Luiz Carlos Azedo: Depois da cassação de Dallagnol, Moro sobe no telhado do Senado

NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

Por ironia, o pedido de cassação de Moro foi feito pelo PL, partido de Bolsonaro, cujo presidente gostaria de ver o ex-juiz sem seu mandato de senador

Ao negar o pedido da defesa do deputado federal cassado Deltan Dallagnol (Podemos-PR) para suspender decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que anulou seu registro de candidatura e determinou que Luiz Carlos Hauly seja empossado no seu lugar, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu, nesta quarta-feira, mais um passo na desconstrução política e judicial da Operação Lava-Jato, da qual o ex-procurador da República foi protagonista. Quem também pode perder o mandato é o senador Sergio Moro, alvo de diferentes ações judiciais.

A principal delas corre no TSE. Por ironia, o pedido de cassação, feito pelo PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, tem o respaldo do presidente da legenda, Valdemar Costa Neto, que não esconde que gostaria de ver o ex-juiz da 8ª Vara Federal de Curitiba e ex-ministro da Justiça do governo passado sem seu mandato.

O PL aponta eventuais irregularidades cometidas pela campanha do senador e usa como base manifestação do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Paraná, que apontou falhas na prestação de contas do ex-juiz federal. O segundo colocado na disputa, Paulo Martins (PL), assumiria a vaga, o que aumentaria a bancada da legenda no Senado. A expectativa do PL é de que, em uma eventual nova eleição diante da cassação do mandato, Martins seja eleito senador.

Dallagnol foi cassado em 16 de maio, por unanimidade, devido a irregularidade ao pedir exoneração do cargo de procurador da República, enquanto ainda era alvo de procedimentos para apurar infrações disciplinares no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). No entendimento dos ministros do TSE, esses processos poderiam levar a punições, com base nas leis da Ficha Limpa e da Inelegibilidade. Ambas consideram inelegíveis membros do Judiciário ou do Ministério Público que se candidatarem para escapar de punições.

No caso de Dallagnol, o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) fez a recontagem de votos e nenhum candidato do Podemos atingiu 10% do quociente eleitoral. A vaga iria para um deputado do PL, o pastor Itamar Paim (PR). O Podemos, partido do ex-procurador, recorreu ao Supremo para que a vaga permanecesse com a legenda. Toffoli, então, acatou o pedido nesta quarta. Com isso, Hauly, que não havia alcançado o mínimo necessário de votos, deverá ser empossado.

A Lava-Jato

A Lava-Jato foi a maior operação de combate à corrupção e lavagem de dinheiro da história recente do Brasil. A partir de março de 2014, agentes públicos, empresários e doleiros passaram a ser investigados pela Justiça Federal em Curitiba, que organizou uma força-tarefa para apurar irregularidades na Petrobras, maior estatal do país, e contratos vultosos, como o da construção da usina nuclear Angra 3.

Outras frentes de investigação foram abertas depois, em vários estados, como Rio de Janeiro e São Paulo, além do Distrito Federal. Entretanto, os métodos adotados para obter delações premiadas sempre foram muito criticados nos meios jurídicos.

O nome “Lava-Jato” decorre do uso de uma rede de postos de combustíveis e um lava a jato de automóveis do Setor Hoteleiro Norte de Brasília, para movimentar recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações criminosas inicialmente investigadas. Foram investigados doleiros do Paraná, de Brasília, de São Paulo e do Rio de Janeiro.

O Ministério Público Federal recolheu provas de um imenso esquema de corrupção envolvendo a Petrobras. Grandes empreiteiras organizadas em cartel pagavam propina para altos executivos da estatal e outros agentes públicos. O valor da propina variava de 1% a 5% do montante total de contratos bilionários superfaturados. Esse suborno era distribuído por meio de operadores financeiros do esquema, incluindo doleiros investigados na primeira etapa.

As empreiteiras formaram um “clube” para fraudar concorrências. Os preços oferecidos à Petrobras eram calculados e ajustados em reuniões secretas, nas quais se definia quem ganharia o contrato e qual seria o preço, inflado em benefício privado e em prejuízo dos cofres da estatal. O cartel tinha até um regulamento, que simulava regras de um campeonato de futebol, para definir como as obras seriam distribuídas. As diretorias mais envolvidas foram de Abastecimento, ocupada por Paulo Roberto Costa, entre 2004 e 2012, indicado pelo PP, com posterior apoio do MDB; de Serviços, ocupada por Renato Duque, entre 2003 e 2012, indicado pelo PT; e Internacional, ocupada por Nestor Cerveró, entre 2003 e 2008, indicado pelo MDB.

Em março de 2015, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) 28 petições para a abertura de inquéritos criminais destinados a apurar fatos atribuídos a 55 pessoas, das quais 49 eram titulares de foro por prerrogativa de função (“foro privilegiado”). Entretanto, sempre houve questionamento dos advogados em relação aos métodos adotados na Lava-Jato, que culminaram na condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Lula chegou a ficar um ano e sete meses preso em Curitiba por causa de condenação na Lava-Jato, que foi anulada pelo ministro Edson Fachin, do STF, em março de 2021. Fachin declarou a incompetência da Justiça Federal do Paraná nos casos do triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia e das doações ao Instituto Lula. Foi vitoriosa a tese do advogado do petista, Cristiano Zanin, de que Moro não era o juiz natural do processo. Recentemente, Lula o indicou para a vaga de Ricardo Lewandowski, que se aposentou, do STF. (Correio Braziliense – 08/06/2023)

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