O cotidiano presidencial agora é normal. Lula viaja para ver de perto áreas atingidas por desastres naturais e inaugurar obras
Em dias sem Bolsonaro! O Brasil está vivendo um novo clima. Não que nossos problemas foram resolvidos. Seria impossível em tão curto espaço de tempo. Mas é inegável que a tensão política foi diminuindo a cada dia, especialmente após o golpe fracassado de 8 de janeiro que teve na sua liderança Jair Bolsonaro. Hoje, os jornalistas podem percorrer as ruas sem temer pela sua própria vida. A canopla, que era escondida, voltou ao microfone. A notícia é apresentada ao público sem que o jornalista tenha de dissimular para qual empresa está trabalhando. O dia a dia do presidente da República voltou ao normal.
Ele viaja pelo País, visita tanto as zonas atingidas por algum desastre natural, como também para inaugurar obras. O clima bélico dos deslocamentos presidenciais desapareceu. As motociatas e a caterva que se reunia para saudar o mandrião ficaram no passado. E a linguagem chula, homofóbica e misógina ficou reservada à triste história do último quadriênio presidencial.
As armas como símbolo de liberdade – uma curiosa e trágica inversão de um conceito tão cara ao nosso País – foram deixadas de lado. Pelo contrário, agora serão novamente registradas, controladas, para que não caiam nas mãos de criminosos. O ex-presidente fugiu do Brasil. Desde 1990 que não havia uma transferência republicana de poder. Mas Bolsonaro foi coerente com seu passado não só reacionário: mas antidemocrático e cultor de ditaduras. Aproveitando a ocasião, não vimos mais o titular do poder Executivo federal louvando torturadores. Pelo contrário, o tema direitos humanos voltou a ser a tônica da linguagem presidencial, como sempre deveria ser. Afinal, é o que determina a nossa Constituição.
A barbárie, tão presente no cotidiano governamental e nas falas de Bolsonaro e de seus ministros, simplesmente desapareceu. Que bom foi ouvir palavras de paz, do campo democrático, sem que tivéssemos de nos envergonharmos do presidente da República. O Brasil deixou internacionalmente de ser um Estado pária. Voltamos a fazer parte da comunidade mundial. O isolamento do período bolsonarista é coisa do passado. O Itamaraty retornou ao bom caminho, o caminho do Barão do Rio Branco. O cercadinho – lembram? – hoje não passa de um triste e patético momento da nossa história. As declarações estapafúrdias à caterva bolsonarista, as frases desconexas, seguranças, que deixariam temerosos os cangaceiros de Lampião, evaporaram. Ufa, agora podemos respirar. Voltamos a ser uma República. Mas não podemos vacilar. (IstoÉ – 15/04/2023)
Marco Antonio Villa, historiador, escritor, professor da Universidade Federal de São Carlos (1993-2013) e da Universidade Federal de Ouro Preto (1985-1993). É Bacharel (USP) e Licenciado em História (USP), Mestre em Sociologia (USP) e Doutor em História (USP)