Na área da diplomacia a demora em defenir nomes já tem consequências, a geração de incertezas.
Lula vem protelando a definição de nomes que indicariam rumos centrais de seu governo, que já se iniciou. A consequência, talvez não intencional, é a geração de incertezas.
Acontece em especial na política externa, na qual as opções à disposição são ainda mais claras do que na economia. Basicamente trata-se de um retorno ao antiamericanismo característico dos períodos anteriores do PT no poder ou a adoção de linha de atuação internacional condizente com um contexto geopolítico que sofreu brutal transformação nos últimos 20 anos.
A disputa colocou em campos opostos o senador Jaques Wagner e o ex-chanceler Celso Amorim. Já tem consequências para o vital relacionamento com os Estados Unidos, demonstradas em dois recentes episódios de furiosa luta nos bastidores. E que deixou os americanos com uma dúvida na cabeça: pra quem eu ligo?
No primeiro, a “corrente” personalizada em Amorim tentou abortar a candidatura do respeitado Ilan Goldfajn para a presidência do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Ele era de saída o favorito para ocupar o cargo e contava com o apoio também dos americanos, que detêm 40% do capital da instituição.
A “corrente” Amorim tentou na última hora os votos dos “esquerdistas” Colômbia, Chile e Argentina para um candidato alternativo, enquanto pediam aos americanos que adiassem a votação. Ilan elegeu-se com mais de 80% dos votos – inclusive da Colômbia.
O segundo episódio tratou da tentativa de torpedear a visita do assessor de segurança nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, que acabou acontecendo no começo desta semana. Jaques Wagner havia participado desde o começo do ano de tratativas com Washington através de um canal discreto de conversas com o Departamento de Estado.
A ideia de fundo era um “reset” das relações entre Brasília e Washington baseadas no empenho comum em combater mudanças climáticas. Com os americanos pragmaticamente comprometendo-se a baixar o tom de cobranças aos brasileiros sobre a Ucrânia e as relações com a China. Os americanos tinham pressa em mandar Sullivan ao Brasil. A “corrente” Amorim, excluída dessas tratativas, nenhuma.
Aos 81 de idade, Amorim sabe que tem poucas chances de reocupar o posto de chanceler, mas luta para emplacar colaboradores antigos adeptos de sua visão das relações internacionais. O cargo está à disposição de Jaques Wagner, mas aparentemente ele e/ou Lula ainda não se decidiram.
É que um eventual “prêmio de consolação” para a corrente Amorim incluiria espaços de enorme influência dentro do Planalto, como a Secretaria de Assuntos Estratégicos. Um bate-cabeça programado na área internacional.
Lula sempre agiu pelo instinto da acomodação. Parece mais fácil na economia do que na política externa. (O Estado de S. Paulo – 08/12/2022)
William Waack, jornalista e apresentador do programa WW, da CNN