Senadora diz que o machismo estrutural na política não é diferente e que mesmo sendo maioria na população, as mulheres ocupam espaços ínfimos no poder (Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)
Em declaração ao Correio Braziliense na matéria publicada pelo jornal (veja aqui e abaixo) nesta segunda-feira (15) sobre os motivos da baixa representatividade feminina na política que aponta, inclusive, a ausência de pré-candidatura de mulheres à Presidencia de República em 2022, a senadora Leila Barros (Cidadania-DF) disse disse ‘não ter dúvidas de que a política é mais difícil para mulheres’ do que para os homens. Para ela, é preciso ter mais mulheres na política para que pautas de igualdade de gênero avancem no Congresso Nacional.
Em patamares globais, o Brasil está na posição 142 no ranking de mulheres nos parlamentos nacionais, conforme indica a plataforma IPU Parline. Das 513 cadeiras da Câmara dos Deputados, por exemplo, 77 são ocupadas por deputadas. Isso representa 15% da composição parlamentar. No caso do Senado, das 81 vagas, 14 são preenchidas por senadoras (17,2%).
A parlamentar, eleita senadora pelo Distrito Federal em 2018, afirmou na entrevista que a diferença de tratamento dispensado as mulheres começa antes mesmo da corrida eleitoral.
“Há uma expectativa diferente quando nós, mulheres, optamos por entrar na política. Os questionamentos que são feitos a nós não são os mesmos feitos aos homens. Infelizmente, muitas vezes, a candidata não é nem levada a sério”, criticou.
Leila Barros disse ao Correio Braziliense que, no caso dela, o fato de ter sido jogadora de vôlei fez com que enfrentasse um machismo ainda maior.
“Tenho um imenso orgulho da minha trajetória e muita gratidão por tudo o que minha carreira como atleta me proporcionou. Mas na campanha, como mulher e atleta, sofri um duplo preconceito, com inúmeros ataques de natureza machista. A minha resposta foi dada com muito trabalho, e o resultado veio nas urnas”, destacou.
Machismo estrutural
Para Leila Barros, o machismo é estrutural e cultural em toda sociedade, e na política não é diferente. Ela lembrou que, mesmo sendo maioria na população, as mulheres ocupam espaços ínfimos no poder.
“O Congresso Nacional é um reflexo atenuado da triste realidade brasileira. Somos poucas senadoras, mas estamos dispostas a batalhar pelo nosso espaço e pelo respeito que merecemos”, sustentou.
Na opinião da senadora, é preciso ter mais mulheres na política para que pautas de igualdade de gênero avancem no Congresso e, consequentemente, a representatividade feminina aumente dentro desse espaço.
“Há interesses que só conseguem ter relevância e voz quando há representatividade. Com mais mulheres na política, nossa voz será naturalmente mais ouvida nos debates dos rumos da Nação. Podemos fazer com que as pautas femininas avancem no ritmo que almejamos”, justificou.
Acesso restrito: Lista de pré-candidatos à Presidência não conta com nome feminino
Num exemplo da baixa representatividade feminina na política, a lista de pré-candidatos à Presidência só tem homens. Único nome ventilado entre as mulheres é o da senadora Simone Tebet, que ainda não se lançou como concorrente
*João Vitor Tavarez, Bernardo Lima – Correio Braziliense
Às portas de mais uma eleição presidencial, somente homens aparecem como pré-candidatos à corrida pelo Palácio do Planalto. Entre as mulheres, o nome mais ventilado é o da senadora Simone Tebet (MDB-MS), que ainda não se lançou como postulante ao cargo. A dominação masculina no pleito é um fenômeno antigo, e a única que conseguiu furar essa bolha foi Dilma Rousseff, que, no entanto, acabou apeada do poder no início do seu segundo mandato.
Desde o período da redemocratização do país, sete mulheres se candidataram à Presidência da República. A pioneira foi a advogada Lívia Maria Ledo Pio de Abreu, que concorreu ao posto pelo Partido Nacionalista em 1989 — Fernando Collor de Mello acabou eleito, vencendo outros 24 concorrentes. As outras candidatas foram Thereza Ruiz (1998), Ana Maria Rangel (2006), Heloísa Helena (2006), Marina Silva (2010 e 2014), Luciana Genro (2014) e Dilma (2010 e 2014).
“Há diferença, sim, entre homens e mulheres na disputa pela presidência. E isso é um fato histórico, vendo o nosso patriarcalismo”, afirmou Rócio Stefson, cientista político e diretor da Royal Consultoria e Marketing Político. Ele ressaltou que os partidos são “machistas” e não abrem oportunidades para mulheres em hipótese alguma, principalmente quando elas tentam disputar a cadeira presidencial com outro homem.
“Na maioria das vezes, mulheres são colocadas para cumprir cotas de gênero. Algumas estão na política para preencher vagas dos nichos masculinos, representando marido, tio, pai ou avô. Mas esse quadro está mudando. Mulheres estão se candidatando mais”, disse.
Sobre o impeachment de Dilma, o especialista destacou que tentaram fixar nela a imagem de alguém que não teve competência no cargo. “O fato é que Dilma era gerente e ex-técnica e não tinha articulação dentro do Congresso, o que a impedia de prosseguir com as políticas públicas necessárias”, avaliou.
Conforme destacou Stefson, no presidencialismo de coalizão — quando o presidente da República faz negociações com parlamentares —, se não houver contato entre o chefe do Executivo e o Congresso, não é possível administrar a máquina pública. “Dilma fez uma excelente administração, mas foi barrada por não saber fazer articulação”, avaliou.
Em patamares globais, o Brasil está na posição 142 no ranking de mulheres nos parlamentos nacionais, conforme indica a plataforma IPU Parline. Das 513 cadeiras da Câmara dos Deputados, por exemplo, 77 são ocupadas por deputadas. Isso representa 15% da composição parlamentar. No caso do Senado, das 81 vagas, 14 são preenchidas por senadoras (17,2%).
Nesse ranking, o primeiro lugar é ocupado por Ruanda, na África, onde o percentual de mulheres no parlamento é de 61,2% (Câmara inferior ou única). Isto é, dos 80 assentos no parlamento ruandês, 49 são ocupados por representantes do sexo feminino.
A doutora em ciência política Carolina Botelho explicou que a falta de representatividade feminina na política reflete o que ocorre na coletividade. “São várias camadas de resposta para essa questão. Vivemos em uma sociedade que não tem incentivo a mulheres em vários campos, entre os quais, a política.” De acordo com a especialista, a população não enxerga pautas femininas com a importância devida. “Tem uma formação na nossa sociedade de não olhar mulheres como grupo a ser atendido em suas demandas para gerar incentivo para que elas sejam reconhecidas”, frisou.
Carolina Botelho criticou a forma como as cotas para mulheres são estabelecidas na política brasileira — partidos são obrigados a lançar, no mínimo, 30% de candidaturas femininas. Segundo sustentou, não adianta criar políticas que estabelecem cotas para mulheres se não se dá condições para que elas tenham poder na estrutura política.
“Parar na ideia das cotas e achar que a distribuição de poder vai acontecer naturalmente é errado. É disputa de espaço político. Se você não cria incentivos e dinâmicas para que isso aconteça, essa questão não vai avançar, vai parar por aí mesmo”, criticou.
Na avaliação de Carolina Botelho, o Brasil vive uma involução nessa pauta. Conforme enfatizou, ter um presidente que, repetidamente, atua contra pautas a favor da igualdade de gênero, como faz Jair Bolsonaro, dificulta ainda mais um processo de conquista de espaço, que já é difícil. “Quando você tem uma liderança cujo empenho é, também, deteriorar essas oportunidades para determinados grupos, isso, de certa forma, cria um ambiente menos propício ainda para favorecer a representatividade feminina na política.”
