Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais (02/09/2022)
MANCHETES DA CAPA
O Globo
Consumo impulsiona PIB, que sobe 1,2% no 2º trimestre
Lula tem 45%; Bolsonaro, 32%; Ciro, 9%; e Tebet, 5%
A um mês da eleição, 804 mil famílias a mais em auxílio
PF vê indícios de que ex de Bolsonaro usou laranja para financiar mansão
Alvo de operação policial, Washington Reis deve deixar chapa de Castro
MP investiga funcionários fantasmas na prefeitura do Rio
Arma falha em atentado contra Cristina Kirchner
O Estado de S. Paulo
PIB cresce 1,2% no trimestre e melhora expectativa para ano
Ciro e Tebet sobem e chance de decisão no 1º turno cai, diz Datafolha
Eleitor terá de deixar celular com mesário para votar, decide TSE
Amazônia tem recorde de queimadas e pior agosto em 12 anos
Governo determina suspensão de venda de cigarro eletrônico
MP aprovada pela Câmara pode encarecer conta de luz
Brasileiro aponta arma para Cristina Kirchner
Folha de S. Paulo
Lula tem 45% e Bolsonaro, 32%; Ciro chega a 9%, e Tebet, a 5%
PIB supera expectativas e avança 1,2% no segundo trimestre
Campanha petista fará ofensiva para tentar evitar segundo turno
Eleitor que não deixar celular com mesário não votará, diz TSE
Haddad lidera com 35%; Tarcísio sobe a 21%, Rodrigo, a 15% em SP
Governo deva dar auxílio a mais 804 mil famílias
Petrobras reduz hoje preço da gasolina em 7%
Órgão determina suspender cigarro eletrônico no Brasil
Brasileiro tenta atirar em Cristina Kirchner
Valor Econômico
Com impulso do governo e reabertura, PIB tem alta forte
Cenário para 2023 segue desanimador
Pela 4ª vez, Petrobras reduz preço da gasolina
Datafolha traz Lula com 45% após debate e Bolsonaro, 32%
Correio Braziliense
Ayres Britto – ‘O país está num cabo de guerra permanente’
PIB tem nova alta, de 1,2%, e supera previsões
Eleitor não pode levar celular à cabine de votação
Ciro ataca polarização e critica Lula e Bolsonaro
Negros são maioria entre os 881 candidatos do DF
Gasolina – Petrobras volta a reduzir preço
Auxílio – Guedes garante pagar R$ 600
Brasileiro tentou matar Cristina Kirchner
EDITORIAIS
O Globo
Manutenção de emendas do relator deteriora Orçamento de 2023
Na proposta enviada por Bolsonaro ao Congresso, R$ 19,4 bilhões serão gastos sem critério nem transparência
É um absurdo o presidente Jair Bolsonaro ter mantido as emendas do relator, conhecidas pela sigla RP9, na proposta de Orçamento da União de 2023 enviada na quarta-feira ao Congresso. Pior foi ter repetido o erro de prever para esse fim mais do que a soma das demais emendas. Bolsonaro reservou R$ 38,7 bilhões aos parlamentares, dos quais R$ 19,4 bilhões abastecerão as emendas RP9, que deram origem ao famigerado orçamento secreto. São gastos destinados a fins paroquiais, feitos sem critério nem transparência, flanco aberto à corrupção.
A aberração das emendas do relator retirou do Executivo a capacidade de comandar as políticas públicas, como escreveu o colunista do GLOBO Merval Pereira. Quase R$ 20 bilhões do Orçamento vão parar nas mãos de deputados e senadores da base de apoio do governo para que gastem como bem entenderem, segundo tão somente os seus interesses políticos, quando não pecuniários.
O dinheiro não vai para os brasileiros que mais precisam. Recebem aqueles que moram no reduto eleitoral do congressista do governo agraciado. Na maior parte das vezes, o investimento vai na contramão de uma estratégia sensata para os estados, para as regiões, para o país. Não têm sido raras as denúncias e evidências de pura roubalheira, casos que ainda esperam apuração rigorosa.
Enfraquecido e preocupado com a possibilidade de perder o mandato por impeachment, Bolsonaro comprou o apoio do Centrão transferindo aos líderes do Congresso o controle sobre uma vultosa fatia do Orçamento. Tal decisão é a culminação de um problema antigo. No sistema político brasileiro, um presidencialismo multipartidário, quando quem está à frente do Executivo é ou fica fraco, o preço cobrado pelo Legislativo sobe.
Quando estava em situação de extrema vulnerabilidade, a presidente Dilma Rousseff atendeu a uma demanda histórica dos congressistas. Eles reclamavam do poder do governo de contingenciar suas emendas. Para liberar a execução, tinham de ir em romaria aos ministérios e quase implorar. Dilma abriu mão da discricionariedade na execução das emendas individuais. Não foi suficiente para que escapasse do impeachment, mas serviu para erodir o poder de barganha do Executivo. Para satisfazer a sanha dos congressistas, Bolsonaro teve de ir além. Abriu mão também da transparência e do controle sobre a execução.
Talvez a única boa notícia sobre as emendas do relator seja que o próximo presidente não é obrigado a mantê-las. O difícil será convencer os congressistas. Se perderem o orçamento secreto, muitos poderão partir para a retaliação. O principal adversário de Bolsonaro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também se mostrou um gerente sofrível de coalizões, como comprovaram os casos do mensalão e petrolão. Seja quem for o eleito em outubro, a questão continua à espera de uma solução que preserve a transparência e a qualidade do gasto público. Com quase R$ 20 bilhões em emendas do relator, ambas são impossíveis.
O Estado de S. Paulo
Bolsonaro deve explicações
A compra de imóveis em dinheiro vivo costuma servir à lavagem de dinheiro. A família Bolsonaro comprou 51 imóveis em dinheiro vivo. Está claro que o presidente deve explicações
O governo Bolsonaro tem problemas sérios envolvendo corrupção e gestão obscura de recursos públicos, com destaque para negociações suspeitas de vacina anti-covid, pedidos de dinheiro por pastores evangélicos no Ministério da Educação e, principalmente, o orçamento secreto – que cria as condições ideais para o florescimento da corrupção, por permitir gastos sem transparência e sem critério. Tudo isso é rigorosamente contrário à promessa de Jair Bolsonaro de combate implacável à corrupção. No entanto, há algo ainda mais explicitamente avesso à moralidade pública e diretamente relacionado ao presidente da República: o sistema metódico de compra de imóveis com o uso de dinheiro vivo da família Bolsonaro.
O caso é gravíssimo e deveria merecer mais atenção dos eleitores brasileiros. Afinal, o Brasil aprovou a Lei da Ficha Limpa, de iniciativa popular, justamente porque a sociedade se cansou de políticos delinquentes. Está claro que Bolsonaro precisa explicar a origem dos milhões de reais em dinheiro que ele e sua família conseguiram movimentar na negociação de dezenas de imóveis, aparentemente sem ter renda suficiente que a justifique.
O site UOL revelou que, desde os anos 90, o presidente, seus irmãos e seus filhos negociaram 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com o uso de dinheiro vivo. Em valores corrigidos pelo IPCA, o montante pago em dinheiro vivo equivale a R$ 25,6 milhões.
Não é crime comprar um imóvel usando dinheiro vivo. Mas essa modalidade de pagamento, especialmente se é recorrente, consiste em forte indício de lavagem de dinheiro. É justamente um dos crimes pelos quais o ex-presidente Lula da Silva foi condenado no caso do triplex do Guarujá. O crime de lavagem de dinheiro consiste em “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”. Uma vez que o dinheiro vivo não tem rastreabilidade, seu uso é muito propício para ocultar ou dissimular a real origem de determinado recurso.
Quando veio à tona que a família Bolsonaro comprou 51 imóveis envolvendo pagamento em dinheiro vivo, o presidente não contestou o dado. Limitou-se a perguntar, com sua habitual truculência: “Qual o problema comprar com dinheiro vivo algum imóvel?”.
Ora, não foi apenas “algum imóvel”. Foram 51. E tudo fica ainda mais suspeito quando se toma conhecimento de que as declarações de bens e renda da família Bolsonaro entregues à Justiça Eleitoral, como revelou o Estadão, não indicam guarda de dinheiro em espécie em casa. De 1998 até agora, apenas o filho Carlos informou ter guardado R$ 20 mil em espécie por ao menos oito anos.
Tudo isso é escandaloso – e demanda pronto e inequívoco esclarecimento. Os mesmos eleitores que, com razão, cobram de Lula da Silva explicações sobre os casos cabeludos de desvio de recursos públicos nos governos do PT devem exigir de Bolsonaro que explique qual foi a mágica financeira que permitiu que ele e seus filhos parlamentares, cujos salários não superam R$ 40 mil brutos, fossem capazes de movimentar milhões de reais no ramo imobiliário, e tudo em cash.
Nem Bolsonaro nem seus filhos foram capazes, até agora, de esclarecer os muitos indícios da prática de rachadinha (apropriação de salários de assessores parlamentares) por parte do clã. Ou seja, há a suspeita de ocultação da origem de bens (pelo uso de dinheiro vivo na compra de 51 imóveis) e, ao mesmo tempo, há a suspeita da origem ilícita desses recursos (a rachadinha), elementos do crime de lavagem de dinheiro. Por muito menos, e com base em indícios muito mais frágeis, inúmeras pessoas foram denunciadas e chegaram a ser presas na época da Lava Jato.
Como candidato à reeleição e, sobretudo, como candidato que se apresenta como incorruptível, Bolsonaro tem o dever de esclarecer a origem desses recursos. Quem quer ser (ou continuar a ser) presidente da República não pode deixar dúvidas sobre sua honestidade, ainda mais quando se está diante de suspeitas de lavagem de dinheiro.
Folha de S. Paulo
Acima do esperado
PIB mostra vigor no 2º trimestre, mas permanecem incertezas em relação a 2023
O crescimento do Produto Interno Bruto novamente superou expectativas. A alta de 1,2% no segundo trimestre do ano, divulgada nesta quinta (1º), já permite antever crescimento acima de 2,5% neste ano.
A se confirmar tal prognóstico, será o melhor desempenho desde 2013 —sem incluir na conta o ano atípico de 2021, que marcou a recuperação do impacto da pandemia. Também relevante, a produção no segundo trimestre superou em 3% o patamar imediatamente anterior à crise sanitária, quase retomando o pico da série histórica, observado no início de 2014.
A demanda interna teve expansão robusta e disseminada, que deve se manter por algum tempo. O consumo aumentou 2,6% e os investimentos também surpreenderam, com alta de 4,8%. Do lado da oferta, nota-se dinamismo na indústria (2,2%) e nos serviços (1,3%).
Além da retomada de atividades direcionadas às famílias, na continuidade da abertura pós-pandemia, há inúmeros fatores que contribuem para o momento positivo. Preços de matérias-primas ainda elevados e a boa safra ampliaram a renda do agronegócio, que no conjunto perfaz cerca de 25% do PIB.
A retomada do emprego é outro vetor importante. Embora a renda do trabalho no trimestre encerrado em julho esteja ainda 2,9% abaixo do mesmo período de 2021, a taxa de desocupação caiu a 9,1%, menor nível desde 2015.
Com isso, a massa salarial se expande cerca de 6,1% no período, o suficiente para manter o ânimo do consumo, que deve ganhar algum fôlego extra com a entrada do Auxílio Brasil de R$ 600 mensais para cerca de 21 milhões de beneficiários.
Também há o impacto positivo da redução da inflação, ainda que por ora concentrado nos combustíveis —proporcionado por cortes de impostos federais e estaduais.
Para 2023, contudo, o cenário é mais duvidoso. Além das dificuldades no âmbito internacional, como juros em alta no mundo desenvolvido e conflitos geopolíticos, há enorme incerteza em relação à política econômica do próximo governo — qualquer que seja o vencedor da eleição presidencial.
Novas temeridades na gestão do Orçamento podem trazer impacto negativo nas variáveis financeiras, como taxas de câmbio e juros.
A política monetária contracionista para combater a inflação terá peso crescente adiante. Juros básicos em 13,75% ao ano são escorchantes para padrões históricos e devem conter a demanda por crédito e o ímpeto do consumo. O aumento recente da inadimplência também é um sinal de alerta.
O PIB traz alívio, enfim, mas não significa que estão superadas as fragilidades da economia nacional.
