A Petrobras explora petróleo no território da Amazônia há 50 anos, sem um único vazamento, mas também sem impacto social positivo na região
O embate entre Petrobras e Ibama é apenas um ponto no debate entre crescimento econômico versus desenvolvimento sustentável, e entre aumento imediato de renda e proteção do meio ambiente. Um embate sem uma visão hegemônica na sociedade e na política do Brasil; sem unidade dentro do governo atual. Na última quinta-feira, 25 de maio, esta coluna defendeu que diante deste impasse o governo adie a decisão sobre exploração de petróleo perto da foz do Rio Amazonas, e promova amplo debate técnico e político sobre qual o rumo da economia: buscando renda imediata ou desenvolvimento sustentável.
Supondo que haverá este debate, a coluna apresenta hoje argumentos contrários ao projeto, pelas seguintes razões:
- A Petrobras explora petróleo no território da Amazônia há 50 anos, sem um único vazamento, mas também sem impacto social positivo na região, como estão prometendo agora ao povo do Amapá. A população local não se beneficiou, nem vai se beneficiar, da exploração deste novo campo no mar. A renda gerada irá para os acionistas distantes e os salários de profissionais de fora, o IDH continuará o mesmo, ainda que cheguem alguns recursos por royalties. O Rio de Janeiro é um bom exemplo desta falta de conexção entre exploração de petróleo e população local aos poços.
- Ainda que o investimento seja feito pela empresa Petrobras, são recursos que em grande parte poderiam ser destinados aos dividendos para o acionista governo federal, que poderia destiná-los a outros propósitos com impactos sociais muito maiores para a população local. A própria empresa poderia investir estes recursos no desenvolvimento de fontes alternativas de energia que substituam o petróleo.
- Quando, há 50 anos, foram tomadas as decisões de exploração na Amazônia, a crise ambiental ainda não era uma questão decisiva para a humanidade. A Amazônia não era uma preocupação internacional e o Brasil não era um país pária no cenário internacional pelo descuido com as florestas e os rios da Amazônia, além disto, o petróleo não era ainda o produto vilão do equilíbrio ecológico.
- Não havia, há 50 anos, a perspectiva atual de repúdio ao uso de petróleo como combustível, nem a política de redução de seu consumo e em consequência a queda das rendas que ele gera. Por isto, parece um equívoco aos interesses nacionais, econômicos, sociais, ecológicos e nas relações internacionais a simples possibilidade de exploração de petróleo no litoral amazônico.
- Depois de anos visto como “o grande destruidor de florestas e da Amazônia”, o Brasil pagará alto preço no cenário internacional, inclusive no comércio, se sinalizar ações de volta a ser pária, apenas poucos meses depois de um novo governo; se depois de gritarmos “o Brasil voltou”, com a Marina Silva ministra, voltarmos ao passado da “boiada passando”.
A presença de Marina no ministério é uma bandeira do Brasil que voltou ao cenário mundial, sua saída desfalcaria o país, sua permanência tolerante e omissa mostraria uma bandeira desbotada. É preciso que ela fique e com a coerência que chegou. (Blog do Noblat/Metrópoles – 27/05/2023)
Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador