Guardiões que protegem o meio ambiente são assassinados e os culpados nunca são encontrados
Confesso que esta semana foi difícil. Dia 18 de abril fará dois anos da morte do meu amigo e guardião da floresta Ari Uru Eu Wau Wau, que prossegue ainda sem respostas. No entanto, o luto e a dor de sua perda continuam.
Lembro bem quando minha família teve que ser escoltada por quase um ano pela Força Nacional por causa das ameaças que meus pais estavam recebendo pelas denúncias de invasões em nosso território. Ameaças que persistem até hoje.
Assim são tratados os defensores do meio ambiente neste país. O Brasil é o quarto país que mais mata defensores ambientais no mundo, e a maioria dos casos aconteceu na Amazônia. O assassinato de indígenas aumenta a cada ano.
O desmatamento na Amazônia é o maior nos últimos dez anos. O Congresso ataca os povos originários com projetos de lei como o 191/2020 e o 490/2007, que querem permitir mineração nos territórios e acabar com a demarcação das terras indígenas.
Lembremos ainda do tratamento que os territórios receberam na pandemia por parte do governo —já são mais de mil indígenas mortos pela Covid. Perdemos nossas bibliotecas vivas e saberes que nunca iremos recuperar. Perdemos entes queridos, amigos, pais e filhos. Eu perdi duas avós e tios.
Tomo conhecimento das últimas notícias da Terra Indígena Yanomami, onde crianças e mulheres estão sendo abusadas em troca de comida. Chego à conclusão de que nossas vidas não valem nada.
Primeiro levaram o garimpo, o mercúrio, a doença, a destruição das florestas e o envenenamento dos nossos rios. Depois vêm a fome, os abusos sexuais e a morte. Os guardiões que protegem nossos territórios são assassinados e os culpados nunca são encontrados, ainda que todos saibam o que se passou.
Casos graves de violações de direitos humanos acontecem dentro das terras indígenas em todo o Brasil. Denunciamos diariamente o genocídio em curso. Por que ninguém faz nada? Nosso choro e nossa dor não importam enquanto estiverem lucrando com isso.
Deixo meu desabafo e o poema que fiz em protesto à situação do povo yanomami:
Ao comprar teu ouro
Não esqueça das crianças
Famintas e eternamente
machucadas
Lembre das mulheres
Tristes e violadas
Pense nas crianças
Com vidas ceifadas
Não esqueça nunca
Das famílias desestruturadas
Lembre das doenças
E florestas devastadas
Pense no mercúrio
E nos rios envenenados
Esqueça do luxo
E da ganância
Mas nunca se esqueça
Das mulheres e crianças (Folha de S. Paulo – 16/04/2022)
Txai Suruí, coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia