Datena movimenta xadrez eleitoral de São Paulo

NAS ENTRELINHAS

A filiação do apresentador, que seria uma candidatura capaz de desestabilizar tanto Boulos quanto Nunes, parece jogo combinado da cúpula do PSDB com Tabata Amaral (PSB)

O apresentador José Luiz Datena se filiou, nesta quinta-feira, ao PSDB e mexeu com o tabuleiro eleitoral de São Paulo. O comunicador, que tem grande prestígio popular, já trocou de partido 10 vezes, mas nunca foi candidato para valer; agora, deixou o PSB de Tabata Amaral, ao qual havia se filiado recentemente, na véspera do último dia de prazo de filiação, para ser pré-candidato a prefeito da capital paulista. Sua entrada no ninho tucano — a convite do ex-deputado José Aníbal (PSDB) e do presidente nacional da legenda, Marconi Perillo — ocorre no momento em que os vereadores da sigla deixam o partido porque apoiam a reeleição do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB).

O PSDB sonha com um nome competitivo para disputar a Prefeitura de São Paulo. O deputado Aécio Neves (MG) defende a tese de que a legenda deve ter candidato próprio em todas as capitais, o que vem estressando as relações com os aliados. No caso de São Paulo, nas conversas com o prefeito Ricardo Nunes, Aníbal havia pleiteado a vice para a sigla, em retribuição ao fato de o prefeito ter herdado o mandato de Bruno Covas, que morreu precocemente de câncer, logo depois de reeleito, em 2020. Não houve acordo entre Nunes e Aníbal.

Com apoio do governador Tarcísio de Freitas (PR), Nunes optou por uma aliança com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que pretende indicar o vice e subir no palanque de Nunes. Quer nacionalizar a eleição à Prefeitura de São Paulo e impor uma derrota ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o venceu na capital paulista em 2022. O candidato do petista é o deputado Guilherme Boulos (PSol), que era o franco favorito na disputa. Lula convenceu o PT a abrir mão de uma candidatura própria; mais do que isso, indicou para vice de Boulos a ex-prefeito Marta Suplicy, que deixou a Secretaria de Relações Internacionais de Nunes, em razão do acordo com Bolsonaro e do convite de Lula, e voltou ao PT.

Até agora, a movimentação de Nunes deu mais resultado eleitoral do que a de Boulos. A última pesquisa Datafolha, realizada em 8 e 9 de março, mostra uma espetacular recuperação do prefeito, que agora está em empate técnico com seu adversário. Boulos e Nunes aparecem com 30% e 29% das intenções de voto, respectivamente. Na disputa, Tabata do Amaral (PSB) tem 8%; Marina Helena (Novo), 6%, e Kim Kataguiri (União), 4%; 14% afirmaram que votariam em branco, nulo ou em nenhum dos candidatos, e 6% disseram que não sabem.

Nunes nunca foi um político carismático, ainda é pouco conhecido pela maioria da população e faz uma gestão administrativa “feijão com arroz”, mas é competente na articulação política. Tem o apoio da maioria dos vereadores e até a simpatia de alguns petistas. Além disso, dono do terceiro maior orçamento público do país (R$ 111,8 bilhões), com esse empate técnico, aumentou muito sua expectativa de poder.

Moderação

No atual estágio da campanha eleitoral, em que os candidatos cavam trincheiras e tentam conquistar territórios, Nunes tem enorme vantagem estratégica na atração de aliados e de apoios na elite paulista, sobretudo entre os que prestam serviços ou dependem da administração. Entretanto, o candidato dos movimentos sociais é Boulos, principalmente dos sem-teto, mas isso pode ser mais um fato de isolamento do que uma força eleitoral decisiva. O candidato do PSol precisa convencer a classe média paulista de que será capaz de resolver o problema da população de rua sem fomentar invasões.

Desde as eleições passadas, Boulos tenta construir a imagem de que é um político “bonzinho”, e não um comunista que come criancinha. Isso o leva a fazer uma campanha morna, supostamente palatável para a classe média paulista, mas que não empolga os eleitores que desejam uma grande mudança na vida cotidiana, o que dependeria de uma gestão disruptiva e programaticamente inovadora. Aliados se queixam de que Boulos não tem um projeto novo para a cidade nem uma estratégia eleitoral clara, capaz de empolgar os eleitores. Sua inércia, nesse aspecto, favorece Nunes.

Mas também ajuda Tabata do Amaral, cuja imagem de jovem que saiu da periferia para estudar em Harvard e voltou como uma liderança renovadora da política seduz a elite paulista. Por essa razão, o apoio do PSDB à candidata do PSB pode ser o desfecho do rompimento da cúpula tucana com Nunes. A filiação de Datena, que seria uma candidatura capaz de desestabilizar tanto Boulos quanto Nunes, parece jogo combinado da cúpula do PSDB, que endossa transferência de legenda, com José Aníbal. Embora no segundo mandato, Tabata ainda cultiva uma imagem de candidata antissistêmica.

No caso de a eleição realmente se nacionalizar e reproduzir em São Paulo a polarização nacional entre o presidente Lula e Bolsonaro, essa radicalização pode ser boa para Nunes, mas é ruim para Boulos, porque abre espaço para Tabata representar uma espécie de terceira via e crescer no processo eleitoral. Essa é a aposta de um grande ator da política paulista, que se move muito discretamente, mas está com Tabata, e não abre: o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB).

A movimentação de Datena teria esse objetivo. O apresentador é uma metamorfose ambulante: já foi do PT, do PP, do antigo DEM e do novo União Brasil, além do PSC, do PDT e do MDB. Várias vezes se apresentou como candidato e desistiu. Por essa razão, ninguém acredita que seja candidato ou vice de Tabata. Sua filiação ao PSDB é vista como uma manobra para fortalecer a indicação de um tucano para vice de Tabata. (Correio Braziliense – 05/04/2024)

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