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Mineração pode atingir 1/3 das áreas indígenas, revela Estadão

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Reservas. Desejada por Bolsonaro e prevista na Constituição, exploração de recursos minerais nas terras dos índios enfrenta críticas das empresas do setor e de estudiosos

Ricardo Galhardo e Giovana Girardi – O Estado de S. Paulo

A determinação do governo federal de permitir a exploração mineral em terras indígenas tem potencial para afetar quase um terço das reservas no País. Prevista na Constituição de 1988, a atividade em territórios demarcados nunca foi regulamentada e é alvo de discussão no Congresso há décadas. O assunto vem sendo tratado com insistência pelo presidente Jair Bolsonaro, declaradamente favorável à mineração nessas áreas. Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), há 4.332 requerimentos para exploração do subsolo em 214 das 735 áreas indígenas registrados na Agência Nacional de Mineração – 29,1% do total, inclusive nos parques indígenas de Tumucumaque (AP e PA), Araguaia (TO) e Aripuanã (MT). Os requerimentos envolvem a exploração de 66 substâncias, principalmente ouro.

A maioria, 88%, é de pedidos para pesquisa, ou seja, sem comprovação científica de que existam minérios nessas áreas. Conforme especialistas, grande parte desses requerimentos é das décadas de 1980 e 1990, protocolada antes da demarcação das terras indígenas, e tem como objetivo garantir aos autores dos pedidos prioridade caso a exploração seja autorizada, prática comum no setor. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que representa as empresas do setor, disse que a exploração em terras indígenas está fora da pauta da entidade há décadas. Para o instituto, antes de falar em legalização, o governo deveria fazer um levantamento científico sobre as potencialidades dos territórios, com a participação de comunidades originárias.

“O governo poderia, num primeiro momento, elaborar um mapeamento geológico, para se estabelecer possíveis ocorrências de minérios. Esta seria uma fase importante para se fomentar um diálogo mais consistente, inclusive, com o envolvimento dos povos indígenas, de acordo com princípios de sustentabilidade e segurança para os ocupantes das terras”, afirmou a entidade. Bolsonaro falou em legalizar o “garimpo” nessas áreas ao comentar a morte do cacique Emyra Waiãpi, supostamente vítima de garimpeiros no Amapá. Na sexta-feira, após pesquisa Datafolha apontar que 86% da população é contra a medida, ele disse que vai submeter o assunto a uma consulta popular. Ainda na semana passada, o presidente afirmou que pretende criar “pequenas Serras Peladas”, que poderiam ser exploradas tanto por índios quanto por estrangeiros.

Um grupo de estudo sobre o tema foi criado no Ministério de Minas e Energia. Lei. Prevista na Constituição, a exploração em áreas indígenas por garimpeiros ou mineradoras nunca foi regulamentada. Pela lei, essas terras são da União e se destinam à posse permanente dos índios que as ocupam. Porém, há regimes distintos de propriedade. Jazidas do subsolo são passíveis de concessão, desde que a atividade tenha sido aprovada pelo Congresso e pelos indígenas, que devem ter direito a uma parte do lucro. Isso não impede que garimpeiros invadam reservas para extração ilegal, às vezes com anuência dos índios.

Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o total de invasões subiu de 11 em 2016 para 17 em 2017. Em 1996, o Senado aprovou projeto do então senador Romero Jucá (MDB-RR), cuja família tem interesse na exploração em terras ianomâmis. O projeto se arrasta na Câmara. Em 2004, foi criado grupo de trabalho após massacre na terra indígena Roosevelt (RO), sem resultado prático. Em 2018, uma comissão especial foi formada. Um substitutivo relatado pelo deputado Édio Lopes (PL-RR) obteve o acordo de vários setores, mas não foi votado. Para estudiosos, a falta de controle pelo Estado torna a legalização inviável.

“Deve-se questionar a ideia simplória segundo a qual os índios se beneficiariam por royalties. Quem controlaria a quantidade de minério extraído para assegurar o pagamento correto dos royalties?”, disse a antropóloga Dominique Gallois, da USP. Índios que concordarem com a mineração, afirmou, devem ser assistidos por Ministério Público e Funai. Na avaliação de Dominique, ao falar sobre mineração em terra indígena antes de sanar falhas na exploração de áreas inexploradas não indígenas, Bolsonaro mostra que sua intenção “é ideológica, não técnica”.

Lopes disse acreditar que, se o governo não “ideologizar” a questão, ela pode avançar, e que trabalha pela regulamentação racional da atividade. “Não podemos simplesmente autorizar a mineração nessas áreas. Senão, vai ser um genocídio.” Procuradas, a Funai e a Secretaria de Comunicação do Planalto não se manifestaram.

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (05/08/2019)

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MANCHETES

O Globo

Governo monta estratégia para votar Previdência
‘Botei parentes no passado, sim’, diz Bolsonaro
Milícias já se expandem por 12 estados

O Estado de S. Paulo

Governo quer R$ 6,5 bilhões de fundos regionais na educação
Bolsonaro se diz ‘chateado’ com ministro do STF
Mineração pode atingir 1/3 das áreas indígenas
Projeto dá a CPI poder para firmar delações

Folha de S. Paulo

Acordos com empresas são contestados por promotores e estado
Presidente diz que Guedes pode trocar o comando do Coaf
Capitalização de Previdência fracassa em 12 estados do país

EDITORIAIS

O Globo

Falta dinheiro no governo, mas sobra em 220 fundos

Engessamento orçamentário impede a transferência de recursos paralisados para áreas sem dinheiro

Com excesso de otimismo, o investimento público federal deverá alcançar R$ 40 bilhões neste ano. É pouco, sobretudo se for considerado o fato de que a despesa da União, descontados juros da dívida pública, será de R$ 1,4 trilhão. Gasta-se muito, investe-se pouco. Na realidade, cada vez menos: o investimento público federal, em valores de hoje, é metade do que era cinco anos atrás. Esse cenário indica a gravidade da crise fiscal, cuja perspectiva de solução no médio prazo depende da rapidez nas reformas estruturais do ambiente econômico. Reflete, também, um legado de balbúrdia nas finanças públicas, resultante do engessamento do Orçamento da União a partir de interesses setoriais e corporativos.

Exemplos dessa herança dominam o cotidiano da Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Faltam cerca de R$ 60 milhões no caixa do Ministério da Infraestrutura para obras em rodovias essenciais ao escoamento da safra agrícola. No entanto, existe um conjunto de fundos públicos na órbita da Infraestrutura que supera R$ 30 bilhões, segundo estimativa do ministro da Economia, Paulo Guedes. O problema é que esses recursos estão “carimbados” no Orçamento. Como não podem ser remanejados, as estradas permanecem deterioradas até que se consiga o dinheiro necessário por outros meios.

Com estados impotentes, por virtual insolvência, a crise na segurança pública se agrava na guerra entre facções criminosas pelo domínio de presídios superlotados. O Ministério da Justiça até projeta um aumento do efetivo da Força Nacional, fundamental no socorro rápido. O custo previsto é de R$ 500 milhões, mas não há previsão orçamentária. Existe um fundo penitenciário com disponibilidade de R$ 1,5 bilhão, mas esse também é um dinheiro “carimbado”, impossibilitado de uso. Casos assim se repetem na União, nos estados e nos municípios. Estima-se que existam 220 fundos federais, mas nem o governo sabe ao certo —há uma equipe do Ministério da Economia tentando mapeá-los.

