Número de pessoas com algum trabalho ainda é o mais baixo desde 2012, pelo menos
O número de pessoas com algum trabalho jamais foi tão baixo desde que o IBGE mudou a maneira de contar a população ocupada, em 2012. No trimestre encerrado em abril, havia 85,9 milhões de pessoas ocupadas. O pior resultado anterior era de 88,4 milhões, em 2012. Mas, nesse ano, o número de adultos era 20 milhões menor, por aí.
A situação despiora desde meados do ano passado. Os economistas do Itaú dizem mais, que os dados seriam melhores do que parecem, pelo menos no emprego formal e na taxa de desemprego. Baseiam-se em um indicador próprio da situação no mercado de trabalho, o Idat-Emprego, a partir de informações de folhas de pagamento processadas pelo banco. Haveria cerca de 4 milhões de empregados formais além daqueles estimados pelo IBGE. A taxa de desemprego seria de 13,8%, e não de 14,3%.
O pessoal do Itaú usa um número próprio por causa da divergência muito grande entre os números oficiais de emprego com carteira assinada, aqueles do Caged (registro administrativo do governo) e os da amostragem do IBGE, díspares talvez por causa da mudança metodológica no Caged e de dificuldades da pesquisa do IBGE durante a epidemia.
De um ponto de vista frio, é possível dizer que há recuperação do terreno perdido. A despiora pode ganhar velocidade caso o país não importe a variante delta do vírus ou não crie seu próprio bicho ruim, se não tiver apagão, se não faltar mais vacina ou se as imundícies do governo Jair Bolsonaro não causarem tumulto político maior.
Ou seja, no fim do ano ou em 2022, pode ser que exista menos gente sofrendo do que agora.
Ainda assim, o desastre ainda é muito grande. A taxa de desemprego em torno de 14% tem um tanto de ilusão. Apenas não é maior na estatística porque um monte de gente nem procura trabalho ou nem tem como. Há setores ainda fechados ou muito prejudicados, como comércio, restaurantes, entretenimento, feiras, cursos, serviços). Em um nível mais normal de procura (taxa de participação mais costumeira), o desemprego seria de 20%.
Quanto ao número de ocupados, a situação não é tão ruim quando do trimestre encerrado em agosto de 2020, auge da falta de trabalho provocada pela epidemia em relação a 2019, desapareceram 12 milhões de empregos. Naquela época o auxílio emergencial de pelo menos R$ 600 chegava a 65 milhões de pessoas.
Parece que se discute se um copo manchado de sangue está meio cheio ou meio vazio. Além disso, o futuro parece mais nebuloso do que de costume, não só por causa das incertezas sanitárias e políticas mas porque pode ser que alguns tipos de trabalho tenham desaparecido de vez e a precarização tenha aumentado.
De um ponto de vista frio, ressalte-se, e apolítico, a coisa despiora. Entre tantas dúvidas, resta saber se as pessoas que arrumarem um trabalhinho não terão pegado raiva resistente, talvez deste governo também.
Por falar em frieza
Um deputado amigo diz que a vida não mudou para Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, apesar do jorro de escândalos do governo de Jair Bolsonaro. Não mudou o relacionamento com o Planalto ou com o Congresso, diz esse deputado amigo.
Lira não vai tocar o impeachment porque não haveria voto para aprová-lo; tem muito metido a democrata por aí incapaz de entender que Lira não manda nos deputados, mais que dois terços contrários ao impeachment, como a maioria dos Poderes em Brasília. E daí? Por que não desengavetar os pedidos? Porque, aí, é política simples, não vai botar tudo a perder e botar o país no caos para dar em nada. (Folha de S. Paulo – 01/07/2021)
Vinicius Torres Freire, jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA)