Luiz Carlos Azedo: França na OTCA consolidará internacionalização da Amazônia

NAS ENTRELINHAS – CORREIO BRAZILIENSE

As mudanças climáticas exigem respostas mais positivas do que a disputa comercial entre os Estados Unidos e a China e a guerra da Ucrânia, que opõe a Rússia invasora aos países do Tratado do Atlântico Norte (Otan), o grande bloco militar do Ocidente ainda hegemônico no mundo, que colocaram a sustentabilidade em terceiro plano na geopolítica mundial. A necessidade de cooperação entre as nações para conter o aquecimento global e transitar da economia do carbono para a economia verde, pautada pela energia limpa e renovável e a preservação da floresta, já “internacionalizou a Amazônia”, que passou a ser uma preocupação mundial, independentemente das suas fronteiras.

O desmatamento da Amazônia durante o governo Bolsonaro, cujo impacto no aquecimento global foi enorme, por causa das queimadas e derrubadas de árvores, foi um catalisador dessa internacionalização. Zerar o desmatamento é a forma mais eficiente e barata de reduzir o aquecimento global e ganhar tempo para a conversão à economia verde. Os países da União Europeia são os mais empenhados nesse processo. Não por acaso, na segunda-feira, o presidente Emmanuel Macron reivindicou que a França passe a integrar a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), formada por oito países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, República da Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.

“Declaro solenemente que a França é candidata a participar da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica e a desempenhar um papel pleno nela, com uma representação associando estreitamente a Guiana Francesa”, disse Macron. Na COP27, no Egito, quando fez dobradinha com Lula, então recém-eleito, com duras críticas ao ainda presidente Bolsonaro, o presidente francês já havia declarado, com muita ênfase, que a França se considera “uma potência amazônica”, por causa da Guiana Francesa. A antiga colônia francesa se tornou um departamento em vez de conquistar a independência, como o Suriname, a antiga Guiana Holandesa, e a Guiana, ex-colônia inglesa.

Quando Macron se refere à França como uma “potência amazônica”, obviamente não se refere à economia local, mantida por subsídios e importações. Restringe-se às plantações de arroz e mandioca, além da pesca e da silvicultura. A principal fonte de renda da Guiana Francesa é o centro espacial de Kourou. As grandes reservas de madeiras tropicais, que alimentavam uma indústria de exportação em expansão, e a exploração do ouro, com forte presença de brasileiros no garimpo ilegal, são atividades predatórias da Amazônia. A região ultramarina francesa abriga 1,1% da superfície amazônica.

Isolamento

Macron não participou da Cúpula da Amazônia, neste mês, em Belém, que reuniu líderes dos países da OTCA, apesar de ter sido convidado. Na segunda-feira, disse que gostaria de ter ido “para ser o único chefe de Estado europeu, ao lado de embaixadores europeus, para explicar como financiamos a Amazônia”. O pleito francês deve entrar na pauta da reunião dos chanceleres dos países membros da OTCA, marcada para novembro, em Brasília. Não é uma decisão fácil de ser tomada. Os oito países consideram que já cobrem o território da Amazônia. Mesmo a participação da França como observadora enfrenta resistência de algumas nações.

Em 2019, ao presidir a reunião do G7 (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido), Macron traduziu a visão dos países mais ricos do mundo sobre a região: “A Amazônia é nosso bem comum. Estamos todos envolvidos, e a França está provavelmente mais do que outros que estarão nessa mesa (do G7), porque nós somos amazonenses. A Guiana Francesa está na Amazônia”.

Situada na costa setentrional da América do Sul, como o Suriname e a República da Guiana, a Guiana Francesa parece mais um território caribenho do que sul-americano. Está isolada do resto do continente pela floresta amazônica, pois é essencialmente povoada na faixa atlântica. O idioma francês e o dialeto créole, também presentes nas Antilhas, não são falados nos demais países sul-americanos.

A Guiana Francesa se manteve isolada, mas agora sofre com os imigrantes ilegais, principalmente garimpeiros brasileiros e peruanos, traficantes colombianos e refugiados haitianos. O Brasil sempre deu mais importância estratégica à cooperação com a Guiana do que a própria França. A Ponte Binacional Franco-Brasileira, liga as cidades de Oiapoque, no Amapá, e Saint-Georges-de-l’Oyapock, na Guiana Francesa. Com duas torres de 83 metros de altura e um comprimento de 378 metros, é uma ponte estaiada, com duas faixas de rodagem e uma calçada para pedestres. Por ela, neste mês, saiu o primeiro carregamento de soja do Amapá para a França. (Correio Braziliense – 30/08/2023)

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