da pequenez e da leviandade a que pode chegar o presidente.

Não espanta, aliás, que tenha classificado como “balela” documentos oficiais sobre abusos cometidos pelo regime. Já eram, afinal, conhecidos seus elogios ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, bem como suas simpatias pelas violações praticadas no submundo dos órgãos de repressão.

Enganou-se, infelizmente, quem esperou que a condição de presidente da República levaria o ex-deputado nanico a moderar o discurso e buscar alguma conciliação.

Pelo contrário, são os traços intolerantes e obscurantistas do mandatário que saltam aos olhos nos ataques e afirmações falsas dirigidos aos jornalistas Miriam Leitão e Glenn Greenwald, nas imposturas acercado desmatamento da Amazônia, nas ameaças de censura ao cinema, no tratamento injurioso aos nordestinos e no desdém pelo massacre de presos no Pará.

Talvez transtornado com as críticas à indicação vexatória de um filho à embaixada em Washington, ou comas investigações que envolvem outro, Bolsonaro aprofunda a estratégia populista e acentua a retórica de confrontação.

Com índices de aprovação aquém dos obtidos por seus antecessores em igual período do mandato, o presidente desperta crescente apreensão quanto a seu desempenho nos anos vindouros.

Para alguns analistas, os destemperos verbais já começam a fornecer munição para um eventual enquadramento em crime de responsabilidade , por procedimentos incompatíveis coma dignidade, a honra e o decoro do cargo.

Não se vê nenhum movimento nesse sentido, e a perspectiva de reforma da Previdência dá fôlego ao governo. Entretanto a recente espiral de infâmias não poderá se perpetuar sem consequências.

Chacina paraense

A carnificina no Centro de Recuperação de Altamira (PA), onde 57 detentos morreram assassinados na segunda (29), inscreve-se entre os capítulos mais hediondos de um sistema prisional que tem se notabilizado por produzir tragédias.

Para além da magnitude do massacre paraense, menor somente do que os ocorridos no Carandiru, em 1992, e no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (AM), no início de 2017, chocam os atos de barbárie.

Ao menos 16 dos mortos foram decapitados —gesto não apenas de crueldade extrema como também repleto de simbolismo.

Assusta ainda a reincidência. Apenas dois meses atrás, 55 presidiários foram chacinados em quatro penitenciárias de Manaus.

O motivo apontado pelas autoridades para os dois morticínios é a disputa entre facções criminosas. No caso mais recente, ele teria sido originado do confronto entre o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital pelo domínio das rotas de distribuição da cocaína que entra pelo rio Amazonas.

A explicação, contudo, apenas evidencia a falência do poder público na gestão carcerária. Se a contenda entre facínoras foi a fagulha, as condições acabrunhantes do presídio foram a pólvora.

Lá, 343 presos empilham-se em 163 vagas, de acordo com relatório do Conselho Nacional de Justiça. Somam-se à superlotação o déficit de agentes penitenciários, a falta de bloqueadores de celular e as estruturas precárias.

Embora só conte com espaço para acolher presos em regime fechado, o Centro de Recuperação de Altamira abriga também detentos em regime semiaberto.

Mais grave, não há separação entre presos provisórios, que aguardam julgamento, e os que já tiveram a sentença transitada em julgado; tampouco entre detentospri-mários e reincidentes —promiscuidade que favorece a arregimentação de novos soldados do crime.

Termina de compor a situação medieval do cárcere paraense a ausência de enfermaria, biblioteca, oficinas de trabalho e salas de aula.

A despeito do quadro complexo, o ministro da Justiça, Sergio Moro, preferiu um discurso simplista, ao propor que os responsáveis pela chacina sejam trancafiados “para sempre” em presídios federais.

Providências do gênero, entretanto, serão de pouca serventia para impedir novos massacres se as condições que os tornam possíveis —como o excesso de encarcerados e a situação desumana dos presídios— não forem enfrentadas comracionalidade pelos governos.