Lula chega na frente graças a seu carisma pessoal, às lembranças das boas ações do seu governo, mas muito ao aval de Simone Tebet
O Brasil atravessou 2022 dividido em três partes: os obstinados por Lula ou por Bolsonaro, e uma terceira via democrata, mas antipetista. Alguns poucos críticos ao PT se manifestaram em defesa de uma unidade com o Lula. Temiam que o histórico isolamento deste partido impedisse os apoios necessários para derrotar Bolsonaro; e também que o primeiro turno provocasse disputas tão acirradas entre os democratas, que o apoio ao Lula no segundo turno ficasse difícil. Ciro foi prova de que este temor se justificava. Lula teve o bom senso de atrair Alckmin para sua chapa; apesar disto, a campanha continuou como disputa entre o PT e Bolsonaro, não entre o Brasil e o abismo bolsonarista.
O quase empate é prova de que tinham razão os que temiam a divisão dos democratas no primeiro turno. Comparando as biografias e os governos de Lula e de Bolsonaro, a eleição deveria ter sido resolvida com vantagem avassaladora a favor do ex-presidente. Apesar do Alckmin, o primeiro turno se desenrolou com o PT isolado e o antipetismo insistindo no discurso de nem um lado, nem o outro. O carisma de Lula, a competitividade do PT e a opção de alguns da terceira via permitiram chegar ao final das eleições com o Bolsonaro atrás nas pesquisas, embora com o resultado indefinido.
Foi Simone Tebet quem simbolizou a reorientação da disputa para ser entre o Brasil e Bolsonaro, e não entre este e o PT. Ela trouxe o compromisso com a responsabilidade fiscal, a confiança no respeito ecológico sem repudiar o agronegócio, a necessidade de dar cor brasileira e não petista nas manifestações. Sem o seu empenho, dificilmente Lula teria atraído apoio de grandes lideranças políticas e intelectuais que ajudaram a quebrar o preconceito antipetista e antilulista, entre democratas que não aceitavam votar em Bolsonaro, mas não queriam votar no PT.
Lula chega na frente graças a seu carisma pessoal, às lembranças das boas ações do seu governo, mas muito ao aval que Simone Tebet emprestou à chapa petista. Antes dela, a disputa parecia ser entre PT e Bolsonaro, e não do Brasil contra Bolsonaro. Muitos colaboraram para esta inflexão, inclusive o próprio Lula e a imagem de Alckmin, mas foi sobretudo Simone, quem colocou o Brasil na chapa petista: nas cores, nos discursos, na postura, nas posições políticas. O Brasil deverá ao Lula ter nos livrado de Bolsonaro, como as pesquisas e as ruas parecem apontar, mas muito à Simone Tebet ter levado Lula para além do PT.
Seu aval ajudou a assegurar o favoritismo-empatado de Lula, e ela fica com grande responsabilidade para o futuro. Se ocorrer o que as pesquisas indicam e que o mundo inteiro, salvo Trump, deseja, cabe a Simone se manter, junto com Alckmin, como avalista do próximo governo Lula. Representar aqueles que, apesar de críticos, há um ano apoiam Lula, e aqueles que se aproximaram nas últimas semanas. Simone é hoje a avalista do Brasil democrático, responsável fiscalmente, tolerante nas ideias, confiante na ciência, aberto ao mundo, justo socialmente, sustentável com eficiência econômica e comprometido com a educação de base.
Se ainda há quem não quer Bolsonaro mas teme Lula, basta olhar e ouvir Simone Tebet para decidir seu voto amanhã. (Blog do Noblat/Metrópole – 29/10/2022)
Cristovam Buarque foi senador, ministro e senador