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Cidade inteligente: Prefeitura de Vitória (ES) adota Escritório Remoto

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A partir desta semana, alguns servidores da prefeitura de Vitória (ES) vão poder desenvolver suas atividades de casa. Trata-se do Escritório Remoto, que começa a ser implantado nesta semana. O primeiro setor contemplado é a Subsecretaria de Comunicação.

O servidor que puder executar seu trabalho remotamente pode fazer a solicitação formal junto à Subsecretaria de Gestão de Pessoas para passar por avaliação do secretário da pasta e de um comitê. O projeto vai ao encontro do conceito de cidade inteligente.

O prefeito de Vitória, Luciano Rezende (Cidadania), ponderou que esse é mais um instrumento para diminuir o custeio da prefeitura de Vitória, melhorar a eficiência do servidor e dar melhores resultados, beneficiando, inclusive, a mobilidade urbana.

“Uma das coisas que a tecnologia propiciou é que muitas das profissões e atividades podem ser feitas de casa, utilizando internet, sem nenhum prejuízo para o exercício da função, com a grande vantagem para o servidor e para a mobilidade. Para o servidor, porque ele não precisa se movimentar de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Para a mobilidade, porque nós vamos ter menos pessoas fazendo esse circuito e melhorando o trânsito. Quando isso for colocado em grande escala, terá um impacto considerável”, disse o prefeito.

De acordo com o secretário de Gestão, Planejamento e Comunicação, Mateus Mussa, os servidores contemplados pelo Escritório Remoto poderão trabalhar de casa sem nenhum tipo de perda.

“O Escritório Remoto será realizado em atividades em que se possa mensurar de forma clara o desempenho do servidor e os resultados esperados. Em vários casos, isso é possível e vai promover uma economia de tempo com o deslocamento e aumentar a produtividade”.

Regras

– Não podem aderir ao Escritório Remoto servidores que:
– sejam contratados em regime de designação temporária;
– sendo efetivos que estejam em estágio probatório;
– ocupem cargo de direção ou chefia;
– tenham equipe de trabalho sob sua responsabilidade e coordenação;
– desempenhem atividades em que sua presença física seja necessária;
– tenham sofrido penalidade disciplinar nos dois anos anteriores à indicação.

Prazo

O prazo para o exercício funcional no sistema de Escritório Remoto será de um ano, podendo ser prorrogado ou revogado, por interesse da administração municipal.

Rotatividade

Nas unidades organizacionais que exigirem um mínimo de presença física de servidores para seu pleno funcionamento, deverá ser implementado sistema de rotatividade anual entre os servidores interessados/participantes.

Metas

A chefia imediata do servidor estabelecerá as metas e os prazos a serem alcançados, de acordo com o Planejamento Estratégico do Município.

Plano de Trabalho

O Plano de Trabalho para o servidor que aderir ao sistema deverá conter:

– a descrição das atividades a serem desempenhadas pelo servidor;
– as metas quantitativas e qualitativas a serem alcançadas com os devidos prazos;
– a periodicidade em que o servidor enquadrado no sistema de trabalho de Escritório Remoto deverá comparecer ao local de trabalho para exercício regular de suas atividades;
– o cronograma de reuniões com a chefia imediata para avaliação das metas de desempenho, bem como eventual revisão e ajustes dessas metas;
– o prazo em que o servidor estará sujeito ao sistema de trabalho de Escritório Remoto, permitida a prorrogação.

Deveres do servidor

O servidor que estiver no sistema de Escritório Remoto deve:

– providenciar a estrutura física e tecnológica necessária à realização de suas atividades;
– prover o transporte e a guarda dos documentos e materiais necessários ao desenvolvimento dos trabalhos;
– cumprir as metas de desempenho estabelecidas;
– atender às convocações para comparecimento às dependências do órgão ou entidade, desde que seja respeitada a antecedência mínima de um dia útil;
– manter telefones de contato permanentemente atualizados e ativos.

Carmen Zanotto quer CPI para apurar abusos do sistema financeiro contra idosos

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A deputada federal Carmen Zanotto (Cidadania-SC) propôs, em reunião nesta quarta-feira (27), na  Comissão de Direitos da Pessoa Idosa da Câmara, a criação de Comissão Parlamentar de Investigação (CPI) para apurar as denúncias de violência financeira exercida pelo sistema bancário contra os aposentados.

“Esta Casa precisa abrir essa caixa-preta do empréstimo consignado. Há um esquema que repassa informações privilegiadas ao sistema financeiro. Eles obtêm as informações antes mesmo de a pessoa se aposentar. As  ligações telefônicas dos agentes bancários começam antes mesmo de o cidadão saber que vai se aposentar”, relatou a vice-presidente da Comissão.

De acordo com Carmen, as denúncias que foram levadas à Comissão revelaram que os idosos, por questão financeira, também são alvos de abusos físicos e  psicológicos de parte da família.

“A extorsão começa com a ajuda na alimentação da família, da escola, depois vem a prestação da moto do neto e por aí. Resultado, eles só ficam com a cota-parte. E olhe lá”, afirmou a parlamentar de Santa Catarina.

Cláudio de Oliveira: Três liberais e o regime de 1964

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Tancredo Neves, Ulysses Guimarães e Carlos Lacerda foram três importantes personalidades do pensamento liberal-democrático no Brasil.

1 – Tancredo Neves

O humorista Millôr Fernandes definia Tancredo Neves como de extremo-centro. De fato, Tancredo era um centrista moderado e conciliador. Porém, de posições definidas.

Foi ele quem bateu na mesa, levantou a voz e confrontou os militares na reunião ministerial de 23 de agosto de 1954, quando os representantes das três armas exigiram a renúncia do presidente Getúlio Vargas, eleito em 1950.

Tancredo era ministro da Justiça e bateu de frente contra a proposta golpista. Depois da reunião, na madrugada do dia 24, Getúlio se suicidou.

Tancredo foi dos primeiros a protestar contra o golpe de 1964, quando, no dia 2 de abril, o senador Auro Moura, da UDN, e presidente do Congresso, declarou vaga a Presidência da República, mesmo o presidente João Goulart estando no Brasil.

Então deputado, Tancredo teve seu microfone desligado e as luzes da Câmara foram apagadas.

O político mineiro foi um dos líderes do antigo MDB, o partido-frente que reuniu comunistas, socialistas, socialdemocratas, trabalhistas e liberais com o objetivo de restabelecer o Estado de Direito democrático.

Em 1985, foi o candidato das oposições contra Paulo Maluf, o representante da ditadura. Com a vitória de Tancredo, o Brasil iniciou uma transição que culminou com a promulgação da atual Constituição, em outubro de 1988.

2 – Ulysses Guimarães

Ulysses Guimarães também era deputado do centrista PSD como Tancredo, mas cometeu o erro de votar, em 11 de abril, no marechal Castelo Branco para presidente da República.

Com o AI-1, de 9 de abril de 1964, o regime cassou 41 deputados federais, suspendeu os direitos de 102 pessoas e expulsou das forças armadas 122 oficiais. Líderes estudantis e sindicais foram presos.

Com o AI-2, de 1965, o regime extinguiu os partidos e suspendeu a eleição presidencial marcada para aquele ano.

Ulysses Guimarães foi um dos fundadores do MDB, em 1966, e liderou a oposição ao autoritarismo. Percorreu o Brasil, em 1974, como o anti-candidato a Presidente. Na Bahia, enfrentou os cães e soldados da Polícia Militar.

Ficou conhecido como o sr. Diretas, por sua participação na campanha das Diretas Já e teve papel decisivo como presidente da Constituinte para que tivéssemos a Carta mais democrática de nossa história.

3 – Carlos Lacerda

Carlos Lacerda, então governador da Guanabara (hoje Rio de Janeiro), foi um dos líderes civis do golpe de 1964.

Principal expoente da UDN, de liberais de centro-direita, foi um radical opositor de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart.

