IMPRENSA HOJE

Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais (31/10/2022)

MANCHETES DA CAPA

O Globo

‘Não existem dois Brasi’ – Lula vence Bolsonaro, conquista inédito 3º mandato e promete reconciliar o País
Chefes de Estado felicitam vencedor logo após resultado
Bolsonaro mantém silêncio depois da derrota
Tarcísio promete ‘entendimento’ com novo governo

O Estado de S. Paulo

‘Não existem dois Brasis; é hora de baixar as armas’
Lula teme boicote na passagem de governo
Tarcísio diz que vai buscar ‘entendimento’ com Brasília

Folha de S. Paulo

Lula é eleito pela terceira vez
Bolsonarismo triunfa em SP com eleição de Tarcísio para o governo
Lula terá apoio de 11 governadores, e 14 estados ficam com a oposição

Valor Econômico

Lula é eleito presidente
Mercado espera por definições para a economia
Bolsonaro sofre derrota inédita
Em sua primeira eleição, Tarcísio vence em SP
TSE coíbe suposto uso da PRF

Correio Braziliense

Lula tem vitória inédita e quer pacificar o Brasil
Bolsonaro silencia sobre a derrota, apaga as luzes do Alvorada e não atende aliados
Moraes diz que o povo brasileiro atestou credibilidade das urnas e do sistema eleitoral
Tarcísio vence em São Paulo. PSDB leva Rio Grande do Sul e Pernambuco. Bahia é do PT

EDITORIAIS

O Globo

Lula tem uma oportunidade de redimir o Brasil

Para isso, ele precisará agir como líder de uma frente plural, não como ungido por uma facção

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva é repleta de significados. Pela primeira vez, um presidente brasileiro foi eleito democraticamente para um terceiro mandato e um presidente disputando reeleição perdeu. Uma vez concluído seu novo governo, Lula terá ficado 12 anos no poder — período superado apenas por um antecessor no cargo, o ditador Getúlio Vargas. É certo que não foi a vitória folgada com que sonhavam os petistas, mesmo assim os 60,3 milhões de votos em Lula foram uma resposta enfática do eleitorado ao autoritarismo tóxico e aos desmandos contumazes do presidente Jair Bolsonaro. Vencida a disputa, Lula precisa agora reiterar por meio de atos, e não apenas de palavras como voltou a fazer ontem, que governará para todos. “O povo brasileiro quer de volta a esperança”, afirmou em seu discurso como presidente eleito. “Somos um único país, um único povo, uma grande nação. A ninguém interessa um país dividido, em estado de guerra.” Ninguém, disse ele, está acima da Constituição. Foi um bom começo.

O sucesso da campanha petista traz um motivo para otimismo e outro para preocupação. Otimismo pela possibilidade de que a aproximação do centro político que se viu na reta final do segundo turno dê um rosto mais pragmático e menos ideológico ao novo governo. Além da contribuição inestimável do vice, Geraldo Alckmin, Lula só tem a ganhar abrindo espaço a figuras como Simone Tebet ou Marina Silva. Ele disse que “não existem dois Brasis” e prometeu que não governaria apenas para o PT. Precisa cumprir a promessa.

Há preocupação sensata com a reação do derrotado e de seus aliados. O triunfo de Lula representa o êxito da democracia, ameaçada nos últimos quatro anos pelo bolsonarismo. Essa oposição não desaparecerá, nem perderá a força que lhe garantem os 58,2 milhões de votos dados a Bolsonaro. A confusão provocada ontem pelas operações da Polícia Rodoviária Federal que impediram vários eleitores de votar parece o início de uma conflagração. Pacificar um país rachado ao meio é um desafio longe de trivial. Mas é essencial, até para que a política volte a ocupar o proscênio nas decisões.

Se os dois mandatos anteriores de Lula servem de guia, pelo menos no comportamento presidencial a cordialidade deverá substituir a grosseria. No governo, programas sociais voltarão a ganhar foco. Na área ambiental, o combate ao desmatamento da Amazônia será prioridade. No cenário internacional, o Brasil voltará a dialogar com as grandes potências. Acima de tudo, ninguém perderá o sono com a possibilidade de o ganhador da eleição de 2026 não assumir em janeiro de 2027.

Mas isso é o mínimo. Os desafios do Brasil continuam gigantescos, e há inúmeras dúvidas sobre o terceiro governo Lula. O país que ele passará a comandar em dois meses é totalmente distinto daquele de 2003, quando chegou pela primeira vez ao Palácio do Planalto. No mundo, o risco de recessão é iminente. Aqui, o quadro é de inflação renitente, baixo crescimento, juros altos, bomba fiscal, fome e miséria. Desta vez, o termo “herança maldita” é mais adequado para definir o país do que a propaganda petista sempre tentou fazer crer sobre o Brasil recebido de Fernando Henrique. A situação exigirá diagnóstico preciso, clareza na definição de prioridades e competência na execução das políticas públicas. É justamente nesses pontos que a eleição de Lula também causa apreensão.

Qual Lula governará? O social-democrata da primeira metade do primeiro mandato? Aquele que defendeu um ajuste fiscal de longo prazo capaz de reduzir a dívida pública, aumentou o superávit primário, promoveu reformas para melhorar o ambiente de negócios, aperfeiçoou instrumentos de crédito e reduziu restrições à concorrência no setor privado? Ou o nacional-desenvolvimentista que veio em seguida? Aquele que apoiou o aumento descontrolado dos gastos, a distribuição de benefícios aos compadres do governo, setores e empresas escolhidos a dedo em troca de apoio ao projeto de poder petista, enfiando o Brasil no buraco sem fundo da corrupção?

Nas próximas semanas, as circunstâncias obrigarão Lula a explicitar e a negociar os itens de seu programa que deixou em segundo plano na campanha. Qual sua proposta para substituir o teto de gastos, que tanto ataca, sem pôr em risco a saúde das contas públicas? Que fará a respeito da reforma trabalhista e das privatizações? Que tem a dizer sobre as reformas tributária e administrativa, fundamentais para garantir ao governo a possibilidade mínima de pôr em marcha qualquer política pública consistente? Qual será o papel dos investimentos do Estado e dos bancos públicos no desenvolvimento, eterno pretexto para mercadejar poder enquanto se abre o flanco à corrupção?

Se, como Lula insiste, sua missão é conversar com todos os setores da sociedade para construir consensos, a hora de começar é agora, ao montar a equipe de governo. Ele precisa reunir nomes com credibilidade suficiente para reerguer o país dos escombros do bolsonarismo. Em especial na economia, área em que o PT jamais fez um acerto de contas honesto com o passado. Lula terá agora a oportunidade de entender que sua vitória não significa uma licença para reviver os devaneios petistas que já levaram o Estado brasileiro à bancarrota. Ele está lá não apenas por ser Lula, mas sobretudo por não ser Bolsonaro. Precisa agir como o líder da coalizão plural pela democracia que o devolveu ao poder, não como o ungido por uma facção política interessada em locupletar-se. Por toda sua história de reveses e superação ao longo da vida, Lula tem plenas condições de reinventar-se para deixar um legado de união e progresso aos brasileiros. Mas um novo governo Lula só resgatará o Brasil do abismo se for mesmo novo.

O Estado de S. Paulo

Lula tem o dever de arrefecer os ânimos

Vitória do petista está longe de representar uma solução. Trata-se de um novo desafio, a exigir vigilância e participação democrática. Oposição responsável é imprescindível

Jair Bolsonaro é o primeiro presidente da República que, tendo disputado a reeleição, não foi reconduzido ao cargo. A maioria do eleitorado rejeitou neste domingo um governo que se mostrou, desde o primeiro momento, conflituoso, desumano e assustadoramente destrutivo. Eleito em 2018 sob a bandeira do antipetismo e do combate à corrupção, Jair Bolsonaro mostrou-se incapaz não apenas de cumprir minimamente um programa de governo, mas de se portar como presidente da República em suas mais básicas exigências legais e cívicas.

Se é um imenso alívio pensar que o Brasil não terá, pelos próximos quatro anos, Jair Bolsonaro na Presidência da República, é preciso reconhecer que o resultado das eleições deste domingo está longe de desanuviar o horizonte nacional. Em primeiro lugar, o próximo governo de Luiz Inácio Lula da Silva é ainda uma imensa incógnita. A campanha eleitoral foi toda baseada em desqualificar o adversário. Mesmo os mais fiéis apoiadores petistas não sabem como será o novo governo do PT.

Em segundo lugar, a derrota de Jair Bolsonaro nas urnas não significa que o bolsonarismo acabou. Se essa campanha eleitoral serviu para algo, foi para mostrar como a mensagem de Bolsonaro continua tendo ressonância em muitos corações. Há parcela relevante da população que, por diferentes motivos, vê Jair Bolsonaro – o omisso na pandemia, o desprovido de programa de governo, o arruaceiro das eleições, o comprador de votos – como solução para o País.

