Roberto Freire: Polarização política não é o cenário de 2022

Ao contrário dos números de pesquisas exploratórias e comentários de alguns analistas políticos – todos eles, respeitáveis – não me parece que as eleições de 2022 estejam caminhando a passos largos para uma polarização entre Bolsonaro e um candidato do campo petista.

É muito cedo para se tirar conclusões que afirmem essa direção, as forças políticas ainda estão começando a se movimentar com mais nitidez, a avaliação de um ano de governo Bolsonaro não é boa quando comparada com presidentes da República anteriores e o PT, mesmo com Lula fora da prisão, não dá nenhuma demonstração maior de recuperação de seu fôlego eleitoral.

A polarização da política no Brasil em sua história recente, por mais paradoxal que seja, foi quebrada exatamente pela eleição de Bolsonaro. O modelo de disputa frontal iniciado em 1994, com PSDB e PT brandindo suas espadas ideológicas tortas, -não dá mais mostra que possa ser retomado, felizmente. Com a tragédia bolsonariana legitimada pelas urnas os espaços políticos se abriram e, se houver competência, poderão ser preenchidos por propostas vitoriosas mais consentâneas com a nossa história democrática e a nossa realidade.

Se voltarmos às eleições de 2018, os números indicam que naquela ocasião a polarização não ocorreu, no primeiro turno. Se Bolsonaro saiu com 46% dos votos e Haddad com 29%, houve um volume de 25% dos votos que ficaram divididos em outras alternativas, como a representada por Ciro Gomes. Como sabemos que a opção por Bolsonaro deu-se muito em função do antipetismo, podemos concluir que há uma grande massa de votos que pode fugir ao esquema pobre da polarização.

Do lado do PT, o partido não ousou, prendeu-se à estratégia de sobrevivência particular do Lula Livre, virando as costas à construção de novas alianças progressistas no país e empurrando possíveis aliados para a linha de fundo. Dificilmente terá energia para superar patamares históricos conquistados, principalmente junto à classe média e aos eleitores do centro-sul.

A situação de Bolsonaro também não é das melhores. Se toma algumas decisões para manter mobilizados algumas de suas bases – polícia, produtores rurais, extrema direita e propagadores de ideias medíocres -, no outro polo vão se acumulando insatisfações fortes junto ao mundo da cultura, aos negros, mulheres, etnias, pequenos empresários, estudantes e aos segmentos globalizados, empresariais ou não.

Ao mesmo tempo, a sua aposta tupiniquim em ser homem de Trump e fiel seguidor da sua política, demonstra ser absolutamente equivocada, pois o nacionalismo e reacionarismo do líder americano não comportam amigos nem aliados e isso deixa o governo brasileiro sem protagonismo internacional. Não se torna amigo de um presidente internacionalmente forte apenas pondo um boné com o nome dele na cabeça.

Com a sua desastrada política ambiental e ações equivocadas em política internacional, a economia tende a não deslanchar de forma efetiva e esse fato logo trará reflexos internos junto aos eleitores. A sanha privatista de Guedes, com a diabolização do Estado, embora possa acertar em alguns aspectos, não é porto seguro para os empresários e para o mercado.

Bolsonaro, ao dar amparo às teses ideológicas de ultra direita e anunciar um partido para ampará-las, distancia-se do grande campo democrático brasileiro. Muitos dos votos que lhe foram dados poderão migrar para outras alternativas que não seja o PT.

É um equívoco clamar por um centro estéril em detrimento das opções hoje colocadas, à extrema direita e à extrema esquerda. Há, sim, um enorme espaço para ser ocupado por uma proposta que saiba tirar do liberalismo a sua força para produzir riquezas com um poder público capaz de atuar numa perspectiva democrática, com políticas públicas de inclusão e da promoção da justiça social. Que mire o combate à corrupção como política permanente e que remova entulhos legais e eleitorais, permitindo que lideranças novas em idade e pensamento possam ter espaço para se apresentar à sociedade, e serem vitoriosas.

Os partidos, tal como eram concebidos, perderam a sua energia vital. Só terão protagonismo se abrirem e respeitarem os movimentos sociais, na verdade fábricas de realidades e sonhos.

Das bandas de Bolsonaro e do PT não há nada de novo e ambos mantém o Brasil fora da contemporaneidade ficando ainda como se permanentes fossem as contradições da sociedade industrial do século XX , sendo que o primeiro remete o Brasil ao século XIX e o PT à sociedade industrial do século XX. O Brasil pede uma solução para o século XXI da inteligência artificial – e ela virá.

Roberto Freire é presidente do Cidadania e ex-deputado federal

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