MANCHETES DA CAPA
O Globo
Na TV, Bolsonaro fatura PIB e é alvo de panelaço
Cármen Lúcia autoriza 2ª investigação contra Salles
Luana Araújo na CPI: médica vetada por Planalto compara tramento precoce à ideia de Terra plana
PF prende secretário do AM e mira governador
Vacinação cai 16% em maio, com impacto na 2ª dose
Faixa de isenção do IR deve subir até R$ 2.500
Feminicídio em shopping expõe um crime em alta
Pandemia pode impulsionar superbactérias
Protocolo rígido da Olimpíada contrata com Copa América
Palestinos céticos com mudança de tom na política de Israel
O Estado de S. Paulo
Doria prevê vacinar todos os adultos de SP até o fim de outubro
Sob panelaço, Bolsonaro fala em imunização total em 2021
Fiocruz terá insumo nacional
Governador do AM é alvo da PF; empresário reage com tiros
‘Legalidade e transparência’
Sargento em live de deputado deixa Exército sob pressão
Ki covid é esdrúxulo, diz médica em CPI
Consumo de carne no País é o menor em 25 anos
Sedes da Copa América têm UTIs cheias
Cármen autoriza novo inquérito contra Salles
Coalizão faz pacto para tirar do poder Netanyahu
Folha de S. Paulo
Governo considera incentivar consumo elétrico fora do pico
Receita rastreou investigações contra entorno de Bolsonaro
Doria fala em imunizar todos os adultos de SP até outubro
Presidente promete vacina para todos em 2021
Esquerda marca para dia 19 novos atos em defesa de impeachment
Coalizão Comprova, que verifica conteúdo falso, tem novas adesões
Segurança de Cláudio Castro, governador do RJ, agride repórter
Montadoras param de novo por falta de peças
Avanço do mar derruba muros em Florianópolis
Fiocruz reduz em 50% plano de produção de vacina nacional
Demanda dispara, e UTIs de três capitais atingem 100% de lotação
Interior de SP monta até barreiras de terra para evitar turistas
Infectologista diz não saber por que foi vetada na Saúde
Operação da PF faz busca em casa do governador do AM
Oposição chega a acordo para novo governo em Israel
EDITORIAIS
O Globo
E se Bolsonaro tivesse ouvido Luana Araújo em vez de Nise Yamaguchi?
É evidente que Bolsonaro perdia tempo com charlatães, enquanto poderia ter à disposição técnicos de excelência como Luana
O depoimento da infectologista Luana Araújo à CPI da Covid ofereceu a oportunidade de pôr em contraste o que o Brasil se tornou na pandemia — e o que poderia ter sido. Inteligente, preparada, articulada, educada e paciente com os presentes, ela respondeu às questões mais estapafúrdias com clareza e firmeza.
Ao longo de mais de sete horas, trouxe para a CPI aquilo que mais tem feito falta aos debates: a voz da razão. Deixou evidente a ignorância dos senadores que saíram em defesa da cloroquina, do famigerado “tratamento precoce” e das demais fabulações que migraram das redes sociais para gabinetes da Presidência da República e do Congresso.
Por uma dessas coincidências fortuitas, Luana prestou depoimento no dia seguinte à oncologista Nise Yamaguchi, uma das maiores porta-vozes do curandeirismo e do negacionismo que brotam nos grupos de WhatsApp, infestam as hostes bolsonaristas e deságuam nas pilhas de papéis com informações fraudulentas, ideias sem nexo e conclusões absurdas sobre as mesas dos senadores governistas que integram a “bancada da cloroquina”.
Mais do que respostas, Luana deixou no ar uma pergunta perturbadora: por que o governo desprezou um quadro tão qualificado? Por que, como ficou claro ontem, o presidente da República dava ouvidos a Yamaguchi e ao “gabinete paralelo” que o aconselhava à revelia do Ministério da Saúde, enquanto há no Brasil gente tão preparada, disposta e competente quanto Luana?
Formada pela UFRJ com mestrado na Universidade Johns Hopkins, Luana foi convidada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, a ocupar a Secretaria de Enfrentamento à Covid. Ficou dez dias e foi dispensada. Quando lhe perguntaram o motivo, foi irônica: “Também gostaria de saber”. Informaram-lhe apenas que sua nomeação não fora aprovada.
