“Errar é humano, repetir o erro é burrice.” Pois o presidente Jair Bolsonaro repetiu no funeral da rainha Elizabeth, em Londres, os mesmos erros que cometeu no bicentenário da Independência, em Brasília e Copacabana. Joga fora, assim, o trunfo de reunir dezenas de apoiadores na capital do Reino Unido, como jogou o de atrair multidões gigantescas no 7 de Setembro.
Além de recursos, agentes e prédios públicos, Bolsonaro usou a festa nacional e o funeral da rainha para fazer campanha e comício. O povo não é bobo, vê e desaprova. O que fica da viagem é a foto, inacreditável, do presidente do Brasil com um sorrisão ao cumprimentar o rei Charles, filho da rainha morta. Rindo no velório? Como se fosse uma festa? É falta de decoro, de compostura, de elegância. De matar de vergonha.
E esse presidente do Brasil pegou o braço do rei, como num abraço de velhos amigos, tomando chope no bar da esquina. Qualquer secretário do Itamaraty, ou aspirante a diplomata de qualquer país, sabe que não se toca em reis e rainhas e não se ri alegremente em velório – aliás, nem de reis nem de plebeus.
Se essa é a foto do protagonista, as imagens dos comícios não ficam atrás. Numa, um bolsonarista intimida uma repórter e um cinegrafista e se sai com a seguinte pérola: a BBC não é bem-vinda em Londres!
Como assim? A BBC é de Londres, é o rádio e a TV pública da Inglaterra, um orgulho do povo inglês. Se alguém estava sobrando ali, não eram os jornalistas…
Num outro vídeo, um inglês pede “respeito” aos bolsonaristas no funeral de quem reinou por sete décadas e faz parte da vida dos súditos. Essa descompostura foi o tom da cobertura da imprensa britânica sobre a presença de Bolsonaro entre os cerca de cem chefes de Estado e de governo nas homenagens a Elizabeth.
É de se imaginar que boa para Bolsonaro a viagem não será, assim como o 7 de Setembro poderia ter sido e não foi. Bolsonaro não amenizou sua imagem internacional e passou a léguas de se comportar como estadista. É assim que a eleição vai chegando com o ex-presidente Lula chovendo no molhado ao reunir ex-presidenciáveis já aliados, mas à frente do início ao fim e recuperando a chance de vitória em primeiro turno.
Hoje, na ONU, em Nova York, Bolsonaro fará discurso, ou comício, não para a comunidade internacional, mas para o eleitor brasileiro. Só falta ele repetir que vai vencer em primeiro turno, como fez em Londres, ou dizer que, se perder, o Brasil vai mergulhar no comunismo. Sem pé nem cabeça, típico de um presidente que usou o dia nacional para se vangloriar de ser “imbrochável”. (O Estado de S. Paulo – 20/09/2022)