Escrevo esta coluna muito abalada pelo desaparecimento do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Araújo. Enquanto aguardamos o desfecho do que aparenta ser um crime brutal que precisa ser esclarecido, devidamente julgado e punido, me pus a refletir sobre como estancar a sangria predatória de recursos naturais e a violência crescente que ocorre na região. Não podemos mais permitir que os defensores da floresta e os que os apoiam assumam com seus próprios meios e corpos a defesa dos seus territórios e do seu modo de vida.
A Amazônia é um ativo estratégico central para nosso país. Para protegê-la é necessário, por um lado, atuar nas múltiplas dimensões de segurança —humana, pública, ambiental e jurídica—, para garantir o cumprimento da lei e a proteção da floresta e seus defensores. Isso envolve um arranjo de governança com diferentes instituições e níveis de governo, com metas comuns e competências de atuação transparentes e colaborativas. E por outro, atrair investimentos alinhados ao desenvolvimento sustentável da região, que tenham a melhoria das condições de vida das populações locais como condição central. Essas duas frentes precisam andar juntas e de forma coordenada.
Para que essa visão seja implementada, os planos para a região devem partir de diagnósticos corretos. A começar pelo fato de que existem múltiplas Amazônias, com diferentes populações com distintas vocações e necessidades, incluindo povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, assentados, população urbana, empreendedores e empresários, mão de obra migrante e refugiados. Há também diferentes regimes fundiários que precisam ser organizados e consolidados, e um paradigma histórico de ocupação violenta que precisa ser transformado.
As sinalizações feitas nos últimos anos pelo governo federal e pelo Congresso Nacional de incentivo e licença social para práticas criminosas contrárias ao meio ambiente e aos direitos humanos, somadas ao desmonte das instituições responsáveis por combater os ilícitos ambientais e proteger as populações tradicionais, agravaram sobremaneira as tensões na região. No vazio institucional instaurado, a violência se fortaleceu como método de resolução de conflitos. (Folha de S. Paulo – 15/06/2022)
Ilona Szabó de Carvalho, empreendedora cívica, mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia). É autora de “Segurança Pública para Virar o Jogo”