Ilona Szabó de Carvalho: Como será o amanhã?

Vivemos tempos incertos e está cada vez mais desafiador tentar prever o futuro

Vivemos tempos incertos e está cada vez mais desafiador tentar prever o futuro. Longe de mim tentar fazê-lo. O que busco no apagar das luzes de 2021 é observar tendências –boas e ruins, e quem sabe provocar algumas reflexões.

Começo pelas constatações que me tiram o sono. Em 2022, os riscos interconectados e sistêmicos – que se apresentaram para todos com tanta clareza nos últimos anos– continuarão a crescer e se intensificar em escala mundial.

Destaco as crescentes tensões entre as potências globais – em especial EUA, Rússia e China –, os esforços incansáveis por parte de populistas autoritários ​​para erodir democracias liberais e o aumento exponencial de ataques cibernéticos e vigilância estatal digital, assim como o aprofundamento das desigualdades e das ameaças climáticas.

A capacidade de transformar e se adaptar a essas ameaças combinadas determinará a legitimidade e o sucesso de diferentes níveis de governo, do setor privado e financeiro, e das organizações internacionais. O trabalho e a colaboração entre iniciativas da sociedade civil serão cada vez mais cruciais para a proteção dos bens públicos, e também para apontar os desvios de rota e correções necessárias por parte de autoridades públicas e lideranças empresariais.

Mais positivamente, após dois anos devastando populações e economias em todo o mundo, a pandemia caminha para se tornar endêmica, possivelmente apresentando menos riscos do que antes. Uma parte crescente dos países de renda baixa e média finalmente receberá e começará a administrar vacinas e medicamentos antivirais para a Covid-19.

Esse alívio trará ainda mais urgência e cobrança para que líderes entreguem desenvolvimento social e econômico e respondam às duríssimas necessidades –como a fome, a falta de acesso a serviços básicos de qualidade como saúde e educação, e o desemprego– que se impõem sobre cerca de quatro bilhões de pessoas deixadas para trás mundo afora.

Além disso, tudo indica que a pressão sobre governos, empresas e investidores para cumprir os compromissos assumidos na Cúpula do Clima (COP26), para descarbonizar rapidamente a economia global até 2050, crescerá sem trégua. O que é uma boa notícia, visto que já vivemos uma emergência do clima. Não podemos mesmo descansar.

No Brasil, teremos eleições no ano que vem. Com o retrocesso e o sofrimento humano impensáveis dos últimos três anos, acredito que haverá menos espaço para a polarização tóxica e para as cortinas de fumaça. Eleitores demandarão compromisso e ação. Não pode ser diferente, e aqui reforço a responsabilidade dos que, como eu, fazem parte do grupo dos que têm sorte.

Nós, que não temos que nos preocupar com a falta de comida no prato, temos o dever de apoiar um pacto democrático e programático baseado no conhecimento, na ciência e inovação. Temos que exigir de todos os candidatos o compromisso republicano de colocar as reais prioridades do país e das pessoas no centro da agenda eleitoral, e na ordem do dia de quem vencer a eleição. Não temos o direito de cometer erros do passado ou novos erros. Precisamos acertar.

Nesse sentido, deixo aqui as provocações para as reflexões de fim de ano. Que tipo de valores devemos resgatar e cultivar para garantir um futuro mais humano, ético e sustentável? Que escolhas e mudanças estamos dispostos a fazer para cumprir nossa responsabilidade coletiva de deixar um mundo melhor para as gerações futuras? Como vamos avaliar as lideranças que se apresentarão em 2022 vis-à-vis a vocação pública e as habilidades necessárias para navegar rumo a um futuro que faça jus ao potencial do nosso capital humano e natural? O amanhã se constrói a partir das nossas escolhas. Feliz Festas! (Folha de S. Paulo – 15/12/2021)

Ilona Szabó de Carvalho, Empreendedora cívica, mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia). É autora de “Segurança Pública para Virar o Jogo”

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