No linguajar armamentista tão caro ao presidente, Jair Bolsonaro termina o mês de agosto sem muita bala no pente para reverter uma rejeição que permaneceu inalterada mesmo diante dos programas sociais turbinados já atropelando a lei eleitoral e que se firma como fator decisivo da eleição deste ano.
A ajuda inédita dada pelo Congresso às pretensões eleitorais de Bolsonaro se mostrou relevante para melhorar um pouco a avaliação do governo e as intenções de voto do candidato do PL. Mas esse movimento, em escala bem menor que a esperada pelo presidente e por seu entorno, foi mais intenso em julho que neste mês que se encerra hoje, justamente quando o dinheiro começou a pingar na conta dos beneficiários do Auxílio Brasil, do vale-gás majorado e dos outros chamarizes de votos.
Diante dessa situação, e das apostas até aqui ainda não concretizadas de reposicionamento de imagem de Bolsonaro, resta à campanha apostar todas as fichas na associação de Lula com a corrupção e com governos de esquerda a ser demonizados nos países do continente.
O dramático, para ele, é que esses são temas que não dizem absolutamente nada aos eleitores mais pobres, seja do Nordeste ou das grandes cidades do Sudeste, dois focos de atenção da campanha, que deram de ombros para o aumento dos auxílios, continuam sentindo no bolso a inflação de alimentos e não se mostram “gratos” a Bolsonaro, como seus ministros parecem esperar de modo quase infantil nas redes sociais, pelos R$ 600 ou pela redução no preço dos combustíveis.
É provável que esses benefícios ainda deem algum gás a Bolsonaro no setembro derradeiro antes da eleição, mas o início da campanha mostrou que os fatos da política continuam fazendo o presidente incorrer em seu discurso de sempre, que o mantém amarrado a uma rejeição proibitiva.
Uma das tarefas de agosto era atrair o eleitorado feminino. Os estrategistas decidiram que um caminho para isso era colocar Michelle Bolsonaro para falar com a eleitora evangélica. Surtiu efeito no conjunto dos evangélicos, mostram as pesquisas, mas sobretudo pelas fake news associando Lula a um fantasioso fechamento de templos.
O voto feminino, cobiçado por representar mais de 50% do total de eleitores aptos a votar, continua refratário a um presidente e candidato capaz de se descontrolar num debate em rede nacional e de ofender jornalistas e candidatas mulheres.
Da mesma forma, a ideia de um Bolsonaro moderado, disposto a não mais questionar as urnas eletrônicas, se esvaiu na mesma proporção em que a sociedade civil e as instituições ocuparam o mês de agosto para deixar claro que ensaios de golpe não serão tolerados.
Bolsonaro agora está diante do dilema entre desistir das conturbações que pretende fazer no 7 de Setembro, sob pena de entornar o caldo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de perder ainda mais apoios, e partir para o tudo ou nada, opção que condiz mais com sua característica de ignorar conselhos e agir sempre de acordo com sua lógica particular e tortuosa.
No pós-debate, as milícias bolsonaristas deram a ordem unida de reforçar os ataques às mulheres nas redes sociais. Incompreensível diante da evidente necessidade de ele crescer agora para garantir o segundo turno e se mostrar capaz de uma virada nas quatro semanas que separam os dois encontros dos eleitores com as famosas urnas eletrônicas.
Depois de um mês praticamente perdido, a despeito dos milhões gastos, e das reiteradas vezes em que Bolsonaro se mostrou impermeável a esquemas táticos, setembro começa sob o signo da incógnita.
Nunca antes um presidente chegou tão mal avaliado e com uma rejeição tão monolítica nos 30 dias anteriores à eleição. As balas na agulha já foram usadas, e agora restam poucos cartuchos, sem sinal da bala de prata. (O Globo – 31/08/2022)