Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais (26/09/2022)
MANCHETES DA CAPA
O Globo
Campanhas têm disparo de gastos com redes e menor investimento em TV
Voto útil leva Lula e Ciro a se atacarem no Rio
Michelle e Jair Renan, o novo atrito público da família Bolsonaro
Registro de pesquisas no TSE crescem 37% em quatro anos
Na reta final, casais divididos pela polarização
Brasileiros sem terceira dose são 89% dos mortos por Covid
Abortos legais em menores de 14 se mutiplicam por seis em 10 anos
Solar e eólica lideram expansão energética em 2023
Intolerância mancha o futebol na Europa
Extrema direita conquista vitória histórica na Itália
O Estado de S. Paulo
Direita radical deve vencer na Itália, apontam projeções
Meloni preocupa parte das italianas
Sigilo de 100 anos inclui telegramas do Itamaraty e visitas à 1ª dama
Candidatos usaram só 6% do tempo do debate para propor projetos e ideias
De vaqueiro a garçom, 156 categorias pedem piso salarial
Aumento dos juros em vários países amplia ameaça de crise global
Nasa lança novo teste da missão Dart, o sistema de defesa planetário
Folha de S. Paulo
Bolsonaro aprova lei de TV e favorece aliados evangélicos
Jovem é agredido, e polícia tenta prender Boulos
Mulher é atacada após irmã criticar o bolsonarismo
Extrema direita vai voltar ao poder na Itália, indica projeção
Vanessa Nascimento – Partidos políticos são locais hostis a pessoas negras
Após resistir a estrada e hidrelétrica, os Kinjas enfrentam marco legal
Autistas adultos têm apoio em SP
Commodities, bancos e consumo lideram na Bolsa
Investidor aposta mais nas vendas a descoberto
Valor Econômico
Pressão para Black Friday e Copa cresce após 3º tri fraco
Leilão prevê R$ 6,2 bi para saneamento
O que esperar da reta final da eleição
Contribuinte busca devolução de ITBI
Correio Braziliense
Chance de 2º turno no DF
Damares avança e se aproxima de Flávia
Bolsonaro consolida liderança
Caixa vazio e estratégias esgotadas
Júlio Lancelotti – ‘O ateísmo não desumaniza ninguém’
EDITORIAIS
O Globo
Privatizações devem ser encaradas como política de Estado
Não se trata apenas de vender ativos para obter recursos, mas de trazer inovação e eficiência à economia
Na campanha eleitoral de 2018, o hoje ministro da Economia, Paulo Guedes, fez uma projeção que ficou célebre: arrecadaria R$ 1 trilhão com as privatizações no novo governo. O passado de Guedes, doutor pela Universidade de Chicago e ícone do liberalismo econômico no Brasil, emprestava credibilidade ao que na época não passava de palpite. Mesmo que o número parecesse exagerado, acreditava-se na intenção.
Passados quatro anos, houve avanços inegáveis em concessões de rodovias, aeroportos e telefonia. Mas o governo Jair Bolsonaro não foi na essência muito diferente de outros no que diz respeito às privatizações. O principal negócio que realizou, a venda da Eletrobras, foi contaminado pela celeuma em torno de uma lei repleta de jabutis que encarecerão a energia. O principal desafio trazido pelas privatizações persiste: criar um mercado competitivo, que beneficie o consumidor. “Quando quebramos o monopólio público, o que se quer é competição e eficiência. Sem isso, temos a maior perversidade que existe: a transferência do monopólio público para o privado”, afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo o economista Luiz Chrysostomo, um dos criadores do Programa Nacional de Desestatização (PND) nos anos 1990.
De acordo com ele, as privatizações, iniciadas no governo Itamar Franco, prosseguiram, mesmo aos tropeços, por todos os governos. A esta altura, podem ser consideradas uma política de Estado, que precisa estar na agenda do presidente que assumir em 1º de janeiro, seja quem for. Não devem ser encaradas como forma de o governo se livrar de ativos para arrecadar recursos, como sugeria a frase de Guedes. O mais importante é ajudarem a aprimorar o modelo institucional e regulatório, trazendo eficiência à economia. Sem regulação benfeita, a sociedade não usufrui nenhum benefício em qualidade ou preço de serviços ou produtos.
