Início Site Página 1066

Mauricio Huertas: Querem reescrever a história ao gosto do freguês

0

Quando eu me refiro ao meme que virou presidente, além da ironia, da crítica e da irreverência que parecem óbvias, ou acima de qualquer deboche ou desrespeito que não existem senão como decepção e desalento, está a constatação de um fato indiscutível – e que agora começa a ter efeitos devastadores e constrangedores: o Brasil elegeu para a Presidência da República alguém que até outro dia não passava de piada de mau gosto. Ele próprio símbolo da escória e da indigência política.

O que mudou, então, para transformar o bobo da vez, o ridículo de plantão, o nome do baixo clero que era escolhido para sofrer o bullying lacrador no programa de humor de alguns anos atrás, justamente na esperança de ser ele o protagonista da mudança desse estado de coisas que cobrávamos entre risos nervosos e que agora um bando majoritário de descerebrados o elevaram ao patamar de mito, herói e salvador da pátria?

São tempos insanos. Um verdadeiro pesadelo! Resultado em grande parcela do engodo que foram os governos petistas. Da esperança de mudança que gerou frustração ao se mostrar idêntica no modus operandi à bandidagem da velha política, da corrupção, do fisiologismo, do continuísmo. Todo o avanço conquistado desde a redemocratização, colocado em risco pela desonestidade de um partido e pela imoralidade do presidencialismo de cooptação que se empoderou em Brasília.

O estrago está feito. Conseguiram enxovalhar toda a história das esquerdas no Brasil. Jogaram no mesmo balaio comunistas, socialistas, sociais-democratas, ambientalistas, sustentabilistas e até liberais, enquanto reavivavam os zumbis da direita mais retrógrada, populista, reacionária e hostil à democracia. Como fizeram isso? Com suas milícias virtuais, com seus assassinatos de reputações, com a guerrilha de robôs e fake news.

O mundo virtual resolveu fazer uma espécie de remake da Guerra Fria, adaptada para a guerrilha digital entre progressistas e conservadores, reproduzindo as disputas e os conflitos estratégicos entre esquerda e direita que pareciam em desuso desde o fim dos anos 80, com a queda do muro, redimensionados agora para a era das redes sociais e das narrativas fictícias à moda de Goebbels, repetindo uma mentira mil vezes até que ela se torne aparente verdade.

É inacreditável o processo em curso: a tentativa de reescrever a História ao gosto do freguês. Cada bolha ideologizada e idiotizada, cada qual em seu extremo, produz e divulga a sua própria versão dos fatos. Do golpe que não é golpe, do nazismo que é de esquerda, do crime que é relativizado, do fundamentalismo religioso, do idiota que vira guru, do político preso que se torna preso político na versão patrocinada pelo inquilino do poder na ocasião. Tente, invente, crie uma narrativa paralela diferente.

A revolução tecnológica que vivemos atualmente terá, naturalmente, como todo processo revolucionário e transformador, consequências históricas dentro da nossa sociedade, alterando profundamente características comportamentais e até mesmo o modo como vemos o mundo e nos relacionamos com as outras pessoas. Resta saber aonde isso vai parar.

Essa mudança radical já começou e seus efeitos são facilmente percebidos em nosso dia a dia, pelas mãos de uma geração que tornou o smartphone complemento do seu próprio corpo e nosso cérebro virtualmente dependente dos mecanismos de busca na internet, além de todo o contexto político, econômico, cultural e social que vem se transformando ao toque dos dedos em uma tela.

Nem os gênios do passado imaginariam ter reunidas na palma da mão todas as invenções revolucionárias que vieram espaçadas no tempo, como a imprensa de Gutemberg, que mudou a história da leitura e da circulação de ideias em escala mundial; o rádio de Marconi, que uniu outras três tecnologias, do telégrafo, do telefone e das ondas de transmissão, para revolucionar a comunicação; depois tudo isso aprimorado e amplificado com o surgimento da televisão, e do computador, e da internet, e das redes sociais, e dos aplicativos.

Pois os inventos estão aí, todos juntos e misturados. É tudo ao mesmo tempo agora, e até por isso você pode ler esse texto neste exato minuto. Hoje cada um de nós é ao mesmo tempo receptor e emissor de infomação. Somos produtores incansáveis de notícias, palpites, opiniões. Certezas e verdades se tornam mais fluidas e subjetivas. Fatos são mais facilmente descartáveis e descartados, diante da profusão incontrolável e inabsorvível de dados, de referências, de conhecimento.

Somos escravos da tecnologia. Viciados em bits e bytes. Presos a conexões e algoritmos. Pior: vivemos de tal modo abduzidos por esse universo digital que mal nos damos conta de criar mecanismos de defesa contra a viralização do pensamento dominante que tentam nos impor.

Mas uma coisa é certa: ou ativamos nosso olhar crítico, nosso filtro ético mental, nosso antivírus ideológico, ou seremos massa de manobra fácil desses usurpadores da política e da realidade. Está na hora de assumirmos também o ativismo autoral da nossa própria História.

Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do #Cidadania23 em São Paulo, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do #BlogCidadania23 e apresentador do #ProgramaDiferente.

Arnaldo Jardim: Chega de incendiários

0

A semana passada foi repleta de xingamentos, provocações e atitudes quase infantis, por parte de mandatários, de lideranças políticas institucionais. Um bate-boca que deixou perplexo o País e nos remeteu ao clima eleitoral de 2018, extremamente polarizado com um resultado que significou a derrota do centro democrático. Prevaleceram as posições extremadas, no segundo turno uma escolha entre oito e oitenta. Um choque de extremos.

Passado o período eleitoral, esperava-se que a oposição tivesse sensatez de compreender a vontade da população, respeitar e trabalhar com este cenário. De outro lado, que o governo afirmasse suas propostas não reveladas durante a campanha e que apresentasse alternativas claras de políticas públicas.

Buscasse ampliar sua base no Congresso Nacional para dar sequência ao grande desafio: fazer as reformas estruturais, que precisam de amplo apoio político e de engajamento da sociedade para poderem ser aprovadas.

A Reforma da Previdência, por exemplo, precisa de 308 votos na Câmara Federal e o mesmo percentual no Senado Federal. Mas precisa também ser entendida e apoiada pelo brasileiro – e hoje as pesquisas de opinião pública mostram que uma grande parcela da população rejeita a proposta.

Especialistas apontam que os efeitos esperados da aprovação da Reforma da Previdência, seriam uma apreciação do Real de 8% (contra depreciação de 13% em caso de a reforma não ser aprovada) e uma alta de 26% na bolsa (contra queda de 20% se a reforma não for aprovada).

Portanto, a Reforma não se fará com atos de bravata, mas com uma consistente articulação política. Daí termos estabilidade fiscal, a certeza de que o Brasil poderá ter um planejamento de médio prazo. Um cenário estável que estimule os investimentos, ou seja, condições para que o enfrentamento do flagelo do desemprego e a retomada do crescimento possam acontecer.

A economia tem sofrido neste clima de “bater cabeças”. A Bolsa despencou 3,6% e o dólar subiu 2%. Os economistas do mercado financeiro reduziram as projeções para o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) para este ano e o próximo. Em 2019, o desempenho econômico deve avançar 2% e em 2020, 2,78%.

A grande prioridade para o Brasil é a retomada do crescimento, do desenvolvimento, não discussões vazias e pessoais. É uma vergonha termos mais de 13 milhões de desempregados em um país por construir e isto deve ser o foco dos chefes de Poderes, do Presidente da República.

Assim iremos para uma pauta positiva: implantar o RenovaBio, o Rota 2030, pensar em um Plano Safra plurianual, com mais recursos e previsibilidade para os produtores rurais. Avançar na implantação do Novo Código Florestal, acelerar as concessões de portos, aeroportos e rodovias, fortalecer a “educação para o trabalho”, ter uma política de Inovação que aumente nossa produtividade.

Enfim um debate político em torno de ideias, uma discussão que não ocorra pelas redes sociais. Mas que permita ao País celebrar convergências.

O ato de dirigir o Brasil não pode ser fruto de rompantes, mas refletir decisões cuidadosamente elaboradas, capazes de em torno delas constituírem uma grande maioria que expresse sua vontade e possibilite o engajamento da nação.

Não precisamos de incendiários, mas de bombeiros. Chega de gladiadores é hora dos construtores!

Arnaldo Jardim é deputado federal do Cidadania de São Paulo

Fernando Exman: Golpes, revoluções e impeachment

0

A “rememoração” da tomada do poder pelos militares em 1964 não saiu como o esperado pelo presidente Jair Bolsonaro, mas a iniciativa foi observada com atenção no Congresso Nacional. A oposição fez o que se poderia esperar dos partidos de esquerda, que alimentaram as redes sociais com notas de repúdio e articularam manifestações contrárias ao golpe. Com isso, também voltou-se para o passado, entrando na disputa pela narrativa histórica dos fatos que levaram o país a uma ditadura que durou 21 anos. Houve, porém, quem preocupou-se com o presente e o futuro.

O debate sobre o episódio ganhou corpo na semana passada, justamente quando a crise na articulação política entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional chegava ao seu ápice. O ministro da Economia, Paulo Guedes, adiava sua ida à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara para debater a reforma da Previdência.

Deputados aprovavam em dois turnos, com inusual rapidez, uma emenda à Constituição para reduzir a já restrita margem do governo federal para manejar o Orçamento. A atitude foi vista como uma demonstração de força, depois de um intenso embate verborrágico entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Não bastasse, atritos entre militares e a chamada ala ideológica do governo alimentavam o desgaste do ministro da Educação. Diante de rumores de que demitiria Ricardo Vélez Rodríguez, Bolsonaro foi às redes sociais na quarta-feira e alertou seus seguidores: “Sofro fake news diárias como esse caso da ‘demissão’ do ministro Vélez. A mídia cria narrativas de que não governo, sou atrapalhado, etc. Você sabe quem quer nos desgastar para se criar uma ação definitiva contra meu mandato no futuro. Nosso compromisso é com você, com o Brasil”.

O risco de um presidente que pratica estelionato eleitoral e se recusa a conversar com líderes partidários não terminar o mandato é conhecido pelos brasileiros. Esse cenário extremo já vinha sendo citado por políticos experientes, que lembravam inclusive que a prerrogativa de abertura de um processo de impeachment é justamente do presidente da Câmara dos Deputados. O que surpreendeu os agentes políticos, no entanto, foi o fato de o próprio presidente da República escancarar sua preocupação com apenas 85 dias de mandato.

Coincidentemente ou não, Bolsonaro postou a mensagem poucas horas depois de a “Ordem do Dia Alusiva ao 31 de Março de 1964” ser divulgada pelo Ministério da Defesa.

Comedido, o documento sintetiza a visão das Forças Armadas do que ocorreu em 1964. Para os militares, atendendo a um clamor da maioria da população, foi feita uma revolução necessária num momento de polarização devido à Guerra Fria. Com ela, teriam impedido o avanço do comunismo no Brasil e uma escalada em direção ao totalitarismo, assumindo assim a responsabilidade pela estabilização nacional.

O documento também lembra que em 1979 foi feito um “pacto de pacificação” estabelecido pela Lei da Anistia, e reafirma que as Forças Armadas, “em estrita observância ao regramento democrático, vêm mantendo o foco na sua missão constitucional e subordinadas ao poder constitucional, com o propósito de manter a paz e a estabilidade”.

O comportamento dos oficiais da ativa deve ser registrado. Mantiveram uma postura moderada, mesmo diante da pressão de setores do governo e da população que demandavam uma celebração mais ostensiva no dia 31. Provocada, a Justiça acabou não alimentando a polêmica. E quem tem juízo no Congresso e no Executivo decidiu agir.

Depois de muita insistência de alguns de seus conselheiros, Bolsonaro parece ter ouvido as recomendações e está marcando reuniões com presidentes e líderes partidários para quando retornar de sua viagem a Israel. Parece ter sido convencido de que, sem aprovar a reforma da Previdência, dificilmente conseguirá destravar outros projetos de seu governo.

Às vésperas dos cem dias de governo, inevitavelmente o presidente passará a ser cobrado cada vez mais para entregar o que prometeu durante a campanha eleitoral. Não está sendo fácil.

Bolsonaro já se viu obrigado a recuar na promessa de logo transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, frustrando a bancada e o eleitorado evangélico. Mais um exemplo vem do setor do agronegócio, que quer anistia de dívidas estimadas em R$ 17 bilhões contraídas com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). No entanto, conforme revelou o Valor, técnicos do governo estão alertando o Palácio do Planalto de que o eventual apoio do presidente à ideia, apesar de representar o cumprimento de uma promessa de campanha, poderia resultar num processo de impeachment por crime de responsabilidade fiscal.

Caminhoneiros, que realizaram paralisações durante os governos de Michel Temer e Dilma Rousseff, seguem insatisfeitos e demandam uma postura mais efetiva da atual administração contra as empresas que têm desrespeitado a tabela do frete. Muitos deles fizeram campanha para Bolsonaro na última greve.

Além disso, apoiadores do presidente insistem em cobrar do Senado a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o Judiciário e até mesmo o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal. Já há uma manifestação marcada para domingo a fim de pressionar o STF a não mudar seu entendimento atual em relação à possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, tema que tem criado atritos entre o Judiciário e integrantes da Operação Lava-Jato.

Apesar da insistência de colegas novatos nessa investida contra o Judiciário, senadores experientes do MDB, do DEM e do PSDB se articulam para desidratar esse movimento. Uma liderança do grupo argumenta: os Poderes constituídos por meio do voto popular estão pessimamente avaliados pela população em comparação com as Forças Armadas. “Não é hora de ajudar a enfraquecer o Judiciário.” (Valor Econômico – 02/04/2019)

Fernando Exman é coordenador do “Valor PRO” em Brasília – E-mail: fernando.exman@valor.com.br

Hélio Schwartsman: Golpe de mestre

0

Na novela da transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, Jair Bolsonaro conseguiu a façanha de ficar mal com todas as partes.

A bancada evangélica, os grupos mais ideológicos de seu governo, além, é claro, do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, ficaram frustrados com o fato de o presidente ter recuado da promessa de campanha. Em vez de anunciar a mudança da embaixada durante sua visita ao Estado judeu, Bolsonaro limitou-se a dizer que abrirá um escritório comercial na cidade.

O problema é que mesmo esse pequeno prêmio de consolação basta para indispor o Brasil com os árabes. A Autoridade Palestina condenou a decisão e convocou seu embaixador para consultas. Há o receio de que outros países árabes e islâmicos adotem alguma represália comercial contra o Brasil. O alvo óbvio são as exportações de carne “halal” para o Oriente Médio, o que é motivo de preocupação para a bancada ruralista.

Nada disso é física nuclear. Se Bolsonaro tivesse consultado um especialista ou estudado ele mesmo a matéria por 20 minutos antes de fazer promessas, teria percebido que os ganhos potenciais não compensavam os riscos. É tolice incorrer na possibilidade de perdas reais para energizar um público que já estava fechado com a candidatura.

E isso nos leva ao ponto central da coluna. Das várias características do neopopulismo de direita que parece estar tomando conta do Ocidente, o anti-intelectualismo é a mais preocupante. A maior parte dos avanços socioeconômicos observados nos últimos 200 anos se deve ao acúmulo de conhecimento técnico, que passou a ser utilizado em políticas públicas. Pense em coisas como saneamento, programas de vacinação etc.

Ao desprezar o racionalismo e o saber de especialistas, a nova direita passa o rodo sobre o que deu certo ao longo da história e ainda abre flanco para criar novos problemas desnecessários, como fez Bolsonaro. (Folha de S. Paulo – 02/04/2019)

Na CBN, Eliziane Gama fala sobre o pacote anticrime

0

O jornal da CBN conversou com a senadora Eliziane Gama, do PPS do Maranhão, sobre a tramitação no pacote anticrime, de autoria do ministro da Justiça, Sergio Moro . O projeto, que ‘concorria’ com a reforma da Previdência na Câmara, acabou sendo levado para o Senado, onde foi desmembrado para facilitar (ouça aqui) a tramitação. ‘Entendemos que poderíamos fazer um debate mais profundo no Senado’, justifica. A parlamentar foi a responsável por convencer o governo a iniciar a tramitação pelo Senado e não mais pela Câmara.

Desenhada a estratégia, a ideia agora é que o texto tramite normalmente na Casa, apesar das emendas já elaboradas. No Senado, já estão escolhidos os três relatores das propostas que compõem o pacote. Sobre as emendas já elaboradas, a senadora destaca a questão da legítima defesa. ‘Temos uma preocupação grande com a defesa da vida. Me preocupa trechos do artigo 23, que pode abrir precedente grande de licença para matar. E não apenas em relação ao agente de segurança, mas aos cidadãos comuns’, alerta.

Para a senadora, hoje em dia, o Brasil tem, praticamente, uma liberação para o porte de arma. ‘Se você tem uma arma em casa, e associa isso à questão da violenta emoção, pode ter uma quantidade grande de pessoas sendo assassinadas, sem ter uma punição, já que se propõe redução da pena nestes casos’. Gama diz que irá emendar este trecho do projeto de Sergio Moro.

A parlamentar ainda aponta como um problema na atual legislação a atual política sobre drogas no Brasil. Ela destaca que 80% dos casos de violência no Brasil têm a ver com a questão dos entorpecentes. Questionada se acredita que o pacote original de Moro será muito modificado, ela pondera que esta não é a ideia do Congresso.

Como há três propostas em tramitação, as emendas deverão ser apresentadas a cada um.
A parlamentar confia, no entanto, que haverá celeridade na tramitação dos trabalhos no Senado para a matéria depois seguir para a Câmara. Ela acredita numa aprovação na Casa até o final do primeiro semestre.

Um dos pontos polêmicos do projeto é o que trata da criminalização do caixa dois, ou seja, a parte que liga a segurança pública ao combate direto à corrupção. ‘Alguns senadores já mostram disposição de debater este ponto’, comenta.

Blog Cidadania 23: O Parlamentarismo está na raiz do #Cidadania23

0

O debate sobre o tema circula ainda timidamente nas nossas redes internas, mas faz parte da gênese do #Cidadania23 e também já integrava o programa de seu antecessor, o PPS.

O Estadão deste 1º de abril – que não se perca pela data – informa em nota: “Cidadania, antigo PPS, quer adoção do Parlamentarismo”. É verdade.

Diante de tantas crises políticas recentes, acontecimentos que paralisam o País e colocam em risco as conquistas democráticas a cada nova turbulência no regime Presidencialista, é necessário manter no radar essa possibilidade (talvez até uma necessidade) de adoção do Parlamentarismo.

Afinal, dos últimos cinco presidentes eleitos diretamente pelo povo desde a redemocratização, dois sofreram impeachment (Collor e Dilma) e outro está preso (Lula). Restam FHC e Jair Bolsonaro, este ainda uma incógnita.

“O Cidadania defende o Parlamentarismo, um regime de governo mais democrático”, explica o presidente nacional do partido, Roberto Freire, julgando oportuna a iniciativa do senador José Serra (PSDB-SP) de retomar a discussão sobre a implantação do Parlamentarismo. Nessa proposta, a mudança passaria a valer a partir de 2023, na sucessão do atual presidente.

O #BlogCidadania23 e o#ProgramaDiferente debatem o assunto com bastante frequência. Reveja abaixo alguns exemplos.

 

Assista a íntegra do debate sobre Parlamentarismo com José Serra, Eduardo Jorge e Davi Zaia

#ProgramaDiferente Especial: Franco Montoro e o Parlamentarismo

Debate: Presidencialismo, Semipresidencialismo ou Parlamentarismo

A transição pós-PT, o presidencialismo de cooptação e as penas que voam no ninho tucano

#ProgramaDiferente antenado às pautas do dia: reforma política, parlamentarismo, combate à corrupção etc.

O #ProgramaDiferente analisa a crise do petismo e debate o parlamentarismo como alternativa

Alberto Dines afirma ser contra o impeachment e defende parlamentarismo para o Brasil sair da crise

2013-2018: Nos cinco anos dos movimentos pela renovação da política, o Brasil fará o teste nas urnas

Debate sobre a Reforma Política no #ProgramaDiferente

#ProgramaDiferente debate a República, a Democracia e a Reforma Política

Pacote anticrime reapresentado por Eliziane Gama já tem relatores e está aberto para emendas

0

Os três projetos de lei que compõem o pacote anticrime reapresentado pela líder do PPS no Senado, Eliziane Gama (Cidadania-MA), já estão nas mãos de relatores e podem receber emendas dos demais senadores ao longo desta semana.

PL 1.864/2019, com diversas alterações nos códigos Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940) e de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689, de 1941), ficou com o senador Marcos do Val (PPS-ES). O PL 1865/2019, que tipifica o crime de caixa 2 no Código Eleitoral (Lei 4.737, de 1965), será relatado pelo senador Marcio Bittar (MDB-AC). Por fim, o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) foi designado para relatar o PLP 89/2019, que determina que o julgamento de crimes comuns conexos ao processo eleitoral seja realizado pela Justiça comum.

Os três projetos foram entregues na semana passada pela senadora do Cidadania, novo nome do PPS. Eles são idênticos a propostas levadas à Câmara dos Deputados pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, em fevereiro. O objetivo é dar andamento imediato ao pacote de Moro, enquanto a Câmara se ocupa com a reforma da Previdência. A apresentação de novas versões dos textos foi o único jeito de encaminhar as medidas para o Senado, porque projetos de autoria do Poder Executivo devem começar a tramitar pela Câmara.

“Optamos que o foco da Câmara dos Deputados esteja na reforma da Previdência, e o Senado inicie o debate acerca desse outro tema de igual modo importante, que é o tema da segurança”, disse a senadora.

Na Câmara, o pacote anticrime encaminhado por Moro foi despachado inicialmente para um grupo de estudos, composto por quatro deputados, que fará uma avaliação prévia antes do envio às comissões temáticas. Os projetos de Eliziane já estão na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania).

A comissão pode ter a palavra final sobre dois deles, os PLs 1.864 e 1.865, se forem aprovados na CCJ, só irão ao Plenário em caso de requerimento especial — caso contrário, poderão seguir diretamente para a Câmara. Já o PLP 89 terá que passar pelo Plenário de qualquer maneira, por se tratar de projeto de lei complementar, que regulamenta dispositivos da Constituição.

Apoio de Moro

A iniciativa de Eliziane teve o apoio de Moro. Em audiência na CCJ na última quarta-feira (27), o ministro disse que não tem “nenhuma objeção” a que o Senado tome a dianteira nestes debates, porque o importante é que os projetos sejam discutidos e aprovados “o mais rápido possível”, com os aprimoramentos do Parlamento.

A presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), fez um apelo pela aprovação do pacote, em especial pelos dispositivos que têm a ver com a violência cotidiana. Ela classificou o problema como um mal que assola o país.

“Nossos municípios não são mais pacatos. Não há um único pedaço de chão desta terra que não esteja tomado hoje pelo crime e pelo medo. É atribuição de todos nós darmos uma resposta à sociedade”, disse.

Simone explica que os relatores receberão as emendas dos colegas e somente depois disso farão a análise dos projetos, decidindo quais modificações irão incorporar. Por isso, não é possível prever quando os relatórios serão entregues para votação na CCJ.

Temas polêmicos

O senador Marcos do Val disse acreditar que o seu projeto não começará a ser votado antes de maio, por conter muitos temas polêmicos. O PL 1.864/2019 trata de dispositivos legais referentes, por exemplo, à legítima defesa, à prisão em segunda instância, à definição de organizações criminosas, aos crimes de resistência e ao regime de segurança máxima. O senador pretende convidar o ministro Sergio Moro para uma nova audiência na CCJ e já adianta uma mudança que deve propor ao texto: a inclusão de testes técnicos periódicos para os policiais. (Com informações da Agência Senado)

Falência de gráfica que imprime Enem leva incerteza a exame

0

Gráfica que imprime o Enem decreta falência e ameaça exame

Renata Cafardo – O Estado de S. Paulo

A gráfica que iria imprimir o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) decretou falência hoje e paralisação de todos os trabalhos. A RR Donnelley, multinacional responsável pelo exame desde 2009, informou hoje que “precisou encerrar suas operações no Brasil” por causa das “atuais condições de mercado”.

O ideal é que a prova fosse para a gráfica ainda este mês ou, no máximo, em maio, para que o cronograma do maior vestibular do País não atrase. A prova será em novembro e hoje começaram as inscrições para quem quer pedir a isenção da taxa. Para especialistas, também há risco de falhas na segurança com mudança da empresa nessa etapa do processo.

A falência complica mais a situação do Enem, que está sendo afetado pela crise atual no Ministério da Educação (MEC). Na semana passada, o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Marcus Vinicius Rodrigues, foi demitido ao se desentender com o ministro Ricardo Vélez Rodríguez. Ele foi o responsável pela decisão de deixar de avaliar a alfabetização no País, revelada pelo Estado e depois revogada por Vélez.

O presidente no Inep daria o aval para o trabalho da comissão criada para analisar questões consideradas inadequadas. Ainda não foi nomeado um substituto. Desde a manha desta segunda-feira, o Estado pede um posicionamento do Inep sobre a falência da gráfica e ainda não obteve resposta. Rodrigues também havia pensado em usar a Casa da Moeda para parte da impressão do Enem, mas a ideia não foi adiante.

Só depois de finalizado o trabalho da comissão é que a prova com 180 questões será montada, um trabalho demorado. “Uma coisa é fazer a prova em novembro, outra coisa é o que tem que ser feito agora, há uma cadeia para ser viabilizada”, diz o especialista em avaliação e professor da Universidade de São Paulo (USP), Ocimar Alavarse. “Não é qualquer gráfica que pode imprimir o Enem, há um risco grande.”

A RR Donnelley assumiu a impressão do Enem quando a prova foi roubada e cancelada em 2009, na gestão de Fernando Haddad no MEC. O episódio foi revelado pelo Estado na época. Depois disso, os contratos foram prorrogados para se manter a mesma gráfica.

Uma licitação foi feita em 2016, mas a RR Donnelley venceu novamente. A Gráfica Plural entrou com representação no Tribunal de Contas da União (TCU) alegando que havia “direcionamento do certame” por causa de “exigências restritivas que teriam a impedido de participar da disputa mesmo tendo uma das maiores capacidades instaladas do país”. Ainda não há deliberação do TCU a respeito.

A licitação realizada no ano passado para impressão do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade) também está paralisada por questionamentos na Justiça.

“O governo federal está prestes a chegar aos 100 dias sem ter muito o que mostrar em educação. Espero que esse episódio não sirva de justificativa para atrasos e alterações no Enem, que tem imensa repercussão na vida dos jovens”, disse a presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz.

O roubo da prova em 2009 aconteceu justamente dentro da gráfica Plural, que havia sido contratada por uma empresa (que ganhou licitação para aplicar a prova) para imprimir o Enem. A Justiça, no entanto, não responsabilizou a gráfica pelo crime.

Desde então, o Inep instaurou diversos processos de logística e segurança para fazer a avaliação. A contratação da gráfica passou a ser de responsabilidade do Inep e não mais da empresa que aplica o Enem.

“Toda mudança traz risco”, diz o então presidente do Inep em 2009, Reynaldo Fernandes. Segundo ele, o governo continuou trabalhando com a RR Donnelley porque ela se mostrou eficiente e segura. Mas, para ele, uma maneira de minimizar os problemas de segurança seria descentralizar a prova. “Temos que sair de sistema de uma prova única, já temos tecnologia para isso.”

Luiz Carlos Azedo: Uma casca de banana

0

NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

O presidente Jair Bolsonaro visitou ontem o Muro das Lamentações, em Jerusalém, ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. No local sagrado, orou e depositou um pedido entre as pedras, um ritual de muito simbolismo para os judeus. O que mais irritou os palestinos e os países árabes, porém, não foi o gesto religioso, mas o anúncio da instalação de um escritório comercial em Jerusalém, que muda a política externa brasileira no Oriente Médio.

A reação foi imediata: o embaixador da Palestina em Brasília, Ibrahim Alzeben, classificou o anúncio como um “passo desnecessário” e revelou que, há 10 dias, todos os embaixadores de países árabes solicitaram uma audiência com Bolsonaro, mas até hoje não obtiveram resposta. O Ministério das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, em nota, anunciou que “entrará em contato com o embaixador da Palestina no Brasil para consultas, a fim de tomar as decisões apropriadas para enfrentar tal situação”, ou seja, convocou seu embaixador, o que é uma forma de protesto.

No antigo Mughrabi Quarter (Quarteirão Marroquino), após a ocupação israelense, 135 famílias árabes foram removidas para a abertura da esplanada do Muro das Lamentações, local sagrado para os judeus, por ser o último pedaço do antigo Templo de Herodes, que foi destruído pelos romanos. Do outro lado do Muro, fica a Mesquita de Al-Aqsar, na parte sul do Haram al-Sharif (o “Nobre Santuário”), terceiro local mais sagrado para o Islã depois de Meca e Medina. A maior mesquita de Jerusalém tem capacidade para receber cerca de cinco mil fiéis. O status diplomático de Jerusalém é um assunto muito controverso na ONU.

O Brasil sempre teve uma presença equilibrada no Oriente Médio, devido ao papel do chanceler Osvaldo Aranha na criação de Israel e às boas relações com os países árabes. Desde 2006, por exemplo, com 250 homens, a Marinha brasileira é responsável pelo navio capitânia da Força-Tarefa Marítima da ONU no Líbano (FTM-UNIFIL), criada pelo Conselho de Segurança, para evitar contrabando de armas e treinar a Marinha libanesa. No mês passado, a fragata “União” substituiu a fragata “Liberal”, que regressou ao Brasil após 22 patrulhas em 89 dias na costa libanesa. A força é formada por navios da Alemanha, Bangladesh, Brasil, Grécia, Indonésia e Turquia, além de dois helicópteros, sob comando do contra-almirante brasileiro Eduardo Augusto Wieland.

Bolsonaro acredita que a abertura do escritório em Jerusalém é uma saída para o impasse criado com os países árabes, após ter manifestado publicamente, após ser eleito, a intenção de transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, a exemplo do que fez o presidente norte-americano Donald Trump. Ao contrário, sinaliza o futuro reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel, e também a intenção de transferir a embaixada. Os ministros da Fazenda, Paulo Guedes, e da Agricultura, Tereza Cristina, com apoio dos generais que assessoram Bolsonaro, conseguiram convencer Bolsonaro a adiar a transferência da embaixada, temendo retaliações comerciais dos países árabes, grandes consumidores de carne bovina e de frango.

Impasse

“É direito deles reclamar”, minimizou Bolsonaro. “A gente não quer ofender ninguém. Agora, queremos que respeitem a nossa autonomia”, completou. Entretanto, deixou no ar a intenção de transferir a embaixada: “Tem o compromisso, mas meu mandato vai até 2022.E tem que fazer as coisas devagar, com calma, sem problema. Estou tendo contato com o público também de outras nações e o que eu quero é que seja respeitada a autonomia de Israel, obviamente”.

Jerusalém é um beco sem saída para o conflito árabe-israelense. Nem judeus nem palestinos aceitam um acordo que garanta um status binacional para Jerusalém, simplesmente porque Israel não aceita a existência do Estado Palestino e os palestinos não reconhecem Israel. Com a ocupação dos territórios árabes, todas as negociações de paz entre judeus e palestinos fracassaram. O que vigora é um cessar-fogo violado sistematicamente pelos dois lados.

A política de ampliação e consolidação de assentamentos nos territórios árabes ocupados por Israel de Benjamin Netanyahu torna cada vez mais difícil um acordo com a Autoridade Palestina e fortalece o Hamas, na Faixa de Gaza. Como Israel se define como um Estado judeu, a população palestina de Jerusalém Oriental e demais territórios ocupados precisa ser contrabalançada pelos colonos, que já representam mais de 10% do eleitorado israelense. A existência de um Estado multiétnico é inimaginável, uma contradição da democracia em Israel.

O mais grave, porém, é o fato de que o conflito na região é alimentado pelos Estados Unidos e os países árabes, com apoio da Rússia e da China. Sem uma mudança de postura dessas potências, não há acordo possível, até porque a forte presença de ex-militares e ex-guerrilheiros na política de Israel e da Palestina, respectivamente, dificulta ainda mais as negociações. São políticos que se fortalecem com a guerra. O Brasil mantinha distância regulamentar de tudo isso, até o presidente Bolsonaro escorregar nessa casca de banana. (Correio Braziliense – 02/04/2019)

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (02/04/2019)

0

MANCHETES

O Globo

Por reforma, Bolsonaro se reunirá com centrão e MDB
Presidente rompe tradição diplomática em Jerusalém
Aposentadoria de servidores pode ter regr mais branda
Falência de gráfica é mais um problema para o Enem
MEC cancela mais de 65 mil diplomas da Unig por fraude
Câmara vota se abre processo de impeachment contra Crivella
Dívida da Comlurb pode causar colapso na coleta de lixo

O Estado de S. Paulo

‘Supremo pode perder sua legitimidade’, diz Barroso
Presidente faz visita inédita a muro sagrado em Israel
Mercado já prevê PIB abaixo de 2% para este ano
Bolsonaro critica IBGE e contesta taxa de desemprego
Moro fala em mandato para diretor-geral da PF
Caoa fecha acordo para comprar fábrica da Ford
Falência de gráfica leva incerteza a Enem
Joice Hasselmann é cotada para o Planalto

Folha de S. Paulo

Bolsonaro minimiza atrito com palestinos
Paulo Preto declara R$ 137 mi em quatro contas na Suíça
Parlamentares estudam desidratar Previdência na CCJ
Para embaixador, elo com Israel não pode ferir Palestina
‘Nova política’ se esgotou, diz líder do bloco na Câmara
TSE exclui de ação empresário ligado a disparos anti-PT
Crivella perde apoio da base e tem mandato ameaçado no Rio
Ana Estela Haddad é cotada para disputar Prefeitura e SP
Gráfica que imprime Enem vai à falência e deixa exame em risco

Valor Econômico

EDITORIAIS

O Globo

Visita a Israel atesta política externa ideológica

Abrir escritório comercial em Jerusalém, em vez de mudar a embaixada, tem seus custos

A inapropriada viagem a Israel confirma que, de fato, o núcleo ideológico do governo Bolsonaro passa a alterar a política externa do país, que deveria ser conduzida com coerência, considerando os interesses permanentes da nação. Diplomacia precisa ser atividade de Estado, não de governo.

Não é o que demonstra esta viagem. Este fenômeno negativo já acontecera no lulopetismo, em prejuízo do país. Isso ficou evidente no alinhamento, por simpatia ideológica, de Lula/Dilma a Néstor e Cristina Kirchner (Argentina), e a José Mujica (Uruguai), todos guiados pelo nacional-populismo bolivariano de Hugo Chávez (Venezuela). Contribuíram para fechar o Mercosul e impedir mais comércio como resto do mundo.

A visita a Israel também pode gerar prejuízos ao comércio internacional, além de arranhar a característica predominante da política externa brasileira, que é o pragmatismo. A intenção de transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, cidade sob litígio, seguindo os Estados Unidos de Trump, seria, e é, uma afronta aos palestino se aos países árabes em geral, com os quais o Brasil tem forte relacionamento comercial.

O fato de o presidente ter anunciado na viagem que o país instalará um escritório comercial em Jerusalém, e não a embaixada, não livrará o país de dissabores. A reação palestina foi imediata: convocou de volta seu embaixador em Brasília, Ibrahim Alzeben, para “consultas”. Uma etapa, no ritual diplomático, que, no limite, pode levar ao rompimento de relações. Potência agro exportadora, o Brasil vende para países árabes US$ 4,5 bilhões por ano apenas em carnes, principalmente de frango, abatido conforme ritual islâmico.

É líder mundial neste mercado, que corre o risco de perder caso os árabes retaliem. Se isso acontecer, até 150 mil empregos diretos, em pequenas cidades do Sul, poderão ser perdidos. Por isso, grandes empresas do setor, assim que a intenção de mudar a embaixada foi mencionada, ainda na campanha, trataram de agir para demover o presidente da ideia. Os generais que cercam Bolsonaro atuaram para ele rever esta intenção.

O próprio vice, Hamilton Mourão, indicou não gostar da mudança da embaixada. O presidente decidiu então abrir o escritório comercial, e desagradou tanto a Israel de Benjamin Netanyahu, que esperava a troca de endereço da embaixada, quanto aos palestinos. Derrota dupla. Há questões em que inexiste meio-termo. Por ser o Itamaraty um dos espaços no governo cedidos à ala mais radical do bolsonarismo, no caso representada pelo chanceler Ernesto Araújo, a política externa passou a ser fonte de problemas.

Bolsonaro acaba de causar mal-estar nas visitas ao Chile e ao Paraguai, onde fez menções elogiosas aos ditadores Pinochet e Stroessner, que os anfitriões querem deixar no passado. E, em Israel, abre um flanco de fragilização diplomática, com reflexos potencialmente sérios nas exportações. Faz falta o profissionalismo no Itamaraty.

O Globo

Combate às milícias demanda ações integradas com o governo federal

Grupos paramilitares já atuam em 14 municípios do estado e em 26 bairros da capital fluminense

O poder das milícias está cada vez mais presente no dia a dia de cariocas e fluminenses. Como mostrou reportagem do GLOBO publicada domingo, esses grupos paramilitares já atuam em pelo menos 14 cidades de diferentes regiões do estado, como Angra dos Reis, na Costa Verde, e Cabo Frio, na Região dos Lagos. Na capital, se espalham por 26 bairros, o que representa uma população de 2,2 milhões de pessoas.

Embora ainda predominem na Zona Oeste, esses bandidos expandem seus negócios para outras áreas, como a Zona Norte. As milícias surgiram na Favela de Rio das Pedras, em Jacarepaguá, no início dos anos 90. Formadas inicialmente por ex-policiais e ex-bombeiros,chegaram com o discurso de que estavam ali para impedir que o tráfico se estabelecesse. Mas o tempo mostrou que não havia mocinhos na história. Usando os mesmos métodos do tráfico para impor a hegemonia, passaram a controlar serviços essenciais para os moradores, como segurança, transportes, distribuição de gás, sinal clandestino de TV e internet, entre outros.

Posteriormente, diversificaram as atividades. Hoje, o faturamento desses grupos criminosos se apoia também em grilagem de terras, extração de areia, agiotagem, contrabando de cigarros e até extorsão a pescadores na Baía de Guanabara. Embora em algumas regiões milicianos disputem território com traficantes, sabe-se que em outras áreas eles estão associados, formando poderosas organizações criminosas. Nunca é demais lembrar que esses grupos paramilitares estenderam seus tentáculos também à política, financiando a eleição de representantes nas Casas legislativas do estado e de municípios fluminenses. Alguns inclusive estão encarcerados.

Não se pode dizer que autoridades sejam negligentes com esse tipo de crime. Afinal, a polícia tem feito operações e prendido criminosos. Mas, claramente, elas não têm sido suficientes. Talvez porque, até agora, essas ações têm ficado apenas no âmbito da segurança do estado. E, embora seja proeminente no Rio, a milícia é um problema nacional. Está na hora de ir além. Crime tão complexo exige combate adequado. O Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado pelo ministro Sergio Moro, tem feito operações bem-sucedidas, em conjunto com as polícias dos estados, como a de combate à pornografia infantil, realizada na semana passada.

Sabe-se que uma das formas de asfixiar essas quadrilhas é tirando lhes as fontes de financiamento. E,nesse campo, é importante a expertise do governo federal. Se houver um trabalho conjunto com a União, certamente o enfrentamento das milícias no Rio de Janeiro alcançará um outro patamar.

O Estado de S. Paulo

Devastação da confiança

A confiança derrete e caem as expectativas de crescimento, enquanto o governo tropeça e o presidente se distancia das negociações com o Congresso. O Índice de Confiança Empresarial da Fundação Getúlio Vargas (FGV) caiu em março de 96,7 para 94 pontos, o nível mais baixo desde outubro, mês das eleições. No mercado já se fala em expansão econômica abaixo de 2% neste ano, e a tendência das projeções é convergir para 1,5%, segundo o consultor e ex-presidente do Banco Central (BC) Affonso Celso Pastore.

Na batalha pela reforma da Previdência, o objetivo mais urgente, o governo é representado principalmente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. O PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, fechou questão a favor do projeto de mudança previdenciária, mas o grande aliado de Guedes no Parlamento, por enquanto, é o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, filiado ao DEM.

Enquanto o chefe de governo dava prioridade a uma visita a Israel, sua terceira viagem ao exterior em três meses de mandato, empresários e analistas baixavam suas apostas em relação ao desempenho dos negócios. Depois de “uma onda de otimismo com o novo governo”, o recuo de agora parece estar ligado “ao desapontamento com o ritmo lento da economia e com a manutenção de níveis elevados de incerteza econômica”, disse Aloísio Campelo Jr., superintendente de Estatísticas Públicas da instituição.

O Índice de Confiança Empresarial da FGV sintetiza avaliações do quadro presente e expectativas em relação aos três meses seguintes. O indicador de situação atual caiu para 89,9 pontos, com redução de 1,5, e retornou ao nível de novembro. Já o índice de expectativas, com recuo de 2,9 pontos, escorregou para 98,1, o menor patamar desde outubro. Em março, os índices de confiança de todos os setores foram menores que no mês anterior. No trimestre, o da indústria avançou 0,5 ponto, enquanto os de serviços, comércio e construção recuaram. Todos continuaram abaixo de 100, linha divisória entre expectativas positivas e negativas. O “otimismo” abaixo de 100 corresponde a uma avaliação menos negativa de uma situação presente ou esperada.

A piora das expectativas em relação ao desempenho da economia vem sendo mostrada há semanas pelo boletim Focus, atualizado semanalmente pelo BC e baseado em consultas a cerca de cem instituições financeiras e consultorias. Em um mês caiu de 2,30% para 1,98% a mediana das projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019, segundo os números divulgados nesta segunda-feira. Na segunda-feira anterior, o número apresentado foi 2,01%. Na semana passada o BC e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) também divulgaram suas novas projeções para este ano. Nos dois casos o crescimento estimado para a expansão do PIB caiu para 2%.

Os números frustrantes do trimestre final de 2018 já indicaram um avanço próximo de 2% em 2019, observou o economista Affonso Celso Pastore num evento promovido pelo Estado. Depois de um primeiro trimestre muito ruim, “com cheiro de crescimento nulo”, as projeções do mercado tendem a convergir para 1,5%, acrescentou. Qualquer otimismo gerado pela aprovação da reforma da Previdência, segundo sua avaliação, só produzirá efeitos em 2020. “Para 2019, com ou sem reforma, o quadro é de crescimento muito baixo”, concluiu. Os economistas consultados na pesquisa Focus também voltaram a diminuir suas projeções para o crescimento industrial.

A mediana das estimativas caiu de 2,57% na semana anterior para 2,50%. Um mês antes estava em 2,90%. Baixo crescimento industrial significa expansão econômica de baixa qualidade, com menor criação de empregos formais e menor difusão de tecnologia. Ganhos de produtividade podem ocorrer na agropecuária, mas neste ano as perspectivas do setor também são de crescimento modesto. Concessões na área de infraestrutura poderão animar segmentos da indústria, mas a transmissão do estímulo tomará algum tempo. Se a confiança continuar escassa, nem a retomada no próximo ano estará garantida.

O Estado de S. Paulo

O novo desafio da dengue

O rápido avanço da dengue neste primeiro trimestre, de acordo com dados do Ministério da Saúde, indica o risco de o País enfrentar um novo e grave surto dessa doença. Mostra também que, apesar de estar às voltas com a dengue há muitos anos, o Brasil não consegue avançar na prevenção. Embora ainda não exista uma vacina contra a dengue, o que dificulta essa tarefa, há outras medidas que podem amenizar a situação, principalmente o combate ao mosquito transmissor, o Aedes aegypti, e as campanhas de esclarecimento da população, cuja colaboração é fundamental.

Os números são preocupantes. De janeiro a 16 de março foram registrados 229.064 casos de dengue, uma alta de 264% em relação ao mesmo período de 2018. O número de mortes também teve um aumento significativo, 67% maior que em 2018. Outra notícia inquietante é que em três Estados – Tocantins, Acre e Mato Grosso do Sul – a dengue já se caracteriza como epidemia. A situação é mais grave em Tocantins, que tem a maior relação de casos da doença por 100 mil habitantes do País (602,9), seguido por Acre (422,8) e Mato Grosso do Sul (368,1).

É grave também, segundo o Ministério da Saúde, a situação em que se encontram Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo e Distrito Federal, onde a relação de casos por 100 mil habitantes é respectivamente de 355,4; 261,2; 222,5; e 116,5. Por região, a situação é mais grave justamente na mais rica e populosa delas, a Sudeste, com 65,4% dos casos prováveis de dengue, o que é especialmente preocupante, seguida da Centro-Oeste (17,6%), Nordeste (7,5%), Norte (6,6%) e Sul (2,9%).

O Estado de São Paulo ocupa posição singular, e nada invejável, nesse quadro. Houve aqui 31 mortes, a metade do total registrado em todo o País (62). E o número de casos prováveis de dengue é muito elevado: naquele período foram nada menos do que 83.045.

O sinal de alerta veio um mês antes, em 15 de fevereiro, quando a Secretaria Estadual da Saúde constatou que entre janeiro e aquela data o número de casos confirmados saltou de 1,9 mil para 13,4 mil, um aumento de 605% em relação ao total de igual período de 2018. As regiões mais atingidas foram o norte e o noroeste do Estado e as cidades mais afetadas foram Bauru, Barretos e Araraquara.

Na ocasião, o coordenador do Controle de Doenças da Secretaria, Marcos Boulos, alertou que o pior deve ocorrer entre o final deste ano e o começo de 2020: “O próximo verão deve ser pior, porque no último a dengue não pegou com força as regiões mais populosas do Estado”. Os novos dados, de 15 de março, que indicam piora da situação desde já, mostram que há razões de sobra para as autoridades estaduais aumentarem logo seus esforços para combater a dengue.

Para o coordenador do Programa Nacional de Controle da Dengue do Ministério da Saúde, Rodrigo Said, o avanço dessa doença se deve principalmente à volta do vírus tipo 2, um dos quatro tipos do vírus. Segundo ele, como o último surto da doença provocado pelo vírus tipo 2 ocorreu há bastante tempo, em 2002, há o risco de que uma parte da população esteja mais sensível a ele. Os dados colhidos pela Secretaria da Saúde até 15 de fevereiro mostram que nas regiões então mais afetadas de São Paulo já circulava o vírus tipo 2.

O trabalho do Ministério da Saúde traz duas boas notícias: o aumento dos casos de zika em relação a 2018 foi muito pequeno e a chikungunya registrou uma redução de 44%. Mas o rápido avanço da dengue é um sério desafio para as regiões mais afetadas, com destaque para o Estado de São Paulo. Enfrentá-lo não é tarefa fácil, porque depende da coordenação de esforços da União, dos Estados e dos municípios – que dividem as responsabilidades pelo combate à doença –, o que até agora, como mostra a experiência, não tem funcionado a contento. A gravidade da situação, porém, com o risco de a epidemia de dengue, ainda circunscrita, se alastrar, exige um esforço redobrado dos três níveis de governo.

O Estado de S. Paulo

Infraestrutura vergonhosa

A área com pior infraestrutura no País é o saneamento básico e, a depender do que tem sido feito nos últimos anos, o brasileiro terá de conviver com essa absurda realidade ainda por muitas décadas. No ritmo atual de investimento nessa área, o Brasil terá uma rede de cobertura nacional de água e esgoto apenas em 2060, informa estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Anualmente são investidos cerca de R$ 10 bilhões em ações de saneamento básico.

Trata-se de uma vergonha nacional. Quase metade da população do Brasil não tem acesso à coleta de esgoto. Ou seja, cerca de 100 milhões de pessoas vivem, em pleno século 21, em ambiente insalubre e totalmente vulnerável a doenças que poderiam ser facilmente evitadas. A falta de água tratada aumenta a incidência de infecções gastrointestinais, principalmente em crianças e idosos. No caso de ausência de rede de esgoto, além do aumento de infecções, verifica-se maior incidência de doenças transmitidas por mosquitos e animais.

Aprovado em 2014, o atual Plano Nacional de Saneamento Básico estabelece como meta a universalização do abastecimento de água até 2023 e o atendimento de 92% da população com rede de esgoto até 2033. Já se vê que não será cumprido, num grave risco de perpetuar números que são estarrecedores. Pelo menos 35 milhões de brasileiros vivem sem abastecimento de água encanada nas periferias do País. Realidade especialmente preocupante é o fato de que 2,1% da população não dispõe de nenhuma forma de esgotamento sanitário. Isso significa que cerca de 4,4 milhões de pessoas têm de defecar a céu aberto.

De cada 100 litros de esgoto lançados diariamente no meio ambiente, 48 litros não são coletados. Além disso, parte do esgoto coletado não é tratada. Estima-se que, por dia, 1,5 bilhão de metros cúbicos de esgoto coletado não é tratado.

É um erro pensar que essa lamentável situação seria o resultado das condições econômicas do Brasil, como se um país em desenvolvimento tivesse de conviver com essa carência de infraestrutura. No Chile, por exemplo, 99,0% das casas têm acesso à água e 99,1% dispõem de acesso ao serviço de esgoto. Na África do Sul, os porcentuais são de 93,2% e 66,4%, respectivamente. Não há desculpa para o Brasil seguir ostentando uma realidade tão lamentável.