Porém, não foi subserviente aos generais que se instalaram no poder. Ao perceber os Claudio de Oliveira: Três liberais e o regime de 1964intentos continuístas dos militares, Carlos Lacerda rompeu com Castelo Branco, procurou JK e João Goulart para lançarem juntos a Frente Ampla, afinal proibida pelo regime.

Assim como JK, Carlos Lacerda foi cassado pelo AI-5. E assim como João Goulart, também morreu de problemas cardíacos, em 1971.

As trajetórias dessas três personalidades trazem uma importante lição: democratas de diferentes orientações (liberais, socialdemocratas, socialistas) não devem fazer concessões ou tergiversar quando o que está em jogo é a liberdade de todos e de cada um.

Comemoremos a democracia, conquista civilizatória da Humanidade.

Claudio de Oliveira é jornalista, cartunista e autor de livros e e-books

Cristiano Romero: Forças ocultas?

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A forma como o presidente Jair Bolsonaro está lidando com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deve ser parte de uma estratégia ainda não compreendida pelos melhores observadores da cena política em Brasília. Ou não, o que torna tudo ainda mais nebuloso e preocupante, uma vez que Maia não integra as fileiras da oposição ao governo, muito pelo contrário. Número 2 da República, o presidente da Câmara se comprometeu com a articulação para a aprovação das mudanças nas regras de aposentadoria – a reforma das reformas – e de projetos relevantes, como o que dá autonomia legal ao Banco Central.

Convidado para um encontro com Maia e Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro decidiu desmoralizar o anfitrião (o presidente da Câmara) ao levar 20 ministros, anulando assim o caráter “petit comité” da reunião. Nas redes sociais, Bolsonaro deu a ideia de que Maia o convidou para oferecer apoio em troca de cargos. Foi um golpe de marketing de resultado pífio e perigoso.

A carreira política de Maia tomou impulso quando ele se elegeu presidente da Câmara no período 2017-2018, um momento extremamente delicado da vida nacional. Dilma Rousseff foi afastada em maio de 2016 – e impedida, em caráter definitivo, de ficar no cargo em agosto daquele ano – em meio a uma das mais graves crises econômicas da história do país, ruína da qual a nação ainda não se recuperou. Impeachment de presidentes eleitos é sempre um processo traumático numa democracia.

No presidencialismo de coalizão, modelo político que grassa no Brasil na ausência de partidos fortes, presidentes da República dependem sobremaneira, para governar, dos presidentes da Câmara e do Senado Federal, especialmente do primeiro. A deposição de Dilma mostrou isso com clareza. A então presidente tentou, em vão, impedir a ascensão ao comando da Câmara do deputado Eduardo Cunha, e este lhe deu o troco – usou uma das prerrogativas do cargo, a decisão monocrática de tirar da gaveta e colocar em tramitação um dos pedidos de impeachment contra a então chefe do Poder Executivo, para derrubá-la.

É verdade que Cunha tentou negociar durante meses um armistício com Dilma, mas a ex-presidente julgava-se, como Bolsonaro, acima dos políticos que, inclusive, integravam sua base de apoio no Congresso e cujos apadrinhados ocupavam milhares de cargos, muitos sem nenhuma qualificação, no enorme aparato estatal nacional. Eleita, Dilma, passou a ter desprezo até pelo responsável por sua chegada triunfal ao poder – Luiz Inácio Lula da Silva -, sem nunca ter sido eleita antes para coisa alguma.

“House of Cards Brazil”: quando se tornou público o escandaloso caso da compra superfaturada, pela Petrobras, da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, Lula teria mandado um emissário – o ex-ministro Antonio Palocci, coordenador da primeira campanha de Dilma, em 2010 – informar à presidente que Pasadena ajudou a elegê-la. A reação da mandatária teria sido um festival de palavrões dirigidos ao interlocutor e ao remetente do aviso. Lula decidiu mandar o recado depois de ver Dilma, como presidente do conselho de administração da Petrobras, confessar, em entrevista, que assinara um parecer tecnicamente “falho” em defesa da compra da refinaria em 2006, em pleno governo Lula. Amigos do ex-presidente têm convicção de que Dilma procurou jogar o caso no colo de Lula para conter seu assanhamento para ser o candidato do PT à Presidência em 2014.

Bolsonaro quis mostrar a seus milhões de seguidores nas redes sociais, e com os quais ele acha que governa este imenso país, que repele a “velha política” e que Maia é um exemplo acabado da velhacaria. Duas hipóteses derivam da ação de Bolsonaro:

1) Ao tentar desmoralizar publicamente o presidente da Câmara, ele tenta enfraquecê-lo porque sua desenvoltura em Brasília, segundo assessores, o incomoda desde sempre. Fraco, Maia perderia poder sobre seus pares e, assim, os governistas dominariam a Câmara com o “apoio” das redes sociais, o que facilitaria ao presidente e seus aliados impor sua principal agenda – mudar na marra, com a força das leis, os costumes de uma sociedade marcada pela diversidade e que, desde a redemocratização, vem avançando de forma significativa no quesito tolerância;

2) Qual Policarpo Quaresma, o anti-herói quixotesco de Lima Barreto, Bolsonaro estaria dizendo ao povo que em Brasília só há políticos corruptos que não o deixam governar com decência, idealismo e em favor dele, o povo. Seria, claro, um simulacro, uma vez que Bolsonaro, eleito presidente do Brasil quando ninguém esperava por isso, não compartilha a ingenuidade de Quaresma. A intenção, portanto, seria atirar em Rodrigo Maia para atingir toda a classe política e, desta forma e com o “incrível” apoio das massas, pedir licença para ter poderes excepcionais nesta quadra da vida nacional, momento que, dada a gravidade da crise econômica, demanda líderes fortes, destemidos, obstinados, denodados e, por que não, autoritários.

Ontem, dia em que as tensões na Praça dos Três Poderes se intensificaram, o presidente “matou a reforma e foi ao cinema”. O chiste de mau gosto, que se disseminou nas redes qual epidemia, foi inevitável. No clássico “Matou a Família e Foi ao Cinema”, de 1969, o cineasta Júlio Bressane mostra um rapaz que mata os pais com uma navalha e, impassível, vai ao cinema. Bolsonaro se mostra solene e imune a paixões em sua marcha contra Maia.

No retrovisor, vemos o seguinte: em 1961, Jânio Quadros comanda governo dividido por forças da esquerda e da direita e, sete meses depois da posse, renuncia, alegando “forças ocultas” e achando que o povo iria às ruas para lhe dar o poder supremo. Ninguém deu o ar da graça porque o presidente se esqueceu de combinar o ardil com os “russos”. Collor assumiu em 1990 sem a companhia dos partidos tradicionais. Confiscou, no primeiro ato, o dinheiro dos viventes sem o apoio de PMDB, do PFL etc. Deu tudo errado e um ano depois caiu nos braços da tradição – o PSDB só não aderiu porque Mário Covas não deixou -, o que não o impediu de ser apeado do cargo em setembro de 1992. (Valor Econômico – 27/03/2019)

Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras – E-mail: cristiano.romero@valor.com.br

Monica De Bolle: Presidentes minoritários e reformas

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Presidentes minoritários têm sido há décadas a regra na América Latina, não a exceção. A exceção atual é o México de Andrés Manuel López Obrador e trata-se da única. Nos sistemas multipartidários e fragmentados que temos região afora, a prática para construir coalizões e consensos, sobretudo quando se pretende aprovar reformas de grande envergadura, é a de engajar- se naquilo que, no Brasil, nos acostumamos a chamar de toma lá dá cá. Em outros países, há outros nomes: na Colômbia, por exemplo, dá-se a isso a denominação de “mermelada”.

Mesmo nos Estados Unidos, onde o sistema é nominalmente bipartidário – digo nominalmente pois, hoje, tanto republicanos quanto democratas estão internamente rachados – existe o “pork barrel politics”. Toma lá dá cá, “mermelada”, e “pork barrel politics” significam todos mais ou menos a mesma coisa: o presidente oferece cargos a partidos “aliados” a fim de garantir a adesão à agenda que quer aprovar, e/ou disponibiliza recursos públicos para emendas parlamentares que favorecem políticos e sua base ou distrito – no caso em que o voto é distrital como nos EUA.

Tais práticas dão margem a vários problemas. Quando cargos são alocados tendo como princípio a garantia de lealdade, ainda que temporária, as chances de que ministérios e agências governamentais sejam entregues a gente que não tem formação ou capacidade para exercer o cargo são elevadíssimas. Exemplos disso temos de sobra na história recente brasileira. Quando gastam- se recursos públicos para comprar a fidelidade dos parlamentares desperdiça- se muito dinheiro que poderia ser melhor alocado em outras áreas – de programas sociais a investimentos públicos. A onda recente que varreu o mundo contra o modo “tradicional” de fazer política levou alguns líderes recém-eleitos na América Latina a se comprometer em acabar com a “mermelada”, ou com o que alguns chamam no Brasil de “velha política”.

A ideia é auspiciosa e causa arroubos de esperança. Pena que na prática a tese não fique de pé por mais de par de meses, quiçá menos. Iván Duque, o presidente colombiano eleito em meados de 2018, prometeu acabar com a “mermelada”. Nomeou técnicos para os seus principais ministérios sem qualquer consideração sobre os partidos aos quais pertenciam ou não – muitos não são filiados à agremiação alguma. Deixou cientistas políticos de cabelo em pé, mas agradou a população que nele votou. Dentre suas principais promessas de campanha estava a necessária reforma tributária para elevar a arrecadação.

A Colômbia precisa urgentemente gerar recursos não só para atender as demandas regionais de territórios onde as Farc foram desmobilizadas pelo Acordo de Paz – e que, hoje, sofrem com a ausência de serviços públicos – como também para enfrentar a crise migratória da Venezuela. A Colômbia já recebeu cerca de 1,5 milhão de refugiados do país vizinho – esses em situação regularizada – e provavelmente outro milhão ou mais de pessoas em situação irregular, portanto não registradas. O problema tende a piorar com as incertezas que cercam o regime de Maduro, pressionando as contas públicas colombianas.

Mas, mesmo em meio a tudo isso, Duque fracassou na tentativa de aprovar sua reforma tributária. Em vez da reforma ampla, ganhou migalhas do Congresso insatisfeito com o término da “mermelada”. Não surpreende que a popularidade de Duque, considerado um presidente frágil no país, tenha começado a cair. No Brasil Bolsonaro afirma que a “velha política” acabou, que não irá ceder às pressões do Congresso para aprovar a reforma da Previdência na qual ele já disse não acreditar muito. Bolsonaro é presidente mais fraco que Duque, já que seu partido não tem tradição ou força, ao contrário do par colombiano.

Bolsonaro cria ruído e está cercado de gente que gosta de fazer o mesmo, como comprar brigas inúteis com o presidente da Câmara. Seu par colombiano sabe que sem “mermelada” a pior estratégia é brigar sem motivo com o Congresso. Duvido que Bolsonaro aprenda algo com seu par latino americano, ou com qualquer outra pessoa – o presidente não é afeito a muitas reflexões. Disso tudo o que fica é que o papo de “velha política” é conversa mole, o Congresso é o mesmo que sempre tivemos, voraz por benesses. Há momentos em que o realismo tem de prevalecer sobre o realismo tragi-mágico que nos impusemos. Não estou prendendo a respiração. (O Estado de S. Paulo – 27/03/2019)

MONICA DE BOLLE, ECONOMISTA, PESQUISADORA DO PETERSON INSTITUTE FOR INTERNATIONAL ECONOMICS E PROFESSORA DA SAIS/JOHNS HOPKINS UNIVERSITY

Luiz Carlos Azedo: Ivan, o Terrível, e o Mestre de Avis

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NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

Por mais que suas diatribes possam parecer fora de qualquer sentido, a metralhadora giratória de Olavo de Carvalho não pode ser ignorada, porque exerce real influência no governo e no discurso do presidente Bolsonaro.

Nem todos no Palácio do Planalto levam a sério o filósofo Olavo de Carvalho, como é o caso do ministro Santos Cruz, general de quatro estrelas que vem sendo ofendido diariamente pelo guru do clã Bolsonaro, mas o fato é que a sua narrativa já não pode ser ignorada, quando nada pela influência que exerce junto ao próprio presidente da República. Olavo de Carvalho foi uma das estrelas do jantar que Bolsonaro ofereceu na embaixada do Brasil em Washington, quando de sua recente visita aos Estados Unidos, para o encontro com o presidente Donald Trump na Casa Branca.

Por mais que suas diatribes possam parecer fora de qualquer sentido, a metralhadora giratória de Olavo de Carvalho não pode ser ignorada, porque exerce real influência no governo e no discurso do presidente Bolsonaro. Na segunda-feira, um post do filósofo no Facebook chamou a atenção pelo significado de suas referências históricas, num momento de grande ativismo de seus partidários nas redes sociais, comandado pelo vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente da República, com a difusão de “memes” contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Disse o filósofo: “O mecanismo político mais eficiente e quase infalível já registrado na História — por exemplo, na origem do reino português ou no triunfo de Ivan, o Terrível — é a aliança do governante com a massa popular para esmagar os poderes intermediários corruptos e aproveitadores. Deus queira que o Bolsonaro entenda ser essa a sua grande oportunidade”. A afirmação de Olavo de Carvalho coincide com a recomendação do presidente da República para que os comandantes militares organizassem as “devidas comemorações” do golpe militar de 1964, em 31 de março próximo, fato que gerou muita polêmica no Congresso. É com um grave desencontro entre o Palácio do Planalto e as principais lideranças da Câmara.

Poder absoluto

A referência a Portugal diz respeito à Revolução do Mestre de Avis, a primeira revolução burguesa do Ocidente, em 1383, na qual se resolveu a crise provocada pela morte de Dom Fernando I, rei de Portugal. A herdeira do trono, a princesa Beatriz, era casada com Dom Juan I de Castela, que reivindicou o trono para o casal, com o apoio da nobreza. A burguesia, a pequena nobreza e o povo não queriam a união com o reino de Castela e decidiram apoiar o irmão bastardo de Dom Fernando I, João, conhecido como o “Mestre de Avis”, que derrotou os castelhanos na Batalha de Aljubarrota. Além de garantir a independência, Dom João, o Mestre de Avis, centralizou o poder, fez uma reforma agrária, implantou uma indústria náutica e iniciou a expansão comercial portuguesa. Foi um dos primeiros regimes absolutistas da Europa, em plena Idade Média.

Ivan, o Terrível, sagrado Ivan IV em 1547, na Catedral da Assunção em Moscou, foi o primeiro czar. Filho de Vassili III e de Helena Glinska, nasceu em 25 de agosto de 1530. Com a morte do pai, sua mãe foi tutelada por uma regência de 20 boiardos, senhores feudais russos, aquém dividiram o poder entre si após envenená-la. Logo após assumir o trono, em 1547, incêndios devastaram Moscou e provocaram milhares de mortos. Ivan se disse abandonado por Deus e decidiu convocar representantes de todas as regiões da Rússia para uma assembleia que só se realizou em 1950, mas mudou a história da Rússia.