O melhor exemplo de êxito foi a venda da Telebras, coordenada por Chrysostomo em 1998. As privatizações e licitações desde então trouxeram competição, modernização e eficiência às telecomunicações brasileiras. O principal revés na trajetória de desestatização foi o aparelhamento das agências reguladoras, a partir do governo Dilma Rousseff. Por isso são preocupantes as declarações do candidato petista Luiz Inácio Lula da Silva, que desdenhou a independência das agências, numa estratégia sorrateira para manter poder nas mãos de políticos, não de técnicos. Outro absurdo é o absoluto descaso do atual governo ao não preencher vagas nesses órgãos, por isso incapacitados de supervisionar os mercados.
Entre os diferentes setores regulados, Chrysostomo considera que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) terá na crise energética global e na adoção energias alternativas (eólica, solar) a maior oportunidade de promover competição no setor. A própria privatização da Eletrobras deverá ajudar no aperfeiçoamento da Aneel.
Independentemente do que acontecerá em cada setor, o país só terá condição de se desenvolver em cima da infraestrutura ampliada e modernizada pelo capital privado. O Estado não tem condições financeiras nem vocação para arcar com tais investimentos. O fracasso retumbante do projeto megalomaníaco para fabricar sondas de exploração do petróleo do pré-sal, conduzido por ambas as gestões do PT, deve ser lembrado toda vez que qualquer governante tiver ideia semelhante.
O Estado de S. Paulo
A dimensão da liberdade de expressão
A liberdade de expressão e de imprensa tem sofrido diferentes ataques – de Bolsonaro, de Lula e, às vezes, do próprio STF. É urgente revigorar sua compreensão e fortalecer sua defesa
Numa democracia ainda em maturação, como é o caso da brasileira, o tema da liberdade de expressão, que deveria ser pacificado, ainda é objeto de barulhenta controvérsia – e, na presente campanha eleitoral, ganhou status de grande prioridade. Noves fora os exageros e as distorções, o fato é que é necessário revigorar a compreensão do que vem a ser liberdade de expressão e de imprensa, além de afastar, de forma muito firme, os ataques e as ameaças que vêm rondando o cenário nacional.
Há muita desinformação sobre o tema, o que gera confusão em muitas mentes e corações. O art. 5.º da Constituição assegura que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (inciso IV), mas a liberdade de dizer o que se pensa não é autorização para cometer crimes, como calúnia, difamação, injúria, grave ameaça ou incitação à prática de crimes. Não existe liberdade absoluta. Cada um é responsável pelo que diz e, por isso, a Constituição veda o anonimato.
Algumas vezes, a própria Justiça difundiu incompreensões sobre o tema. Em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) trouxe tranquilidade ao País ao reconhecer, por unanimidade, o direito de publicar biografias não autorizadas. Na ocasião, a ministra Cármen Lúcia lembrou que “o cala a boca já morreu”. No entanto, em 2019, a mesma Corte, em decisão do ministro Alexandre de Moraes, determinou a censura da revista Crusoé, por entender que determinada matéria não correspondia aos fatos. Ora, o Estado, seja em que instância for, não é censor da verdade. Logo depois, a ordem de censura foi suspensa, mas o caso serviu de alerta para o perigo de violar, sob pretexto de virtude, a liberdade de expressão e de imprensa.
Deve-se advertir que os dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto para presidente da República – Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro – apresentam, cada um a seu modo, ameaças à liberdade de expressão. Desde sua fundação, o PT flerta com propostas de “regulação social da mídia”. Para piorar, os petistas nunca são claros na concretização dessas ideias, o que revela o caráter intimidatório dessas propostas – querem impor um clima de apreensão sobre o jornalismo profissional –, bem como a tentativa de criar uma falsa contraposição entre interesse público e imprensa.
É impressionante como o PT, mesmo depois de todos esses anos, se recusa a ver o mal que causa ao País e à democracia o seu discurso de encabrestar os meios de comunicação. Em boa medida, o partido de Lula forneceu as condições para que Jair Bolsonaro transformasse, sob aplausos de seus apoiadores, a imprensa num inimigo a ser combatido.