Mesmo sendo insuficientes os investimentos feitos em infraestrutura de saneamento, a tendência recente é de queda nesses aportes. “O mais preocupante é que os investimentos caíram nos últimos dois anos”, alerta Ilana Ferreira, especialista em infraestrutura da CNI.

É urgente reverter esse quadro, seja por razões humanitárias básicas, seja pelos reflexos do saneamento no desenvolvimento econômico e social. A ONU reconhece que o acesso a uma rede de água e esgoto é um direito humano fundamental, decorrente da própria dignidade humana. Ninguém pode ser submetido a um tratamento desumano – e é desumano ter, por exemplo, de defecar a céu aberto.

São conhecidos também os ganhos econômicos e sociais proporcionados por uma infraestrutura de saneamento minimamente razoável. Os estudos destacam efeitos positivos especialmente nas áreas de saúde, educação, produtividade, turismo e valorização imobiliária. Ao listar as muitas evidências dos efeitos positivos do saneamento para a economia e a vida social, o Instituto Trata Brasil lembra, por exemplo, da correlação entre saneamento básico e aproveitamento escolar. Quem mora em residência sem acesso à água e ao serviço de coleta de esgoto tem, em média, uma escolaridade 25,1% menor do que aqueles que têm acesso integral ao saneamento. Exigir uma melhor educação de qualidade, ponto nevrálgico para o País, deve incluir também a preocupação com a urgente universalização da rede de água e esgotos.

O Brasil não pode esperar até 2060 para ter uma rede de cobertura nacional de água e esgoto. Os males e os custos de tal demora são muito grandes. Saneamento deve ser absoluta prioridade.

Folha de S. Paulo

Melhor o recuo

Bolsonaro decide que Jerusalém receberá só um escritório brasileiro, não a embaixada; antes uma promessa descumprida que o desatino diplomático

Dada a enrascada em que Jair Bolsonaro (PSL) meteu seu governo com a promessa de transferir para Jerusalém a embaixada brasileira em Israel, pode-se dizer que o presidente minimizou danos com a saída intermediária encontrada.

Ele decepcionou, decerto, os eleitores que esperavam uma anunciada reviravolta na política externa para o Oriente Médio. Já para os setores preocupados com a solidez da diplomacia nacional, o que se viu foi um sinal de sensatez quando o mandatário anunciou que abrirá apenas um escritório comercial na disputada cidade santa.

Em alguma medida, decerto, a providência desagradará a todos os lados. Israelenses e a base de apoio ideológico-religiosa do mandatário esperavam que a sede da representação passasse de Tel Aviv para Jerusalém, o que na prática significaria o reconhecimento da segunda como capital do Estado judeu.

Já entre países de maioria muçulmana, que ameaçaram boicotar a compra de carnes com o selo de pureza islâmica do Brasil, o protesto da Palestina ao convocar seu embaixador em Brasília para consultas tende a ecoar. Dos males o menor, de todo modo.

Prevaleceu o bom senso, mais uma vez atribuído à ala militar do governo, ainda que o escritório em si constitua uma esquisitice — trata-se de repartição normalmente adotada em países com os quais não se mantêm relações plenas.

O presidente sustenta que governos anteriores nutriram animosidades contra o Estado judeu, no que pode ter alguma razão. Ele erra, entretanto, ao concentraras críticas nas gestões petistas.

Foi Ernesto Geisel, presidente da ditadura admirada por Bolsonaro, quem tomou a mais dura medida contra Israel na história brasileira. Em busca de melhores relações com os árabes e maior autonomia em relação aos EUA, assinou em 1975 resolução equivalendo sionismo a racismo, só revogada pelas Nações Unidas em 1991.

Em 2010, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) emitiu uma nota de apoio ao estabelecimento do Estado palestino, num ato simbólico que estava longe de representar alguma guinada das posições brasileiras.

Dilma Rousseff, por sua vez, indispôs-se com o premiê Binyamin Netanyahu em 2015 ao recusar credenciais a um embaixador ligado a colonos judaicos na Cisjordânia.

Na essência, porém, as administrações mantinham-se fiéis à defesa feita no berço da crise israelo-palestina — a partilha de 1947 sob os auspícios da ONU em sessão conduzida pelo brasileiro Oswaldo Aranha. Desde então, a busca por uma solução de dois Estados e com status negociado para Jerusalém norteia o Itamaraty.

Equilíbrio e equidistância devem pautar, de fato, a atuação de um país em que convivem pacificamente comunidades árabes e judaicas. Antes o descumprimento de uma promessa impensada que a captura do comando da política externa por exotismos ideológicos.

Folha de S. Paulo

Sem saída

Plebiscito resultou em um impasse de elevado risco político e econômico

Há dois anos e nove meses, os britânicos decidiram, por 52% a 48% dos votos, deixar a União Europeia. Em vez de atenuar a divisão amarga do país, o plebiscito resultou em conflito ainda mais agudo e, neste momento, um impasse de elevado risco político e econômico.

Por três vezes, desde janeiro, a Câmara dos Comuns rejeitou propostas de acordo para o brexit negociadas entre a primeira-ministra conservadora, Theresa May, e a UE.

O Reino Unido deveria ter deixado o bloco na sexta-feira (29). Obteve-se um adiamento, mas, na falta de decisão até 12 de abril, haverá rompimento brusco e caótico.

O acordo em discussão trata apenas da primeira fase do divórcio. Define o rompimento político, obrigações financeiras e burocráticas e, na prática, estipula que as partes manterão uma união aduaneira. Apenas na fase de transição, que se encerraria no final de 2020, seriam negociadas novas relações.

Tanto trabalhistas como conservadores, os dois maiores partidos, estão divididos a respeito de como ou mesmo se deve ocorrer o brexit.

A ala mais radical dos correligionários de May quer rompimento quase total e imediato. A coalizão governista, ademais, depende do pequeno Partido Unionista Democrático, da Irlanda do Norte, que tem votado contra o acordo.

Desmoralizada, a primeira-ministra prometeu renunciar caso se aprove sua proposta. Foi até agora ignorada, e talvez não ocorra uma quarta votação. Em vez disso, em decisão rara, os parlamentares decidiram tirar a pauta legislativa do controle do governo. Agora tentam definir as opções a considerar.

As possibilidades incluem união aduaneira ou mesmo a permanência no mercado comum (o que prevê livre trânsito de pessoas), novas consultas populares ou a revogação do pedido de saída do bloco.

Os britânicos também podem pedir mais prazo para a decisão. Mas, na hipótese de novo adiamento, o Reino Unido teria de participar da eleição para o Parlamento Europeu, em maio. Teme-se que, assim, o conflito político nacional ficaria escancarado de modo crítico.

O plebiscito do brexit foi promessa eleitoreira dos conservadores, que procuravam explorar a insatisfação com a crise econômica e a imigração. A estratégia populista rendeu vitórias, mas o oportunismo político produziu longa crise.

Qualquer que venha a ser, o desfecho não agradará a quase metade do país e provocará alguma, se não grande, degradação econômica.