Ivan afastou os boiardos, decretou um código civil, reorganizou o clero e criou um Estado centralizado, com uma polícia secreta que perseguiu duramente os seus opositores. Conquistou o Volga e estendeu seu império à Suécia e à Polônia; à frente de um exército de 100 mil homens, ocupou Kazan, a capital dos tártaros. Para celebrar essa vitória, construiu em Moscou a catedral de São Basílio. Em 1558, tentou assegurar uma saída ao Mar Báltico, mas acabou derrotado pela coalizão formada por Polônia, Suécia, Lituânia e os Cavaleiros Teutônicos da Livônia, em 1578. Depois de 25 anos de guerras, com a Rússia assolada por uma epidemia de peste, em 1581, matou seu filho mais velho, Ivan Ivanovich, num acesso de cólera, provavelmente provocado pelo mercúrio usado no tratamento de uma sífilis. Morreu jogando xadrez, em 18 de março de 1584, misteriosamente. (Correio Braziliense – 27/03/2019)

Orçamento Impositivo: Câmara aprova PEC que reduz poder do governo

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Câmara aprova em 2 turnos PEC que reduz poder do governo no Orçamento

Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro – Valor Econômico

BRASÍLIA – Num troco contra o presidente Jair Bolsonaro, a Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira, por 448 a 3, proposta de emenda à Constituição (PEC) para tornar impositivo todo o Orçamento de investimentos e emendas parlamentares de bancadas estaduais. A proposta foi aprovada em dois turnos em menos de uma hora e segue agora para o Senado Federal.

O projeto deixa o governo com condições de cortar e remanejar sem justificativas apenas 3% de um Orçamento total de R$ 1,4 trilhão e ainda aumentará em quase R$ 4 bilhões o gasto obrigatório com as emendas parlamentares. A versão final do texto, contudo, causou polêmica entre assessores técnicos e apenas a parte das emendas de bancada está garantida.

A versão da PEC aprovada por uma comissão especial em 2015 dizia que era “obrigatória a execução de políticas públicas e metas definidas como prioritárias” pelo Plano Plurianual (PPA) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) — o que abrange quase 100% dos investimentos. O pagamento só não será exigido por impedimento técnico (falta de uma licença ambiental, por exemplo) ou “limitações fiscais” (falta de dinheiro).

No lugar, ficou um parágrafo mais genérico, que diz que “o dever de execução das programações orçamentárias tem como propósito garantir a efetiva entrega de bens e serviços à sociedade, devendo a administração adotar os meios e medidas necessários à implementação do programa de trabalho”. No entendimento de técnicos orçamentários da Câmara, isso tornará todas as ações de serviços para a população obrigatórias.

A supressão do primeiro parágrafo ocorreu por destaque combinado com o relator, com o argumento de que restringia a execução obrigatória apenas ao que era definido pelo PPA e LDO. Líder do PP, o deputado Arthur Lira (PP-AL) disse que a alteração visava evitar problemas com a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas a interpretação no PSL é que o texto final deixou como impositivo apenas o pagamento das emendas de bancada.

Os deputados ficaram impossibilitados de deixar mais explícita a impositividade de todos os investimentos porque a PEC já foi votada pela comissão especial, onde poderia receber emendas, e cabia ao plenário votar apenas os dispositivos já aprovados pelo colegiado, sem poder criar texto novo.

Líder do bloco da maioria (que representa os maiores partidos) na Câmara, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) afirmou ao Valor que o dispositivo na Constituição é genérico e que o Congresso determinará, na LDO e na Lei Orçamentária Anual (LOA), as regras para a execução obrigatória dos investimentos.

Discussão política

Com a insatisfação dos parlamentares com o governo, o projeto entrou em debate a pedido do PRB e teve apoio de todos os partidos, até do PSL de Bolsonaro. “É o resgate das nossas prerrogativas”, disse o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA). “A gente define o orçamento e o governo executa.”

O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, se reuniu por duas horas com os líderes partidários à tarde para ouvir as reclamações e negociar a melhora da relação com o Congresso, mas não tocou no assunto. Na saída, disse a jornalistas que o governo “ainda não tinha preocupação” com a PEC. O líder do governo na Câmara, deputado major Vitor Hugo (PSL-GO), sequer participou da reunião com os partidos que decidiu a votação.

No governo anterior, da ex-presidente Dilma Rousseff, a aprovação do Orçamento impositivo para as emendas parlamentares individuais se tornou uma guerra. O governo tentou por meses evitar a aprovação. Essa PEC surgiu logo depois, para tornar obrigatório também o pagamento das emendas feitas pelas bancadas de cada Estado.

A votação da nova PEC é uma resposta às declarações do presidente Jair Bolsonaro, que tem se recusado a negociar com o Congresso, acusado os parlamentares de pedirem cargos em troca de votos e que disse que cada um, Executivo e Legislativo, devem cuidar de suas atribuições.

A reação dos parlamentares foi ampliar a força do Congresso. “Você pode ler para frente: é o começo do Parlamentarismo”, disse o deputado Paulinho da Força (SP), presidente do SD.

O governo, contudo, tentou evitar que a votação soasse como uma derrota e declarou apoiou o projeto – que teve como signatários, na legislatura passada, o então deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) e seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). “Só queria deixar nossa posição favorável a PEC. Realmente, é uma pauta que ele e eu somos favoráveis, vai trazer independência para esse plenário, para os deputados federais”, disse Eduardo, negando que se fosse uma derrota.

A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), disse, porém, que votou contra a PEC porque estava com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que defendeu um debate maior em torno do projeto para saber o impacto para o país.

Se a PEC for aprovada pelo Senado, o governo só poderá remanejar sem justificativas o valor referente ao custeio da máquina pública, como despesas com conta de luz e água, o que torna limitados os cortes possíveis. No Orçamento de 2019, eles representam R$ 45 bilhões de R$ 1,4 trilhão em despesas primárias do governo. Os demais gastos são com salários, aposentadorias, pensões e benefícios obrigatórios, que o Executivo não pode contingenciar.

O governo ainda terá um aumento no gasto com emendas. Hoje, por determinação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o Executivo paga 0,6% da receita corrente líquida (RCL) com emendas de bancadas estaduais. A PEC eleva o valor para 1,0% da RCL, o que elevará o montante de R$ 4,6 bilhões para R$ 8,3 bilhões, em torno de R$ 300 milhões por Estado. Atualmente, o governo já é obrigado a executar 1,2% da RCL com as emendas individuais.

Presidente do Senado arquiva pela 2ª vez a CPI da Lava Toga

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O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) , arquivou pela segunda vez nesta terça-feira (19) o requerimento de criação da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre a cúpula do Poder Judiciário, chamada de Lava Toga. Ele argumentou que parte dos fatos usados para justificar a criação da CPI, de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), estavam fora dos limites da fiscalização do Senado. O requerimento tinha 29 assinaturas, duas a mais do que o mínimo necessário.

Após o anúncio, Davi recorreu da própria decisão para o plenário, que decidirá se mantém ou se reverte o arquivamento. A CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) se manifestará sobre o assunto. Não há prazo para essa deliberação.

A CPI pretendia investigar irregularidades no trabalho de ministros dos tribunais superiores. No requerimento, Alessandro Vieira justificava a iniciativa destacando casos de juízes atuando em processos para os quais deveriam se declarar suspeitos ou impedidos; exercendo atividade comercial simultânea à atuação na magistratura; recebendo dinheiro por palestras para escritórios de advocacia; revertendo liminares em “tempo recorde”; incorrendo em “uso abusivo” de pedidos de vista; e até recebendo propina, entre outras atividades consideradas contestáveis.

Segundo Davi Alcolumbre, alguns dos fatos continham “vícios”, pois se tratavam de atos jurisdicionais: decisões próprias da atividade do Judiciário, que não podem sofrer interferência do Legislativo. A presença desses fatos inadequados inviabiliza o requerimento, segundo o entendimento do presidente, mesmo que outros possam ser considerados razoáveis.

“O recebimento parcial, com aceitação de alguns itens e rejeição de outros, implicaria no fatiamento do requerimento. Nesta hipótese, estaria o presidente substituindo a vontade dos subscritores, que o assinaram em sua integralidade. Não é possível afirmar que as mesmas assinaturas seriam apostas se o requerimento contivesse apenas alguns fatos e não outros”, explicou.

Davi observou que ainda resta a possibilidade de se fazer um novo requerimento, excluindo os fatos viciados. No entanto, ele não disse quantos ou quais são os fatos que podem embasar uma CPI.

A decisão foi embasada em pareceres emitidos pela Consultoria Legislativa e pela Advocacia do Senado.

Questão de ordem

O proponente da CPI, Alessandro Vieira, apresentou uma questão de ordem para que a presidência aponte quais são os fatos incontroversos do requerimento. Ele observou que a decisão de Davi confirma que alguns dos fatos originais são pertinentes para a criação de uma comissão de inquérito, e afirmou que pretende levá-los adiante.

“Gostaria de assinalar essa evolução a quem dizia que não existia fato determinado. O presidente do Senado assinala que temos. Já temos essa clareza. Passa a ser apenas uma questão de tempo. Se temos fato e assinaturas, devemos ter CPI”, afirmou.

O senador também insistiu na manutenção do seu requerimento com as 29 assinaturas. Ele encaminhou um recurso à CCJ para que o documento seja aceito parcialmente, apenas com os fatos que a Presidência indicar como pertinentes.

Pressão

Ao longo do dia, Alessandro denunciou um movimento de “pressão” contra os outros 28 senadores que apoiaram o seu requerimento. Sem citar nomes, ele acusou ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), agentes do Poder Executivo e setores do empresariado de comandarem a investida.

Até o arquivamento, nenhuma assinatura foi retirada. O senador disse que seus colegas “honraram os votos que receberam”.

O senador Major Olímpio (PSL-SP), um dos apoiadores do requerimento e líder do partido do governo na Casa, minimizou o possível papel de membros da gestão na ação contra a CPI.

— Não vou nomear quem possa estar fazendo pressão. Sou responsável pela minha assinatura e prezo por ela. Duas [outras] senadoras do PSL também foram signatárias — disse.

Já o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), se manifestou em Plenário contra a instalação da comissão de inquérito. Ele destacou que o Congresso está incumbido de votar reformas econômicas e não pode arriscar uma outra crise institucional.

“O papel do Senado, como instituição moderadora da República, é o de interpretar bem o momento político que estamos vivendo. Estamos diante de graves desafios. O Brasil quer se reconciliar, abrir espaço para o debate sereno, para a unidade”, acrescentou.

O líder do PT, senador Humberto Costa (PE), também opinou que a CPI “atrapalha mais do que ajuda”. Ele observou que o seu partido teria todas as razões para ser favorável a uma investigação sobre o Judiciário, mas garantiu que o objetivo da legenda “não é vingança”. Ele também lembrou que já existem instâncias de controle externo que podem fazer esse trabalho.

“O que nós precisamos agora não é sermos utilizados como um instrumento de uma disputa de poder entre segmentos do Ministério Público e do Judiciário, mas fazermos com que esse controle externo aumente, com que nós possamos avançar num Judiciário que seja ágil, rápido e imparcial. Essa proposta não ajuda a construir isso”, observou.

Entre os signatários da CPI, apenas o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) disse que, numa segunda oportunidade, não emprestaria seu apoio à investigação. Ele disse entender que “não é o momento”, mas manteve a assinatura no requerimento original. Os demais afirmaram que respeitam a decisão do presidente Davi Alcolumbre e aguardam a deliberação do Plenário.

O senador Carlos Viana (PSD-MG) sugeriu que, mesmo com o arquivamento da CPI por ora, o Senado peça ao STF e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) uma resposta oficial sobre os pontos reunidos no requerimento. Segundo ele, o Judiciário precisa mostrar que está trabalhando para “coibir excessos”. (Com informações da Agência Senado)

Reforma da Previdência: No Valor, Daniel Coelho defende mudanças nas regras

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Partidos exigem mudanças na PEC da reforma

Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro – Valor Econômico

Partidos que representam 282 deputados na Câmara divulgaram ontem nota dizendo que serão contra três pontos da reforma da Previdência proposta pelo governo: a desconstitucionalização das regras previdenciárias e as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), voltado para idosos de baixa renda, e na aposentadoria rural.

O posicionamento pode dificultar a alteração do regime de repartição, sistema em que as contribuições dos trabalhadores da ativa e das empresas pagam o benefício de quem já está aposentado, para o regime de capitalização. De acordo com o anúncio feito pela equipe econômica no mês passado, na capitalização brasileira cada trabalhador faria sua própria poupança e o governo só garantiria o pagamento de um salário mínimo para aqueles que não conseguiram atingir nem esse nível de economia.

A proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma só estabelece as diretrizes para o regime de capitalização e deixa para lei complementar definir as regras. Segundo o Valor apurou, os partidos não discutiram esse ponto a fundo e não há oposição antecipada a que as regras da capitalização sejam jogadas para a lei complementar, mas também não há apoio.

Se for mantido o entendimento de que as regras do sistema precisam estar na Constituição para garantir a segurança jurídica da população, o governo terá que mandar outra PEC para estabelecer como funcionará a capitalização. A tramitação seria muito mais longa e exigiria apoio muito maior do que o governo espera. São necessários 257 deputados, dos 513, para aprovar uma lei complementar, ao passo que para dar um aval à PEC são necessários 308.

Líderes disseram que há uma resistência conceitual em se jogar regras que hoje estão na Constituição para leis complementares. “A minha opinião é de que a alíquota e idade mínima podem ser por lei complementar, por serem mais transitórios, mas que as regras de como funcionará a capitalização precisam estar na PEC”, disse o representante do Cidadania (antigo PPS), deputado Daniel Coelho (PE).

Além da demora maior, a sinalização dos partidos reduz a economia esperada pelo governo com as regras na aposentadoria rural – o Ministério da Economia não divulgou o valor exato de cada ponto do projeto, mas o impacto total da proposta era de R$ 1,1 trilhão em 10 anos.

A alteração proposta no BPC, outro ponto vetado pelos partidos, criaria um benefício de R$ 400 para os sexagenários, que seria elevado ao salário mínimo depois que o beneficiado completar 70 anos. Hoje, o idoso carente começa a receber salário mínimo aos 65 anos. Na aposentadoria rural, o governo quer aumentar a idade mínima e estabelecer 20 anos de contribuição.

Na nota, os 12 partidos dizem que a reforma “deve ter como princípios maiores a proteção aos mais pobres e mais vulneráveis” e por isso resolveram retirar da proposta a “parte que trata de forma igual os desiguais e penaliza quem mais precisa”. Também não permitirão a “desconstitucionalização generalizada” para garantir a segurança jurídica de todos. A exclusão deve ocorrer apenas na comissão especial, após votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Assinaram o documento: DEM, PP, PR, PSD, PRB, Pode, PTB, MDB, SD, Cidadania, Patri e PSDB. As mudanças também têm apoio da oposição – um representante do PCdoB participou da reunião na segunda-feira, na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para elaborar o documento.

Esses partidos também querem que o PSL assuma a relatoria da reforma na CCJ e na comissão especial. “Isso dará oportunidade de o governo indicar alguém da sua estrita confiança e o único partido que está na base do governo hoje é o PSL do presidente”, disse o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA).

O posicionamento ocorre num momento de conflito entre o Congresso e o governo Bolsonaro. Alguns líderes chegaram a levantar até a possibilidade de votar a reforma da Previdência do governo Temer como alternativa, mas isso foi de pronto descartado por Maia. Segundo fontes, ele acha que isso tiraria força da reforma, daria espaço para a oposição reclamar da falta de debate e munição para Bolsonaro jogar no colo dos deputados uma eventual derrota – ou até de receber as benesses da aprovação sem o desgaste de defender o projeto.