São poças de recursos dentro do Orçamento, criadas nas últimas cinco décadas e meia ao abrigo da lei (nº 4.320, de 1964). Na prática, perdeu-se o controle do número e do valor desses fundos, todos “carimbados”, como observou o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, em recente debate no Congresso. É preciso liquidar com esses autênticos feudos orçamentários, e burocráticos, rapidamente. Não há lógica política ou econômica em manter ilhas de ineficiência na gestão do dinheiro público, especialmente numa etapa financeira crítica, com sucessivos déficits projetados até 2026. O Legislativo deveria acelerar a faxina nas leis sobre o Orçamento. A situação requer profunda revisão que privilegie a transparência.

Onda de calor na Europa reacende debate sobre o aquecimento global

Multiplicam-se eventos extremos, e o tempo para a reação, por meio de cortes nas emissões, fica mais curto

Queira-se ou não, o clima se firma como um dos temas mundiais prioritários no mundo. Não é sem motivo que, na recente eleição para o Parlamento Europeu, a força política que mais avançou foram os partidos verdes. O presidente americano, Donald Trump, adversário confesso dos preservacionistas, e sua réplica brasileira Jair Bolsonaro, terão de conviver com esta realidade. Nos Estados Unidos, a Casa Branca, devido à força do federalismo americano, tem de admitir que estados como a Califórnia tenham rígidos padrões para a emissão dos veículos. Já no Brasil, por uma feliz coincidência, Bolsonaro assumiu com a assinatura do acordo comercial Mercosul-UE, em que há cláusulas que subordinam o seu cumprimento ao respeito do país ao meio ambiente.

Enquanto isso, o planeta continua a demonstrar que existe algo fora da ordem no clima. Mais uma onda de calor no verão europeu é um sinal de alerta. Recordes de temperatura foram batidos na Bélgica, na Holanda e na Alemanha. Paris enfrentou 42,6 graus centígrados, dignos de verão carioca, batendo o limite alcançado há 72 anos. Segundo o jornal “Washington Post”, 20 lugares no sul da Noruega experimentaram “noites tropicais”. Realimenta-se a discussão sobre a contribuição humana ao aquecimento. Os cientistas ressaltam, com mais ênfase, que seria impossível acontecerem esses fenômenos sem a contribuição da Humanidade.

O sistema meteorológico responsável pelo calor europeu estacionou sobre a Groenlândia, contribuindo para elevar a velocidade do degelo na região. As evidências da desordem climática estão por toda parte. Do Brasil — onde as tempestades se tornam mais fortes no Sul e Sudeste, por exemplo — ao derretimento dos glaciais no Himalaia, que dobrou de velocidade em relação à virada do século, do Ártico e da Antártica. O resultado inescapável é a elevação do nível dos oceanos, com efeitos catastróficos em países litorâneos.

É indiscutível que o tempo apressou o passo, e começam a ser insuficientes medidas que vêm sendo tomadas por meio de acordos multilaterais. No ano passado, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas estabeleceu que o mundo precisaria reduzir em 45% as emissões de carbono antes de 2030, para evitar que a temperatura suba mais de 1,5 grau até o final do século. Agora, diz que as medidas com este objetivo precisam ser aplicadas a partir do final do ano que vem. As perspectivas se degradam. Na proporção em que o discurso antipreservacionista é cada vez mais negado pelos fatos.

O Estado de S. Paulo

Decálogo do bom governante

Governar é difícil. Governar o Brasil, por sua vastidão territorial, multiplicidade étnica e cultural, histórica desigualdade e deficiência crônica em áreas básicas para o progresso humano, é tarefa para quem, antes de tudo, enxergue essas questões como estímulo e, de forma empática, saiba liderar a Nação na busca por soluções para nossas mazelas. As variáveis que levaram os eleitores a escolher Jair Bolsonaro como presidente da República em outubro do ano passado já não importam, senão para a historiografia. A democracia não corre o risco de embolorar quando a sociedade se mostra capaz de aprender as lições deixadas por cada pleito. Aliás, é dessa abertura dos cidadãos ao aprendizado cívico que vem o oxigênio que mantém a democracia viva.

Ora avançando, ora retrocedendo, o que importa é o constante apuro do discernimento dos eleitores. Os cidadãos serão mais uma vez convocados às urnas no ano que vem para escolher os prefeitos e vereadores dos 5.570 municípios do País. É uma escolha muito importante porque é o município a base do sistema político brasileiro. É no município que acontecem os fatos que mais afetam a vida de milhões de homens e mulheres no País. Trata- se, pois, de mais uma excelente oportunidade para os eleitores buscarem informação confiável, sopesarem seus interesses e necessidades e identificarem no rol de candidatos aqueles que julgam estar preparados para melhorar suas vidas.

Já dissemos que governar é difícil. Um governante, pois, para dar conta da responsabilidade de influenciar a vida de milhões de pessoas, deve estar munido de uma série de atributos que o qualifiquem para o desafio. Em Do institutions matter? (As instituições importam?, em tradução livre), publicado em 1993, R. Kent Weaver e Bert A. Rockman enumeraram as dez capacidades que seriam indispensáveis a todos os governantes, seja qual for o sistema político-eleitoral de um país. É um bom decálogo para orientar o processo decisório dos eleitores. A primeira é a capacidade de definir prioridades diante da miríade de interesses coletivos em jogo, muitos deles contraditórios.

Uma vez definidas as prioridades, é fundamental que um governante saiba empregar os recursos humanos e financeiros para atingir tais objetivos eficazmente. A terceira capacidade é a de inovar quando os modelos até então tentados se mostram ineficazes para o atingimento daqueles objetivos. A quarta é a capacidade de construir um “todo coerente” a partir da coordenação de projetos conflitantes. A quinta capacidade indispensável a um governante é a de impor perdas a grupos poderosos. Não raro os interesses desses grupos se contrapõem ao interesse nacional. A um governante cabe fazer a justa distinção.

A sexta capacidade que os eleitores devem enxergar em seus escolhidos é a de saber representar “interesses difusos e desorganizados” ao lado de “interesses concentrados e mais bem organizados”. Definido um programa de governo, cabe ao governante, por óbvio, cuidar de sua execução, avaliando eventuais mudanças que possam se interpor no caminho. Este é o sétimo atributo básico enumerado pelos autores. Os governantes também devem assumir compromisso com a estabilidade política, de modo a criar as condições para que as ações do poder público possam surtir os efeitos delas esperados.

O mesmo vale para os compromissos assumidos no plano internacional, área em que devem estar divididos claramente os interesses de governo e de Estado. Por fim, mas não menos importante, um governante deve ser o primeiro a se mostrar aberto à conciliação das divisões políticas a fim de garantir que a sociedade “não degenere numa guerra civil”. Ou seja, é papel de um governante pacificar a sociedade, não estimular rupturas. Tanto melhor seremos uma nação quanto os eleitores estiverem dispostos a observar a presença de tais atributos nos que lhes suplicam o voto. É um processo que não levará mais ou menos tempo a depender do grau de amadurecimento da sociedade entre um pleito e outro.

