Ricardo Noblat: O bom exemplo de Paulo Câmara no trato com a indisciplina da PM

Não foi o coronel Vanildo Maranhão, comandante da Polícia Militar de Pernambuco, que pediu demissão do cargo depois que o Batalhão de Choque reprimiu a manifestação anti-bolsonarista do último sábado, no Recife, deixando feridos e dois homens cegos.

Na verdade, foi o governador Paulo Câmara (PSB) que o demitiu. Câmara mandou avisar ao coronel: ou ele pediria demisifsão ou seria demitido. Para não passar vergonha maior, Maranhão demitiu-se, e seu substituto já foi escolhido.a

Temem-se atos de vandalismo durante manifestações de rua, mas foram os policiais que os protagonizaram ao obedecer a ordens que partiram ainda não se sabe de quem, e dispararem balas de borracha contra pessoas cercadas na ponte Duarte Coelho.

Não se limitaram a isso, nem a jogar bombas de gás lacrimogêneo. Surgiram novos vídeos que mostram policiais atirando contra moradores de um prédio que a tudo assistiam pela janela. Até uma bomba foi arremessada no telhado de um sobrado.

Demitir o comandante da Polícia Militar não basta. É preciso punir os policiais truculentos, descobrir o que se esconde por trás do que aconteceu e revelar as conclusões do inquérito que foi aberto. O distinto público tem o direito de saber tudo.

Acuado, Bolsonaro faz do futebol o antigo circo dos romanos

Vai ter Copa América no Brasil e não se discute mais isso, decreta o presidente. A não ser que a justiça proíba e arque com o desgaste

Pão e circo. Se a fórmula de governar, inventada pelos romanos há milênios, sustentou o maior império que o mundo já conheceu, por que não levá-la em conta no momento em que a pandemia, e os sucessivos desacertos, ameaçam as chances de reeleição de um presidente que virou alvo de manifestações hostis de rua?

Se o pão sobe de preço, ofereça-se circo de graça. É preciso desviar a atenção do distinto público das questões que de fato importam. Bolsonaro pode não saber governar, mas de distração entende. Portanto, apesar da terceira onda da Covid-19 que se agiganta, e dos quase 500 mil mortos, a Copa América será jogada aqui.

Pelos aeroportos entrarão 650 atletas, dirigentes esportivos e membros oficiais das delegações. O número de jornalistas ainda não foi calculado, mas não há limite. Pelas fronteiras, grande parte delas desguarnecidas, os torcedores das seleções. Aumentará o movimento nos cartões postais das cidades que sediarão os jogos.

O vírus lambe os beiços. O presidente Jair Bolsonaro, também. Quem sabe (é o que deseja) o tempo fechado, sujeito a relâmpagos e trovoadas, não lhe concede um refresco? Quem sabe, ao final da Copa, ele não é convidado para levantar a taça do Brasil campeão? Campeão de um torneio caça-níquel! Mas, e daí?

E daí que ainda morram os que tiverem de morrer, ele não é coveiro; e daí que na vida real o Brasil da pandemia seja vice-campeão do mundo em número de mortos; e daí que o país se ressinta da falta de vacinas por que o governo não quis comprá-las a tempo? A taça é nossa. Com o brasileiro, não há quem possa!

Tem mais. Seria de bom tom que o Supremo Tribunal Federal, acionado por partidos, decidisse que não haverá Copa América no Brasil em meio a mais grave crise sanitária dos últimos 100 anos. Caso decida, que amargue o desgaste por isso. Bolsonaro dirá que tentou devolver a alegria ao povo e a Justiça não deixou.

O jogo dele é esse. (Blog do Noblat/Metrópoles – 02/06/2021)

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