Tratamento
Eleita senadora em 2018, Leila Barros (Cidadania-DF) disse não ter dúvidas de que a política é mais difícil para mulheres. A parlamentar frisou que a diferença de tratamento começa antes mesmo da corrida eleitoral. “Há uma expectativa diferente quando nós, mulheres, optamos por entrar na política. Os questionamentos que são feitos a nós não são os mesmos feitos aos homens. Infelizmente, muitas vezes, a candidata não é nem levada a sério”, criticou.
A senadora relatou que, no caso dela, o fato de ter sido jogadora de vôlei fez com que enfrentasse um machismo ainda maior. “Tenho um imenso orgulho da minha trajetória e muita gratidão por tudo o que minha carreira como atleta me proporcionou. Mas na campanha, como mulher e atleta, sofri um duplo preconceito, com inúmeros ataques de natureza machista. A minha resposta foi dada com muito trabalho, e o resultado veio nas urnas”, destacou.
Para Leila Barros, o machismo é estrutural e cultural em toda sociedade, e na política não é diferente. Ela lembrou que, mesmo sendo maioria na população, as mulheres ocupam espaços ínfimos no poder. “O Congresso Nacional é um reflexo atenuado da triste realidade brasileira. Somos poucas senadoras, mas estamos dispostas a batalhar pelo nosso espaço e pelo respeito que merecemos”, sustentou.
Na opinião da senadora, é preciso ter mais mulheres na política para que pautas de igualdade de gênero avancem no Congresso e, consequentemente, a representatividade feminina aumente dentro desse espaço. “Há interesses que só conseguem ter relevância e voz quando há representatividade. Com mais mulheres na política, nossa voz será naturalmente mais ouvida nos debates dos rumos da nação. Podemos fazer com que as pautas femininas avancem no ritmo que almejamos”, justificou.
Barreiras
Com uma carreira política de renome, Heloísa Helena já foi vereadora, deputada, senadora e a terceira mulher a receber mais votos em uma campanha presidencial no Brasil, atrás apenas de Dilma Rousseff e Marina Silva. Hoje, professora da Universidade Federal de Alagoas, disse que parte do problema por trás da pouca representatividade feminina na política é a jornada de trabalho dupla, que dificulta o ingresso das mulheres.
“A grande maioria é submetida ao trabalho doméstico, que é exaustivo, repetitivo, não remunerado e não reconhecido socialmente. Isso leva a uma gigantesca exaustão física, lesões de esforço repetitivo e exaustão emocional”, elencou.
Segundo lembrou, as mulheres que quebraram barreiras do preconceito e conquistaram cargos de poder, como ela, são exceções. Mesmo dentro da política, ela continuou tendo de enfrentar o machismo, está presente em todas as legendas do país, seja de esquerda, seja de direita, seja de centro. “O machismo que existe na sociedade está representado em todos os partidos, isso é fato. Não importa o espectro político”, acrescentou.
“Eu gostaria de estar em uma sociedade onde o meu argumento fosse mais importante do que o volume de minha voz, mas, infelizmente, não é assim. Então, se eu tiver de elevar meu tom de voz para ser ouvida em estruturas partidárias machistas que só ouvem mulheres assim, eu elevarei.”
Na avaliação de Heloísa Helena, “é preciso trabalhar com todas as forças para potencializar a participação feminina nos espaços de poder”. “A única maneira é aumentar a participação política feminina para que, de alguma forma, possa representar outras mulheres.” Para isso, considera ser preciso quebrar as engrenagens da estrutura social, de modo que possibilite paridade entre os gêneros. “Agora, lógico: quanto mais mulheres participam (da política), de alguma maneira incentiva outras”, ressaltou.
“Quando me elegi ao Senado, cheguei a um assentamento de trabalhadores rurais, e uma menininha me disse: ‘Eita, Heloísa, quando crescer quero ser senadora igual a você’. Então, quando você identifica, no cenário político-social, mulheres que quebraram a estrutura do machismo e seguiram em frente, também é uma sinalização muito importante.”
*Estagiários sob supervisão de Cida Barbosa