Vera Rosa: O desafio de Simone Tebet

Quibes, esfihas e outros quitutes árabes ornamentavam a comprida mesa de 12 lugares, na casa de Campo Grande, quando Simone entrou na sala. “Você vai ser candidata a deputada federal”, disse-lhe o pai. “Não vou, não”, reagiu a filha, então professora universitária. “Quero ser deputada estadual.”

O ano era 2002 e, à época, Ramez Tebet desfrutava de prestígio no MDB. Era presidente do Senado, havia comandado a CPI do Judiciário, que resultou na cassação de Luiz Estevão, e o Conselho de Ética durante as investigações sobre a quebra de sigilo do painel eletrônico de votação.

Intrigado, o pai de Simone quis saber os motivos da decisão que desafiava a lógica política num momento em que ele era poderoso cabo eleitoral. “Mas por que você não quer ser candidata a deputada federal?”, perguntou Tebet.

A resposta foi simples e inesperada. “Pai, eu tenho duas filhas pequenas e quero almoçar todos os dias com elas”, afirmou Simone, ao explicar por que deixaria Brasília fora de seu mapa em sua primeira investida eleitoral. E assim foi.

Escolhida há uma semana como candidata da aliança MDB, PSDB e Cidadania para disputar a sucessão de Jair Bolsonaro (PL), Simone Tebet enfrenta agora, 20 anos depois, o desafio de mostrar a que veio.

Pesquisas indicam que ela tem, hoje, de 1% a 3% das intenções de voto.

A terceira via tenta construir uma alternativa capaz de romper a polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula (PT), mas ainda não tem um mote para chamar de seu nessa campanha. Não basta ficar no discurso do “nem-nem”, enquanto Lula ressuscita o “nós contra eles” e Bolsonaro bate na tecla do “bem contra o mal”.

Depois de conquistar empresários e economistas, Simone cumprirá um roteiro popular, que inclui festas juninas nordestinas, passando pelo Ceará. A entrada do senador Tasso Jereissati (PSDB) como vice na chapa pode atrair votos no Nordeste, região que concentra 40 milhões de eleitores. Muitos depositam em Tasso a expectativa de convencer Ciro Gomes (PDT) a pular no barco da terceira via, uma missão quase impossível.

Nesse cenário de fogo amigo, há traições a Simone no MDB e no PSDB, principalmente no Nordeste e no Sul, onde os dois partidos estão divididos no apoio a Lula e a Bolsonaro.

Ao Estadão, a candidata disse que não reivindica palanque exclusivo, mas, sim, espaço para expor ideias. Uma delas é criar portas de saída para a desigualdade social. Não por acaso, seu livro de cabeceira é Cuidar Uns dos Outros, de Minouche Shafik. “Sempre tive que empurrar portas”, afirmou.

Simone sabe, porém, que terá de dizer “não”, como fez quando decidiu entrar na política, se quiser avançar casas no jogo. (O Estado de S. Paulo – 15/06/2022)

Vera Rosa, repórter especial

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