Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais (06/03/2023)
MANCHETES DA CAPA
O Globo
Tribunais de contas acumulam indicações de parentes de políticos
Juscelino Filho gera crise entre PT e União Brasil
Carlos Lupi – ‘Quero discutir a regra da pensão por morte’
Articulações para 2024 reproduzem polarização
Cresce a disputa por vagas de cotistas nas universidades
A volta do banho de mar em Paquetá
O Estado de S. Paulo
Demissão voluntária cresce e já significa 30% dos desligamentos
Busca por bem-estar e qualidade de vida
Pressão a servidor para liberar joias teve ligação de chefe da Receita
Sócio de Juscelino em haras é funcionário fantasma no Senado
Brasil deixa de ganhar 2 pontos no PIB por educação de má qualidade
Bancos miram inteligência artificial em análise de crédito
Tasso Jereissati – ‘Não veio um Lula Mandela, veio um Lula anti-Bolsonaro’
China anuncia aumento de 7% em gasto militar
Folha de S. Paulo
Desoneração da folha pode ser incluída na reforma
Outras joias escaparam do Fisco e chegaram ao Planalto
Fabiana Severi – Domínio de homens brancos no STF é insulto
SP fez só 2% das casas necessárias em São Sebastião
Projeto leva pessoas com deficiência para fazer trilha no Rio
Juro faz Tesouro Direto altrativo a investidores
Famílias aprovam óleo de câbanis para demência
Valor Econômico
Fazenda tem benefício no Carf com voto de minerva
MPF começa a apurar caso das joias de Michelle
Inflação de núcleo supera a dos ‘ricos’
Como cientistas viram gestoras
Historiador, CEO da Previ cria polêmica
México sai na frente no ‘nearshoring’
A difícil busca de consenso na reforma
EDITORIAIS
O Globo
PGR virou anexo do Planalto na gestão Bolsonaro
Levantamento do GLOBO revelou que procuradores atenderam interesses do presidente em 95% das manifestações
O ex-presidente Jair Bolsonaro não pode reclamar da Procuradoria-Geral da República (PGR) em seu governo. Liderada por Augusto Aras, ela serviu de barreira às acusações contra ele próprio e seus filhos, quase sempre alinhada com a defesa deles.
Levantamento do GLOBO no Supremo Tribunal Federal (STF) revelou números eloquentes. De 186 peças analisadas, a PGR pediu a extinção de 134 e acatou sem recorrer a decisão do próprio STF de extinguir outras 32. Houve ainda dez iniciativas para retirar ações da esfera do ministro Alexandre de Moraes, desafeto do bolsonarismo. Ao todo, em 95% das manifestações a PGR atendeu a interesses de Bolsonaro, seja para arquivar processos, seja para ajudar a família.
Ficou evidente a paralisia da PGR na gestão da pandemia por Bolsonaro. Por leniência do Planalto, o país atrasou a importação das primeiras levas de vacinas. Um terço das tentativas de processar o presidente por falhas no enfrentamento da Covid-19 foi objeto de pedidos de arquivamento por parte da PGR. Em despacho de outubro de 2020, Aras argumentava contra as conclusões que já eram consenso entre cientistas. “Autoridades em matéria sanitária divergem sobre várias questões, tais como eficácia do isolamento social e imunidade coletiva”, escreveu.
Não havia divergência alguma a respeito desses temas no meio científico nacional e internacional. O isolamento de infectados era, e ainda é, adotado para deter a propagação do vírus. Quanto à referência à “imunidade coletiva”, Aras dava respaldo à tese estapafúrdia de que quanto mais infectados houvesse, melhor, pois seria maior a imunidade. Tivesse sido essa a política adotada, a letalidade do vírus, que no Brasil já matou 700 mil pessoas, levaria a um morticínio ainda maior induzido pelo governo.
Os ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas, tentativa de contestar o resultado das eleições em caso de derrota, também receberam proteção na PGR. Em junho do ano passado, ao determinar o arquivamento de uma notícia-crime contra Bolsonaro pela campanha mentirosa contra o sistema de votação, a vice-procuradora geral da República, Lindôra Araújo, deixou registrado que as declarações eram “mera crítica” e estavam “amparadas pelo princípio da liberdade de expressão”.
