Camila Rocha: As Forças Armadas na mira da opinião pública

Troca de comando foi primeiro passo para recuperar imagem do Exército, com imagem das Forças Armadas fragilizada e desprestigiada sob o vidro estilhaçado pelo golpismo

As Forças Armadas costumavam ser percebidas pela maioria dos brasileiros como uma instituição digna de confiança. Hoje, a instituição transmite insegurança, irresponsabilidade e falta de patriotismo.

Em 2018, um levantamento do Latinobarômetro apontava que 58% da população confiava nos militares. Tal índice ficava atrás apenas da confiança depositada na Igreja Católica, e era fonte de orgulho nas casernas.

Contudo, o que explicava o contentamento com a instituição não era seu desempenho na defesa do país, mas sua atuação na área de assistência social. Atividades subsidiárias relacionadas à distribuição de cestas básicas, à vacinação em áreas de difícil acesso, solicitude aos vizinhos de quartéis, entre outras, eram tidas como demonstração de uma preocupação legítima em auxiliar as populações mais vulneráveis do país.

Jair Bolsonaro procurou explorar essa boa imagem a seu favor durante seu governo. Mas em vez de melhorar a aprovação das Forças Armadas, o efeito foi o oposto. A avaliação do desempenho dos militares piorou à medida que o apoio ao governo Bolsonaro declinava.

A atuação do general Eduardo Pazuello é exemplar nesse sentido. Sua gestão no Ministério da Saúde foi desastrosa, e sua participação em um ato político ao lado de Jair Bolsonaro em maio de 2021 foi desculpada pelo Exército quando deveria ter sido punida.

Logo após a decisão equivocada do Alto-Comando do Exército, o deputado federal e ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o debate sobre a PEC que proíbe que militares da ativa ocupem cargos de natureza civil na administração pública deveria ser acelerado.

A imagem pública da instituição se deteriorou ainda mais com o apoio explícito de vários militares à campanha promovida por Bolsonaro contra as urnas eletrônicas e com a condescendência diante de atos que vinham demandando publicamente uma intervenção militar. Após o fim das eleições, a maioria da população ficou estarrecida com a conivência explícita de militares com centenas de golpistas acampados nas imediações de quartéis.

Na época, 75% dos brasileiros eram contra os acampamentos e bloqueios de estrada e defendiam a punição das pessoas envolvidas nos atos antidemocráticos, como aponta pesquisa do Datafolha publicada em dezembro de 2022. No entanto, isso pouco afetou a decisão dos militares de dar guarida a pessoas com condutas abertamente criminosas. Afinal, a despeito de se apresentarem como “pacíficos”, os protestos visavam a abolição do Estado de direito, algo intolerável sob a ordem democrática e passível de ser punido com prisão.

Porém, se 21% dos brasileiros ainda viam com bons olhos os atos antidemocráticos, o cenário mudou depois de 8 de janeiro. Uma parcela expressiva do eleitorado de Bolsonaro passou a condenar de forma veemente a conduta de militares envolvidos direta ou indiretamente com o ocorrido e a demandar que sejam responsabilizados com perdas de cargos e prisões.

Em sua visão, Lula se fortaleceu publicamente ao atuar como estadista em prol da democracia em conjunto com todos os governadores e demais Poderes. Já a imagem das Forças Armadas se encontra fragilizada e desprestigiada sob o vidro estilhaçado pelo golpismo. A troca de comando do Exército foi o primeiro passo para transformar tal cenário. (Folha de S. Paulo – 23/01/2023)

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