No depoimento à CPI, ela dá pistas sobre as causas da dispensa. Durante a exposição técnica, objetiva, demolidora, não ficou cloroquina sobre cloroquina. Luana decifrou o funcionamento da ciência, desmascarou o “tratamento precoce”, defendeu medidas de restrição e foi implacável com o negacionismo do atual governo: “É como se a gente estivesse escolhendo de que borda da Terra plana vamos pular”. Noutro momento certeiro, disse: “A ciência não tem lado. O que existe é ciência bem feita e ciência mal feita”.
A CPI tem mostrado que o governo prefere se cercar dos adeptos do “neocurandeirismo”. Está cada vez mais bem delineado o aconselhamento paralelo por nomes como Yamaguchi. Embora sem cargo no governo, ela participou de reuniões no Planalto e teve ingerência em políticas públicas. Chegou a discutir minutas de decreto para ampliar o uso da cloroquina, droga ineficaz contra a Covid-19.
É evidente que Bolsonaro perdia tempo com charlatães, enquanto poderia ter à disposição técnicos de excelência como Luana. Infelizmente, inteligência, formação e civilidade parecem não caber num governo mais preocupado com ideologia do que com as quase 470 mil vidas perdidas.
O Estado de S. Paulo
Indisciplina premiada
Nomeação de Eduardo Pazuello premia um oficial militar que desprezou o espírito da farda que veste. As consequências desse gesto são nefastas
O presidente Jair Bolsonaro nomeou o general intendente Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, para a Secretaria de Estudos Estratégicos da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Com esse gesto, o presidente premiou um oficial militar indisciplinado, que desprezou publicamente o espírito da farda que veste. As consequências desse gesto são nefastas – e potencialmente perigosas.
A nomeação não causa surpresa. O intendente Pazuello vem demonstrando há muito tempo ter a principal – talvez única – qualidade exigida por Bolsonaro em sua administração: lealdade canina ao chefe. Na CPI da Pandemia, o ex-ministro da Saúde agrediu a inteligência alheia de maneira constrangedora para defender Bolsonaro, o principal responsável pelas enormes dificuldades que o Brasil enfrenta no combate à pandemia de covid-19.
Não bastasse isso, o intendente foi a um comício do presidente Bolsonaro, em óbvia afronta ao regulamento das Forças Armadas e à Constituição, que proíbem a atividade político-partidária aos militares da ativa, caso do general Pazuello. Para adicionar insulto à injúria, o oficial, para tentar evitar punição, justificou-se diante do Comando do Exército com a patranha de que a manifestação bolsonarista não era “política”, e sim apenas um singelo “passeio de moto”.
Desse modo, Pazuello seguiu à risca o manual bolsonarista de desfaçatez: depois de ter franqueado o Ministério da Saúde ao charlatanismo, o general fez troça da disciplina e da hierarquia militares, testando os limites institucionais – exatamente como Bolsonaro faz desde que foi um mau militar.
Para os celerados bolsonaristas, o desrespeito às instituições é sinal de valentia – essa gente considera que os pilares do regime democrático estão apodrecidos pela corrupção generalizada e pela ideologia comunista e por isso devem ser demolidos. Melhor ainda se esse combate for travado por meio de cinismo, como mostrou a indecente defesa apresentada pelo intendente Pazuello ao Exército.
Essa aventura irresponsável está conduzindo o País para um terreno minado. Bolsonaro entregou a um general insubordinado um cargo que tem entre suas atribuições elaborar análises “para o planejamento de ações governamentais com vistas à defesa da soberania e das instituições nacionais e à salvaguarda dos interesses do Estado”, conforme o Decreto 10.374. Além da óbvia afronta de Bolsonaro às Forças Armadas, que credibilidade terão os estudos em áreas tão sensíveis produzidos por um secretário que vê de maneira tão equivocada os interesses do Estado e valoriza tão descaradamente os interesses próprios e de Bolsonaro?
Na caquistocracia bolsonarista, contudo, isso é irrelevante. Com a nomeação do indisciplinado e incompetente Pazuello, Bolsonaro confirma a profunda mediocridade de seu governo. Mais grave, contudo, é que o presidente consagra como princípios a insubordinação e a quebra da hierarquia militar, exatamente à sua imagem e semelhança. Convém lembrar que no mais recente momento da história nacional em que isso aconteceu, o presidente da República que estimulou a indisciplina militar foi afastado pelas Forças Armadas.
Engolfado pela pandemia e pela perda de quase meio milhão de brasileiros, o Brasil não precisa de desordem militar. O País está pacificado desde 1985, com a culminação do processo de transição do regime militar para a democracia. Desde aquele momento, os militares retiraram-se da cena política. Não há hoje nenhuma questão ideológica que justifique essa tensão que Bolsonaro provoca nos quartéis e no País.
Na verdade, o presidente Bolsonaro parece interessado em submeter as Forças Armadas a seus propósitos autoritários, mas as Forças Armadas certamente não se têm deixado submeter a interesses mesquinhos nem deixarão que se instaure em suas fileiras a desobediência sistemática. Se o fizessem permitiriam que se instalasse na tropa uma ruptura institucional que, depois de tantas lutas pela restauração da democracia, seria inadmissível diante dos brasileiros e diante do mundo.
Bolsonaro, em resumo, nomeou o intendente Pazuello pensando escarnecer dos militares. Mas o escarnecido é o País e, antes dele, um comandante em chefe que se comporta como chefe de milícia.
Folha de S. Paulo
Abuso armado
Casos de truculência policial ganham nova gravidade sob o governo Bolsonaro
À primeira vista, episódios de abuso policial podem parecer não mais que novas e deploráveis manifestações de práticas arraigadas na sociedade brasileira —que vão da abordagem truculenta de cidadãos, em geral pobres e pretos, ao excesso de violência, não raro letal, no cumprimento de deveres do ofício.
Os últimos dias foram pródigos em casos do gênero. No mais dramático deles, dois homens perderam a visão de um dos olhos ao serem atingidos, no sábado (29), por balas de borracha disparadas pela Polícia Militar durante protesto contra Jair Bolsonaro em Recife. As vítimas não participavam do ato.
No mesmo dia, um PM agrediu com um soco na boca um jovem negro em Caieiras (SP), durante uma abordagem; um dia antes, em Cidade Ocidental (GO), um jovem negro que gravava em vídeo suas manobras ciclísticas teve uma arma apontada para si e foi algemado por um policial militar.
Na segunda-feira (31), a PM goiana invocou a Lei de de Segurança Nacional, de 1983, e deteve em Trindade um professor que tinha em seu carro uma faixa que chamava o presidente de genocida.
Como já se percebe a esta altura, a natureza do governo Bolsonaro confere a esses tristes episódios uma nova gravidade —ainda que nem todos eles apresentem uma conexão política óbvia.
O atual chefe de Estado, afinal, baseou sua longa carreira parlamentar na defesa de interesses corporativos de militares e agentes de segurança pública —e também na apologia da brutalidade policial.
No Planalto, tal militância resulta em má política pública: desde reajustes salariais descabidos e cargos na administração aos fardados até tentativas de garantir na lei a impunidade de policiais que matam em serviço. Mas esse nem é o desdobramento mais preocupante.
Bolsonaro estimula, sobretudo, a politização nos quartéis e nas delegacias. Assim fez quando sem maiores sutilezas quis emprestar legitimidade ao criminoso motim de PMs cearenses no ano passado, por ele chamado de greve, ou quando levou o general da ativa Eduardo Pazuello a um palanque.
A profissionais que recebem armas do Estado não é dado o direito a movimentos paredistas e a manifestações políticas, pelos óbvios riscos à segurança dos cidadãos e ao convívio democrático. Ensaios do tipo, mesmo os incipientes, precisam ser rechaçados por superiores hierárquicos, autoridades, líderes políticos e sociedade.
Do presidente da República, infelizmente, não se pode esperar nada além de arruaça. Na ausência de compostura do mandatário maior, cabe às forças responsáveis de defesa e segurança pública zelar pela disciplina e pelo respeito à sua missão constitucional.