A partir de janeiro de 2023, Jair Bolsonaro não estará na Presidência da República, mas o País continuará tendo de lidar com ele e seus apoiadores. Entre outros aspectos, isso traz enormes desafios para o debate público e para a composição de uma efetiva e responsável oposição ao PT, que será mais necessária do que nunca.

Depois de quatro anos de Jair Bolsonaro e de uma virulenta campanha eleitoral, o País precisa urgentemente de união e pacificação. Lula da Silva tem o dever de arrefecer os ânimos, de respeitar os vencidos e, sobretudo, de transmitir confiança a todos os brasileiros. Se há alguma dose de responsabilidade no PT, agora é a hora de mostrar ao País que os temores levantados por Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral – a respeito, por exemplo, de liberdade religiosa e de imprensa, de responsabilidade fiscal, de respeito aos reais interesses e valores das famílias, de proximidade com regimes autoritários – eram mentirosos.

A tarefa de pacificação nacional não começa no dia 1.º de janeiro de 2023. Começou domingo à noite. Esse dever inclui palavras respeitosas e serenas, mas envolve, sobretudo, ações. Muito da tão necessária paz virá quando o País souber qual será o plano de governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Ou seja, são necessários gestos e palavras, mas, sobretudo, é essencial responsabilidade, uma efetiva responsabilidade com o País.

Depois de seu partido ter se envolvido nos maiores escândalos de corrupção da história recente nacional, Lula da Silva – este é o grande resultado do governo Bolsonaro – ganhou um novo mandato. Não há dúvida de que essa constatação desperta imediato desânimo, como se o País se mostrasse incapaz de andar para a frente, enredado nas mesmas questões e nos mesmos nomes do passado. Eis o paradoxo das eleições de 2022: para resolver os problemas nacionais, o eleitor elegeu aquele que é um dos grandes artífices da atual crise social, política, econômica e moral.

A vitória de Lula está longe de representar uma solução para o País. Trata-se, na verdade, de um novo desafio, a exigir especial vigilância e renovada participação democrática. O PT tem um histórico marcadamente antirrepublicano, com aparelhamento político-ideológico da máquina estatal, conivência – para dizer o mínimo – com práticas de corrupção e negacionismo na condução de suas políticas públicas. Nesse cenário, a oposição responsável e democrática tem um importantíssimo papel a cumprir. E não nos enganemos: o bolsonarismo é incapaz de fazer isso. É preciso urgentemente um centro democrático e responsável.

Folha de S. Paulo

Ao centro, Lula

Alternância atesta solidez da democracia; país precisa buscar o desenvolvimento

Luiz Inácio Lula da Silva, 77, tornou-se neste domingo (30) o primeiro brasileiro a ser eleito por três vezes para a Presidência da República. Sua vitória e, dentro de dois meses, sua posse consagrarão a alternância de poder e a solidez da democracia brasileira.

Lula conquista o novo mandato graças, em parte, à memória de realizações durante sua passagem pelo governo. Em seus momentos mais virtuosos, o petista soube aproveitar com responsabilidade as vantagens do bom momento econômico global na década retrasada e das transformações demográficas do Brasil.

Muito do triunfo lulista se deve também à firme e mais do que justificada rejeição de metade do eleitorado a seu oponente, Jair Bolsonaro (PL), o primeiro presidente a perder a disputa no cargo desde que o país adotou a reeleição.

O ímpeto autoritário, a truculência, a inoperância e o desmazelo de Bolsonaro facilitaram a campanha de Lula, que se deu ao luxo de sonegar ao eleitor o detalhamento de seus planos econômicos para um governo que se afigura difícil.

O presidente eleito —com a menor margem de votos desde a redemocratização— é também rejeitado por parcela expressiva e influente da sociedade, seja pelos escândalos de corrupção durante suas administrações, seja pela ruína econômica operada por sua sucessora, Dilma Rousseff, seja pela pauta ideológica abraçada por vezes de forma intolerante pelo PT.

Deverá enfrentar no Congresso uma oposição mais ampla e radical que a de 20 anos antes. O bolsonarismo e outras forças à direita conquistaram posições importantes no Legislativo e nos estados.

Não poderá esperar uma conjuntura internacional favorável, ao menos de pronto. A guerra na Ucrânia e a alta da inflação e dos juros em todo o mundo elevaram os riscos de recessão. No plano doméstico, as finanças do governo exigem ajuste crível e rigoroso.

Por tudo isso, Lula precisa dar mostras imediatas de responsabilidade orçamentária e disposição de rumar ao centro, política e economicamente. Deve se cercar de especialistas e quadros qualificados, para além do raio estreito do partido e de aliados à esquerda.

Sem definir uma regra fiscal que assegure a solvência da dívida pública, não haverá dinheiro para as demandas prementes em educação, saúde e assistência social. Sem permitir que a economia funcione com liberdade e competição, não haverá o crescimento sustentado essencial para reduzir a pobreza.

Acaba a propaganda de campanha, começam as responsabilidades de governo. A democracia estará fortalecida se o país for capaz de superar ideias e práticas que obstruem seu desenvolvimento.

Valor Econômico

Lula vence eleição e terá de obter força no Congresso

Lula terá de delinear, antes da posse, um plano viável de como se movimentar no terreno movediço no Congresso

Por pouco mais de 2,1 milhões de votos à frente do presidente Jair Bolsonaro, na mais apertada eleição desde a redemocratização, o ex-presidente Lula voltará a governar o Brasil. Será missão mais difícil do que quando pisou pela primeira vez no Palácio do Planalto. O resultado final das urnas (50,9% ante 49,1% do rival) acentuou o desenho que as pesquisas eleitorais vinham traçando desde janeiro: o país está politicamente dividido ao meio.

Bolsonaro reduziu a diferença entre ele e Lula de 6,3 milhões de votos para um terço disso. Os três maiores colégios eleitorais, São Paulo, Minas e Rio, serão comandados por aliados. A vitória tranquila de seu ex-ministro Tarcísio de Freitas (55,2% contra 44,7%) no Estado mais rico realçou sua força eleitoral no Sudeste. Mesmo assim, o número de eleitores que viram em sua reeleição uma ameaça maior e urgente à continuidade da democracia, e engrossou o caudal de votos arrastados pelo ex-presidente Lula, foi maior. Está perto do fim o mandato de um dos presidentes mais controversos que o Brasil já teve.

O fato de a ameaça de reeleição de Bolsonaro ter sido rejeitada pelas urnas não torna a tarefa de governar mais fácil a partir de 1º de janeiro. Ao contrário, Lula terá de usar do máximo de sua capacidade, e no menor tempo possível, para agregar lideranças partidárias e apoios parlamentares de todas as forças políticas que possam colaborar para aprovação de um projeto coloque o país na rota do crescimento sustentável.

É importante que, encerrada a eleição, o presidente Jair Bolsonaro promova uma transição transparente, ordeira e pacífica. Há dúvidas sobre isso porque Bolsonaro governou abusando do sigilo, o orçamento secreto do qual se beneficia é o contrário de transparente, e o presidente demonstrou que moderação não é uma de suas qualidades.

Lula tem inegáveis dons para apaziguar ânimos e formar maiorias que permitam governar com alguma serenidade e eficiência. Sua grande capacidade de negociação e articulação revelou-se mais uma vez na forma com que montou, antes do primeiro turno, seu arco de alianças. Com o apoio de líderes tradicionais do MDB, obteve o apoio de que precisava para os palanques do Nordeste, onde garantiu vantagem abissal sobre Bolsonaro. Da mesma forma, candidatos regionais de partidos do Centrão esconderam seu candidato para apoiar Lula onde lhes fosse conveniente.

O presidente eleito terá de encaminhar soluções para intricados desafios antes da posse, o que sugere que terá de fazer uma composição política que se reflita já na formação de seu ministério em um governo que irá, segundo ele, além do PT.

A primeira batalha do novo governo, e uma das mais difíceis, será adequar o orçamento à realidade. Ele envolverá uma nova relação entre o Executivo e o Congresso, depois que Bolsonaro deu autonomia ao Centrão, que garantiu R$ 19,6 bilhões para seu orçamento secreto, enquanto os demais ministérios, especialmente os da área social, sofreram cortes brutais de custeio. O presidente da Câmara, Arthur Lira, quer permanecer no cargo, e disse sem meias palavras que ou há o orçamento com emendas do relator ou então o mensalão, sinalizando que quer manter o avanço já conquistado pelos partidos fisiológicos sobre os cofres públicos.

A definição orçamentária trará também em si a marca da política fiscal que o novo presidente pretende executar. Durante as eleições, soube-se apenas que Lula quer revogar o teto de gastos, que exige emenda constitucional e aprovação de dois terços do Congresso. Além disso, será necessário definir um “estouro” do teto responsável, que abarque só despesas irreversíveis. A principal é a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600, uma promessa de campanha que custa inexistentes R$ 50 bilhões. Abrir mão dos impostos federais sobre combustíveis exigirá outro tanto, e acabar com a desoneração provocará aumento da inflação e manutenção de juros altos por mais tempo.

