Luiz Carlos Azedo: Envolvimento de Lula na Lava-Jato virou calúnia

NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

Para nove em cada 10 marqueteiros, as pesquisas de opinião estão mostrando que a disputa eleitoral entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera os levantamentos, e o presidente Jair Bolsonaro, em recuperação, tende a se decidir no confronto de rejeições. É aí que a decisão de ontem, por 4 a 1, da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), contra o ex-procurador federal Deltan Dallagnol, pode transformar a Lava-Jato num ativo da campanha de Lula contra seus desafetos, justamente o tema que é a sua maior vulnerabilidade para manter uma rejeição menor do que a de Bolsonaro.

O ex-chefe da Operação Lava-Jato foi condenado a indenizar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por danos morais, avaliados em R$ 75 mil, mais juros e correção monetária, o que deve superar os R$ 100 mil, conforme o relatório do ministro Luís Felipe Salomão. A razão do pedido de indenização foi a entrevista coletiva da Lava-Jato na qual o Ministério Público acusou o petista de corrupção e lavagem de dinheiro, no famoso caso do tríplex de Guarujá (SP). Lula chegou a ser condenado pelo então juiz federal Sergio Moro, porém a sentença foi anulada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Votaram a favor da indenização os ministros Raul Araújo, Antônio Carlos Ferreira e Marco Buzzi. A ministra Maria Isabel Gallotti divergiu dos colegas.

Naquela entrevista, Dallagnol recorreu ao PowerPoint para acusar o ex-presidente Lula, cujo nome aparecia no centro da tela, ao lado das expressões “petrolão + propinocracia”, “governabilidade corrompida”, “perpetuação criminosa no poder”, “mensalão” e “enriquecimento ilícito”, entre outras. A Corte aceitou o argumento da defesa de Lula de que houve abuso de autoridade, ofensas à honra e à reputação. O caso havia sido rejeitado em primeira e segunda instâncias, mas foi acolhido pelo ministro Salomão: “Essa espetacularização do episódio não é compatível nem com o que foi objeto da denúncia nem parece compatível com a seriedade que se exige da apuração desses fatos”, afirmou.

Dallagnol ainda pode recorrer ao próprio tribunal, mas a decisão já serve de advertência para os desafetos de Lula, que podem também ser processados e obrigados a indenizar o ex-presidente da República. O advogado Márcio de Andrade, responsável pela defesa do ex-procurador, recorrerá da decisão. Argumenta que a entrevista foi concedida de acordo com o exercício regular do cargo. Segundo ele, a Corregedoria da Procuradoria da República e o Conselho Nacional do Ministério Público “concluíram de forma uníssona: não houve excesso e não houve sanção administrativa”.

Dificilmente o STJ reexaminará o caso antes das eleições, o que fará com que o tema da Lava-Jato fique fora da agenda de ataques diretos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por parte dos adversários. Mesmo assim, o petista não estará livre de desgastes, pois a Lava-Jato continua sendo uma das principais variáveis de voto nas eleições. Entretanto, as acusações contra o petista na propaganda eleitoral estarão interditadas, porque os programas e peças de propaganda poderão ser retirados do ar, e os adversários, penalizados, com direito de resposta e perda de tempo de tevê e rádio, se o acusarem de corrupção.

Tiro no pé

O sincericídio do ministro da Educação, Milton Ribeiro, que admitiu o aparelhamento da pasta para favorecer pastores evangélicos, durante reunião com prefeitos, é a mais nova crise no governo criada por combustão espontânea, ou seja, sem que nenhuma ação possa ser atribuída à oposição. Segundo áudio obtido pelo jornal Folha de S. Paulo, o ministro mantinha uma espécie de gabinete paralelo, no qual dois pastores controlam as verbas e a agenda da pasta, supostamente a pedido do presidente Jair Bolsonaro.

Ribeiro admitiu o conteúdo do áudio, mas negou que a orientação partisse de Bolsonaro. Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, embora não tenham cargos no ministério, eram responsáveis pela destinação de recursos a pedido das igrejas evangélicas. Gilmar é presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil Cristo Para Todos (Conimadb), à qual Arilton Moura também integra.

O Ministério da Educação é tratado por Bolsonaro como uma pasta estratégica do ponto de vista ideológico, mas sempre foi objeto de disputas políticas dentro do próprio governo, porque os setores de extrema-direita que apoiam o presidente da República sempre viram a área educacional como um instrumento de combate ao chamado “marxismo cultural”. Com a crise, que pode resultar na demissão de Ribeiro, o Ministério da Educação está sendo cobiçado pelo Centrão, que se aproveita da ofensiva da oposição contra o ministro. (Correio Braziliense – 23/03/2022)

Leia também

“Reeleição” de Maduro pode desestabilizar continente

NAS ENTRELINHASA situação da Venezuela é um desastre econômico...

A Europa começa a respirar novamente

A Democracia dá sinais claros de resistência no Velho...

Atropelos em série

Lula está se dando conta de que o desafio ao ser eleito presidente não era bloquear a extrema direita bolsonarista: era fazer o País ingressar em outra rota.

Um alerta para o risco de estrangulamento fiscal

Pelo lado das receitas, as medidas aprovadas em 2023, surtiram efeito na arrecadação de 2024. No entanto, muitos dos resultados não se sustentam no futuro.

Informativo

Receba as notícias do Cidadania no seu celular!