Os fatos demonstraram o absurdo dessa posição. Atrás dos ataques às urnas eletrônicas, escondia-se a conspiração golpista que culminou nos ataques do 8 de Janeiro em Brasília. Só depois de Bolsonaro deixar a Presidência, diante do vandalismo e da violência, o subprocurador Carlos Frederico Santos, indicado por Aras para tratar do caso, incluiu Bolsonaro entre os “instigadores e autores intelectuais dos atos antidemocráticos”.
Aras foi escolhido por Bolsonaro para a PGR fora da lista tríplice que a Associação Nacional dos Procuradores da República apresenta à análise do presidente, prática que tenta garantir um mínimo de independência ao escolhido. Lula já declarou que, quando for escolher o nome do novo procurador-geral, em setembro, não se limitará à lista tríplice. O maior desserviço à democracia que poderá prestar será repetir o que fez Bolsonaro e tentar transformar a PGR em um anexo do Planalto.
O Estado de S. Paulo
Da corrupção miúda às joias milionárias
Suspeita de que Bolsonaro tentou contrabandear joias reforça o padrão de um político cujo clã, famoso pelas rachadinhas, vê o Estado como repartição a serviço de seus interesses privados
A conjugação virtuosa do senso de dever de servidores da Receita Federal e do esforço de reportagem deste jornal deu ao País mais uma razão para acreditar que raros foram os presidentes que marretaram com tamanha violência os pilares que sustentam esta República como o sr. Jair Messias Bolsonaro.
Na sexta-feira passada, o Estadão revelou que o ex-presidente tentou de tudo, até a undécima hora do mandato, para fazer entrar no País, ilegalmente, um conjunto de joias da grife suíça Chopard avaliado em € 3 milhões, o equivalente a R$ 16,5 milhões. O pacote, contendo colar, brincos, relógio e anel cravejados de diamantes, seria um “presente” oferecido pela ditadura da Arábia Saudita à então primeira-dama, Michelle Bolsonaro, em outubro de 2021.
Ao longo de um ano e dois meses, Bolsonaro tentou liberar essas joias mobilizando nada menos que três Ministérios – Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores –, além de outras instituições de Estado. O ex-presidente pressionou a cúpula da Receita Federal, que, para o bem do País, respaldou o comportamento republicano de seus servidores no aeroporto de Guarulhos. Protegidos pela estabilidade constitucional para dizer “não” até mesmo ao presidente da República quando ele quer se desviar da lei, eles confiscaram as joias.
Toda essa frenética movimentação de Bolsonaro para liberar os diamantes reúne fortes indícios de tentativa de contrabando, razão pela qual a Receita não realizou o leilão das joias, que agora servem de prova. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, determinou a instauração de inquérito pela Polícia Federal para apurar esse e outros crimes que possam ter sido cometidos com o objetivo de, ao que tudo indica, levar aquele pequeno tesouro até a família do ex-presidente às escondidas.
Do início ao fim, a jornada dessas joias rumo ao Brasil esteve eivada de mistérios e ilegalidades. Afinal, a que título a ditadura saudita teria sido tão generosa com Bolsonaro? Se o objetivo não era reter para si o presente milionário, por que o ex-presidente, como manda a lei, não determinou que as joias fossem declaradas como patrimônio da União?
Os diamantes poderiam ter passado facilmente pelo controle alfandegário caso fossem declarados como presente de um Estado estrangeiro ao governo brasileiro. Por lei, teriam sido considerados patrimônio da União e seguiriam para o acervo da Presidência sem obstáculos, livre de impostos. Mas há fortes razões para crer que Bolsonaro queria as joias para si, o que implicaria o pagamento de cerca de R$ 12,3 milhões em tributos de importação pessoal.