Coerente com seu histórico incivilizado, Jair Bolsonaro, por sua vez, inaugurou novos patamares de ataque e de intimidação dos profissionais da imprensa, especialmente de jornalistas mulheres. O bolsonarismo é de uma covardia deprimente. Mas toda essa dinâmica de enfrentamento dos meios de comunicação tão própria do governo atual teve o seu caminho aplainado pelo discurso e pela prática petista de desmerecer os questionamentos incômodos da imprensa independente.
Em vez de assumir a responsabilidade dos atos de Dilma Rousseff – que motivaram depois o seu impeachment –, o PT preferiu criticar a “imprensa golpista”. Agora, Jair Bolsonaro usa a mesma tática, revestida – esta é a novidade – de sua grosseria habitual. Quando é questionado sobre depósitos bancários suspeitos na conta de sua mulher, Michelle, o presidente da República interrompe a entrevista. Quando é indagado sobre a compra de 51 imóveis usando dinheiro vivo, fala da vida pessoal da entrevistadora e diz que está sendo indevidamente acusado. Ninguém o acusa de nada: apenas questiona a existência de tantos indícios de lavagem de dinheiro.
Em 2023, é preciso restaurar o fiel respeito à Lei de Acesso à Informação, a legitimidade das perguntas incômodas e a transparência dos atos estatais. Hostilidade à imprensa é coisa de regime autoritário, e não de democracia.
Folha de S. Paulo
Emendas em jogo
STF deve se conter ao rever prerrogativa de Executivo e Legislativo no Orçamento
Em dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal impôs um necessário limite ao esquema articulado entre Jair Bolsonaro (PL) e as siglas do centrão para garantir apoio ao governo no Congresso.
Ao suspender temporariamente a execução das emendas orçamentárias bilionárias controladas pelo bloco partidário, a corte exigiu maior transparência na aplicação do dinheiro e incentivou os parlamentares a rever as regras do opaco mecanismo então instituído.
Para convencer o STF a desbloquear as verbas, o Legislativo passou a divulgar informações mais detalhadas sobre as chamadas emendas de relator e estabeleceu certas normas, incluindo um teto para os recursos destinados anualmente ao instrumento.
A ação do tribunal contribuiu assim para expor patrocinadores e beneficiários das verbas à luz do sol, criando condições para que a imprensa e os órgãos de controle investigassem favorecimentos, desvios e desperdícios.
Ficou pendente, porém, o julgamento do mérito das ações que questionam a legalidade dessas emendas, que dispõem neste ano de R$ 16,5 bilhões para obras e outras benesses em redutos eleitorais de deputados e senadores.
Os partidos de oposição que levaram o problema ao tribunal argumentam que a ausência de critérios equitativos na distribuição do dinheiro ofende a Constituição, que requer a impessoalidade como regra na administração pública.
Não se discute a legitimidade dos congressistas para influir no processo orçamentário, tampouco os danos causados pela pulverização do dinheiro. O que está na balança é o equilíbrio entre as prerrogativas do Executivo e do Legislativo, uma seara em que o STF deveria se mover com extremo cuidado.
O acerto com o centrão garantiu a Bolsonaro proteção contra o risco de impeachment e, em contrapartida, concedeu ao Congresso excessiva autonomia no manejo de uma fatia crescente do Orçamento, equivalente a mais de um quarto das despesas não obrigatórias.
É do interesse do Executivo, seja quem for o próximo presidente, recuperar o controle sobre esses recursos, dos quais necessitará não só para executar políticas, mas também para cimentar sua base de sustentação no Parlamento.
Nada impede que um governante habilidoso reveja os termos desse arranjo com a formação de uma nova coalizão partidária, aproveitando a composição de forças a ser produzida pelas urnas.
Apoiadores de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o líder da corrida presidencial, torcem para que o STF antecipe o julgamento e facilite as coisas para o próximo governo, podando as prerrogativas recém-adquiridas pelo Legislativo. Melhor seria se o tribunal esperasse o jogo começar antes de apitar.
