Laura Karpuska: Classe política se cala para o mais novo golpe às instituições feito por este governo

Desde que assumiu a Presidência, Jair Bolsonaro trabalha para minar a confiança nas instituições brasileiras. Seu foco nunca foi fazer reformas econômicas de natureza liberal, nem mesmo defender uma pauta conservadora nos costumes. Bolsonaro governa pelo caos, usando-o como estratégia de manutenção do poder e de apropriação do Estado por pequenos grupos de interesse.

O foco desta coluna era elencar o risco de Bolsonaro acelerar o derretimento institucional para tentar, a qualquer custo, ganhar as eleições. A pauta do Senado desta semana serviu como exemplo prático disso, mostrando que o governo Bolsonaro não está sozinho nesta empreitada. Enquanto escrevo, o Senado vota uma Proposta de Emenda à Constituição que coloca o País em “estado de emergência” por conta dos aumentos do petróleo. Inicialmente, a proposta previa compensar Estados que decidissem zerar o ICMS dos combustíveis.

A PEC, no entanto, passou a ser um pacote de benesses do governo, um populismo eleitoral descarado. O projeto prevê aumento e expansão do Auxílio Brasil, bolsa-caminhoneiro, vale-gás, subsídio a transporte coletivo e compensação para o setor de etanol. Tudo isso a um custo de quase R$ 40 bilhões este ano. Parte desses gastos pode não vir a ser temporária. Isto é particularmente arriscado porque não houve discussão técnica que embasasse essas decisões orçamentárias. Há, portanto, aumento do risco fiscal de médio e longo prazos.

Apesar do alto custo fiscal, o maior dano é institucional. Os valores seriam liberados a despeito do calendário eleitoral e das regras de contenção de despesas ditadas pela regra de ouro e pelo teto de gastos. É um dano permanente para o sistema de pesos e contrapesos do orçamento público, já tão machucado com despesas do relator e afins.

Há dúvidas sobre a constitucionalidade da PEC. Infelizmente, isso não foi suficiente para fazer com que senadores, mesmo da oposição, fossem contrários à proposta. É com essa conveniência política que vemos nossas instituições cada vez mais enfraquecidas. De nada serve uma regra que regule o comportamento político se os agentes públicos se unem para enfraquecer o sistema de pesos e contrapesos que eles criaram.

O projeto bolsonarista de avariar as instituições brasileiras conta, hoje, com o apoio de quase toda a classe política, que se cala convenientemente para o mais novo golpe às instituições praticado por este governo. (O Estado de S. Paulo – 01/07/2022)

LAURA KARPUSKA, PROFESSORA DO INSPER, PH.D. EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK EM STONY BROOK

Leia também

Brasil fica mais perto da nova Rota da Seda

Os chineses tentam atrair a adesão do Brasil ao programa há anos. Até agora, os governos brasileiros resistiram, por razões econômicas e geopolíticas.

Meia-volta, volver!

Ivan Alves Filho* Aprendi com um mestre do valor de...

A Democratização da Literatura no Brasil

Matheus Rojja Fernandes * A democratização da literatura no Brasil...

As eleições de 2024 e as de 2026

* Ivan Alves Filho Escrevo logo após o encerramento do...

O que se move sob nossos pés?

Há algo que se move sob nossos pés e...

Informativo

Receba as notícias do Cidadania no seu celular!