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (27/03/2019)

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MANCHETES

O Globo

Câmara desafia Planalto e aprova limite a poder de gasto do governo
Petrobras anuncia reajuste do diesel a cada 15 dias
Relato de Cabral põe Fisco do Rio na mira da Lava-Jato

O Estado de S. Paulo

Câmara mostra força e limita poder de gasto do governo
Corte de R$ 30 bi deve prejudicar funcionamento de ministérios
Novo recuo de Vélez mostra MEC à deriva
Sem cortar tropa, projeto de militares custa R$ 23 bi
Com ameça de greve, estatal muda política de diesel
CPI da Lava Toga é arquivada pela 2ª vez

Folha de S. Paulo

Líderes criam frente para mudar texto da Previdência
Petrobras vai reajustar diesel no mínimo a cada 15 dias
Disputa pela PGR deflagra lobby de procurador militar
Presidente do Inep sai após mais um recuo de Vélez
Petrobras vai reajustar diesel no mínimo a cada 15 dias
Criticado, governo decide alterar time de comunicação
Grupo paramilitar cerca Assembleia na Venezuela

EDITORIAIS

O Globo

A correta proposta de Dodge à Justiça Eleitoral

Juízes federais atuarem em casos de caixa 2 garantirá um melhor cumprimento da decisão do STF

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) precisa analisar com as devidas atenção e urgência o requerimento que a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, enviará à Corte com a solicitação de que os juízes federais também possam atuar na esfera eleitoral. O virtual monopólio da função exercido por juízes estaduais vem de uma resolução do TSE de 2002, que se baseou no Código Eleitoral, de julho de 1965, quando não existia a Justiça Federal, recriada em outubro daquele ano.

O assunto deve ser discutido como forma de a Justiça Eleitoral ser reforçada para poder cumprir com eficiência determinação de julgamento recente do STF, por apenas um voto, de que os crimes conexos ao caixa 2, instrumento usual nos casos de corrupção ocorridos em torno da política, também sejam analisados por juízes federais cedidos a Varas Eleitorais.

Sintomaticamente, sequer a presidente e o vice do TSE, ministros do Supremo Rosa Weber e Luís Roberto Barroso, apoiaram atese vencedora, entendida como manobra para enfraquecer o combate à corrupção travado pela Justiça Federal e, em particular, a Operação Lava-Jato.

A sugestão de Raquel Dodge se justifica, porque a Justiça Eleitoral é reconhecidamente despreparada, em termos de estrutura, para analisar casos de corrupção cometidos de forma sofisticada, até mesmo com o uso da própria Justiça Eleitoral para lavar dinheiro sujo. É o que ficou provado pela Lava-Jato ao investigar delações de que propina havia sido distribuída a políticos por meio de doações apenas formalmente legais.

Reportagem do GLOBO de domingo é objetiva: a força-tarefa da Lava-Jato, criada em Curitiba em 2014, conta com 15 procuradores, 11 policiais federais e 30 assessores, a maioria com dedicação exclusiva; ainda na capital do Paraná, a maior zona eleitoral tem apenas quatro servidores concursados (dois analistas judiciários e dois técnicos), dois estagiários e dois outros funcionários. A disparidade é imensa, e isso se reflete na qualidade do trabalho. Acrescente-se ao quadro de precariedade da Justiça Eleitoral o fato de que juízes estaduais são cedidos a ela.

Sem avaliar a qualificação de cada um, é indiscutível a maior capacidade para julgar processos de corrupção de um juiz federal que se dedica ao tema de forma exclusiva. Há, em questão, uma demanda corporativista dos juízes federais de atuarem em Varas eleitorais, para receber o adicional de R$ 5.390,26. Mas esta é uma outra discussão. Importa é que este dinheiro, que será gasto de qualquer forma, seja usado de maneira mais produtiva para a sociedade. Ou seja, na repressão à onda de corrupção no país.

A decisão, por um voto, do Supremo foi comemorada por advogados de denunciados, condenados e presos da Lava-Jato. Todos querem se aproveitar das fragilidades estruturais da Justiça Eleitoral. Até defensores do ex-presidente Lula desejam que o caso do tríplex, típico de propina paga em troca de benefícios (na Petrobras), vire crime eleitoral e ele seja solto. Não faz sentido. É importante o TSE avaliar todos os aspectos do pedido de Raquel Dodge, até para não se supor que a concentração dos crimes de caixa 2 na Justiça Eleitoral é mesmo para favorecer a impunidade.

O Globo

Dar posse a deputados presos é um acinte à luta contra a corrupção

Quatro parlamentares assinaram termo no presídio Bangu 8, fato inédito na história da Assembleia

Na semana passada, em mais um apêndice de sua vasta folha corrida, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) decidiu dar posse a cinco deputados que estão presos: André Corrêa (DEM), Luiz Martins (PDT), Marcos Abrahão (Avante), Marcus Vinícius Neskau (PTB) e Chiquinho da Mangueira (PSC), este último cumprindo prisão domiciliar.

Os parlamentares foram detidos em novembro do ano passado, durante a Operação Furna da Onça, acusados de integrar a quadrilha chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral, que também está encarcerado, condenado a quase 200 anos de prisão. Como, por motivos óbvios, eles não puderam ir à Alerj para assinar o termo de posse, a Alerj foi até eles, fato inédito na história da Casa. Com exceção de Chiquinho, o rito foi cumprido no presídio Bangu 8.

A polêmica decisão foi tomada pela Mesa Diretora, sem passar pelo plenário. O presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), alegou que a medida tem como objetivo permitir aposse dos suplentes, já que “a Casa não pode funcionar desfalcada de deputados como ocorreu em 2017 e 2018”.

Ora, se a Casa está desfalcada é por demérito próprio. Além de Corrêa, Martins, Abrahão, Neskau e Chiquinho, encontram-se presos os ex-presidentes da Alerj Jorge Picciani e Paulo Melo e o deputado Édson Albertassi, todos do MDB. Eles também são acusados de corrupção.

Acrescente-se à lista o deputado eleito Anderson Alexandre (SD), ex-prefeito de Silva Jardim. Acusado de fraudar licitações, entre outros crimes, responde em liberdade, mas não pode assumir o mandato por determinação da Justiça. Seu primeiro suplente, o coronel Jairo, também está preso.

Ceciliano disse que os deputados presos não receberão salários ou farão nomeações. Esclarecedor, mas era só o que faltava. Acusados de receber propina para garantir, na Alerj, os interesses da quadrilha ainda terem direito a salários pagos pelo contribuinte e a nomeações feitas diretamente de Bangu 8.

Um dia depois de dar posse aos deputados presos, a Assembleia conseguiu mais uma façanha. Instituiu uma verba de gabinete de R$ 26,8 mil para cada parlamentar, que poderá administrá-la como bem entender. Com aluguel de carros e combustível, por exemplo.

Nas últimas eleições, a Alerj teve um índice de renovação de 51% (36 novos deputados em 70). Havia esperanças de que, oxigenada, pudesse seguir um caminho diferente, mais afinado com os tempos atuais, de luta contra a corrupção. Mas, pelo jeito, nada mudou.

O Estado de S. Paulo

O abacaxi da Previdência

O ministro da Economia, Paulo Guedes, desistiu de comparecer a uma audiência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara convocada para ouvi-lo sobre a proposta do governo de reforma da Previdência. Oficialmente, o ministro alegou que considerava “mais produtivo” esperar a escolha do relator do projeto. Na prática, o ministro declinou do convite porque a audiência certamente seria convertida num espetáculo dos adversários da reforma, estimulados pela franca desorganização da base governista – onde, aliás, se abrigam muitos dos que se opõem à proposta do governo.

A decisão de Paulo Guedes faz todo o sentido, especialmente quando se observa a qualidade da atual articulação política do governo no Congresso. Sem a certeza de contar com algum apoio no plenário da CCJ, o ministro provavelmente calculou que sua ida à comissão, além de ser inócua – porque nem relator a reforma tem ainda –, permitiria aos demagogos de sempre confrontá-lo com as costumeiras mistificações acerca do estado das contas da Previdência e sobre a cassação de “direitos”. O ministro Paulo Guedes foi designado pelo presidente Jair Bolsonaro como articulador da reforma da Previdência no Congresso, como se isso bastasse para aplacar os ânimos hostis à proposta e fosse suficiente para conferir à base do governo um mínimo de coesão em favor das mudanças propostas.