Valor Econômico
STF combate farra das armas, mas método ainda é prova
Arsenal em poder dos chamados CACs cresceu de 350 mil armas para mais de 1 milhão nos últimos anos
Em mais uma demonstração de que o sistema de pesos e contrapesos está em pleno funcionamento na República Federativa do Brasil, o Supremo Tribunal Federal entrou em ação novamente na semana passada. Desta vez, para dar um freio a decretos do presidente Jair Bolsonaro que flexibilizavam a compra e o porte de armas e munições.
Quanto ao mérito, venceu, com folga, o bom senso. Será preciso verificar à frente, contudo, se o método utilizado para destravar o julgamento do caso não terá desdobramentos negativos para o funcionamento da Corte. Isso porque no dia 5 de setembro o relator, ministro Edson Fachin, concedeu liminar para suspender a norma, citando o risco de violência política nas eleições e a demora do ministro Nunes Marques em devolver o processo à pauta.
Nunes Marques havia pedido vista, ou seja, solicitado mais tempo para analisar o assunto. Algo legítimo, mas que muitas vezes é utilizado com o objetivo de impedir a conclusão de um julgamento. Diante do impasse (ou da demora), Fachin concedeu a liminar e levou sua decisão para o plenário virtual. Ela foi referendada pela maioria: apenas dois ministros divergiram do relator, justamente os magistrados indicados pelo chefe do Poder Executivo, o próprio Nunes Marques e André Mendonça.
A preocupação dos outros nove magistrados tem fundamento. Pela estimativa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o arsenal em poder dos chamados CACs – caçadores, atiradores e colecionadores – cresceu de 350 mil armas para mais de 1 milhão nos últimos anos. Esse dado reflete o maior acesso que o grupo, majoritariamente formado por bolsonaristas, passou a ter a equipamentos e munições, inclusive de calibres mais letais.
Segundo publicou o Valor em recente reportagem, um número sem precedentes de armas de fogo chegou ao Brasil nos últimos dois meses. Foram 40.303 revólveres e pistolas em julho e 39.389 em agosto. Em 25 anos, segundo as estatísticas disponibilizadas pelo Ministério da Economia, nunca tantas armas de fogo foram trazidas ao país por mês. Em outras palavras, o equivalente a mais de 1.200 armas de fabricantes estrangeiros entrou por dia no Brasil ao longo desses meses.
Para especialistas, esse movimento teria relação com a possibilidade de um endurecimento das regras em caso de mudança de governo a partir de 2023. Afinal, algo parecido ocorreu nos Estados Unidos, quando americanos adeptos de armas ampliaram seus arsenais diante da perspectiva de vitória do Partido Democrata nos pleitos de 2008 e 2020, antes das eleições de Barack Obama e Joe Biden, respectivamente.
Sendo certeira ou não essa comparação feita pelos especialistas, o fato é que o aumento da circulação das armas de fogo no país trouxe variados problemas para a área de segurança pública. O jornal “O Globo”, por exemplo, revelou que investigações das polícias de quatro Estados apontaram a atuação de pessoas registradas como CACs no fornecimento de armas e munição para o crime organizado. A clientela seria formada por quadrilhas especializadas em roubos de grandes quantias por meio de ataques a agências bancárias e transportadoras de valores.
Para o ministro-relator, contudo, o cenário eleitoral havia tornado ainda mais urgente a tomada de uma medida cautelar. “Deve-se indagar se a facilitação à circulação de armas na sociedade aumenta ou diminui a expectativa de violência provada. Penso que se deve concluir pelo aumento do risco e consequente violação do dever de proteção pelo Estado”, anotou Fachin em seu voto.
Esse cenário é ainda mais grave diante da constatação de que os chamados CACs têm utilizado o chamado “porte de trânsito” para circular pelas ruas do país, alegando que estão se dirigindo para clubes de tiro com o objetivo de treinar ou praticar esporte. De uns tempos para cá, foram criados estabelecimentos desse tipo de alcance nacional ou com funcionamento 24 horas por dia, uma artimanha para justificar a circulação de armas e munição em qualquer horário e local.
Ganha importância também, portanto, a possibilidade de o Judiciário analisar o funcionamento dos clubes de tiro no dia da eleição. A ideia foi apresentada ao presidente Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por chefes das Polícias Civis.
