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Luiz Carlos Azedo: Gaiato no navio

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NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

A aparente desorientação do presidente Jair Bolsonaro, que compartilhou de forma enigmática, na sua rede pessoal de WhatsApp, um texto do economista João Portinho, no qual o autor afirma que o país é ingovernável por causa das corporações, do Congresso e do Judiciário, lembra um velho rock de Os Paralamas do Sucesso, Melô do marinheiro, de Bi Ribeiro e João Barone: “Entrei de gaiato num navio/ Entrei, entrei, entrei pelo cano/ Entrei de gaiato/ Entrei, entrei, entrei por engano”, diz o refrão. É uma analogia quase perfeita com a situação: “Aceitei, me engajei, fui conhecer a embarcação/ A popa e o convés, a proa e o timão/ Tudo bem bonito pra chamar a atenção/ Foi quando eu recebi um balde d’água e sabão/ Tá vendo essa sujeira bem debaixo dos seus pés?/ Pois deixa de moleza e vai lavando esse convés!”

Sucesso na voz de Hebbert Vianna, a música prossegue: “Quando eu dei por mim eu já estava em alto-mar/Sem a menor chance nem vontade de voltar/Pensei que era moleza, mas foi pura ilusão/Conhecer o mundo inteiro sem gastar nenhum tostão/Liverpool, Baltimore, Bangkok e Japão/ E eu aqui descascando batata no porão!” A divulgação do texto por Bolsonaro, com um comentário que revelava sua frustração no cargo, provocou boatos e muita confusão política. Fontes palacianas vazaram para a imprensa que o presidente da República, desgostoso com as dificuldades que enfrenta, estaria disposto até a renunciar para não ceder às pressões do Congresso, por mais espaço no governo em troca da aprovação da reforma da Previdência. O vazamento foi atribuído a militares, que estariam em rota de colisão com Bolsonaro.

O diagnóstico foi catastrófico para o governo. Ao ser indagado sobre o texto ontem, em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro minimizou sua repercussão: “O texto? Pergunta para o autor. Eu apenas passei para meia dúzia de pessoas”. Entretanto, em linha com a narrativa de Portinho, apoiadores de Bolsonaro estão convocando uma manifestação para o próximo dia 26, cujo objetivo seria “invadir” o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Movimentos cívicos como Vem Pra Rua, liderado por Rogério Chequer, e Movimento Brasil Livre (MBL), de Kim Kataguiri, também nas redes sociais, porém, se manifestaram contra o movimento, que virou um dos assuntos quentes deste fim de semana.

Outro assunto é a quebra do sigilo bancário de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República. De janeiro a dezembro de 2016, a conta no Itaú aberta por Queiroz na agência Personnalité Freguesia, no Rio, movimentou R$ 1,23 milhão. Os depósitos em dinheiro representam um terço do total de R$ 605.652 que entraram na conta. Também terão as contas bancárias investigadas a esposa de Flávio, Fernanda Bolsonaro; uma empresa do casal, Bolsotini Chocolates e Café Ltda; as duas filhas de Queiroz, Nathalia e Evelyn; e a esposa do ex-assessor, Marcia. Outros 88 ex-funcionários do gabinete, seus parentes e empresas relacionadas a eles também terão as informações bancárias checadas. Entre os investigados estão Danielle Nóbrega e Raimunda Magalhães, irmã e mãe do ex-PM Adriano Magalhães da Nóbrega, o homem-forte do “Escritório do crime”, organização de milicianos suspeitos de envolvimento no assassinato da vereadora carioca Marielle Franco.

Ideologia

O “apelo às massas” é recorrente na política brasileira, quando presidentes se veem em dificuldades com a economia e o Congresso, mas não costuma dar certo. Bolsonaro lembra Jânio Quadros e Collor de Mello, simultaneamente. O primeiro renunciou ao mandato, acreditando que voltaria ao poder nos braços do povo; o segundo, convocou seus apoiadores a vestir verde e amarelo e acabou forçado a renunciar pela campanha do impeachment. A voz rouca das ruas, como dizia o falecido deputado Ulysses Guimarães, se manifestou na semana passada pela primeira vez após as eleições, por causa do contingenciamento de verbas das universidades federais, com forte repercussão no Congresso. A convocação de uma manifestação em apoio ao governo como resposta não vai resolver os problemas do país, apenas eleva a temperatura política e aumenta a radicalização.

O governo tem duas ordens de problemas: uma é estrutural, a crise fiscal, a estagnação econômica e o desemprego em massa demandam reformas econômicas, principalmente a da Previdência; a outra é política, passa por reformas nas instituições, que são contingenciadas pela Constituição, ou seja, pelo Congresso e o Judiciário. A maneira correta de lidar com isso é a apresentação de propostas tecnicamente robustas e politicamente exequíveis, não há outro caminho na democracia. O problema é que Bolsonaro está focado numa revolução conservadora, inspirada em certa nostalgia reacionária.

Houve, no mundo, uma revolução cultural bem-sucedida, com o feminismo, os direitos dos homossexuais e o declínio da autoridade patriarcal, mas não houve uma revolução política. A democracia representativa foi posta em xeque pelo globalismo e o multiculturalismo. É nesse cenário que autores reacionários, como Olavo de Carvalho, encontraram seu público e ajudaram políticos de direita do Ocidente a sair do isolamento e catalisar as insatisfações populares, chegando ao poder em alguns países, entre os quais os Estados Unidos. Toda ideologia, porém, é uma visão distorcida da realidade; diante da objetividade dos nossos problemas, o Brasil precisa é de coesão política para sair do atoleiro. (Correio Braziliense – 19/05/2019)

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (20/05/2019)

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MANCHETES

O Globo

Governo negocia mudanças no texto para aprovar reforma
Bolsonaro oferece ‘atalho’ para projetos de deputados
No Rio, juízes ‘sem rosto’ deverão atuar contra o crime
Descaso com encostas
Opositores de Maduro fogem para embaixadas

O Estado de S. Paulo

Com governo desarticulado, Centrão tenta impor agenda
Para Bolsonaro, não há ‘teoria da conspiração’
Desemprego faz brasileiro se reinventar
Conta digital pode ser até 50% mais barata
Chacina em bar de Belém deixa 11 mortos
Morador pede isenção de IPTU em via com prostituta

Folha de S. Paulo

Em meio a crise, Bolsonaro testará força no Congresso
Empresas deixam de lado piora do PIB em balanços
Sem explicar, governo represa nomeação de reitores
Alas governistas tentam moderar tom de atos de rua
Brasil não espera apoio para entrar em ‘clube de ricos’
Total de presos quadruplica em SP sob governos tucanos
Venezuelanos vão a Roraima para abastecer carros

Valor Econômico

Balanços das companhias revelam resistência à crise
Vendas da linha branca crescem 11,7%
Bolsonaro busca apoio contra o Congresso
Odebrecht vive o seu momento mais difícil
Especialistas querem lei para unificar leniência
ICMS sobre querosene de aviação traz guerra fiscal de volta a Estados

EDITORIAIS

O Globo

Partidos usam o Coaf para vingança contra a Lava-Jato

Retomada do desenvolvimento deveria ser prioridade das lideranças do Congresso

O país convive com 13,4 milhões de desempregados nas ruas e está à beira do abismo fiscal, mas os chefes de alguns partidos políticos consideram ser mais importante desperdiçar tempo e energia em atos de retaliação à Operação Lava-Jato. Estabeleceram prioridade na pauta legislativa à remoção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça, impondo o seu retorno à estrutura do Ministério da Economia.

Só há uma justificativa lógica, plausível, para tal esforço multipartidário que se desenvolve há três meses entre algumas lideranças partidárias no Congresso: enviar uma mensagem política de vingança ao ex-juiz Sergio Moro, ministro da Justiça, e a todos os agentes responsáveis pelas investigações que desvendaram um ciclo de crimes na política.

A ansiedade por uma vindita contra a Lava-Jato produziu exóticas alianças entre partidos autoproclamados de esquerda, como PT, PSOL e PCdoB, com um bloco da chamada centro direita, composto pelo Progressista (antigo PP), PR, MDB, PSDB e o DEM. Não por coincidência, essas mesmas organizações foram abaladas pelas investigações, e alguns dos seus líderes se destacam na lista de réus por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

O PT e seus satélites PSOL e PCdoB se mantêm inconformados com a exposição do legado de desvios deixado pelos governos em que foram sócios. Para os petistas, por exemplo, não importa que o ex-presidente Lula ou o ex-ministro José Dirceu tenham sido investigados, denunciados, condenados e presos com base em provas validadas em três instâncias da Justiça. Se pertencem ao PT, têm imunidade—segundo a maneira particular de raciocinar do petismo e das organizações que dele dependem.

Até o mês passado, a Lava-Jato havia produzido 285 condenações, com sentenças que somavam mais de 3 mil anos de prisão. O número de réus ultrapassou 600, e os valores ressarcidos ao Estado superaram R$ 13 bilhões. Os resultados nesses cinco anos traduzem de forma cristalina a mensagem de mudança, reafirmada nas urnas por uma sociedade enfadada com o predomínio de práticas viciadas na vida política nacional.

Usar a pauta legislativa para vinganças contra o Judiciário é absurdo. É, também, um contrassenso, porque boa parte do acervo de provas determinantes das condenações na Lava-Jato teve origem em colaborações premiadas dos próprios líderes políticos envolvidos, réus confessos do PT, Progressista, PR, MDB, PSDB e o DEM, entre outros partidos.

O tempo que já se gastou nesse falso debate sobre a retirada do Coaf do Ministério da Justiça representa o mais puro desperdício de energia num país aflito com a deterioração das condições sociais e econômicas. A retomada do desenvolvimento deveria ser prioridade absoluta das lideranças do Congresso.

O Globo

Rio precisa construir autódromo para trazer de volta a Fórmula 1

Bolsonaro, Witzel e Crivella assinaram termo de cooperação para viabilizar novo circuito

Quando o Autódromo Nélson Piquet, em Jacarepaguá, foi demolido, em 2012, para dar lugar ao Parque Olímpico da Rio-2016, a ideia era construir o novo circuito em Deodoro, na Zona Oeste, e inaugurá-lo ainda antes da competição. Mas, por uma série de motivos, o projeto não se concretizou. A Olimpíada acabou e, quase três anos depois, nem sinal de autódromo.

É verdade que no meio do caminho surgiram imprevistos. Descobriu-se, por exemplo, que o terreno do Exército disponibilizado para o empreendimento era um campo minado — compreensível, já que a área era usada para treinamento militar —, o que exigiu amplo trabalho de descontaminação. Além disso, houve a grita de ambientalistas, que alegam que o projeto põe em risco resquícios de Mata Atlântica na Floresta do Camboatá. Estudo da prefeitura sustenta, porém, que não há mais vegetação nativa e propõe que sejam feitas compensações ambientais.

O fato é que o Rio precisa abraçar o projeto, estratégico para o turismo e a economia da cidade. E essencial para que se possa reivindicar a volta da Fórmula 1, ausente da capital fluminense desde 1989 — a partir de 1990 passou a ser realizada em Interlagos, São Paulo.

E o momento não poderia ser mais oportuno. No último dia 8, o presidente Jair Bolsonaro, o governador Wilson Witzel e o prefeito Marcelo Crivella assinaram um termo de cooperação para construção do Autódromo de Deodoro. Na ocasião, Bolsonaro disse que o Grande Prêmio do Brasil de F1 voltará a ser realizado no Rio.

Os ventos favoráveis não vêm apenas do poder público. Como mostrou reportagem do GLOBO, presidente, governador e prefeito receberam cartas de Sean Bratches, diretor de Operações Comerciais da F1, sobre a expectativa de trabalhar “num futuro muito próximo” com a cidade do Rio. São Paulo tem contrato com a Liberty Media, grupo que controla a F1, até 2020.

A ideia é que o autódromo seja construído por meio de uma PPP. O complexo, para cerca de 130 mil pessoas, custaria R$ 697,4 milhões, que viriam exclusivamente da iniciativa privada.

Três décadas atrás, a Fórmula 1 era um dos principais eventos do calendário turístico do Rio, ao lado do réveillon e carnaval. Em artigo publicado no GLOBO, o advogado e professor da FGV Pedro Trengrou se diz que o impacto econômico já no primeiro GP seria de aproximadamente R$ 1,6 bilhão.

Evidentemente, há obstáculos a serem superados, como a questão ambiental e as exigências feitas pelo Tribunal de Contas do Município em relação ao edital. Mas sempre é possível buscar consensos, especialmente em se tratando de um projeto fundamental para acelerar a economia do Rio. O que precisa ficar claro é que nunca houve momento tão propício para dar a largada.

O Estado de S. Paulo

Não foi essa a promessa

Na campanha eleitoral, Jair Bolsonaro prometeu adotar uma nova atitude contra a corrupção e a criminalidade na vida pública. Ao tomar posse, o presidente reiterou, perante o Congresso Nacional, o compromisso de “restaurar e reerguer nossa pátria, libertando- a, definitivamente, do jugo da corrupção, da criminalidade, da irresponsabilidade econômica e da submissão ideológica”. Pois bem, diante da notícia do avanço das investigações relativas às movimentações financeiras do seu filho Flávio e do ex-funcionário do gabinete dele na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) Fabrício Queiroz, o presidente Jair Bolsonaro esqueceu o que havia prometido e reagiu ao modo antigo – aquele rejeitado contundentemente pela população.

Em vez de apoiar o trabalho das instituições e facilitar o esclarecimento dos fatos, o presidente optou por denunciar espúrias alianças que estariam confabulando contra ele. “Estão fazendo esculacho em cima do meu filho”, disse o Jair Bolsonaro, em tom exaltado. Não soube apontar, no entanto, nenhum elemento que pudesse desabonar o trabalho investigativo feito até agora. Além do mais, caso Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz entendam que houve algum excesso por parte das autoridades investigativas, eles têm, como todo cidadão num Estado Democrático de Direito, caminhos legais para fazer valer seus direitos e, se estiverem dispostos, apresentar suas versões do que teria ocorrido.

Ao ser questionado sobre as investigações envolvendo seu filho mais velho, o presidente Jair Bolsonaro ainda disparou críticas aos governos do PT e à imprensa, como se as investigações fossem apenas intrigas da oposição, real ou imaginária. De acordo com o Ministério Público (MP), foram encontrados “indícios de subfaturamento nas compras e superfaturamento nas vendas” de imóveis feitas por Flávio Bolsonaro durante seu mandato como deputado na Alerj. Entre 2010 e 2017, o parlamentar teria lucrado R$ 3,08 milhões com as transações imobiliárias, que envolveram 19 apartamentos e salas comerciais. O MP ainda constatou o “constante uso de recursos em espécie nos pagamentos”.

Foram precisamente essas suspeitas de lavagem de dinheiro que embasaram a quebra de sigilo bancário e fiscal de 95 pessoas e empresas deferida, no fim de abril, pela Justiça do Rio. Entre as pessoas investigadas, oito trabalharam no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro. As explicações até agora foram pouco convincentes. Na defesa técnica apresentada ao MP, Fabrício Queiroz alegou que recolhia os salários dos colegas e os distribuía a um número maior de assessores, para ampliar a rede de colaboradores de Flávio Bolsonaro. Esse esquema informal contraria a própria natureza do salário, que é remuneração personalíssima. Não é da competência de assessor remanejar destino de salário dos outros funcionários de gabinete.

Além disso, desde 2011, a Alerj dispunha de procedimento específico para ampliar a rede de colaboradores de um parlamentar, sendo possível destinar formalmente a verba referente a funcionários de gabinete a até 63 pessoas. Assim, a própria defesa de Queiroz afirmou que, no gabinete de Flávio Bolsonaro, não se seguia o procedimento previsto pela Alerj – e isso é de responsabilidade direta do parlamentar. Não foi o PT quem disse isso, e muito menos a imprensa. Foi o próprio Fabrício Queiroz, cuja proximidade com a família do presidente é admitida amplamente. Questionado se Queiroz tinha confiança do seu pai, Flávio Bolsonaro disse: “Com certeza, ou não teria vindo trabalhar comigo. Ele convivia mais comigo. Mais de dez anos trabalhando comigo quase todo dia. Eu estava mais junto com o Queiroz algumas vezes do que com a minha família”.

Só os outros – só os “inimigos” – é que podem ser investigados? Aqueles que são próximos da corte presidencial estariam imunes a tais inconvenientes? O ministro da Justiça, Sergio Moro, poderia ajudar a esclarecer ao presidente Bolsonaro como a lei deve funcionar. Igualmente, para todos.

O Estado de S. Paulo

A validade da LRF

No dia 6 de junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomará o julgamento de oito ações que questionam a constitucionalidade de alguns artigos da Lei Complementar n.º 101/2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O plenário da Corte iniciou o julgamento das ações no dia 27 de fevereiro, mas a sessão foi suspensa após a leitura do relatório do ministro Alexandre de Moraes e das manifestações da Procuradoria- Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU), entre outras partes interessadas.

As ações foram interpostas na década passada. Logo, o STF fará muito bem ao País caso se pronuncie definitivamente sobre a plena validade de uma lei após tantos anos decorridos desde sua aprovação, especialmente a lei ora contestada. A Lei de Responsabilidade Fiscal é um dos mais eficazes instrumentos legais de que dispomos para salvaguardar o Estado Democrático de Direito consagrado pela Constituição. A higidez na gestão das finanças públicas está diretamente ligada à observância do pacto federativo, à qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos e à garantia de direitos fundamentais.

No cerne do debate em torno da LRF está a possibilidade de redução da jornada de trabalho e dos vencimentos dos servidores públicos nos Estados e municípios que passam por dificuldades financeiras. A medida excepcional, autorizada pela redação original da LRF, poderia ser acionada quando o gasto com a folha de pagamento dos entes federativos ultrapassasse o limite de 60% da receita líquida. De acordo com o Tesouro Nacional, esta era a realidade de 14 Estados em 2017. No entanto, em 2002, o STF decidiu suspender este dispositivo da lei.

Em sua manifestação ao STF na retomada do julgamento em fevereiro, a procuradora-geral, Raquel Dodge, sustentou que a redução da jornada e dos vencimentos dos servidores públicos fere o artigo 37, inciso XV, da Constituição porque transfere os ônus da eventual incúria dos gestores públicos para os servidores. “A ineficiência do gestor poderia ser resolvida, de acordo com essa norma, com a redução de remuneração de cargos e funções. Uma solução que tem apelo imediato e eficiente, mas que fere a Constituição (quanto à irredutibilidade dos vencimentos)”, disse a PGR. Não são raros os casos de governadores e prefeitos que têm de reverter os males econômicos causados pela incúria de seus antecessores.

Logo, a adoção de uma medida extrema, como é a redução de jornada e de vencimentos, não seria, por si só, um “prêmio” concedido aos maus gestores pela LRF, mas antes uma medida saneadora da qual o conjunto da sociedade é o maior beneficiário. Cada caso há de ser analisado à luz de suas particularidades. Importante, ao fim e ao cabo, é que o administrador público tenha uma garantia legal para adotar medidas que julgue necessárias para o bom exercício de seu mandato. A LRF é bastante dura com os governantes. E assim deve ser. Mas ao mesmo tempo que deles exige responsabilidade na gestão das contas públicas, deve, por outro lado, dar-lhes a autonomia para tomar as decisões que julgam necessárias para reversão de eventuais situações adversas.

O advogado-geral da União, André Mendonça, vê a redução de jornada e de vencimentos como uma “medida extrema”, mas “constitucionalmente válida e legítima”. Em parecer enviado ao STF, André Mendonça afirmou que o País “não suporta mais a insensibilidade com a situação fiscal” dos entes públicos. “Temos de conviver com a estabilidade no serviço público, mas nós também não podemos ter hoje uma visão de serviço público como tínhamos no passado. Uma visão onde a administração pública era engessada. Não havia uma lei de responsabilidade fiscal”, afirmou o AGU.

O STF deve ser o primeiro a se afastar da “insensibilidade” quanto à situação fiscal dos Estados e municípios. A sessão prevista para o dia 6 é uma ótima oportunidade para a Corte mostrar-se imune às pressões corporativas e atenta aos anseios mais elevados da Nação.

O Estado de S. Paulo

Equilíbrio eleitoral

O estudo Os Custos da Campanha Eleitoral no Brasil, do Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp) da FGV, evidencia o impacto positivo que o fim do financiamento empresarial teve sobre o processo eleitoral. A pesquisa, baseada nas campanhas para deputado federal, aponta que as eleições no Brasil estão entre as mais caras do mundo, o que, de pronto, é um fator nocivo. Campanhas custosas tendem a reduzir a quantidade e a diversidade dos candidatos e os incitam à competição individualista por recursos em detrimento das soluções partidárias.

Além disso, tornam a classe política mais vulnerável a pressões dos grandes doadores e estimulam a corrupção. Com base nas apurações da Operação Lava Jato, estima-se que entre 2006 e 2012 os financiamentos ilícitos podem ter chegado a R$ 965 milhões. Entre 2002 e 2014 os recursos legalmente arrecadados com empresários somaram R$ 10,46 bilhões, dos quais R$ 1,08 bilhão veio de empresas citadas pela Lava Jato.

Estas seguiram uma estratégia de contribuições mais abrangente que a das não citadas, com maiores somas, maior foco nos partidos e mais diversificação de candidatos – o que deixa transparecer a dinâmica da corrupção endêmica. Em 2015, o financiamento empresarial foi declarado inconstitucional. As evidências confirmam que nas eleições de 2018 a influência do dinheiro diminuiu. Os gastos médios por candidato caíram pela metade em relação a 2014. Diminuíram as assimetrias nas despesas em todos os segmentos comparados, a saber, entre candidatos ricos e pobres, homens e mulheres, brancos e negros, escolarizados e não escolarizados, bem como entre os filiados há mais tempo nos partidos e os filiados há menos tempo, e entre os com mais anos na política e os com menos.

Assim, a proibição do financiamento corporativo, além de eliminar transações promíscuas entre políticos e empresários, tornou a competição eleitoral mais equitativa e plural, ou seja, mais democrática. Isso não significa que todas as distorções tenham sido corrigidas. Para compensar a perda do capital dos empresários, a classe política tomou o dinheiro dos contribuintes, agravando assim outra distorção: o financiamento público dos partidos. Em 2000 o Estado respondia por menos de 8% dos custos eleitorais; em 2018 respondeu por quase 70%. Entre 1995 e 2018, os gastos anuais do Fundo Partidário saltaram, em valores já deflacionados, de R$ 9 milhões para R$ 888 milhões, nada menos que 9.766%. Nas últimas eleições, o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, inventado pelo Congresso em 2017, custou R$ 1,7 bilhão aos cofres públicos, fora o R$ 1 bilhão da propaganda eleitoral dita “gratuita”.

Vinte e um partidos enriqueceram no processo, alguns dobrando a receita em comparação com 2014. Ademais, o Fundo de Campanha foi regulamentado de tal modo que, uma vez repassados os recursos às legendas, quase não há controle, ficando a gestão do dinheiro público à mercê dos caciques partidários. Isso agrava a já deficiente fiscalização e abre uma nova porta à corrupção. Como disse o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, “o Tribunal Superior Eleitoral desempenha um papel formal e extremamente ineficiente no controle da prestação de contas às sanções, que são relativamente inexpressivas, e frequentemente invalidadas por legislação no Congresso”.

Partidos políticos são entidades privadas e devem ser sustentados com recursos de filiados e simpatizantes. Sua subvenção pelo Estado é injusta e corrosiva. Injusta, porque obriga o cidadão a custear legendas com as quais não raro antagoniza. E é corrosiva para os alicerces da democracia representativa, na medida em que os políticos se habituam a recorrer aos eleitores na hora das urnas, mas não no dia a dia, alargando a distância que os separa. Tramitam no Congresso oito projetos de lei referentes aos financiamentos de campanha. Quatro propõem a extinção do fundo eleitoral. Se ela for aprovada até outubro, valerá para o pleito de 2020. Ainda é tempo de sanar essa distorção do nosso sistema eleitoral.

Folha de S. Paulo

Pelo debate educado

Diante das restrições orçamentárias, faz sentido dar prioridade ao ensino básico; há como melhorar qualidade do aprendizado sem expansão do gasto

Não é tarefa simples avaliar o melhor destino do gasto público. To-me-se o debate do momento, sobre o financiamento governamental do ensino em seus diversos níveis.

Resta pouca dúvida de que, em termos de esforço relativo, o Brasil atingiu níveis satisfatórios de dispêndio nessa área. Estimulado pela expansão do setor público nos últimos anos, o gasto total do país com instrução, entre 5% e 6% do PIB, está alinhado com o verificado nos países desenvolvidos.

Aparcela dos orçamentos governamentais brasileiros destinada ao ensino, de 17%, supera os 11% em média das nações, em sua grande maioria ricas, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Apesar disso, o dinheiro despendido com cada estudante fica em geral aquém das cifras observadas no mundo desenvolvido. O Brasil tem um grau de riqueza apenas mediano e, mesmo que reserve fatia substanciosa dela para a educação, a quantidade de reais que sobram por aluno não é tão grande assim.

Ao longo da educação básica, até o final do ensino médio, o Brasil gasta cerca da metade dos dólares por estudante que a média dos países da OCDE desembolsa. Mas essa é apenas uma parte da explicação.

Historicamente, governos brasileiros têm favorecido o nível superior. Nesse estágio, o gasto público em dólares por universitário praticamente iguala o das nações ricas.

Aqui se despende com um estudante na faculdade pública quatro vezes o que é destinado a um aluno do ensino básico. Trata-se da maior disparidade registrada em análise comparativa feita pela OCDE.

O governo Jair Bolsonaro (PSL) tem um argumento válido. Não faz sentido, diante desses dados, ampliar o desembolso com universidades. Toda a folga de recursos, quando houver, deveria ser canalizada aos estágios inferiores.

A boa notícia, entretanto, é que melhorar os indicadores de aprendizado de crianças e adolescentes depende muito pouco da expansão da despesa total. 0 Brasil gasta mais por aluno que o México e a Colômbia, mas tem desempenho pior que os dois países na avaliação internacional da OCDE.

A disparidade dentro do Brasil ajuda a enterrar a ideia de que mais dinheiro produz melhor resultado.

Em 2013, os concluintes do ensino médio de Pernambuco e de São Paulo tinham desempenho parecido no índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), embora o gasto per capita p aulista fosse o quádruplo do pernambucano.

E nos estados e nos municípios, aliás, que o jogo da educação se desenrola. Ao governo federal cabem os papéis de agente regulador e disseminador de boas práticas.

Que esse debate saia do trilho da provocação barata e volte para o caminho das decisões ponderadas e informadas pela melhor ciência.

Folha de S. Paulo

Pelo debate educado

Diante das restrições orçamentárias, faz sentido dar prioridade ao ensino básico; há como melhorar qualidade do aprendizado sem expansão do gasto

Não é tarefa simples avaliar o melhor destino do gasto público. To-me-se o debate do momento, sobre o financiamento governamental do ensino em seus diversos níveis.

Resta pouca dúvida de que, em termos de esforço relativo, o Brasil atingiu níveis satisfatórios de dispêndio nessa área. Estimulado pela expansão do setor público nos últimos anos, o gasto total do país com instrução, entre 5% e 6% do PIB, está alinhado com o verificado nos países desenvolvidos.

Aparcela dos orçamentos governamentais brasileiros destinada ao ensino, de 17%, supera os 11% em média das nações, em sua grande maioria ricas, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Apesar disso, o dinheiro despendido com cada estudante fica em geral aquém das cifras observadas no mundo desenvolvido. O Brasil tem um grau de riqueza apenas mediano e, mesmo que reserve fatia substanciosa dela para a educação, a quantidade de reais que sobram por aluno não é tão grande assim.

Ao longo da educação básica, até o final do ensino médio, o Brasil gasta cerca da metade dos dólares por estudante que a média dos países da OCDE desembolsa. Mas essa é apenas uma parte da explicação.

Historicamente, governos brasileiros têm favorecido o nível superior. Nesse estágio, o gasto público em dólares por universitário praticamente iguala o das nações ricas.

Aqui se despende com um estudante na faculdade pública quatro vezes o que é destinado a um aluno do ensino básico. Trata-se da maior disparidade registrada em análise comparativa feita pela OCDE.

O governo Jair Bolsonaro (PSL) tem um argumento válido. Não faz sentido, diante desses dados, ampliar o desembolso com universidades. Toda a folga de recursos, quando houver, deveria ser canalizada aos estágios inferiores.

A boa notícia, entretanto, é que melhorar os indicadores de aprendizado de crianças e adolescentes depende muito pouco da expansão da despesa total. 0 Brasil gasta mais por aluno que o México e a Colômbia, mas tem desempenho pior que os dois países na avaliação internacional da OCDE.

A disparidade dentro do Brasil ajuda a enterrar a ideia de que mais dinheiro produz melhor resultado.

Em 2013, os concluintes do ensino médio de Pernambuco e de São Paulo tinham desempenho parecido no índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), embora o gasto per capita p aulista fosse o quádruplo do pernambucano.

E nos estados e nos municípios, aliás, que o jogo da educação se desenrola. Ao governo federal cabem os papéis de agente regulador e disseminador de boas práticas.

Que esse debate saia do trilho da provocação barata e volte para o caminho das decisões ponderadas e informadas pela melhor ciência.

Folha de S. Paulo

Além da reforma

Se o ambiente político nebuloso dificulta o andamento da reforma da Previdência, ao menos avançou no Legislativo outra peça essencial para o controle da despesa com aposentadorias e benefícios.

A medida provisória 871, que promove amplas mudanças regulatórias para combater fraudes e acelerar a revisão de benefícios que apresentem indícios de irregularidade, foi aprovada em comissão mista do Congresso e agora segue para votação em plenário.

Um ponto de partida fundamental para justificar as alterações propostas é a constatação de que há excessivo grau de litigiosidade e alto potencial de erros e desmandos nos pagamentos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Dos cerca de 34 milhões de benefícios a cargo do órgão, estima-se que 3,8 milhões decorram de decisões judiciais, não raro resultantes de regras confusas que favorecem divergências de interpretação.

Também há mais cerca de 3 milhões de processos com suspeitas de irregularidades, cuja revisão poderá propiciar economia próxima de R$ 10 bilhões nos primeiros 12 meses, segundo estimativa do governo. Para tanto, serão criados programas específicos de revisão, com vigência estimada até o final do ano que vem.

Tal potencial não parece superestimado quando se observa a revisão, realizada no governo Michel Temer (MDB), de auxílios por doença e aposentadorias por invalidez — que resultou no cancelamento de quase 400 mil pagamentos e poupança de R$ 14,5 bilhões.

O caso talvez mais notório de propensão a fraudes seja o das aposentadorias rurais. Para uma população com mais de 55 anos estimada em 6 milhões de pessoas no campo, em 2017 havia 9,5 milhões de benefícios ativos no INSS.

A mudança no cadastro constitui o mecanismo mais importante para combater concessões irregulares. Se aprovada, a declaração do sindicato deixará de ser aceita como critério de prova de trabalho rural, em favor de uma autodeclaração homologada por entidades (para os benefícios existentes) e outro cadastro (para os novos).

No geral, a proposta do governo se mostra correta, e a comissão preservou seus pontos essenciais. Para que os benefícios possam chegar a quem precisa é fundamental eliminar fraudes e melhorar procedimentos administrativos.

O impacto ao longo dos próximos anos pode chegar a algumas dezenas de bilhões de reais, uma contribuição importante para que a União possa recuperar sua capacidade de investimento em áreas essenciais hoje carentes.

Roberto Freire destaca avanço da luta contra a homofobia no Brasil

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O presidente do Cidadania, Roberto Freire, gravou mensagem (veja aqui e abaixo) pelo Dia Internacional de Combate à Homofobia e Transfobia comemorado nesta sexta-feira (17), data escolhida em referência ao dia 17 de maio de 1990, quando a OMS (Organização Mundial da Saúde) retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças.

O Brasil registrou 141 mortes de pessoas LGBT de janeiro a 15 de maio deste ano, segundo relatório do Grupo Gay da Bahia. Foram 126 homicídios e 15 suicídios, o que representa a média de uma morte a cada 23 horas.

O número representa uma queda de 8% em comparação ao mesmo período de 2018, quando foram registradas 153 mortes (111 homicídios e 42 suicídios). Apesar de uma queda do número geral, houve um aumento de 14% do número de homicídios, de 111
para 126.

[Quero] dizer da importância que no Brasil se tenha consciência de todo esse preconceito, de todo esse atraso e anacronismo [contra a população LGBT], mas aqui estamos avançando e que posso dizer que sou parte dessa luta há muito tempo porque acredito num mundo mais fraterno”, afirmou Roberto Freire, que na Constituinte de 1988 foi autor de emenda com objetivo de criminalizar a homofobia.

Ação para criminalizar a homofobia

Em dezembro de 2013, o PPS, antecessor do Cidadania, ingressou a ADO 26 (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão -26) na qual pede que o STF (Supremo Tribunal Federal) declare a omissão do Congresso Nacional por não ter votado projeto de lei que criminaliza atos de homofobia.

O partido pede a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, sobretudo, as ofensas individuais e coletivas, homicídios, agressões e discriminações motivas pela orientação sexual e identidade de gênero da vítima.

A legenda foi a única que se sensibilizou com a causa e pediu que os assassinatos, atos de violência ou discriminatórios por homofobia e transfobia no País sejam combatidos com as mesmas punições contidas na Lei do Racismo (Lei 7716/89).

A ADO 26 requer ainda que a corte reconheça a inconstitucionalidade da omissão do parlamento brasileiro e fixe prazo de um ano para que o Congresso aprove legislação relacionada ao tema. Caso o prazo não seja cumprido, o partido solicita que o próprio STF declare a homofobia como crime.

Julgamento da ADO 26

Depois de mais de cinco anos, o STF começou a julgar a ADO 26 e o MI 4733 (Mandado de Injução), impetrado pela ABGLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros) que também pede a equiparação da homofobia ao crime de racismo.

Segundo o coordenador nacional do Diversidade 23 – orgão de cooperação LBGT do Cidadania -, Eliseu Neto, o STF deve retomar da ação nesta quinta-feira (23).

Audiências

Nesta semana, Eliseu representou o Diversidade 23 na audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado para tratar sobre “O Dia Internacional de Enfrentamento à LGBTIfobia”. Ele participou também na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados de debate da agenda legislativa pelos direitos LGBTI.

Ensino público sob risco: Desperdício com evasão escolar e reprovação supera cortes na educação

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O fracasso do sistema educacional brasileiro se traduz também no abandono e na evasão escolar. E o prejuízo é bilionário. De acordo com pesquisa do IAS (Instituto Ayrton Senna) e  Insper, somente no ensino médio são R$ 7 bilhões em dinheiro público jogados fora com adolescentes que abandonam os bancos escolares ou são reprovados. O fenômeno se repete todos os anos. Esse desperdício representa quase 11% do gasto público com a última etapa da educação básica no Brasil. É o dinheiro dos brasileiros arrecadado com os impostos sendo literalmente abandonado.

O valor desperdiçado é superior ao corte no orçamento das instituições federais de educação anunciado pelo governo Bolsonaro, de R$ 5,8 bilhões neste ano. Vai faltar dinheiro para pagar bolsas de estudo nas universidades, auxílios a pesquisadores, compra de ônibus escolares, livros didáticos e até para o pagamento de contas de água e energia elétrica das instituições de ensino, segundo levantamento feito pela “Folha de S. Paulo”.

O País já enfrentou essa situação há quatro anos. Em 2015, o governo Dilma Rousseff, do PT, cortou mais de R$ 10 bilhões do ensino básico, equivalentes a 10% do orçamento federal destinado à educação naquele ano. Tirou recursos do FIES (Fundo de Financiamento Estudantil), do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), das escolas em tempo integral e até do PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola), que entrega dinheiro diretamente para as escolas de educação básica. 

Os cortes e o baixo investimento estão deixando cada mais precário o ensino público, refletindo diretamente na formação escolar. Menos de 5% das escolas públicas brasileiras têm a infraestrutura adequada para educar.

No Brasil, de cada 100 crianças que entram na escola, somente 65 conseguem completar todo seu ciclo educacional com um diploma do ensino médio. Se nada for feito para mudar esse quadro, o Brasil precisará de 200 anos para ter todos os jovens na escola. E a competência para resolver a evasão escolar, por meio de boas políticas públicas, é do MEC (Ministério da Educação).

Em audiência pública no Senado neste mês, o ministro da Educação, Abraham Weintraub,  reconheceu que a evasão é um problema, mas não traçou nenhum plano concreto para combatê-la, enquanto já planeja mais cortes nas universidades federais.

Ensino fundamental e infantil

A tesoura do governo no orçamento da educação não está afetando somente o ensino superior, mas o fundamental e o infantil no País inteiro.

“Houve um corte de R$ 2,4 bilhões no ensino infantil e mesmo se a reforma da Previdência for aprovada agora, os efeitos só serão sentidos ao longo dos próximos anos”, disse a senadora Eliziane Gama (MA), líder da bancada do Cidadania no Senado, ao cobrar que o governo Bolsonaro não pode fazer chantagem para a aprovação da mudança no sistema de aposentadoria com os cortes que estão sendo anunciados na educação. 

Ela reconhece, no entanto, que a reforma previdenciária é importante para o equilíbrio das contas públicas, mas cobra que o governo coloque essa questão de “forma clara” para a população.

Um país sem educação custa caro

Para além da evasão de alunos das salas de aulas e dos que sequer estão matriculados no ensino médio, chegamos à cifra de 2,8 milhões adolescentes fora da escola, segundo o estudo do IAS/Insper. Cada um deles representa uma perda de R$ 35 mil  para a economia do País.

Fez as contas? Jovens fora da escola deixam o Brasil R$ 98 bilhões mais pobre todos os anos. O valor é equivalente ao faturamento da terceira maior empresa do Brasil.

Reforma

Para tentar reverter o problema, em 2017 o Congresso aprovou a Reforma do Ensino Médio, que flexibiliza o currículo escolar e dá mais oportunidades para os jovens. As primeiras turmas desse novo ensino médio devem começar já no próximo ano, mas, para que isso aconteça, o MEC precisa acompanhar de perto a implementação da reforma, apoiando os estados e municípios.

Vinícius Miguel quer quadros competitivos e fomentadores do debate político para disputa municipal em 2020

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O presidente provisório do Cidadania em Rondônia, Vinícius Miguel, afirmou, em entrevista ao portal do partido, que terá o compromisso de organizar a legenda no estado visando a disputa eleitoral do próximo ano. Para ele, o objetivo é buscar quadros não só competitivos, mas também fomentadores do debates políticos.

“A primeira coisa é tornar o partido permanente fazendo eleições internas para estruturar os seus quadros, seguindo o estatuto partidário e as resoluções do TSE. Feito isso, a ideia é nos organizarmos nos mais variados municípios do estado pensando em disputar as eleições do ano que vem, e criar uma base eleitoral para o partido. Lançar candidatos viáveis. Não só com viabilidade eleitoral, mas para fomentar a discussão política”, disse.

Viniciuis Miguel, que também é advogado e professor universitário, falou sobre o potencial do Cidadania no estado e adiantou que buscará, por meio do diálogo, o lançamento de seu nome para a disputa da prefeitura da capital, Porto Velho. Nas ultimas eleições, Vinicius Miguel foi o candidato mais bem votado na cidade para o governo de Rondônia.

“Hoje o partido está mais ou menos estruturado. Temos três vereadores no interior e com a minha chegada ampliamos nossa presença na capital, o maior colégio eleitoral do estado. Temos boas expectativas. É provável que eu dispute a prefeitura da capital, mas isso ainda precisa ser amadurecido”, adiantou.

Ao ser questionado sobre os motivos que o trouxeram para o Cidadania, o professor afirmou que a legenda se alinha com os preceitos éticos e democráticos que acredita.

“Eu acho que a partir desta proposta de recolocação e de uma refundação, o partido atualiza os preceitos éticos e democráticos que se alinham, e muito, com aquilo que acredito”, afirmou.

Bancada no Senado: A luta para garantir mais recursos para o ensino público

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Na semana da primeira manifestação popular no governo Bolsonaro, centenas de milhares de pessoas foram às ruas de mais de 200 cidades para protestar contra cortes no orçamento do MEC (Ministério da Educação), que atingiram as universidades e institutos federais e as etapas básicas de ensino.

A bancada do Cidadania no Senado está agindo para garantir os recursos necessários ao ensino público no País. Na terça-feira (14), o plenário da Casa aprovou requerimento do senador Alessandro Vieira (SE) que desarquiva a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 40/2017), de autoria do ex-senador do Cidadania Cristovam Buarque (DF).

A PEC determina que não fará parte do cálculo do teto de gastos públicos (Novo Regime Fiscal) as despesas em educação financiadas com recursos relativos aos royalties e compensações financeiras da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais.

A Comissão de Constituição e Justiça aprovou, na quarta-feira (15), uma Proposta de Emenda à Constituição para proibir o governo de editar medidas provisórias que alterem o planejamento da educação.

“A medida é meritória, é necessária, mas é fruto dessa lamentável situação em que vivemos”, disse o senador Alessandro Vieira, membro titular do colegiado, ao comentar o avanço da proposta na Casa. 

Fundos de pensão

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado aprovou requerimento apresentado por Alessandro Vieira para realização de audiência pública (veja aqui) para debater irregularidades nos fundos de pensão das empresas públicas e maneiras de garantir mais efetividade e transparência a sua gestão.

Representação feminina

A senadora Eliziane Gama (MA), líder do partido,  apresentou na quarta-feira (15) projeto de lei (veja aqui) que acrescenta artigo ao Código Eleitoral para garantir e reservar cadeiras por gênero quando houver renovação de dois terços do Senado Federal, restando uma cadeira para candidatas e outra cadeira para candidatos. O projeto prevê que a Casa tenha pelo menos um terço de mulheres.

“O objetivo é reparar, pelo menos de forma parcial, a situação de sub-representação aguda das mulheres na Casa”, defendeu a parlamentar do Cidadania.

Belo Monte

A senadora Eliziane Gama vai integrar a subcomissão destinada a acompanhar as obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (veja aqui). O Senado é responsável por fiscalizar o cumprimento do Plano Básico Ambiental da usina, que está em construção desde 2011 e já opera parcialmente desde 2016.

A líder do Cidadania também se posicionou em relação à sanção, na segunda-feira (13), da lei que obriga a instalação de banheiros químicos acessíveis voltados para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, em eventos públicos ou privados (Lei 13.825, de 2019). A proposta (PLC 32/2017) foi votada no plenário do Senado no final de março.

Na opinião de Eliziane Gama, a instalação de banheiros químicos acessíveis deveria ser uma prática espontânea por parte dos promotores de eventos. Como não é, tornou-se necessário aprovar uma lei criando esta obrigação.

Eliziane Gama citou dados do IBGE apontando que mais de 20% da população brasileira hoje é portadora de alguma deficiência. Lembrou que o próprio Senado precisou fazer uma série de adaptações em suas dependências para receber a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é tetraplégica e assumiu o mandato em fevereiro.

Previdência dos militares

A senadora também criticou durante a semana os dispositivos que elevam os adicionais para os militares mais graduados, em detrimento dos de patentes mais baixas,  ao analisar o Projeto de Lei (PL 1.645/2019), que atualiza o Sistema de Proteção Social dos Militares das Forças Armadas, a previdência dos militares (veja aqui).

“Não houve um olhar prioritário para a sociedade, houve um olhar, no meu entendimento, privilegiado para os oficiais em relação à questão militar em todo o Brasil. Isso é muito ruim, porque o governo perde o seu discurso [de ajuste] e mostra claramente que não é uma preocupação geral”, afirmou.

Internação involuntária

Eliziane Gama também se posicionou quanto ao projeto que prevê internação involuntária de dependentes químicos, aprovado pelo plenário do Senado na quarta-feira (15).  Defensora da proposta aprovada, a senadora destacou a inclusão das comunidades terapêuticas no Sisnad (Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas).

“O encaminhamento e a inclusão dessas comunidades no sistema nacional será fundamental e vital para a reestruturação e a garantia mínima do seu custeio e funcionamento”, disse a parlamentar. Como o texto já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, seguirá para sanção do presidente Jair Bolsonaro.

Violência nas escolas

Em audiência pública sobre a segurança nas escolas, na Comissão de Educação, Cultura e Esporte (veja aqui), o senador Marcos do Val (Cidadania-ES) usou o massacre de Columbine, nos Estados Unidos, e a política de repressão daquele País para neutralizar franco atiradores em escolas.

Ele lançou à mesa o questionamento sobre a possibilidade de armar professores e funcionários, como já previsto nas leis da Flórida e no Texas, para que neutralizem (ou matem) os assassinos como forma de prevenir novos ataques.

Decreto das armas

Marcos do Val (Cidadania-ES) foi designado, na quarta-feira (15), relator na Comissão de Constituição e Justiça de quatro projetos de lei que propõem derrubar um decreto do governo federal que flexibiliza regras de desarmamento, publicado na semana passada.

Os quatro projetos que visam anular o decreto foram apresentados pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP); Eliziane Gama; o terceiro por sete senadores – Humberto Costa (PT-PE), Paulo Rocha (PT-PA), Paulo Paim (PT-RS), Rogério Carvalho (PT-SE), Jaques Wagner (PT-BA), Jean Paul Prates (PT-RN) e Zenaide Maia (Pros-RN) – e o último por Randolfe em conjunto com seu colega de partido Fabiano Contarato (Rede-ES).

Fundeb

A pedido do senador capixaba, a Comissão de Educação, Cultura e Esporte iniciará, nos dias 21 e 22 de maio, um ciclo de debates sobre o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), cuja vigência expira em dezembro de 2020.

Em 2018, segundo o senador Marcos do Val (Cidadania-ES), um dos proponentes das audiências públicas na CE, o Fundeb ultrapassou R$ 140 bilhões, sendo 10% do montante aportados pela União e os outros 90% pelos estados e municípios.

Prêmio Congresso em Foco

Eliziane Gama, Alessandro Vieira e Marcos do Val (ES) participaram, na terça-feira (14), em Brasília, do anúncio do regulamento do Prêmio Congresso em Foco 2019 (veja aqui).

Tradicional no calendário da capital federal, a premiação é um “estímulo à responsabilidade social por meio da fiscalização do poder público, mas também do reconhecimento de boas atitudes”.

De acordo com os organizadores, em 17 de junho a população já pode começar a ficar de olho nas primeiras informações. É que nesta data será divulgada a lista dos parlamentares que poderão disputar as categorias gerais de “Melhores Senadores” e “Melhores Deputados” deste ano.

O ex-senador Cristovam Buarque (Cidadania-DF) ganhou quatro vezes o prêmio de senador mais votado pela internet, entre 2007 e 2013.

