Deportação ameaça brasileiros nos EUA

NAS ENTRELINHAS

Antes, a esmagadora maioria procurava ganhar a vida à própria sorte, mas hoje é um público mais diversificado: investidores, aposentados, profissionais de alta qualificação

Ao anunciar que Tom Homan será o diretor da agência de Imigração e Fiscalização Aduaneira (ICE), o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, gerou grande insegurança na comunidade brasileira residente nos Estados Unidos, que chega a 1,9 milhão de pessoas, centenas de milhares em situação ilegal. “Eu conheço Tom há muito tempo e não há ninguém melhor para policiar e controlar nossas fronteiras”, afirmou Trump em sua rede social, a Truth Social.

Thomas Douglas Homan, esse é o nome completo, foi diretor interino da agência de Imigração de janeiro de 2017 a junho de 2018, durante o governo Trump. Grandalhão, louro de olhos azuis, notório “supremacista” branco, defende “tolerância zero” com imigrantes sem documentação em dia e a construção de barreiras físicas na fronteira com o México, principalmente o muro, uma das principais bandeiras de campanha de Trump. Agora, ficará encarregado de todas as deportações de imigrantes ilegais de volta ao seu país de origem.

Desde a década de 1990, no governo de George W. Bush e, também, no governo Obama, cercas e barreiras foram construídas para evitar a entrada de imigrantes latino-americanos. Já na campanha de 2016, Trump defendeu a construção do muro na fronteira Estados Unidos-México, que teria 3.145km e cruzaria os estados da Califórnia, Arizona, Novo México e Texas. No primeiro governo Trump (2017-2021), 1,6 milhão de imigrantes foram deportados dos EUA — quase metade do que houve no primeiro mandato de Obama (2009-2012) e 490 mil a menos do que no segundo (2013-2016).

No governo Obama, houve o maior número de deportações por via legal da história: 3 milhões. Isso foi consequência de processos iniciados ainda sob George W. Bush (2001-2008), cuja pressão em cima dos imigrantes sem documento levou à saída voluntária de 8 milhões de pessoas “deportáveis”. Esse efeito pode se repetir sob Trump, já que a via legal é mais lenta e custosa.

Trump conseguiu construir 727km de muros, a maior parte onde já existiam barreiras e cercas. Biden autorizou a construção de mais 32km, sob alegação de que os recursos estavam alocados desde o governo anterior e não poderiam ser redirecionados. Trump transformou o muro numa marca de sua gestão e bandeira para a volta à presidência. Agora, pretende concluí-lo e deportar centenas de milhares de imigrantes.

Os imigrantes não autorizados nos EUA somam em torno de 10,5 a 11 milhões, segundo o Pew Research Center. A maioria vem da América Latina, especialmente do México. No entanto, nos últimos anos, houve um aumento significativo de imigrantes de outros países, como o Brasil, Venezuela, Haiti, Honduras, El Salvador e Guatemala. Em 2021, o número de brasileiros detidos na fronteira sul dos EUA aumentou consideravelmente, chegando a cerca de 56.000 detenções naquele ano, o que representou um aumento significativo em relação aos anos anteriores.

Diáspora

A deportação de brasileiros que viviam nos Estados Unidos disparou em 2022. Só nos seis primeiros meses aquele ano, 2.221 pessoas desembarcaram no Brasil em aviões que traziam até famílias inteiras que estavam em situação irregular ou que tentaram entrar no país ilegalmente. Com o retorno de Donald Trump à Casa Branca e sua promessa de promover “a maior deportação em massa da história”, teme-se que a hostilidade contra imigrantes e a abordagem ostensiva das autoridades tragam de volta a instabilidade que os imigrantes sentiram na pele durante o primeiro mandato do republicano.

Essa seria a primeira medida de grande impacto de Trump junto aos seus eleitores. Segundo um balanço do Departamento de Segurança Interna de 2023, desde 2019, 162 mil brasileiros foram flagrados tentando cruzar a fronteira México-EUA, a 12ª nacionalidade mais apreendida. Tentavam chegar a Nova York, Boston e Miami, principalmente. Cerca de 230 mil brasileiros estão em risco de deportação imediata.

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, em 2022, dos 4,5 milhões de brasileiros em situação legal no exterior, 45% vivem na América do Norte, 32% na Europa e apenas 14% migraram para um dos vizinhos na América do Sul. Os cinco principais destinos são Estados Unidos, Portugal, Paraguai, Reino Unido e Japão.

Marta Mitico, presidente da Associação Brasileira de Especialistas em Migração e Mobilidade Internacional (Abemmi), avalia que o número de brasileiros no exterior cresceu 47% na última década, enquanto o percentual da população interna foi de apenas 6,5% no mesmo período. Pesquisa Datafolha feita com jovens de 12 capitais brasileiras em 2022 revelou que 76% deles têm muita ou alguma vontade de deixar o país para sempre. Entre a população de 15 a 19 anos, que ocupa a menor fatia do mercado de trabalho, o patamar chegou a 85%

O perfil dos brasileiros que emigram para os EUA mudou bastante nos últimos 30 anos. Antes, a esmagadora maioria procurava ganhar a vida à própria sorte, mas hoje é um público mais diversificado, formado também por investidores, aposentados do serviço público, profissionais de alta qualificação e estudantes de famílias de alta renda, que têm melhores oportunidades de trabalho e formação profissional no exterior. Exportamos talentos e renda. (Correio Braziliense – 12/11/2024 – https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/doze-mil-vezes-favela-um-retrato-da-crise-urbana/)

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