Correio Braziliense
Apreensão chega a nossas mesas
Embora de uso liberado em certos alimentos, o propilenoglicol não poderia ser empregado na fabricação de massas alimentícias
O alerta quanto ao uso do aditivo propilenoglicol contaminado pelo altamente tóxico monoetilenoglicol, inicialmente deflagrado para produtos de nutrição animal, chegou à indústria alimentícia humana e, dela, a restaurantes do país. Depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou o recolhimento de massas da empresa paulista Keishi, fabricadas entre 25 de julho e 24 de agosto deste ano, por uso do composto proveniente do mesmo lote empregado em petiscos que intoxicaram e mataram cães, a fabricante informou que o estoque em questão já havia sido comercializado. O destino: casas de culinária oriental de São Paulo. Uma informação que expande o já grave temor de envenenamento de pets para a mesa da população.
Em que pese o alerta da Anvisa e a declaração da indústria de que rastreia os produtos, sustentando que “não houve nenhum relato de danos à saúde do consumidor”, a apreensão é real, e justificada. Até porque a agência estendeu o alerta e investigações a todas as indústrias de alimentação humana que usam o propilenoglicol em suas linhas, depois que mais de 100 cães apresentaram sintomas de intoxicação por monoetilenoglicol após consumirem petiscos da empresa Bassar Pet Food fabricados com o aditivo.
Segundo a Anvisa, o uso do propilenoglicol como aditivo alimentar é autorizado para alguns produtos da indústria alimentícia. O composto com pureza adequada — o chamado grau USP — também pode ser empregado na indústria farmacêutica. Já o monoetilenoglicol “é um solvente orgânico altamente tóxico, que causa insuficiência renal e hepática quando ingerido, podendo inclusive levar à morte”, informa a agência. Não há autorização para o uso dessa última substância em alimentos.
Investigação apontou que o aditivo permitido contaminado pelo solvente tóxico foi vendido pela empresa Tecno Clean Industrial Ltda. localizada na Grande Belo Horizonte. A companhia, por sua vez, informou não fabricar o produto, que indicou ter comprado da A & D Química, com sede em Arujá-SP, que também se declara revendedora.
Estabelecer a origem da contaminação e responsabilidade por seus efeitos é tarefa que mobiliza autoridades sanitárias, do Ministério da Agricultura e policiais. Rastrear o destino dos produtos com suspeita de alteração envolve também as indústrias que usam o aditivo. Determinar responsabilidades por reparações fatalmente caberá à Justiça.
Enquanto isso, resta ao consumidor a apreensão. O nome da fabricante de massas que usou o aditivo contaminado em sua linha só veio a público mais de 20 dias após as primeiras informações sobre intoxicação de cães, quando estoques sob suspeita já haviam se esgotado. Não se sabe até o momento se há uma lista de outras fabricantes de produtos humanos que possam ter adquirido o aditivo de lotes contaminados, tampouco se a contaminação se restringiu aos lotes já identificados.
Uma informação divulgada pela Anvisa contribui para aumentar a preocupação: embora de uso liberado em certos alimentos, o propilenoglicol não poderia ser empregado na fabricação de massas alimentícias. Não deveria, portanto, estar entre os ingredientes da linha de produção da Keishi.
Todo esse conjunto de constatações transmite a incômoda sensação de que o consumidor não tem ideia exata do que entra na fabricação daquilo de que se alimenta. Pior: lança dúvidas sobre a fiscalização aplicada à indústria alimentícia e levanta desconfiança de que esta promove um controle de qualidade frágil sobre suas matérias-primas.
A suspeita de contaminação de alimentos com propilenoglicol “aditivado” com o solvente mortal ainda tem muito mais perguntas que respostas, e a rapidez com que os esclarecimentos surgem não parece acompanhar a ansiedade de quem também teme se intoxicar. Por triste coincidência, o monoetilenoglicol foi um dos compostos letais identificados na intoxicação de vítimas de cervejas no caso Backer, que remonta aos primeiros dias de 2020. Pelo menos 10 pessoas morreram, no mínimo 16 foram hospitalizadas e várias seguem enfrentando sequelas, enquanto o debate sobre culpados, reparação e responsabilidades ainda se arrasta na Justiça. Frente a novo temor envolvendo o veneno, não é uma lembrança confortável.