Representatividade feminina: Eliziane Gama quer garantir ao menos um terço de mulheres no Senado

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A líder do Cidadania, senadora Eliziane Gama (MA), apresentou projeto de lei que acrescenta artigo ao Código Eleitoral para garantir e reservar cadeiras por gênero quando houver renovação de dois terços do Senado Federal, restando uma cadeira para candidatas e outra cadeira para candidatos. O projeto prevê que o Senado tenha pelo menos um terço de mulheres.

“O objetivo é reparar, pelo menos de forma parcial, a situação de sub-representação aguda das mulheres na Casa”, defendeu a parlamentar do Cidadania.

A senadora ressalta que essa situação de desequilíbrio atinge todas as Casas Legislativas do País e não se alterou depois da introdução, na lei, do mandamento da reserva de ao menos 30% das candidaturas para cada um dos sexos.

Segundo o Estudo “+ Mulheres na Política”, uma publicação conjunta do Senado e da Câmara dos Deputados, esse desempenho faz nosso país permanecer nas últimas posições do ranking mundial de participação feminina no parlamento, atrás dos nossos vizinhos da América Latina e, inclusive, de países de longa tradição de exclusão e discriminação das mulheres, na política, na economia, na sociedade e na cultura.

Fernando Gabeira: Os dilemas de Moro

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Não posso dizer que o ministro Sergio Moro me surpreenda, porque não o conheço bem. Nem posso avaliar o êxito de sua escolha, pois o governo apenas começa, apesar de tantos episódios cheios de som e fúria, significando nada. Nos últimos meses, o Brasil vem reduzindo o número de assassinatos. A queda foi de 12,5% em 2018. Leio que em fevereiro a queda dos assassinatos no Ceará foi de 58%. Já analisei a situação do Ceará em artigos anteriores. Parte da derrocada do crime se deve à suicida ofensiva militar das facções.

Derrotadas, tiveram de unir objetivos e parou a matança mútua. Mas houve trabalho também por trás dessa redução. Do governo petista e de Moro. Um dos fatores foi a apreensão rápida dos carros roubados, graças às câmeras que identificam as placas e acionam o alarme. Carros roubados são fundamentais em ações criminosas. Era o momento de dizer: o índice de assassinatos está caindo, é possível reduzi-los, vamos discutir o que aconteceu e traçar os rumos do próximo avanço. Moro parece-me indiferente a esses dados. É provável que, no caso do Ceará, exista um pequeno incômodo: o sucesso parcial se deve a um trabalho conjunto com o governo petista.

Reconhecer as vantagens de uma ação republicana não repercute bem nas hostes radicais governistas. Mas, no meu entender, existe outro fator que condena o pequeno sucesso ao anonimato. Ele se deve também à tecnologia. Assim como em Guararema (SP), são as câmeras que fazem o trabalho – um trabalho decisivo. Num governo preocupado com espingardas e trabucos, a grande expectativa é a posse de armas para todos. O sucesso não interessa porque ele é resultado do avanço tecnológico, não comprova a ideologia oficial que vê nas armas a única salvação. Moro assistiu meio constrangido à assinatura de um decreto claramente ilegal para a liberação das armas.

É uma espécie de estatuto próprio de Bolsonaro, atropelando o Congresso e a lei. De que adianta ser ministro da Justiça e concordar com esse amadorismo bélico? De certa forma, Moro lembra a obra mestra da literatura alemã: Fausto, de Goethe. Bolsonaro sabe que Moro engole sapos no governo e tende a ser derrotado no Congresso. E relembra a compensação para tantos transtornos: um lugar no Supremo Tribunal Federal. Com todo o respeito pelo Supremo e pelos juízes que querem chegar lá como ápice de suas carreira, isso é um enredo modesto e provinciano diante das oportunidades que se abrem de construir uma eficaz política de segurança pública no Brasil. As afirmações de Bolsonaro sobre o compromisso de levar Moro ao Supremo, entre outras coisas, apenas reduzem a dimensão do que parecia ser até para ele um tema de grande importância.

Isso sem contar o absurdo de indicar um ministro para o Supremo com mais de um ano de antecedência, abstraindo as condições da Corte e os potenciais candidatos, algo que só pode ser levado em conta no momento da escolha. Moro tem um pacote anticrime e se empenha em aprová-lo, o que acho improvável em curto prazo e na integridade do texto. Mas isso não esgota o trabalho. Há muita coisa a fazer no campo da segurança pública e nem tudo está contido no pacote. Uma das coisas mais lamentáveis nos políticos é ocuparem um cargo pensando em outro. Alguns são derrotados por causa disso. Outros escapam pela tangente, como é o caso do governador de São Paulo. Essa história do Supremo acabou colocando Moro no mesmo patamar das pessoas que estão fazendo de seus postos apenas uma espécie de alavanca para o que consideram um salto maior. E nem sempre consideram com precisão.

De fato, seria uma bela carreira começar como juiz no interior do Paraná, conduzir importantes processos e conquistar ainda jovem uma cadeira no Supremo. Mas isso é um capítulo do livro “pessoas que deram certo”, que realizaram seus sonhos. Muitos podem achar que a soma de pessoas que deram certo faz um país vitorioso. Mas é um engano. É preciso um trabalho específico de recuperação do Brasil, que independe de promoções, promessas compensatórias. Uma política de segurança pública é algo essencial. No entanto, apesar de eleito com essa bandeira, Bolsonaro confia apenas nas armas e aponta os dedos como se estivesse atirando. Ao seu lado, numa foto meio patética, políticos e aspones apontam o dedo também como se estivessem atirando.

A base deixada por Temer e implementada por Jungmann precisa ser desenvolvida. Visitei no Ceará um centro de informações que será vital para o Nordeste. Agora foi inaugurado de vez. Inteligência e tecnologia, aos poucos, vão transformando o caos na segurança pública em algo administrável. Movidos por sua ideologia bélica, os dirigentes atuais seguem apontando os dedos como se atirassem. Não há provas da eficácia dessa visão. É um pouco como as cerimônias religiosas dos antigos para garantir a chuva e fertilidade. É preciso problematizar a solução pelas armas e Moro até agora não se dispôs a fazê-lo. Não foi pelas armas que a Lava Jato rendeu muitos elogios e prestígio internacional. Apoiei a operação por considerá- la a única capaz de desatar o nó da impunidade no Brasil, unindo instituições, estabelecendo a cooperação internacional, usando da melhor forma os recursos tecnológicos.

Se alguém me dissesse que o sonho de Moro era fazer tudo isso para ganhar uma cadeira no Supremo Tribunal, perguntaria: mas só isso? Moro decidiu entrar no governo para completar seu trabalho, uma vez que a Lava Jato dependia de novas leis. Agora, corre o risco de retrocesso e tudo o que lhe prometem é uma compensação, um cargo de ministro, uma capa preta, lagosta com manteiga queimada, vinhos quatro vezes premiados e espaço na TV para falas intermináveis. Mesmo o Doutor Fausto queria mais. (O Estado de S. Paulo – 17/05/2019)

Naercio Menezes Filho: Financiamento da educação

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As polêmicas com relação ao financiamento da educação aumentaram muito nos últimos dias, com o contingenciamento de gastos nas universidades públicas, o corte nas bolsas de pesquisa e o início das discussões sobre o novo Fundeb (fundo de desenvolvimento da educação básica), já que o atual acaba no ano que vem. Afinal, o que deve ser feito com relação ao financiamento da educação? Quais devem ser as prioridades?

Na hora de definir as prioridades nos gastos com educação e saúde, o primeiro critério deveria ser priorizar as áreas que mais contribuem para igualar oportunidades para todos os brasileiros desde o nascimento. Além disso, devemos sempre buscar eficiência nos gastos, ou seja, almejar alto impacto gastando o menos possível, para igualar oportunidades poupando o contribuinte, com maior retorno para a sociedade.

Com relação ao ensino superior, é preciso notar que só recentemente a parcela mais pobre da população teve acesso a esse nível de ensino. Dados históricos mostram que entre 1900 e 1960 menos de 1% da população acima de 25 anos tinha ensino superior completo. Isso ocorreu porque poucas pessoas completavam o ensino médio naquela época, devido à alta repetência entre os mais pobres que vigorava (e ainda vigora) no país e porque havia poucas faculdades. Assim, aqueles que nasceram na década de 60 e têm pais que concluíram o ensino superior (quase todos brancos), tiveram muita sorte na loteria da vida.

Mas as coisas mudaram nas últimas décadas. Entre 1970 e 2000 a parcela da população com ensino superior aumentou para 7%, principalmente devido à desregulamentação do ensino superior privado. E entre 2000 e 2018 ela aumentou mais rapidamente, passando de 7% para 17%, com o crescimento da renda dos mais pobres, o aumento de vagas na rede pública, a criação do Prouni e o Fies. Além disso, as cotas fizeram com que a parcela dos estudantes de escolas públicas e negros aumentasse significativamente nas universidades públicas, o que é muito importante para aumentar a mobilidade entre gerações e servir de referência e incentivo para que outras crianças pobres também se esforcem para ingressar.

Os gastos com educação dobraram nos últimos 15 anos, passando de R$ 170 para R$ 340 bilhões. Mas é importante notar que, enquanto no ensino básico o gasto por aluno triplicou entre 2000 e 2015, no ensino superior o gasto por aluno ficou constante. Assim, o aumento de gastos no ensino superior foi utilizado para aumentar o número de alunos, que dobrou nesse período, passando de 1 para 2 milhões com a abertura de novas universidades. Vale notar que o retorno econômico desse investimento para os alunos mais pobres é elevado, pois a diferença salarial de um curso superior de boa qualidade com relação ao ensino médio é de aproximadamente 200% e eles não podem pagar mensalidades.

Além disso, não é possível cortar os gastos federais anuais com educação sem ferir a Constituição, pois a PEC do teto, ao mesmo tempo que desvinculou os gastos com educação e saúde das receitas da União, impediu uma redução no valor real de despesas nessas áreas. O governo pode contingenciar recursos ao longo do ano ou realocar despesas dentro do orçamento da educação, do ensino superior para o ensino básico por exemplo, mas não pode diminuir os recursos gastos com relação ao ano anterior. Mas será que ele deveria realocar recursos entre as áreas, retirando recursos do ensino superior?

Em primeiro lugar, critérios políticos e ideológicos não podem servir de parâmetro para definir a alocação dos gastos com educação, nem entre níveis de ensino nem entre áreas do conhecimento. As universidades devem ter autonomia para decidir aonde e como alocar seus gastos, desde que sejam transparentes. Além disso, apesar de todos os seus problemas associados ao corporativismo, as universidades públicas cumprem um papel importante na formação de alunos de graduação e pós-graduação, especialmente agora que também estão formando alunos inteligentes mais pobres.

Mais ainda, elas são responsáveis pela maior parte da pesquisa científica no país. Assim, seus recursos atuais, assim como suas bolsas de estudo, devem ser preservados. Mas se quiserem um aporte financeiro maior da sociedade no futuro, elas terão que se reinventar, avaliando a qualidade do ensino e da pesquisa de cada professor e buscando parcerias com setor privado tanto para diversificar suas fontes de financiamento como para aumentar a aplicabilidade das suas pesquisas.

Um dos problemas principais atuais da sociedade brasileira é que, para cumprir a PEC do teto dos gastos num contexto em que há crescimento de gastos com aposentadoria e manutenção de gastos com educação e saúde, as despesas das outras áreas, tais como assistência social, ciência, tecnologia e qualificação do trabalhador terão que cair. Caso a PEC do teto seja mantida, em breve faltarão recursos para programas como o Criança Feliz, Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada, que são essenciais para o desenvolvimento infantil e para redução da pobreza. Por isso é essencial aprovar uma reforma da previdência ambiciosa (mas sem alterar as regras do BPC e da aposentadoria rural).

Com relação à educação básica, sua gestão é feita essencialmente pelos Estados e municípios e sua principal fonte de financiamento é o Fundeb. Dado o grande aumento nos gastos por aluno que houve nos últimos 15 anos e a diminuição acelerada do número de alunos que haverá no futuro, a prioridade agora é tornar o Fundeb mais efetivo e mais redistributivo. Para isso, teremos que mudar as regras de distribuição de recursos para diminuir ainda mais a diferença de gastos por aluno entre as redes, priorizar os gastos com creche e pré-escola para as crianças mais pobres e incentivar a busca pela eficiência, transferindo mais recursos para os municípios que implementarem políticas educacionais baseadas em evidências: aumento do número de horas-aula, foco na alfabetização, adesão à base nacional curricular comum, avaliação de aprendizado dos alunos e meritocracia.

Em suma, mesmo num período de grave restrição fiscal como o que estamos passando, os gastos públicos com educação e saúde têm que ser preservados, pois são essenciais para gerar igualdade de oportunidades e aumentar o crescimento econômico no longo prazo. Porém, devemos priorizar os gastos que vão para os mais pobres e buscar sempre mais eficiência na aplicação desses gastos. (Valor Econômico – 17/05/2019)

Naercio Menezes Filho, professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no Insper, professor associado da FEA-USP e membro da Academia Brasileira de Ciências, escreve mensalmente às sextas-feiras (naercioamf@insper.edu.br)

A “desconstrução” de Trotsky na minissérie da Netflix na análise de José Carlos Monteiro

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Na sexta edição da revista Política Democrática online (veja aqui), José Carlos Monteiro publica um ensaio exclusivo sobre Trotsky da Netflix. Veja abaixo os  principais trechos.

A quem interessava a grotesca “desconstrução” de Leon Trotsky (1879-1940) e da revolução soviética promovida na minissérie Trotsky (em russo: Троцкий) pelo Pevry Kanal russo e encampada pela plataforma norte-americana de streaming Netflix? A julgar pela repercussão dos oito episódios da minissérie, tanto no âmbito interno como no exterior, a produção parece ter atingido seus objetivos: admiradores do líder revolucionário a detestaram, ao passo que anticomunistas brasileiros e americanos (e moderadamente europeus) vibraram.

Ainda (ou cada vez mais), percebe-se a existência de um sentimento antissocialista. Basta ler as manifestações nas redes sociais e em certa mídia ocidental. O seriado surge, assim, num contexto de populismos direitistas e ferozmente antagônicos à Rússia ou ao que ela representa em termos de continuidade ou evocação do passado. Mas a Rússia se esquiva de qualquer associação com a ideologia do passado.

A operação Trotsky teve como pretexto o centenário da Revolução de 1917, cuja comemoração o governo de Vladimir Putin ignorou. Afinal, astuciosamente, o putinismo quer distância de comunismo e de imagens e valores de seus “pais fundadores”, empenhado como está em forjar sua “ideologia do futuro”. Onde se inscreve precisamente esta megaprodução televisiva, elaborada nos moldes das mais facciosas biopics hollywoodianas?

Uma oportuna reflexão de Vladimir Surkov, conselheiro de Putin, nos sugere que a perspectiva dos realizadores consistia em que a linguagem da minissérie deveria ser “aceitável para público suficientemente amplo, porque o sistema político que opera na Rússia é feito não só para atender futuras necessidades domésticas, mas também para garantir significativo potencial como artigo de exportação”.

Daí a empolgação da Netflix ao ver Trotsky em lançamento mundial no Mipcom, mercado internacional de conteúdos audiovisuais, que acontece em Cannes. “É a primeira série dedicada a Trotsky na história da Rússia”, alardeou Konstantin Ernst, diretor do Pevry Kanal, do qual a rede americana comprou a minissérie na suposição de que ela tinha os ingredientes postulados por Ernst: “Trotsky se parecia com um herói do rock and roll: fuga da prisão, revolução, amor, exílio e morte.” Uma equação, sem dúvida, de inspiração hollywoodiana. (Assessoria FAP/Cleomar Almeida)