‘A esquerda anti-Bolsonaro não é pró qualquer coisa’, diz Cristovam Buarque

Em entrevista ao jornal “O Globo”, ex-senador do Cidadania do DF fala sobre os erros da esquerda brasileira (Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo)

‘Nós toleramos a corrupção, o aparelhamento do Estado’, diz Cristovam Buarque

Ex-ministro da Educação do governo Lula lançou livro no qual afirma que erros do bloco progressista ajudaram a eleger Bolsonaro

Isabella Macedo – O Globo

Ex-ministro da Educação do governo Lula e ex-senador pelo Distrito Federal, Cristovam Buarque (Cidadania) elenca em seu livro “Por que falhamos – O Brasil de 1992 a 2018” o que considera os principais erros do bloco progressista. Lançado no fim do ano passado, o livro aponta 24 desacertos que levaram à eleição de Jair Bolsonaro em 2018. Para o ex-senador, o bloco — que, para ele, reúne PSDB e PT, entre outros partidos —não foi capaz de se unir em torno de um projeto de país e cedeu à corrupção. Em entrevista ao GLOBO, Buarque afirma que a esquerda está nocauteada, sob o risco de se diluir ainda mais na corrida eleitoral deste ano. “Que se tenha alguma unidade, senão o Bolsonaro vai continuar”, afirmou o ex-senador.

O senhor elenca 24 erros da esquerda em seu livro. Qual foi o mais grave?

Não dá para classificar, mas o começo foi não ter uma unidade entre as forças. O PSDB e o PT se comportaram o tempo todo como inimigos, e não como parceiros em uma proposta de reorientar o futuro do país. Nós saímos do regime militar e ficamos com dois governos curtos, o do Sarney e o do Collor. E quando chega o primeiro governo do bloco dos democratas progressistas, era a hora de nos unirmos. O ponto fundamental seguinte é que não criamos uma identidade, eu chamo de uma utopia. Juscelino (Kubistchek) colocou uma, com a industrialização. A esquerda, naquele período, falava nas reformas estruturais. Nós ficamos sem uma bandeira. Tanto que, depois que perdemos, a única proposta da esquerda é tirar Bolsonaro. A esquerda anti-Bolsonaro não é pró qualquer coisa. Qual a proposta das forças progressistas no Brasil hoje? Manter as conquistas nos costumes que Bolsonaro ameaça. E o que mais? Manter o Bolsa Família? Ele não só está mantendo como deu o 13º. Crescer a economia? Entregamos o governo em depressão. Não criamos a utopia. A única utopia viável era o Brasil ser um dos melhores países do mundo em Educação e uma estratégia para que, em 20 ou 30 anos, os pobres tivessem uma escola tão boa quanto a dos mais ricos.

E o que seria necessário para corrigir os erros?

A primeira coisa é aceitar que erramos. Podem não ser esses os erros, mas erramos. Se nós não tivéssemos errado, o presidente não era o Bolsonaro. Era alguém do PSDB, alguém do PT, do PSB, do PDT. Era alguém desse bloco. Aliás, um erro grave foi o de cair na corrupção. Quando eu digo “nós”, eu não digo todos. Eu não caí. Mas faço questão de colocar no mesmo bloco. Nós, como bloco, toleramos a corrupção, o aparelhamento do Estado, convivemos com as mordomias. Não acabamos com as mordomias, elas aumentaram. Temos que reconhecer que erramos e discutir quais os erros. Concomitantemente, qual é a nossa proposta para o Brasil, sem se preocupar com sigla? Qual é a proposta do bloco que pensa que é preciso progredir democraticamente?

Esses erros pavimentaram o crescimento e a eleição do presidente Jair Bolsonaro?

Não tenho a menor dúvida. Tanto que o livro vai sair em inglês e o título (traduzido) vai ser “Como a Esquerda elegeu a Direita no Brasil”.

A esquerda segue errando? Quais são os acertos atuais?

Vejo a esquerda perplexa e não está acertando. Está perplexa, levou um nocaute no ringue e ainda não se levantou. O PT ficou prisioneiro do “Lula Livre”; o PSDB, dividido completamente; e os outros tentam sobreviver.

A falta de união da esquerda também teve peso nisso?

A falta de união, de um projeto e de autocrítica. E segundo é que ninguém aceita o “nós”. O PSDB, os tucanos me escrevem dizendo “nós não, foi o PT”. E os petistas dizem “foi você, que votou pelo impeachment” (da ex-presidente Dilma Rousseff). Ninguém aceita formular uma proposta unificada. Claro, com divergências, mas que se tenha alguma unidade, se não o Bolsonaro vai continuar.

Para as eleições deste ano, qual deve ser o caminho o campo da esquerda?

Eu temo que neste ano a esquerda se dilua completamente por causa da eleição municipal. E aí a diluição virá por duas coisas: a esquerda vai brigar para ver quem é o prefeito e o debate vai ser sobre como fazer saneamento mais barato, como melhorar escolas, mas não vai ser um debate de concepção de nação. A esquerda é uma questão de concepção de nação. Não é uma questão apenas de gestão municipal. Eu acho que 2020 vai ser perdido do ponto de vista da construção de um projeto alternativo para o Brasil.

E o senhor vê possibilidade de reconstrução em 2022?

Vai ter de ter. O Brasil vai ter que encontrar um rumo e uma coesão. São duas palavras que eu acho que resumem nosso fracasso. Nós não fomos capazes de fazer uma coesão e não fomos capazes de definir um rumo.

Leia também

Secretário-geral visita Goiás para acompanhar reestruturação do Cidadania no estado

O Cidadania está passando por uma fase de reestruturação...

Vigilância em Saúde de Campo Mourão se torna exemplo de sucesso no Paraná

O município de Campo Mourão, administrado pelo prefeito Douglas...

ATENÇÃO DIRETÓRIOS: Pedido de tempo de TV deve ser feito de 10 a 25 de maio

A direção nacional do Cidadania alerta os diretórios estaduais...

Executiva Nacional discute preparação para próximas eleições no dia 26 de maio

Os integrantes da Executiva Nacional do Cidadania se reúnem...

Prefeitura de Nova Lima lança app para inclusão da comunidade surda

A Prefeitura de Nova Lima, administrada por João Marcelo...

Informativo

Receba as notícias do Cidadania no seu celular!