Valor Econômico
Desempenho da economia pode suavizar desaceleração
Com impulsos fiscais e parafiscais já dados, e outros que possam vir, a desaceleração esperada para o 3º trimestre pode ser amenizada
A economia brasileira cresceu mais do que o previsto no segundo trimestre do ano (1,2%) em relação ao primeiro trimestre, que teve sua taxa revista para cima (1,1%). A remoção de entraves não econômicos à expansão, o passado, explica parte da recuperação – o arrefecimento da pandemia e praticamente o fim das restrições às atividades presenciais, o que liberou a energia do setor de serviços, que compõe 70% do PIB. A outra parte diz respeito ao presente: o ano eleitoral e as estratégias de gastos dos governantes para se manterem no poder.
O setor de serviços, pelo lado da oferta, recuperou sua expansão e mantém um ritmo de atividade já razoavelmente superior ao de antes da pandemia. O fim dos obstáculos à mobilidade fez com que a rubrica “outras atividades de serviços”, onde entram aquelas mais diretamente dependentes de salários e proximidade física, se destacassem em crescimento por qualquer padrão de comparação: de um trimestre contra o anterior, ante o mesmo período do ano passado ou o acumulado em quatro trimestres. Sem a plena mobilidade não haveria esta expansão. Sem o aumento do consumo das famílias, também não.
O consumo das famílias deu um salto de 2,6% no segundo trimestre e de 5,3% em relação ao mesmo período do ano passado. Foi nesse trimestre que o desemprego caiu com mais força (a 9,1%) e, em consequência, que a massa salarial aumentou com força, ainda que os salários continuassem caindo. A oferta de crédito, apesar da elevação da taxa de juros e da alta da inadimplência, seguiu aumentando em dois dígitos.
O calendário político deu um estímulo considerável ao consumo das famílias, que em valores atingiu o maior ponto da série com ajuste sazonal com valores a preços de 1995 (comparação até 2010). O fim do auxílio emergencial, criado na pandemia, reduziu o avanço do consumo no primeiro trimestre do ano em relação ao anterior, mas o governo promoveu nova liberação emergencial do FGTS (R$ 30 bilhões) e outra antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas (R$ 56 bilhões). A preços correntes, isto explica em parte o aumento das despesas de consumo do primeiro trimestre (R$ 1,406 trilhão) para o segundo (R$ 1,490 trilhão).
O arsenal eleitoral do governo não se esgotou e o Auxílio Brasil, que começou a ser pago em agosto, levará para a economia mais R$ 60 bilhões, ou cerca de R$ 40 bilhões a mais do que os recursos que já circulariam em decorrência do Bolsa Família, cujo valor médio era um terço de seu substituto. Estimularão ainda indiretamente o consumo a remoção federal dos impostos sobre combustíveis (R$ 52 bilhões em um ano) e a redução das alíquotas de ICMS sobre itens essenciais, como transportes, telecomunicações e combustíveis (cerca de R$ 65 bilhões em um ano).
No bom desempenho da economia do trimestre influíram ainda o aumento de 4,8% do investimento (formação bruta de capital fixo), impulsionado pela expansão forte da construção (2,7% no trimestre, 9,9% ante o mesmo trimestre de 2021). Eles se beneficiaram dos gastos feitos por Estados e municípios, repletos de recursos em caixa. A maior parte dos governadores tenta agora a reeleição.
A grande valorização das cotações das commodities ajudou a movimentar a economia e empurrar para cima a contribuição da agricultura, prejudicada por adversidades climáticas, que ficaram para trás (o setor avançou 0,5% no segundo trimestre, ainda assim, menos que os demais componentes da oferta, como indústria e serviços).
Maiores cotações de produtos exportados pelo país e desvalorização do real não produziram, no entanto, um impulso do setor externo à economia. As importações cresceram e as exportações recuaram no segundo trimestre. Segundo o economista Alberto Ramos, diretor de pesquisa para a América Latina do Goldman Sachs, a demanda externa reduziu o PIB em 1,34 ponto percentual. Esse resultado foi amenizado pela expansão de 2,5% da demanda final doméstica.
As revisões do PIB de 2022 entraram, então, em alta, para perto dos 3%. Se não houver crescimento no segundo semestre, o PIB fechará o ano em 2,6%. Não se descarta que, com impulsos fiscais e parafiscais já dados, e outros que possam vir, a desaceleração esperada para o 3º trimestre seja postergada ou amenizada. A queda da inflação, além disso, pode dar novo alento ao consumo, assim como os salários, que ensaiam uma recuperação.
Correio Braziliense
O agro avança, água recua
O encolhimento da superfície alagada e o avanço da agropecuária coincidem ainda com a constatação de que o Brasil perdeu 13,1% de vegetação nativa
Ao mesmo tempo em que o governo brasileiro e os produtores rurais fazem projeções otimistas para a safra 2022/2023 — a soja, por exemplo, tem perspectiva de recorde na produção, com estimativa de 150,36 milhões de toneladas e aumento de 3,54% na área cultivada, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) —, uma equação não fecha no país do agronegócio. Parafraseando a constatação de um dos presidentes da ditadura militar ao avaliar o contraste de então entre os bons indicadores da economia e a má situação da população, no cenário atual a agropecuária vai bem, mas a terra e os biomas que a sustentam vão mal.
É o que aponta a iniciativa MapBiomas, formada por uma rede de universidades, startups de tecnologia e ONGs, ao lançar nova edição dos mapas anuais de cobertura e uso da terra do Brasil, feita a partir de imagens de satélite. Mapeando um período de 37 anos, os estudos demonstram que o espaço ocupado pela agropecuária aumentou no período de 21% para 31% do território nacional, com avanço de 228% das zonas de agricultura, representado pelo acréscimo de 43,6 milhões de hectares de cultivo.
Quando se considera o avanço das pastagens para gado de leite e de corte, o acréscimo em todo o país entre 1985 e 2021 foi de 42,2 milhões de hectares, o que representou avanço de 39% da área destinada à pecuária, aponta o MapBiomas. Vale destacar que, embora, o avanço da agricultura tenha sido percentualmente muito mais significativo e os aumentos de territórios usados para plantio e para criação tenham sido parecidos em números absolutos, a área ocupada por rebanhos no país ainda é incomparavelmente maior: são 151 milhões de hectares (17,77% do território nacional), contra 62,7 milhões de hectares de plantio (7,4% do mapa do Brasil).
Observados desse ponto de vista, os números não parecem ruins. Afinal, o crescimento da população, não apenas no país, mas em nível planetário, justifica a necessidade de avanço da produção, e ele só ocorre com o aumento do cultivo e da criação de gado. De outro lado, mais lavouras e pastagens significam aumento das exportações, suporte para a balança comercial e incremento no Produto Interno Bruto (PIB).
O lado mais preocupante do estudo, no entanto, aparece no momento em que o MapBiomas verifica o resultado de todo o avanço do agronegócio — somado, claro, às demais atividades econômicas — sobre um elemento que é fundamental tanto para o plantio, quanto para a criação, sem contar a manutenção de todas as espécies, incluindo a humana: a água. Considerados apenas os últimos 30 anos, a constatação foi que a superfície de água no país recuou assustadores 17,1%. Não é preciso ser especialista para intuir que é impossível equacionar de forma sustentável a multiplicação das lavouras e das cabeças de gado, associada ao recuo na disponibilidade de recursos hídricos. A conta, é evidente, não fecha.
O encolhimento da superfície alagada e o avanço da agropecuária coincidem ainda com a constatação de que o Brasil perdeu 13,1% de vegetação nativa, entre florestas, savanas e outras formações não florestais, apenas entre 1985 e o ano passado, segundo o estudo. Nessas menos de quatro décadas, apontam os dados, as alterações causadas pelas ações humanas correspondem a um terço da área modificada pelo homem ao longo de toda a história do país. Foi um tempo em que 23 estados perderam áreas naturais, enquanto apenas três se mantiveram estáveis e somente um, o Rio de Janeiro, teve recuperação.
Enquanto se observa no mapa o avanço nítido na degradação do Sul em direção ao Norte ao longo das décadas, um alento do estudo do MapBiomas vem da constatação de que o país ainda conserva 66% de cobertura vegetal nativa. Ainda que 37 anos atrás essa cobertura fosse de 76%, os dados mostram que há muito a se preservar, e que é urgente avaliar como a ocupação e uso do solo avançou nos últimos anos para fazer frente ao desafio urgente de compatibilizar o avanço da produção, que é necessário, com a conservação de biomas, que já não é apenas indispensável — é questão de sobrevivência.