Cidadania vai ao Supremo para derrubar Lei de Segurança Nacional

Partido também vai pedir urgência para projeto que institui Lei de Defesa do Estado Democrático; objetivo da ofensiva é impedir as tentativas de Jair Bolsonaro de silenciar e perseguir cidadãos críticos ao governo

O Cidadania ingressou neste sábado (3) no Supremo Tribunal Federal pedindo que a Corte julgue incompatível com a Constituição a Lei de Segurança Nacional (LSN), que vem sendo usada pelo presidente Jair Bolsonaro para perseguir cidadãos críticos ao seu governo. Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), assinada pelo advogado Paulo Iotti, o partido argumenta que a lei deve ser integralmente derrubada, mas, caso esse entendimento não prevaleça, pede que os ministros reconheçam a validade da Lei apenas para proteger instituições democráticas e grupos vulneráveis, não pessoas físicas em cargos públicos.

Na avaliação do partido, o governo federal está usando a LSN para violar preceitos fundamentais da Constituição com “as recentes instaurações de inquéritos policiais e prisões efetivadas, ora por requisição do Sr. Ministro da Justiça e da Segurança Pública, ora por autoridades policiais, pelo fato de se qualificar, com toda a justiça, o Sr. Presidente da República como genocida ou termos afins, em contexto de evidente crítica política ante a notoriamente desastrosa condução negacionista e anticientífica do mesmo relativamente à pandemia do COVID-19”.

“A peça é assinada pelo Iotti, mas sustentada por um grupo de juristas que, como o partido, entende que esse entulho da ditadura militar não pode permanecer de pé porque nas democracias não existe delito de opinião. As pessoas devem ser livres para criticar aqueles que elas elegeram ou as autoridades que as governam. No mínimo, a LSN só pode valer para ameaças reais a instituições democráticas, não a pessoas físicas que delas façam parte. E, mesmo assim, somente se estivermos diante de incitação real a dano e não por meras palavras”, explica o presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire.

A ofensiva do partido contra a tentativa do atual governo de cercear a liberdade de expressão não ficará só na ADPF. Na Câmara dos Deputados, o líder Alex Manente (Cidadania-SP) vai apresentar um requerimento de urgência para acelerar a votação do Projeto de Lei 6764/2002, que revoga a LSN e institui, no lugar, a Lei de Defesa do Estado Democrático. A proposta foi apresentada por Miguel Reale, então ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso, e elaborada por uma comissão de juristas da qual fazia parte o atual ministro Luís Roberto Barroso, do STF.

O texto abandona a terminologia da Segurança Nacional, própria do regime de exceção, e privilegia a “importância da liberdade duramente conquistada” e o “respeito ao pluralismo político e às instituições democráticas”, espíritos que nortearam os trabalhos daquela comissão. Entre outros pontos, o projeto visa coibir o abuso de poder do Estado e estabelece o “crime de atentado a direito de manifestação, que consiste em impedir ou tentar impedir, mediante violência ou grave ameaça, sem justa causa, o livre e pacífico exercício do direito de manifestação”.

Conforme Iotti, os objetivos da ação no Supremo são compatíveis com diversos projetos em tramitação no Congresso Nacional, inclusive o projeto para o qual o partido pedirá urgência.

“Fizemos diálogos institucionais com todos os PLs que pedem revogação ou alteração da LSN para que o STF possa decidir o mais próximo possível, se assim julgar necessário, do que se debate no Legislativo. É algo que a Corte costuma levar em consideração em decisões concretistas e decisões em geral”, observa, ao ponderar que essa é uma das principais diferenças desta para outras ações que igualmente pedem a derrubada da LSN.

“Uma delas pede só a interpretação da Lei conforme a Constituição, não que a lei seja integralmente derrubada, enquanto pedimos também a não-recepção. Tem também a diferença de pedirmos subsidiariamente para que, se o STF não derrubar a lei inteira, que ela se aplique só para proteger instituições democráticas e grupos vulneráveis, já que a LSN trata também de racismo e intolerância religiosa”, pontua.

ADPF

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental é usada para questionar a constitucionalidade de normas anteriores à Constituição Federal de 1988, caso da Lei de Segurança Nacional que, na visão do partido, não foi recepcionada pela Carta Magna.

Na ação no STF, o Cidadania define a LSN como “pura e simplesmente um entulho autoritário, criada a partir de uma ideologia ditatorial, pela Ditadura Militar que assolou o Brasil no período de 1964 a 1985, com o intuito de calar a crítica política e impor a aceitação de quaisquer políticas por parte dos detentores do poder, como prova o mote ‘Brasil, ame-o ou deixe-o’, notoriamente adotado pela Ditadura em suas perseguições políticas”.

O partido alega, ainda, que a Constituição não criminaliza a opinião, motivo pelo qual mesmo o uso de adjetivos como “genocida” não pode ser considerado crime contra a segurança nacional ou mesmo contra a honra “quando o contexto político-social justifique tais críticas”.

“Não há que se falar sequer em tese em ofensa à honra subjetiva do presidente da República, mas tão somente de crítica ao comportamento (aliás, amplamente questionado) deste em relação à pandemia causada pelo novo coronavírus”, sustenta a ação.

“O STF reconhece critérios particulares para aferir ofensas à honra baseados na maior ou menor exposição pública da pessoa ofendida, tendo em vista que ‘ao dedicar-se à militância política, o homem público aceita a inevitável ampliação do que a doutrina italiana costuma chamar a zona di iluminabilit, resignando-se a uma maior exposição de sua vida e de sua personalidade aos comentários e à valoração do público, em particular, dos seus adversários”, pondera o texto, citando voto do ministro Sepúlveda Pertence.

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