Paulo Guedes pode até ser competente ministro, o que ainda está por ser provado, mas definitivamente não é mágico. A desarticulação da base governista é tão acentuada que torna praticamente impossível defender a proposta de reforma tal como foi desenhada pelo ministro – e pode-se dizer que essa bagunça política dificultará a aprovação mesmo de uma versão mais branda do projeto. Portanto, não havia nada que Paulo Guedes pudesse fazer na CCJ ontem – e não há perspectiva de que esse quadro se altere nos próximos tempos.

O problema de fundo é a qualidade das lideranças políticas destacadas pelo presidente Jair Bolsonaro para atuar em nome do governo. O caminho natural para uma discussão madura sobre a reforma da Previdência seria o engajamento dessas lideranças para isolar os sabotadores de sempre, mas o que se tem observado é que esses políticos têm sido incapazes de arregimentar apoio mesmo entre os correligionários do presidente da República. O PSL, partido de Jair Bolsonaro, ainda não fechou questão em relação à reforma – isto é, não orientou a bancada a votar a favor da proposta do presidente. “Sobre o fechamento de questão, nem o PSL está convencido da reforma”, explicou, com clareza meridiana, o deputado Delegado Waldir (GO), líder do PSL na Câmara.

“Quando chegou a reforma, fui o primeiro a questionar que veio um abacaxi aqui, e até agora a faca não chegou. Não vamos abrir esse abacaxi no dente”, disse o parlamentar, que cobrou do ministro Paulo Guedes um “facão” para cortar o “abacaxi” – em outras palavras, uma redução drástica na ambição da proposta do governo. Do contrário, disse o líder do PSL, “dificilmente” o presidente terá os votos dos deputados de seu próprio partido. Não surpreende que assim seja. O líder do governo na Câmara é Major Vitor Hugo (PSL-GO) e a líder do governo no Congresso é Joice Hasselmann (PSL-SP), ambos parlamentares de primeira viagem. O primeiro não conquistou o respeito de seus pares e tem sido frequentemente boicotado em suas iniciativas; a segunda parece mais dedicada a bater boca publicamente com correligionários, nas redes sociais, em vez de trabalhar para arregimentar apoio à reforma.

Tudo isso é reflexo natural da notória incapacidade do governo, a começar pelo presidente Jair Bolsonaro, de definir suas prioridades e organizar-se para defendê-las no Congresso. Sem ter convicção sobre a reforma da Previdência, o presidente parece bem mais à vontade e seguro quando se dedica a ampliar os antagonismos que tantos votos lhe deram na eleição. Nesse cenário, em que o presidente da República hostiliza até o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que apoia a reforma, parece perda de tempo falar em negociação política. Sem apoio real de Jair Bolsonaro, nem um “superministro” como Paulo Guedes terá poder para mudar essa realidade.

O Estado de S. Paulo

Incertezas e o risco da inflação

Com a comida mais cara, a inflação ganhou impulso e já roda em ritmo superior a 4% ao ano, bem perto da meta oficial de 4,25%. O risco de um estouro parece muito pequeno, por enquanto, a julgar pelas avaliações do mercado e do Banco Central. Mas preços em boa parte dependem de expectativas, e expectativas poderão desandar se a pauta de reformas ficar emperrada. Se isso ocorrer, os problemas do governo se multiplicarão e se tornarão muito mais graves em pouco tempo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, deve ter noção desse risco.

Poderia, talvez, dizer uma palavrinha sobre o assunto ao presidente Jair Bolsonaro. Nem todos os leitores de tuítes devem ter notado a importância da reforma das aposentadorias, mas todos deverão reclamar se houver um forte repique da inflação. As atuais pressões inflacionárias podem ser passageiras, mas são desconfortavelmente sensíveis. A prévia da inflação oficial chegou a 0,54% em março, 1,18% no ano e 4,18% em 12 meses. Esses números são do Índice Nacional de Preços ao Consumidor 15 (IPCA-15), calculado com base em preços coletados entre os dias 13 de fevereiro e 15 de março. A informação foi divulgada ontem pelo IBGE. O IPCA-15 de fevereiro havia subido 0,34%.

O último aumento foi o maior para um mês de março desde 2015, quando a elevação chegou a 1,25%. O item alimentação e bebidas, com alta de 1,28%, teve impacto de 0,32 ponto porcentual no IPCA-15 de março, produzindo sozinho mais de metade da variação geral. O item transportes, o segundo mais importante no mês, subiu 0,59% e teve impacto de 0,11 ponto. O custo da alimentação foi inflado principalmente pelo encarecimento do feijão carioca (41,44%). A quebra da primeira safra, ocasionada principalmente pelo tempo desfavorável, é a causa básica da disparada dos preços. A segunda safra, prevista para breve, deverá normalizar o mercado. Nos 12 meses terminados em fevereiro, o IPCA-15 subiu 3,73%.

No período encerrado em março, a variação saltou para 4,18%, quase encostando na meta anual. Sem novos sustos, o indicador deverá chegar a dezembro sem romper a meta. A expectativa de inflação dentro do limite oficial foi reafirmada na ata da última reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, divulgada ontem. Segundo a ata, a inflação acumulada em 12 meses poderá atingir um pico em abril ou maio. Deverá em seguida recuar e chegar ao fim do ano dentro do limite oficial. A projeção se refere, naturalmente, ao IPCA, o indicador oficial, referente ao período entre o começo e o fim de cada mês. Não há referência, no texto, ao IPCA-15, considerado um sinalizador de tendência do índice oficial.

Com base na ata, analistas do mercado sustentam a aposta de manutenção da taxa básica de juros, a Selic, em 6,50% na próxima reunião do Copom. Segundo alguns, até uma redução da taxa poderá ocorrer nos próximos meses. De modo geral, a hipótese de novo aumento da Selic neste ano é desconsiderada. Quanto aos membros do BC, mantêm cautela. Os dados e projeções da inflação mostram um cenário confortável, mas qualquer nova decisão dependerá de uma análise cuidadosa e sem pressa das tendências da economia. O estímulo monetário, segundo a ata, “requer ambiente com expectativas de inflação ancoradas”.

Mas essas expectativas dependerão do andamento de “reformas e ajustes necessários na economia brasileira”. Em várias passagens a ata menciona o avanço na pauta de ajustes e reformas, principalmente na área fiscal, como indispensável à contenção dos preços e à dinamização dos negócios. Uma boa aceleração da retomada vai depender da “diminuição das incertezas em relação à implementação da pauta de reformas”. O Copom reconhece, portanto, a existência de incertezas, apontadas como importante obstáculo a um avanço mais veloz da economia. Mas a remoção desse obstáculo deve ser apenas um primeiro passo. Faltarão medidas, como já se lembrou em outras atas, para elevar o potencial produtivo do País.

O Estado de S. Paulo

Estado de Direito preservado

A decisão do desembargador Antonio Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), de conceder habeas corpus ao ex-presidente Michel Temer e a outros seis investigados, restaura o império da lei ante o arbítrio judicial. “Mesmo que se admita existirem indícios que podem incriminar os envolvidos, eles não servem para justificar prisão preventiva”, ponderou o desembargador Athié. A prisão preventiva não é instrumento para antecipar eventual pena a ser imputada no futuro.

Ignorar os requisitos legais da prisão preventiva agride o Estado Democrático de Direito. “Ao que se tem, até o momento, são suposições de fatos antigos”, resumiu o magistrado. E as hipóteses legais da prisão preventiva exigem fatos atuais. “Não cabe prisão preventiva para fatos antigos”, lembrou o desembargador Athié. “Não servem para fundamentar prisão preventiva (fatos) decorridos mais de quatro anos, em março de 2019”, diz a decisão. “Além de (os indícios) serem antigos, não está demonstrado que os pacientes atentam contra a ordem pública, que estariam ocultando provas, que estariam embaraçando, ou tentando embaraçar eventual, e até agora inexistente instrução criminal, eis que nem ação penal há”, lembrou o relator do caso no TRF-2, listando cada uma das hipóteses legais para a prisão preventiva.

Ao decretar prisão preventiva sem fundamento legal, na prática o juiz Marcelo Bretas antecipou pena de uma eventual condenação que não se sabe se virá. O Ministério Público ainda nem propôs ação penal sobre os fatos alegados. Como disse o desembargador Athié, prisão antecipatória de possível pena é “absolutamente contrária às normas legais”. Tamanha era a disposição de decretar a prisão dos investigados – e tão evidente a ausência dos requisitos legais – que o juiz Marcelo Bretas não se furtou a usar, em sua decisão, elementos de outras investigações, o que também contraria o bom Direito. “A decisão (de primeira instância) faz análise de depoimentos prestados em outros feitos”, apontou o desembargador.

“A decisão faz mais considerações sobre outras investigações e afirma que há “evidências de que foi instaurada uma gigantesca organização criminosa em nosso país, cujo único propósito é recolher parte dos valores pagos em contratos públicos e dividi-los entre os participantes do esquema””, afirmou o relator, desvelando a fragilidade das conclusões do juiz de primeira instância. Ao tratar da ausência de contemporaneidade dos supostos fatos, o desembargador Athié é categórico ao afirmar que a conclusão a que chegou o juiz Marcelo Bretas sobre o caso não tem “a menor base empírica para justificar as prisões”. A clareza do diagnóstico do desembargador é de grande importância nos tempos atuais em que, muitas vezes, indícios são tratados como fatos e delações se convertem em verdades incontestáveis.

A decisão deve respeitar a lei e a realidade, com uma análise rigorosa das circunstâncias do caso. Não há como falar em contemporaneidade dos fatos quando eles teriam ocorrido há quatro anos. O desembargador Athié lembrou também que Michel Temer e Moreira Franco já não mais ocupam cargos públicos, “sob os quais teriam sido praticados os ilícitos”, razão pela qual “o motivo principal da decisão atacada – cessar a atividade ilícita – simplesmente não existe”. Ao longo da decisão liminar do TRF-2, fica evidente que a concessão do habeas corpus não representa nenhuma concessão à impunidade ou a um menor rigor investigativo.

“Ninguém discorda da necessidade de apuração de todos os fatos, e de responsabilização dos autores, mediante devido processo legal, assegurados contraditório e ampla defesa”, lembrou o desembargador Athié, mas todas as investigações, “sem exceção, devem observar as garantias constitucionais e as leis, sob pena de não serem legitimadas”. Num Estado Democrático de Direito, não pode haver espaço para o arbítrio judicial, seja qual for o motivo. Não há combate à corrupção com prisões ilegais – e é grande desserviço ao País e às instituições insinuar o contrário.

Folha de S. Paulo

Festejo indevido

Bolsonaro determina comemorações dos 55 anos do golpe, no que felizmente deve ser contido por líderes militares; democracia do país amadureceu

O porta-voz do Planalto, general Otávio Rêgo Barros, relatou na segunda-feira (25) que o presidente Jair Bolsonaro havia determinado ao Ministério da Defesa a realização de “comemorações devidas” dos 55 anos do golpe militar levado a cabo em 31 de março de 1964.

Não se sabe ao certo o que o mandatário entende por “comemorações devidas”. São conhecidas, entretanto, suas opiniões acerca do regime instituído pelo marechal Humberto de Alencar Castello Branco, que sufocou a democracia brasileira por duas décadas.

Elas não se resumem a considerar que se tratou de uma reação, com apoio de setores do empresariado e da classe média, ao fantasma da implantação de um governo de inspiração soviética no país, em meio aos embates da Guerra Fria.

Em sua vida pública, Bolsonaro, capitão reformado após carreira conturbada nas Forças Armadas, já teceu elogios ao que de pior aconteceu durante os anos de autoritarismo. É um entusiasta declarado, por exemplo, do coronel Carlos Brilhante Ustra, um notório torturador, a quem considera um herói brasileiro.

Num bem-vindo contraponto, autoridades de origem militar têm recomendado discrição ao governo e à caserna. Foi nesse sentido que se pronunciou o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, ao considerar, com bom senso, inadequado o uso da palavra “comemoração” para marcar a data.

Ao insistir no tom de celebração, o presidente mostra-se mais uma vez ambíguo quanto aos princípios democráticos que diz defender.

Parece evidente sua inclinação a atiçar setores mais extremados da opinião pública, que estiveram entre os primeiros apoiadores de sua candidatura presidencial. Com isso, estimula a polarização e o conflito, quando deveria estar empenhado em acalmar os ânimos.

Aviva-se artificialmente um debate que deveria estar, se não superado, sendo ao menos conduzido em termos mais racionais. Desde o golpe, toda a sociedade passou por um penoso processo de amadurecimento e aprendizado, que felizmente levou ao período de liberdades democráticas mais duradouro da história nacional.

Se há falhas no arranjo em vigor, tampouco se podem negar os avanços conquistados sob sua égide. Eliminou-se o descontrole inflacionário crônico e equacionou-se a dívida externa; estabeleceu-se um aparato de proteção social capaz de ao menos mitigar a pobreza e a desigualdade de renda.

Não é hora de tergiversações. Não há caminho para o Brasil fora da democracia e do Estado de Direito.

Folha de S. Paulo

A conta do diesel

Desde que não signifique uma abertura para interferências políticas, é defensável a decisão da Petrobras de passar a ajustar o preço do diesel nas refinarias a cada 15 dias.

A medida, estudada havia meses, surge num momento em que os caminhoneiros autônomos parecem se mobilizar para uma nova paralisação. A tensão vem crescendo desde o início do ano, quando venceu o acordo provisório com o governo que assegurava reajustes mensais da cotação do combustível.

Embora a Petrobras não tenha retornado ao padrão anterior de correções diárias, não há como escapar da alta do petróleo no mercado externo, além da desvalorização do real. Tudo somado, os preços subiram 18,5% desde janeiro nas refinarias, ainda que o impacto nas bombas possa ser menor.

A nova periodicidade quinzenal parece um bom critério. Além de não significar perdas para a estatal, que preserva seus mecanismos de gestão de custos, permite melhor planejamento dos fretes.

O caminhoneiro não vai se deparar com altas súbitas nos postos, que possam erodir sua margem de lucro durante o transporte. A ideia de um cartão pré-pago é outra inovação potencialmente útil.

Os problemas do setor se mostram bem maiores, contudo. O principal está no excesso de oferta de caminhões, resultante em parte da política de financiamento barato da gestão de Dilma Rousseff (PT). Houve grande renovação e crescimento da frota, mas a recessão diminuiu a demanda, e os preços dos fretes caíram.

A saída encontrada pelo governo Michel Temer (MDB) — sob pressão do movimento abusivo que paralisou o país em maio do ano passado — foi definir uma tabela de preços mínimos, ainda em vigor, mas aparentemente desrespeitada.

A situação jurídica desse arranjo mambembe permanece indefinida, pois o Supremo Tribunal Federal ainda não julgou a constitucionalidade da ingerência do governo no que é uma atividade privada.

Tendo em vista o risco de passivos legais e o custo alto resultantes da tabela, empresas têm optado por frotas próprias ou contratos com grandes transportadoras, o que enfraquece a posição dos caminhoneiros. Como é típico em intervenções desse tipo, a suposta ajuda logo se converte em maldição.

O governo deve buscar soluções definitivas, que passam pelo aumento da concorrência nos mercados de refino e transportes de combustíveis. A redução de preços também depende de menor carga tributária, sobretudo do ICMS.

Com as contas públicas em frangalhos, é irrealista esperar uma grande redução da cunha fiscal no curto prazo. Pode-se ao menos, porém, alterar a sistemática de cobrança — para um valor fixo por litro, em vez de percentuais que amplificam as oscilações.