O pagamento desses tributos, por óbvio, era algo inimaginável em se tratando de alguém como Bolsonaro, que se notabilizou por explorar o Estado como plataforma para o enriquecimento pessoal. A família Bolsonaro, no que concerne à sua vida pública, foi forjada pela corrupção miúda das “rachadinhas”, pelas fraudes na prestação de contas de verbas de gabinete, pela compra de dezenas de imóveis em dinheiro vivo, pelo depósito de cheques suspeitos nas contas de Michelle Bolsonaro, entre tantos outros escândalos. Um possível contrabando milionário seria apenas mais um risco nesse “bingo” de malfeitos.
Para evitar o pagamento dos tributos, as joias foram escondidas na mochila de um assessor do então ministro de Minas e Energia do governo Bolsonaro, o almirante de esquadra Bento Albuquerque, que viajara a Riad para representar o Brasil na cúpula “Iniciativa Verde do Oriente Médio”. A manobra sub-reptícia, no entanto, não resistiu ao raio X e ao espírito público dos servidores da Receita Federal em Guarulhos, que apreenderam o pacote. Prestando-se a um papel indigno de sua patente, Bento Albuquerque ainda tentou pressionar os servidores mencionando que a destinatária daqueles diamantes era a primeira-dama.
De modo paradigmático, esse caso dos diamantes revela como Bolsonaro enxerga a natureza das instituições de Estado, o exercício do poder e a relação com servidores, civis ou militares. Tudo é uma mixórdia a serviço de seus interesses privados.
Espera-se dos responsáveis pela investigação desse caso escabroso o mesmo espírito público que norteou a atuação dos bravos servidores da Receita Federal.
Folha de S. Paulo
A hora da reforma
Lula deve usar seu poder de convencimento para avançar o redesenho dos impostos
Após dois meses de governo, passa da hora de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixar em segundo plano os discursos inflamados e divisivos. Cumpre trabalhar com afinco nos temas essenciais para a retomada do crescimento econômico e a melhoria das condições de vida da população.
Houve um ou outro progresso nas últimas semanas em áreas pouco controversas. É positivo, por exemplo, que o programa Bolsa Família comece a voltar aos trilhos, com revisão do cadastro para combate a fraudes, diferenciação de valores do benefício a depender do tamanho da família e o retorno de contrapartidas, como mandam as boas práticas.
Entretanto a retomada da economia dependerá do sucesso em fazer avançar reformas essenciais, como a tributária. Eis um campo minado desde sempre por interesses setoriais e federativos diversos, que há décadas travam qualquer tentativa de mudança.
Para vencer as resistências e convencer a sociedade de que as alterações são necessárias, não bastará o Ministério da Fazenda lutar sozinho no Congresso. É preciso que o presidente da República deixe claro se tratar de sua prioridade política e que se engaje pessoalmente no avanço da pauta.
Mais ainda no contexto atual, em que não se tem clareza da solidez da base de apoio parlamentar, a ser testada na prática.
Quanto mais Lula insistir numa atuação teatral, como se ignorasse a realidade do governo, mais distanciará outros atores políticos de seu projeto —se é que há um.
A reforma é complexa e suscita controvérsia sempre que o debate desce aos detalhes. Nos últimos anos, ao menos, cresceu o alinhamento político em torno de sua primeira fase —a que simplifica e moderniza a cobrança dos impostos sobre bens e serviços.
Já há boa compreensão de parlamentares sobre as vantagens da unificação dos cinco tributos atuais (PIS/Confins, IPI, ICMS e ISS) num novo imposto cobrado sobre uma base de incidência ampla e no local de consumo.
Outra boa notícia é o destaque dado ao tema nas falas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do vice-presidente, Geraldo Alckmin. Resta Lula, de inegável capacidade de comunicação e negociação, entrar em campo.
É necessário engajar governadores e prefeitos, superando as resistências federativas. Há que vencer as objeções setoriais, concentradas nos serviços e no agronegócio.
Se o presidente quer restaurar o crescimento sustentável, como diz, a reforma tributária é a agenda positiva mais ao alcance da administração petista. Nela, as tertúlias ideológicas pesam menos que o esclarecimento da sociedade.