Os grupos que estiveram contra o petismo em 2018 ainda não sabem como se rearticular
A força de Lula nas pesquisas criou até aqui dois relevantes grupos de perdedores. Um é o segmento de agentes da economia nos setores financeiros, da agro indústria e indústria que viram em 2018 em Bolsonaro a possibilidade de transformação da economia brasileira. O outro é a atual geração de comandantes militares opostos ao lulopetismo por razões ideológicas mas, também, por considerarem que tinham um projeto melhor de País.
Ambos retardaram demais o abandono da barca bolsonarista, na qual subiram por um misto de circunstâncias e conveniências – e falta de lideranças. Ambos pareciam emprestar ao governo Bolsonaro impulsos de modernização e eficiência de planejamento e gestão. O fracasso do presidente expôs também as dificuldades desses dois grandes segmentos em articular agendas abrangentes.
A adesão desses vários agentes a Bolsonaro foi mais circunstancial do que de fundo. Empresários e empreendedores tinham a esperança de um ambiente de negócios melhor em todos os sentidos (alguns acreditavam até em aumento de produtividade geral da economia, estagnada há décadas). Os militares viram inicialmente em Bolsonaro sobretudo um freio à volta do PT ao poder, depois do desastre dilmista.
Como sempre ao sabor do momento, estão novamente considerando – sobretudo o meio empresarial e financeiro – se uma acomodação com Lula não seria possível mas até desejável. Na definição imortal de Abílio Diniz, “no Brasil empresário não briga com o governo”. A não ser que o governo prejudique diretamente interesses, como aconteceu no caso do meio ambiente e política comercial exterior.
Lula jamais prejudicou interesses empresariais, muito pelo contrário. A roubalheira registrada em seu governo (mas não só dele, reconheça-se) foi a expressão do triunfo do patrimonialismo – quando grupos privados se apropriam de setores do Estado em benefício próprio. E o patrimonialismo, como se pode ver na votação do Orçamento e no domínio do governo Bolsonaro pelo Centrão, continua sendo uma característica fundamental no sistema político brasileiro. Lula é parte disso, e não o seu contrário.
Quanto aos militares, só o surgimento de uma liderança expressiva será capaz neste momento de superar a profunda desmoralização trazida ao setor pelo bolsonarismo. Alguns de seus expoentes (em comando de tropa ou já de pijama) admitem que o general incompetente na Saúde e a perda das posições de comando dentro do Palácio (agora do Centrão) são os fatos que perduram. Eles também não parecem dispostos a combater Lula. Querem uma terceira via, mas ainda não sabem qual. (O Estado de S. Paulo – 23/12/2021)
WILLIAM WAACK, JORNALISTA E APRESENTADOR DO JORNAL DA CNN