O preço do passado

Se a reforma da Previdência for aprovada em caráter definitivo até dezembro, como se espera, a economia que ela propiciará aos cofres públicos no exercício de 2020, estimada entre R$ 12 e R$ 14 bilhões, poderá ser anulada quase totalmente pelo pagamento dos precatórios – as dívidas do Poder público que o Judiciário manda pagar. A informação, divulgada pelo secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, durante a entrega do Prêmio Otimiza a prefeituras que mantêm boas práticas em matéria de finanças públicas, dá a medida das dificuldades que a equipe econômica do governo está enfrentando para assegurar um mínimo de equilíbrio entre gastos e receitas no orçamento do próximo ano. Por lei, o projeto do orçamento de 2020 tem de ser enviado ao Congresso até 31 de agosto.

Pelas estimativas do Judiciário, o pagamento dos precatórios custará pouco mais de R$ 12 bilhões aos cofres públicos, no próprio exercício. Como determina a legislação em vigor, todos os anos a cúpula da Justiça tem de mandar para as autoridades orçamentárias do Ministério da Economia a programação da execução dos precatórios já julgados para o próximo exercício. Essa informação costuma ser enviada pelo Judiciário até o final do primeiro semestre. Deste vez, contudo, o montante vultoso surpreendeu o governo, segundo o secretário do Tesouro. “Esse valor não estava em nosso radar, afirmou Mansueto Almeida, depois de lembrar que “mais da metade do tempo da equipe econômica é gasta para lidar com problemas do passado”.

Por isso, o ganho fiscal a ser obtido com a reforma previdenciária não acarretará uma retração nas despesas. Em termos concretos, permitirá somente uma desaceleração nos gastos, explicou. Basicamente, o montante de R$ 12 bilhões estimado pelo Judiciário será utilizado para pagamentos devidos a usinas de álcool e açúcar, por causa do polêmico programa de política de congelamento de preços imposto no começo da década de 1990 pelo governo do presidente Fernando Collor de Mello. Concebido como uma solução pragmática para um problema de natureza conjuntural, esse programa não deu os resultados esperados.

E como os usineiros atingidos recorreram aos tribunais, reivindicando o ressarcimento dos prejuízos sofridos, o que era uma questão conjuntural se converteu num problema estrutural. Isso porque, quase três décadas depois dessa discussão ter passado por todas as instâncias do Poder Judiciário, a conta do ressarcimento – com juros, encargos e correção monetária – finalmente chegou para o Tesouro Nacional em 2019, afetando o planejamento orçamentário de 2020. O mesmo aconteceu com os pacotes econômicos baixados às pressas entre a segunda metade da década de 1980, como o Plano Cruzado I, Plano Cruzado II, Plano Bresser, Plano Verão, Plano Collor I e Plano Collor II.

A exemplo do que aconteceu com o congelamento de preços imposto por Collor, todos esses planos manipularam índices inflacionários. Passaram por cima de atos juridicamente perfeitos. Comprometeram a reciprocidade na distribuição de direitos e obrigações. E intervieram arbitrariamente no livre jogo de mercado, disseminando insegurança jurídica. Em todos esses casos, quanto mais o tempo foi passando, por causa da morosidade judicial, mais os juros e outros encargos foram se acumulando, multiplicando o valor dos prejuízos a serem ressarcidos.

Desse modo, a judicialização de equívocos regulatórios cometidos no passado acaba, nos dias de hoje, dificultando não apenas a formulação de políticas públicas, mas, também, o uso mais racional e eficiente do dinheiro dos contribuintes. Foi por isso que o ex-ministro Pedro Malan disse, certa vez, uma frase que se torna histórica – “no Brasil, até o passado é incerto”. Também é por isso que o secretário do Tesouro afirmou, em sua palestra, que, apesar do avanço das técnicas de gestão financeira e orçamentária, os gestores públicos muitas vezes são surpreendidos por problemas que não estão no “radar”, como é o caso dos precatórios.

Matando o mensageiro

O Ministério da Ciência e Tecnologia informou na sexta-feira que o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, será exonerado. A situação de Ricardo Galvão se tornou, segundo suas próprias palavras, “insustentável”, pois seu trabalho foi duramente criticado pelo presidente Jair Bolsonaro e por alguns de seus ministros depois que o Inpe divulgou números desastrosos sobre o aumento do desmatamento na Amazônia. O governo argumenta que os números do Inpe não estão corretos, embora não apresente outros dados que possam indicar um quadro diferente.

O presidente Bolsonaro chegou a convocar uma coletiva de imprensa para dizer que os números foram “espancados” pelo Inpe com o objetivo de prejudicar “o nome do Brasil e do governo” no exterior. Para o presidente, pode ter havido “quebra de confiança”. Ao que parece, o governo considerou um desserviço do Inpe a divulgação de dados segundo os quais o desmatamento na Amazônia pode ter crescido mais de 80% em junho na comparação com o mesmo mês do ano passado. Dados como esses, obtidos pelo sistema Deter (Detecção de Desmatamento em Tempo Real), são há muito tempo regularmente publicados no site do Inpe, razão pela qual não há fundamento nas queixas do governo sobre uma suposta “má-fé” daquele órgão ao divulgar os números.

Má-fé teria havido se o público fosse privado dessas informações, como acontece em governos com vocação antidemocrática – caso, por exemplo, da Venezuela chavista, que habitualmente esconde os dados que são desfavoráveis à imagem do ditador Nicolás Maduro. De fato, o quadro revelado pelo Inpe é constrangedor e começa a repercutir no exterior. A revista britânica The Economist, por exemplo, dedicou a principal reportagem de sua mais recente edição à devastação da Amazônia, acentuada sob a gestão de Jair Bolsonaro. A publicação acusa o presidente de proteger os desmatadores ao “deixar claro que aqueles que violam as regras não têm nada a temer” – embora, como lembra a revista, Bolsonaro tenha sido eleito “para restaurar a lei e a ordem”.

Tanto a leniência do governo em relação aos desmatadores como sua reação colérica contra os responsáveis por divulgar os números que comprovam a devastação são coerentes com a ideologia que Bolsonaro e seu entorno esposam. Segundo essa ideologia, as preocupações com o meio ambiente e os alertas sobre o aquecimento global são exagerados, frutos de uma conspiração internacional “marxista” de ONGs e governos esquerdistas para impedir o desenvolvimento do Brasil. Há alguns dias, por exemplo, o presidente Bolsonaro disse que Ricardo Galvão, diretor do Inpe, estava “agindo a serviço de uma ONG”.

Na mesma ocasião, opinou que a questão ambiental só interessa “aos veganos que comem vegetais”. Enquanto enriquecem o anedotário bolsonarista, declarações como essas apenas reforçam a certeza de que a preservação ambiental não é prioridade para o governo – que, ao contrário, se manifesta frequentemente a favor de projetos e de iniciativas que, a título de desenvolver o Brasil, simplesmente ignoram a necessidade imperiosa de evitar ainda mais danos à Amazônia e a outros biomas ameaçados. O Brasil tem totais condições de prosperar sem a necessidade de degradar o ambiente. Tanto isso é verdade que, conforme lembrou a Economist, a produção brasileira de soja e de carne cresceu entre 2004 e 2012, período em que o desmatamento caiu 80%.

Por outro lado, é certo que o desenvolvimento do País estará seriamente comprometido se a devastação continuar, pois os efeitos climáticos certamente vão prejudicar a agricultura – e, ademais, servirão de pretexto para que haja boicote a produtos agrícolas brasileiros no exterior. Assim, em lugar de questionar os números que comprovam o desmatamento, atribuindo-os a complôs contra o Brasil, o governo faria melhor se os usasse para apertar a fiscalização e punir quem viola as leis ambientais, mitigando o desastre que já está à vista de todos. Essa seria a atitude correta de um presidente que estivesse realmente preocupado com as próximas gerações, e não, ao que parece, com as próximas eleições.

Folha de S. Paulo

Inpe na encruzilhada

Depois da vexatória demissão do diretor do órgão, ministro da Ciência terá a responsabilidade de nomear comitê que apontará nomes para o posto

Por ora, a razia de Jair Bolsonaro (PSL) contra o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) acarretou estragos só na imagem do presidente e de seu ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes.

0 próprio Inpe saiu engrandecido com a atitude do diretor exonerado Ricardo Galvão, que não se dobrou à sanha obscurantista de Bolsonaro e a sua fixação com sonegar dados objetivos de desmatamento. Isso não significa que a instituição não possa ainda ser prejudicada pelo mandatário e pelo astronauta que pousou no ministério.

Galvão, como tem sido praxe nos centros de pesquisa da pasta, foi escolhido com base em lista tríplice composta por um comitê independente de busca.

As melhores instituições científicas do mundo — incluindo brasileiras — recorrem ao método para minorar a influência política na indicação de dirigentes, que deve pautar-se apenas no mérito como pesquisador e na capacidade gerencial dos candidatos.

0 administrador defenestrado por Pontes tinha doutorado no prestigioso Instituto de Tecnologia de Massachusetts e fora diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), um dos mais renomados institutos federais.

Foi nomeado pelo então ministro Gilberto Kassab (PSD), em 2016, depois de ser incluído na relação de três nomes pelo comitê de busca, composto por cinco especialistas externos ao Inpe.

Pelo regimento interno do órgão, o governo federal pode designar um diretor interino, mas cabe ao Conselho Técnico-Científico, que tem seis integrantes do próprio instituto e outros seis de fora, requisitar ao ministro da área a composição de um novo comitê de busca.

Na reunião em que acertou com Galvão sua saída do cargo, Pontes lhe teria dado garantia de que preservará a excelência do Inpe, a qual depende de sua autonomia para perseguir objetivos de pesquisa e não de propaganda. O processo para escolher o novo diretor será o grande teste do ministro.

Se o ex-astronauta nomear um comitê de busca cheio de paus-mandados do Palácio do Planalto e relegá-lo a meramente referendar nomes de agrado de Bolsonaro, estará pondo em risco muito mais que apropria reputação.

Esta, de resto, já se encontra abalada por ele ter coadjuvado o presidente na fracassada tentativa de desacreditar mais de três décadas de trabalho sério com satélites para medir o desmatamento.

Ao trair o espírito de impessoalidade consagrado no regimento interno, como hoje não parece improvável, Pontes estará indicando que sua pasta, em lugar de fazer avançar a ciência, sujeita-se a promover a agenda ideológica e inimiga das evidências que representa o pior do governo.

Progresso africano

O chamado Renascimento Africano figura com alguma frequência em discursos de políticos e teses de analistas, mas raramente se traduz em mais do que um exercício de relações públicas.

O cenário-padrão no continente continua a ser o de regimes fechados e democracias incompletas. Na economia, intervenção estatal, protecionismo e monopólios favorecem o compadrio e restringem a livre iniciativa.

Há que celebrar algum progresso, contudo. Sinais em diversos países importantes permitem algum otimismo, com populistas e líderes fossilizados por décadas no poder destronados nos últimos anos.

O caso mais chamativo é o da África do Sul, que trocou o desastroso presidente Jacob Zuma pelo reformista Cyril Ramaphosa. O governo tem feito do combate à corrupção uma prioridade e deu início a uma agenda que inclui a redução da inchada máquina pública.

Para 2019 prevê-se crescimento de 1,5%, que, longe de ser exuberante, representa melhora ante a estagnação dos últimos anos.

Em Angola, onde se localiza uma das maiores reservas petrolíferas africanas, o longo reinado do presidente José Eduardo dos Santos, que estava no poder desde 1979, chegou ao fim há dois anos.

O atual ocupante do cargo, João Lourenço, tão logo assumiu defendeu investigações contra o antecessor e sua família, incluindo a filha, Isabel dos Santos, uma das mulheres mais ricas da África e com interesses em diversos segmentos econômicos. Após três anos de recessão, o Produto Interno Bruto deve ao menos deixar de cair neste 2019.

O Zimbábue é outro exemplo de renovação, ainda que restrita. Eleito presidente há um ano, Emmerson Mnangagwa deu fim à brutal ditadura de Robert Mugabe, que vigorava desde a fundação do país, em 1980. Ativistas de direitos humanos relatam melhora no ambiente, e a imprensa sente-se mais livre para fiscalizar o governo.

A situação econômica e de infra-estrutura, contudo, ainda é ruinosa, com apagões de até 18 horas e inflação oficial de quase 100% ao ano. O próprio Mnangagawa está longe de ser uma ruptura com o antecessor, tendo ocupado diversos postos relevantes na máquina do Estado nas últimas décadas.

De todo modo, o PIB da África subsaariana deve crescer relevantes 3,3% em 2019, maior patamar em cinco anos. Espera-se que a relativa retomada propicie um ambiente de reformas e não se converta, como já ocorreu diversas vezes, em novas oportunidades para a pilhagem do Estado por grupos políticos apegados ao poder.

Alex Manente: PEC da prisão em Segunda Instância deve ser apreciada pela CCJ

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O deputado Alex Manente afirmou, nesta sexta-feira (02), que a Proposta de Emenda Constitucional que trata da prisão em segunda instância judicial vai ser apreciada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal ainda neste ano. Segundo o parlamentar, o presidente do colegiado, Felipe Francischini, revelou que esta é uma das suas prioridades.

Em matéria publicada pelo jornal “Gazeta do Povo”, nesta sexta-feira, Francischini colocou que a PEC d “Limpa Brasil”, como é chamada, está alinhada “com o que vem sendo encaminhado pelo governo”.  A proposta, que altera o inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal e propõe de maneira clara a execução da pena em segunda instância, aguarda relatoria e votação na CCJ.

Em Janeiro deste ano, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, chegou a dizer que a aprovação da PEC dará mais segurança jurídica para a questão da prisão após condenação em segunda instância. Dois meses depois, a Advocacia Geral da União (AGU) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma nova manifestação favorável à medida.

Artigo: “Em busca da sustentabilidade”

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Correio Braziliense – Arnaldo Jardim e Victor Bicca – 02/08/2019

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) completa nove anos hoje. Foram duas décadas de tramitação no Congresso Nacional para conseguirmos aprovar uma lei revolucionária em termos ambientais, capaz de enfrentar um problema antigo do país e do mundo: o que fazer com todo o lixo gerado pela atividade humana. Nos últimos 10 anos, o volume de lixo cresceu 21% no Brasil. Estima-se que o Brasil produza, a cada 24 horas, 240 mil toneladas de lixo, ou seja, mais de um quilo de resíduos por habitante/dia.

O grande dilema: como continuar a estimular a produção e o consumo de bens com menor impacto ambiental. Com esse desafio no horizonte, a PNRS criou o conceito da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, distribuindo a “obrigação de fazer” entre os setores envolvidos.

Aos governos federal e estaduais, estabelecer planos, garantir a infraestrutura para disposição adequada dos resíduos, organizar e fiscalizar a lei. Aos governos municipais, a gestão integrada dos resíduos sólidos, incluído a implantação e a manutenção da coleta seletiva. Ao setor privado, a obrigação da “logística reversa” — recuperar os resíduos e dar-le destinação adequada; e à população, o papel de acondicionar de forma diferenciada seus resíduos e rejeitos, descartando-os corretamente.

Assim, no que diz respeito à legislação, a PNRS colocou o Brasil em um patamar de igualdade com os países desenvolvidos. A expectativa era a sua implementação. Apesar das enormes dificuldades, após quase uma década, muitos avanços foram alcançados. Mais da metade dos municípios brasileiros (64%) já disponibilizam informações sobre sua gestão de resíduos sólidos. Os Planos Municipais de Gestão de Resíduos Sólidos já são elaborados por 1.765 municípios. Esses planos estabelecerão as metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, visando reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final.

Que pese ainda os lixões fazerem parte da realidade brasileira, já contamos, segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA), com 2.202 municípios que adotaram medidas para garantir a destinação adequada do lixo. Com o lançamento do programa Lixão Zero pelo MMA, busca-se melhorar essa situação. A coleta seletiva, segundo dados da Ciclosoft, pesquisa nacional realizada em 2018 pelo Compromisso Empresarial para a Reciclagem (Cempre), estava implementada em 1227 cidades (22% dos municípios brasileiros), atingindo 35 milhões de brasileiros (17% da população). A evolução é lenta, mas consistente, e passou a priorizar a participação das cooperativas de catadores.

Em relação à logística reversa, implementada por meio dos Acordos Setoriais, muito já se avançou. O índice de coleta de embalagens Plásticas de Óleos Lubrificantes já alcança 86%. No setor de Lâmpadas, verifica-se a recuperação de 657 toneladas em 1.636 pontos de coleta instalados em 257 municípios.

O compromisso do setor das Embalagens em Geral (alumínio, papel e plástico) encerrou sua primeira fase no final de 2017, reduzindo em 21,3% a quantidade de embalagens dispostas em aterro. Há ações executadas em pelo menos 63 cidades de 21 estados e DF, incluindo, por exemplo, o apoio a 802 cooperativas de catadores.

Avançamos muito, sem dúvida, mas ainda há muito para ser feito. A implementação da lei tem sido um aprendizado para todos os setores e trouxe inúmeros ensinamentos, dentre os quais, a necessidade de maior integração entre os poderes constituídos (Executivo, Judiciário e, destacadamente, o Ministério Público), no sentido de se adotar uma visão comum para a adequada implementação da PNRS.

É importante ainda estarmos abertos à incorporação de novos princípios, uma vez que a busca pela sustentabilidade passa obrigatoriamente pela adoção de um modelo que ultrapassa o foco estrito das ações de gestão de resíduos e de reciclagem.

O modelo da “Economia Linear” de extrair, transformar e descartar, ainda que de forma ambientalmente adequada, está atingindo seus limites. A PNRS deve incorporar os princípios da Economia Circular, que é vista como um elemento chave para promover a dissociação entre o crescimento econômico e o aumento do consumo de recursos.

Além disso, é imperativo buscar uma sustentabilidade econômica para a implantação da política, haja vista que um dos principais entraves para o crescimento da cadeia da reciclagem é a carga tributária. Não faz sentido o setor de reciclagem ser obrigado a pagar a mesma carga tributária que o restante da indústria. Ser multitributado!

Nesse sentido, criamos, ao lado de 27 entidades representativas do setor privado, a Frente Parlamentar pela Criação de Estímulos Econômicos para a Preservação Ambiental – a Frente da Economia Verde —, que visa ser um foro de debate democrático sobre o desenvolvimento de um sistema tributário que leve em consideração o impacto ambiental dos diversos bens e serviços. Esperamos que a resposta dos agentes econômicos a esses estímulos venha na forma de incremento da atividade industrial ambientalmente responsável.

Daniel Coelho: Reforma Tributária deve ser aprovada até Dezembro

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O líder do Cidadania na Câmara Federal, Daniel Coelho, afirmou, nesta sexta-feira (02), que a Reforma Tributária entrará na pauta do Congresso no segundo semestre, com prioridade. Segundo ele, a matéria deve ser aprovada até o mês de dezembro deste ano.

Em entrevista ao Site “O Antagonista”, Daniel colocou que o empenho dos líderes partidários tem sido fundamental para o avanço das reformas. Na sua visão, o debate sobre as medidas que podem tirar o País da crise deve acontecer, independente da agenda de polêmicas tocada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Em postagem no Twitter, o deputado falou sobre os efeitos positivos que as podem gerar. “A aprovação da reforma da Previdência, só em primeiro turno, já traz redução da taxa de juros SELIC para 6%. Menor taxa de juros da história. Não há milagre em Economia. Ajustou as contas, os resultados aparecem. Menos juros, mais produtividade, mais investimentos e empregos”, disse.

Luiz Carlos Azedo: STF intervém na Vaza-Jato

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Nas entrelinhas

“A decisão é um constrangimento para Moro e os procuradores da Lava-Jato, principalmente Dallagnol, que não confirmaram nem desmentiram seus diálogos nas mensagens hackeadas”

No mesmo dia em que a Polícia Federal pediu a prisão preventiva dos quatro suspeitos de envolvimento na invasão de celulares de autoridades, investigada na Operação Spoofing — Danilo Cristiano Marques, Walter Delgatti Neto, Gustavo Henrique Santos e Suelen Priscila de Oliveira —, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux determinou que seja preservado o material resultante da invasão de celulares de diversas autoridades e pediu uma cópia do material, além da íntegra da investigação da Operação Spoofing.

Foi mais um lance na queda de braços entre o Supremo e os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato. É que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, havia anunciado a intenção de destruir os conteúdos das mensagens, o que foge a suas atribuições. A proibição de destruir o material valerá até decisão final do plenário do Supremo. Na semana passada, o ministro João Otávio de Noronha, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), havia recebido um telefonema de Moro comunicando que as mensagens seriam descartadas para “não devassar a intimidade de ninguém”.

Moro chegou a anunciar que mais de mil autoridades do país haviam sido bisbilhotadas pelos quatro hackers, mas esses números não se confirmaram ainda. Diante das intenções do ministro da Justiça, a Polícia Federal divulgou nota na qual dizia que preservará o “conteúdo de quaisquer mensagens que venham a ser localizadas no material” apreendido na Operação Spoofing, mas que caberia à Justiça definir o seu destino, no caso o juiz Vallisney Oliveira, da 10ª Vara de Brasília.

Sorteado para tratar do caso, em razão de um requerimento do PDT, porém, o ministro Fux determinou “a preservação do material probatório já colhido no bojo da Operação Spoofing e eventuais procedimentos correlatos até o julgamento final” do caso, requisitando “cópia do inteiro teor do inquérito, incluindo as provas”. A decisão é um tremendo constrangimento para Moro e os procuradores, principalmente Deltan Dallagnol, que até hoje não confirmaram nem desmentiram os diálogos contidos nas mensagens hackeadas.

Como se sabe, os quatro suspeitos foram presos após a divulgação de trocas de mensagens atribuídas ao então juiz federal Sérgio Moro e ao coordenador da Lava-Jato no Paraná, Deltan Dallagnol, por meio do aplicativo Telegram, em série de reportagens do site The Intercept Brasil, do jornalista americano Glenn Greenwald, ironicamente chamada de Vaza-Jato. O jornalista questiona a conduta de Moro na condução do processo, por seu envolvimento direto nas investigações, principalmente no julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso em Curitiba.

O hacker Walter Delgatti Neto, em depoimento à Polícia Federal, assumiu que entrou nas contas de procuradores da Lava-Jato e confirmou que repassou mensagens ao site The Intercept Brasil. A ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) fez o contato entre o hacker e o jornalista. Agora, a Polícia Federal quer saber qual é o real envolvimento entre o hacker e Greenwald. O presidente Jair Bolsonaro chegou a insinuar que o jornalista seria preso, por envolvimento com os hackers, mas não há provas quanto a isso. A publicação do material e a preservação do sigilo da fonte são prerrogativas constitucionais, que garantem a liberdade de imprensa em todos os países democráticos do mundo, desde que não haja envolvimento financeiro ou operacional com o crime praticado para ofertar os dados.

Sigilo fiscal

Em outra decisão do Supremo que atinge a Operação Lava-Jato, o ministro Alexandre de Moraes determinou a suspensão de procedimentos de investigação da Receita Federal sobre 133 contribuintes, entre os quais o ministro Gilmar Mendes e a advogada Roberta Rangel, mulher do presidente do STF, ministro Dias Toffoli. A decisão de Moraes foi tomada em razão de “graves indícios de ilegalidade no direcionamento das apurações em andamento”. Para Moraes, houve “indevida quebra de sigilo” praticada por dois servidores da Receita, com “graves indícios da prática de infração funcional”. Ambos foram afastados das funções por Moraes.

A decisão do ministro foi tomada em polêmico inquérito aberto pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, sem a participação do Ministério Público Federal (MPF). A liminar vai na mesma linha da decisão de Toffoli que suspendeu todas as investigações da Polícia Federal com base em informações fiscais obtidas sem a devida autorização judicial. O vazamento de dados da Receita envolvendo ministros do Supremo levantou a suspeita de que a força-tarefa da Lava-Jato, por meio da Comissão de Controle de Operações Financeiras (Coaf), estaria investigando 133 agentes públicos, inclusive ministros do Supremo. Segundo Moraes, “sem que houvesse, repita-se, qualquer indício de irregularidade por parte desses contribuintes”. (Correio Braziliense – 02/08/19)

Elena Landau: Sob ataque

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Foram precisos 16 anos de tramitação no Congresso para aprovação da Lei Geral para agências reguladoras e apenas um punhado de dias para o governo desmoralizá-la. Bolsonaro e Osmar Terra ameaçaram fechar a Ancine e a Anvisa por discordar de suas decisões. Na realidade, os políticos jamais aceitaram a autonomia dessas autarquias e a população não entende bem para que servem. Muitas foram criadas no fim dos anos 90 para acompanhar a mudança no papel do Estado, decorrente da privatização, e surgiram para regular os serviços públicos.

São as que atuam nos segmentos de energia, transporte e telecomunicações, por exemplo. Até a desestatização, esses serviços eram oferecidos sem fiscalização e sem regulação. Havia o pressuposto que o Estado estava dando o melhor de si. Ao consumidor só restava aceitar, porque não havia nem sequer a quem reclamar. A agência reguladora de energia – Aneel – foi a primeira a ser criada e substituiu o DNAEE, um departamento vinculado ao ministério setorial, que funcionava basicamente repassando aumentos tarifários. Não havia foco na qualidade, na saúde financeira das empresas nem em investimentos.

A privatização mudou esse cenário e as agências foram criadas para, de forma imparcial entre investidores e consumidores, regular a prestação de serviços, garantindo e exigindo direitos e deveres definidos nos contratos de concessão assinados pelos novos controladores. Foi uma mudança cultural grande e, por isso mesmo, é natural que se leve tempo para entender suas reais funções. Às vezes, são vistas como uma espécie de Procon, criadas para defender o usuário do serviço. No entanto, quando elas homologam reajustes de tarifas ou mensalidades, com base nos contratos assinados, viram o “governo” malvado que aumenta tudo. Fica ainda mais difícil para a sociedade entender seu papel porque há diferentes tipos de agências.

Há as que também são de fomento, como Ancine, que atua no mercado audiovisual e tem a função de promover ganhos intangíveis, ampliando e democratizando o acesso à cultura e à informação. Suas decisões devem obedecer a princípios como: liberdade de expressão e promoção da diversidade cultural e das fontes de informação, produção e programação. Há as de regulação de produto, como a Anvisa, que tem entre suas obrigações normatizar, controlar e fiscalizar produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde.

Independentemente de seu papel, todas elas são agora regidas pela Lei Geral, recém-promulgada, que reafirmou no texto legal a garantia de sua autonomia, como bem definida no Art. 3.º: “A natureza especial conferida à agência reguladora é caracterizada pela ausência de tutela ou de subordinação hierárquica, pela autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira e pela investidura a termo de seus dirigentes e estabilidade durante os mandatos”. O presidente vetou alguns artigos da nova lei, mas manteve o texto que garante a independência decisória. Não deve ter lido o que assinou e, se leu, não entendeu, e se entendeu, não deu bola. Afinal, o Estado é ele. Nesses 20 anos de existência, a independência das agências foi fragilizada pela indicação política de seus diretores, pelo contingenciamento de recursos e por cooptação pelo ministério a que estão subordinadas.

Um regulador que participa de cerimônias de lançamento de políticas ao lado do governo perde a isenção para analisar os impactos de tais políticas sobre a sociedade, aceitando de livre e espontânea vontade a subordinação hierárquica que a lei veda. O ataque frontal que este governo vem fazendo às agências é muito grave, indo além das formas de captura tradicionais. Presidente e ministros resolveram atropelar a lei. Osmar Terra sugeriu que fecharia a Anvisa por discordar da aprovação do uso medicinal da maconha – ao que ele se opõe só por crença e sem ciência.

Só que a lei não permite. Bem fez seu diretor em reafirmar a continuidade dos estudos nessa direção, mostrando a separação entre governo e agência de forma clara. A Ancine foi fortemente criticada pelo presidente, que tem dificuldade para entender o significado de “liberdade de expressão” e “diversidade cultural”. Quer ele mesmo decidir que filmes são “próprios” e que “heróis” devem ser homenageados pelo cinema brasileiro. Mostra também ignorância sobre as fontes de recursos ao ameaçar transferi-los para Secretaria de Comunicação diretamente ligada a ele. Mas, ao contrário da Anvisa, o presidente da agência não se manifestou, e o setor de audiovisual vive momento de paralisia e incerteza. A ignorância de Bolsonaro sobre como funcionam as agências é tão grande que ele ameaçou “privatizar” a Ancine, contribuindo para o trágico Febeapá em que se transformou seu governo. (O Estado de S. Paulo – 02/08/19)

ECONOMISTA E ADVOGADA

Merval Pereira: Campeão de tiro no pé

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O presidente Bolsonaro, que está ganhando medalha de ouro no campeonato mundial de tiro no pé, deu ontem mais dois, em temas de grande sensibilidade internacional. Voltou a acusar o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de estar divulgando dados falsos sobre o desmatamento da Amazônia, talvez com má-fé, e vai ter que voltar para a Funai a demarcação das terras indígenas, por uma decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF).

É impressionante que o presidente não se importe com a repercussão para a imagem do país em questões envolvendo índios e desmatamento. Bolsonaro reconheceu que sua fama no exterior “é péssima”, mas a atribui a “rótulos” que colocam nele.

Não entende, infelizmente, que ajuda a fortalecer esses “rótulos” com atitudes como a de cancelar em cima da hora a audiência com chanceler francês Jean-Yves Le Drian.

O que já era uma desfeita diplomática grave piorou ontem quando, num dos seus rompantes, revelou a verdadeira razão do cancelamento. “O que ele foi fazer se encontrando com ONGs?”, perguntou Bolsonaro, confirmando nota publicada na coluna do Ancelmo de terça-feira, que dava conta de um encontro no domingo do ministro francês com ambientalistas.

Com relação ao Inpe, ele ontem cometeu o mesmo erro anterior, quando disse para correspondentes estrangeiros que os números eram falsos. O Inpe é um órgão do governo brasileiro reconhecido internacionalmente, que deveria ser aproveitado para ajudar a imagem do país no exterior.

Em vez de desacreditá-lo, o governo deveria trazê-lo como parceiro de uma campanha pela redução do desmatamento. Se, porém, como se desconfia aqui e no exterior, a política de seu governo é afrouxar os controles ambientais para favorecer o agronegócio, deveria se munir de dados científicos para rebater os do Inpe, e não ficar no achômetro.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, estimou, sem revelar em que se baseava, que o número do desmatamento, se utilizada a técnica correta, será cerca de 30% menor. Ora, uma redução nesse nível é realmente um dado importante nessa discussão, mas não pode ser “chutado’.

Seria preciso que o ministro estivesse acompanhado de um técnico respeitado, que explicasse a nova metodologia científica, e a contrapusesse aos números do Inpe.

Tendo essa base científica, deveria ter chamado os correspondentes estrangeiros para comprovarem que seu comentário no café da manhã não era mera especulação irresponsável.

Essa insistência de Bolsonaro de impor seus pontos de vista, sem aceitar decisões contrárias, foi ressaltada na reunião de ontem no Supremo Tribunal Federal pelo decano Celso de Melo, na sessão em que o plenário confirmou decisão, tomada liminarmente pelo ministro Luís Roberto Barroso, de retornar a demarcação de terras para a Funai.

O Congresso já havia vetado a medida provisória de Bolsonaro que transferia essa demarcação para o Ministério da Agricultura. O presidente insistiu com nova medida provisória sobre o mesmo tema, o que é proibido pela Constituição. Por isso, foi dada liminar no Supremo, ontem confirmada por unanimidade pelo plenário.

O ministro Celso de Mello, em seu voto, chamou a atenção para o fato de que não aceitar os limites impostos ao Executivo revela “uma inadmissível e perigosa transgressão ao princípio fundamental da separação dos poderes”.

Também alertou para o perigo de um “processo de quase imperceptível erosão” das liberdades da sociedade civil. No mesmo dia em que foi derrotado no STF, Bolsonaro lamentou na sua live diária nas redes sociais que a Justiça está “se metendo em tudo”

Citou decisões recentes da Justiça revogando propostas como a retirada de radares das rodovias federais e a demissão de servidores comissionados. “Está uma briga, porque a Justiça, em cima da gente (…), quer que a gente mantenha radares multando você. É a Justiça, lamentavelmente, se metendo em tudo”.

Quem considera que Bolsonaro é um Jânio no mundo digital liga o alerta, pois acusar “forças ocultas” que o impedem de governar é repetir em farsa uma tragédia anunciada. (O Globo – 02/08/19)

STF suspende investigações da Receita Federal contra ministros

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STF reage, proíbe destruição e pede cópia de conversas da Lava Jato hackeadas

Alexandre de Moraes suspende investigações da Receita contra ministros do Supremo após novas mensagens apontarem cerco de Deltan

Reynaldo Turollo Jr., Thais Arbex e Mônica Bergamo – Folha de S. Paulo

Na retomada dos trabalhos após o recesso de julho, o STF (Supremo Tribunal Federal) reagiu nesta quinta-feira (1°) às novas revelações de mensagens de autoridades, incluindo de integrantes da Lava lato, que mostram colaboração entre o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, e o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa.

Dois ministros, Luiz Fux e Alexandre de Moraes, tomaram medidas judiciais. Outros, como Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, criticaram os procuradores da Lava Jato. Nos bastidores, ministros avaliaram que era preciso uma resposta dura e imediata.

A reação ocorreu no mesmo dia em que mensagens publicadas pela Folha, em parceria com o site The Intercept Brasil, revelam que, em 2016, Deltan incentivou colegas a investigar Dias Toffoli, hoje presidente do Supremo.

Fux concedeu liminar — decisão provisória — para determinar que sejam preservadas as mensagens apreendidas com os suspeitos de terem hackeado celulares de autoridades como Moro. A Polícia Federal prendeu quatro pessoas na semana passada.

Conforme a Folha antecipou, Moro informou autoridades alvos dos hackers que as mensagens, obtidas pelo grupo preso, seriam destruídas.

A comunicação provocou a reação de ministros do STF e de especialistas em direito, que afirmaram que a decisão de destruir ou não o material não cabe ao ministro da Justiça, mas ao Judiciário.

Fux atendeu a um pedido do PDT para proibir o descarte das mensagens. A decisão ainda precisa passar pelo plenário do Supremo, composto pelos 11 ministros.

Além de proibir a destruição das mensagens, Fux pediu acesso a todo o material, que passará aos cuidados do STF de forma sigilosa.

“Há fundado receio de que a dissipação de provas possa frustrar a efetividade da prestação jurisdicional, em contrariedade a preceitos fundamentais da Constituição, como o Estado de Direito e a segurança jurídica”, escreveu.

Fux determinou que se remeta a ele “cópia do inteiro teor do inquérito relativo à referida operação, incluindo-se as provas acostadas, as já produzidas e todos os atos subsequentes que venham a ser praticados”.

O ministro foi citado em uma das mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil, que as publica desde junho.

Conforme as mensagens, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato em Curitiba, relatou a colegas uma conversa em que o ministro teria declarado que a força-tarefa poderia contar com ele “para o que precisar”.

Numa conversa com Deltan, o então juiz Moro escreveu: “In Fux we trust [em Fux nós confiamos]”.

Também nesta quinta, o ministro Alexandre de Moraes determinou a suspensão imediata de procedimentos investigatórios instaurados na Receita Federal que atingiram ministros da corte e outras autoridades. Para Moraes, há “graves indícios de ilegalidade no direcionamento das apurações em andamento”.

Além da suspensão, Moraes decidiu afastar temporariamente dois servidores da Receita por indevida quebra de sigilo apurada em procedimento administrativo disciplinar.

A decisão é uma reação à reportagem publicada pela Folha, em parceria com o site The Intercept Brasil, com mensagens que revelam que Deltan incentivou colegas a investigar Toffoli

Em um dos diálogos, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba sugere que recebeu da Receita informações sobre pesquisas em andamento nas contas do escritório de advocacia da mulher de Toffoli, Roberta Rangel.

“São claros os indícios de desvio de finalidade na apuração da Receita Federal, que, sem critérios objetivos de seleção, pretendeu, de forma oblíqua e ilegal investigar diversos agentes públicos”, afirmou Moraes.

O ministro também pediu informações detalhadas sobre os critérios que levaram a Receita a realizar a fiscalização de 133 contribuintes e pediu esclarecimentos sobre eventual compartilhamento dessas informações com outros órgãos.

Moraes ainda criticou a Receita por ter informado ao Supremo Tribunal Federal que baseou-se em “notícias da imprensa”.

A decisão ocorreu no âmbito de um inquérito aberto em março para apurar fake news e ameaças contra integrantes da corte. A investigação também foi prorrogada por mais 180 dias.

Na manhã desta quinta, ministros atuaram para que a reação às novas mensagens divulgadas viesse nesse inquérito. Magistrados passaram as primeiras horas do dia discutindo a melhor maneira.

De acordo com relatos feitos à Folha, os ministros criticaram duramente a atuação de Deltan, que, na avaliação deles, passou a usar a operação de combate à corrupção como instrumento de intimidação.

Conforme as mensagens, Deltan buscou informações sobre as finanças pessoais de Toffoli e sua mulher, Roberta Rangel, e evidências que os ligassem a empreiteiras envolvidas com o esquema de corrupção na Petrobras.

A Constituição determina que ministros do Supremo não podem ser investigados por procuradores da primeira instância, como Deltan e seus colegas.

Após a publicação das conversas, o ministro Gilmar Mendes disse à coluna Mônica Bergamo que o aparato judicial brasileiro vive sua maior crise desde a ditadura.

Pouco depois, Gilmar voltou a criticar o uso da Receita e, sem mencionar o nome de Deltan, comparou sua atuação a “conversa de botequim”.

“Isso virou um jogo de conversa de botequim, quando o procurador diz assim: ‘Eu tenho uma amiga na Receita que me passa informações’. Coloquem-se cada um de vocês nessa situação. Que segurança o cidadão tem? Quando isso se faz com o presidente do Supremo Tribunal Federal, o que não serão capazes de fazer com o cidadão comum?”, disse.

O ministro Marco Aurélio Mello também fez críticas aos procuradores.

“Isso é incrível, porque atua no STF o procurador-geral da República. É inconcebível que um procurador da República de primeira instância busque investigar atividades desenvolvidas por ministro do Supremo”, disse Marco Aurélio.

Segundo o magistrado, “o problema do Brasil é que não se observa a lei”.

Quando as primeiras mensagens vieram à tona, em 9 de junho, o Intercept informou que obteve o material de uma fonte anônima, que pediu sigilo. O pacote inclui mensagens privadas e de grupos da força-tarefa da Lava lato em Curitiba, no aplicativo Telegram, a partir de 2015.

As mensagens obtidas pelo Intercept e divulgadas até este momento pelo site e por outros órgãos de imprensa, como a Folha, revelam que o então juiz Sergio Moro atuou em parceria com os procuradores em diferentes processos, aparentemente sem a imparcialidade diante de acusação e defesa exigida a um magistrado segundo as regras do Judiciário.

Caso haja entendimento de que Moro estava comprometido com a Procuradoria (ou seja, era suspeito), as sentenças proferidas por ele podem ser anuladas. Isso inclui o processo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está sendo avaliado pelo STF e deve ser julgado no segundo semestre deste ano.

Segundo o Código de Processo Penal, “o juiz dar-se-á por suspeito, e, senão o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes” se “tiver aconselhado qualquer das partes”. Afirma ainda que sentenças proferidas por juízes suspeitos podem ser anuladas.

Já o Código de Ética da Magistratura afirma que “o magistrado imparcial” é aquele que mantém “ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito”.

Moro tem repetido que não reconhece a autenticidade das mensagens, mas que, se verdadeiras, não contêm ilegalidades.

Fux proíbe destruição de provas sobre hackers, destaca O Globo

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Ministro do Supremo determina ‘preservação do material probatório’ e também quer cópia do inquérito. Detidos na Spoofing tiveram prisões preventivas decretadas, e perícia aponta 1.162 celulares atacados

ANDRÉ DE SOUZA E AGUIRRE TALENTO – O Globo

Em resposta a um pedido do PDT, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou “a preservação do material probatório” já colhido na Operação Spoofing, que prendeu quatro suspeitos de invadir ou tentar invadir os celulares de várias autoridades. Fux também deliberou que seja enviada ao STF “cópia do inteiro teor do inquérito relativo à referida operação, incluindo-se as provas acostadas, as já produzidas e todos os atos subsequentes que venham a ser praticados”.

Ontem, o juiz Ricardo Leite, da 10- Vara Federal do Distrito Federal, decretou a prisão preventiva (sem prazo) dos quatro alvos da Spoofing: Walter Delgatti Neto, Gustavo Henrique, Suelen Oliveira e Danilo Marques.

O juiz acolheu pedido da Polícia Federal. Segundo a PF, caso fossem colocados em liberdade, os acusados poderiam apresentar risco para as investigações. Delgatti admitiu em seu depoimento que foi autor dos ataques ao Telegram do ministro da Justiça, Sergio Moro, e do coordenador da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol. Ele também afirmou que copiou as conversas do celular de Dallagnol e as repassou de forma anônima ao site The Intercept Brasil, que vem publicando reportagens sobre o assunto. Os demais são suspeitos de terem conhecimento das invasões e de serem o elo financeiro com possíveis pagamentos pelos atos — o que Delgatti nega.

Os acusados foram presos temporariamente na terça-feira da semana passada, depois que a PF rastreou os endereços eletrônicos (IP), de onde se originaram os ataques ao Telegram de Moro. A prisão temporária terminaria à meia-noite de ontem. Eles devem ser encaminhados para um presídio.

A decisão do ministro Fux vale pelo menos até o julgamento final da ação. O processo continuará em segredo no STF. Há a suspeita de que ministros da Corte tenham sido hackeados.

O TOTAL DE INVASÕES

O pedido do PDT foi uma reação à declaração de Moro, que, segundo nota do Superior Tribunal de Justiça (STJ), informou ao presidente da Corte, João Otávio de Noronha, que o material seria “descartado para não devassar a intimidade de ninguém” Noronha teria sido hackeado. As mensagens podem confirmar reportagens do The Intercept Brasil, segundo as quais Moro não agiu com imparcialidade quando era juiz da Lava-Jato.

Fux ainda deu prazo de cinco dias para que Moro preste informações. A PF também terá cinco dias para enviar cópia do inquérito ao STF.

Perícia feita pela Polícia Federal nos aparelhos eletrônicos apreendidos com o hacker Delgatti, também conhecido como Vermelho, detectou que o grupo criminoso fez ataques a 1.162 números telefônicos distintos, número ainda maior do que o estimado inicialmente pela PF, que era de aproximadamente mil alvos.

As novas provas obtidas na investigação foram consideradas um indício de que Vermelho não agiu sozinho, como ele havia dito no depoimento. Segundo o laudo pericial, foram feitas 5.812 ligações consideradas suspeitas, por meio do sistema BRVOZ, usado pelo grupo para simular ligações com mesma origem e destino e, dessa forma, invadir o Telegram das autoridades.

Os ataques foram muito mais extensos do que Delgatti havia admitido, aponta a PF. Por isso, a PF considera que existem “incongruências” pendentes de esclarecimento.