Antes de pensar nas reformas, e delas quase não se falou na campanha do PT, a missão primeira será atrair apoios no Congresso e influir na direção das duas Casas. Lula, em seus dois mandatos, abraçou as velhas raposas do Centrão, como Valdemar Costa Neto, manteve boas relações com o PSD de Kassab e cacife eleitoral renovado para atrair legendas que apoiam qualquer governo. Com base de 140 deputados, o governo, porém, ficará em córner legislativo. Para fazer diferença nos 100 primeiros dias, terá de delinear antes da posse um plano viável de como se movimentar no terreno movediço no Congresso.

Correio Braziliense

Hora de superar a paralisia eleitoral

É imperioso que o país retome o enfrentamento vigoroso de suas demandas socioeconômicas e administrativas

Totalizadas as urnas, consolidado o resultado da eleição nacional e escolhido o dono da faixa presidencial para o próximo mandato, proliferam análises de que o país corre o risco de caminhar, superada a votação definitiva, para uma espécie de “terceiro turno”: um questionamento mais ou menos institucionalizado do resultado da eleição mais polarizada desde a redemocratização. Pouca coisa seria mais danosa às urgências de um país que já passou os últimos meses imerso em paralisia eleitoral, dividido, não só em nível político, mas também social, e em clima de expectativa, até mesmo em termos de atividade econômica.

Por mais rachado que o Brasil saia das urnas com a vitória apertada de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre Jair Bolsonaro (PL), é imperioso que o país retome o enfrentamento vigoroso de suas demandas socioeconômicas e administrativas, e que não desperdice os últimos meses do ano apenas imerso em um debate que só tende a atrasar essa necessidade urgente. É preciso que o país e seus principais atores políticos desçam do palanque e passem a administrar o fim de 2022, republicanamente, como preparação para os próximos quatro anos de mandato, por mais que a campanha eleitoral tenha deixado feridas abertas, cicatrizes e pendências jurídicas, que não devem ser ignoradas, mas precisam ser tratadas em seus devidos fóruns.

Respeitar a voz soberana das urnas é o primeiro passo para que o país, e todos os seus cidadãos, possam começar um processo de reconciliação imprescindível para que o desemprego siga recuando, para que a economia acelere no caminho da recuperação, para que os desafios da pauta ambiental sejam atacados e, principalmente, para que as demandas da parcela mais vulnerável dos brasileiros, que antes de eleitores são cidadãos, sejam ouvidas.
E, no campo social, talvez a maior urgência a se enfrentar seja o escândalo da fome no país que se orgulha de ser uma espécie de celeiro ou despensa do planeta. Tema de campanha em um debate sobre o real tamanho do exército de famintos – que, seja qual for, deveria envergonhar a nação do agronegócio – a insegurança alimentar emitiu mais um sinal de alerta máximo, às vésperas do segundo turno das eleições.

Levantamento divulgado na última quarta-feira pelo Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância), da Fundação Oswaldo Cruz, sobre a desnutrição de bebês brasileiros, mostra que apenas no ano passado houve 2.979 hospitalizações de crianças abaixo de 1 ano por esse motivo no Sistema Único de Saúde. É como se a cada dia oito brasileirinhos dessem entrada em leitos de unidades de saúde em consequência de deficiências nutricionais.
Pior: o total é o maior dos últimos 13 anos, mas, em números relativos, o quadro, que já era péssimo, piorou em 2022. Até 30 de agosto, a saúde pública havia registrado 2.115 internações de bebês por desnutrição, elevando a 8,7 a taxa média de hospitalizações a cada 24 horas, com um aumento de 7% em comparação com 2021, aponta o estudo.
É o ponto mais alarmante de uma realidade que vem se agravando desde 2016, segundo o trabalho de pesquisadores da Fiocruz, quando a taxa de hospitalização começou a subir, chegando à pior marca para um ano inteiro em 2021. Foram 113 internações de bebês por desnutrição para cada 100 mil nascidos vivos – assustadores 51% a mais que em 2011, quando houve a menor marca nos 13 anos avaliados.

Para além de confrontar análises que, durante a campanha eleitoral, questionavam o aumento da fome no país – sob o argumento de que esse crescimento não estaria se refletindo em indicadores de saúde ligados à prevalência da fome –, o estudo da Fiocruz indica que o desafio é tão real quanto urgente, e se reflete pesadamente sobre os brasileiros mais frágeis e vulneráveis. Mostra ainda o retrato de um país que precisa ser pacificado, se reconciliar e trabalhar, unido, desde já, para resolver problemas incomparavelmente mais importantes que debates ideológicos – ainda que estes tendam a continuar – e eventuais queixas sobre o resultado das urnas.

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