Raros assassinatos políticos recebem ordem direta de mandante, os assassinos agem motivados por clima moral criado pelos líderes. Tiram a vida de pessoas por acreditarem que elas são inimigas de uma causa. Bolsonaro não deu ordem para que os irmãos Amarildo da Costa e Oseney da Costa assassinassem Dom Phillips e Bruno Pereira, mas criou o clima moral para que eles tomassem a iniciativa de matar as vítimas, esquartejar seus corpos, carbonizar seus restos e enterrar as partes. Eles não esperaram ordem direta, mas a mente de cada um foi forjada nas falas e agressões feitas ao longo de meses por Jair Bolsonaro.
Raros assassinatos políticos recebem ordem direta de mandante, os assassinos agem motivados por clima moral criado pelos líderes. Tiram a vida de pessoas por acreditarem que elas são inimigas de uma causa. Bolsonaro não deu ordem para que os irmãos Amarildo da Costa e Oseney da Costa assassinassem Dom Phillips e Bruno Pereira, mas criou o clima moral para que eles tomassem a iniciativa de matar as vítimas, esquartejar seus corpos, carbonizar seus restos e enterrar as partes. Eles não esperaram ordem direta, mas a mente de cada um foi forjada nas falas e agressões feitas ao longo de meses por Jair Bolsonaro.
Olhavam para Dom Phillips com o mesmo pensamento que Bolsonaro havia explicitado diretamente ao jornalista britânico, em reunião transmitida pela televisão: “A Amazônia não é de vocês (estrangeiros), é nossa”. Avisando para não se meterem nos nossos assuntos de queimada de florestas, poluição de rios, pesca insustentável, derrubada de árvores. Ao usarem suas armas, os irmãos viam Dom como um invasor estrangeiro, e Bruno como cúmplice traidor da pátria. Além de invasor e cúmplice, os dois eram inimigos dos pescadores, dos garimpeiros, dos madeireiros, daqueles que desejam o progresso.
Ao clima moral se somou o incentivo a usar pistolas criado desde o início do atual governo. É do presidente a ideia de cada cidadão, como os dois irmãos, defenderem seus direitos com as armas nas mãos. Inclusive o direito de pescar, mesmo que em um ritmo que destrua a sustentabilidade, ou garimpar, mesmo que o mercúrio mate os habitantes nas margens dos rios. Ainda mais quando o presidente diz que Jesus teria usado pistolas para se defender dos inimigos se elas existissem no tempo dele.
Os irmãos não se sentiam assassinos, apenas soldados da soberania nacional, do progresso do país, do direito a pescar tudo que fosse possível, e a usar pistolas sagradas na defesa da liberdade. Para completar o clima moral, os irmãos têm a confirmação ao verem a impunidade dos que antes mataram índios, seringueiros, agricultores, ecologistas na guerra amazônica. Não se sentiam assassinos, eram apenas parte visível do sonho moral do Presidente da República, que se controla para não elogiar assassinos que ele vê como soldados. Tanto que ele facilita o acesso às armas pelos particulares e desarticula o sistema público de segurança. Fez parte da criação do clima moral corromper as Forças Armadas, com gabinetes no lugar dos quarteis, menos tarefas de defesa das fronteiras, de desarmamento do crime organizado, proteção do patrimônio natural e dos direitos dos povos indígenas, e mais tarefas políticas relacionadas às urnas eletrônicas.
Os assassinos não precisavam de ordem direta, ela estava dada pelo clima social criado por um governo que incentiva o crime contra jornalistas, meio ambiente, povos indígenas, dando armas e argumentos, por um presidente que concluirá seu mandato como um farrapo moral diante do mundo. (Blog do Noblat/Metrópoles – 18/06/2022)
Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador