Eliane Cantanhêde: ‘Mais vale uma imagem…’

A viagem de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos, nesta semana, para a Cúpula das Américas e um (ou melhor, o primeiro) encontro bilateral com Joe Biden, pode ser um sucesso, um fiasco ou… nada. Depende do humor e da boa ou da má vontade de Bolsonaro e de Biden, um com o outro. É aí que mora o perigo.

A agenda é muito politicamente correta, ao gosto do norte-americano. Logo, só “mimimi” indigesto para o paladar do brasileiro. Democracia, eleições, ambiente, aquecimento global e energia limpa, o que deixa uma dúvida no ar poluído da relação bilateral: Bolsonaro vai assinar o documento final cheio de compromissos com democracia e sustentabilidade?

Ele pode se sentir desconfortável e até querer “reagir à altura” contra Biden, que também tem lá seu, ou melhor, seus telhados de vidro: o pós-pandemia de covid traz um novo e preocupante fator nos EUA, a inflação, e recrudesce um velho e igualmente preocupante problema do país, a imigração. Aliás, Biden deve se preparar para protestos de governos (pela exclusão de países de esquerda) e também de ruas (de imigrantes ilegais).

Rápido no gatilho, Bolsonaro já começou a atirar de véspera. Após receber o convite pessoalmente do enviado Christopher Dodd e aceitá-lo, já deixou claro, para Biden e quem mais quisesse ouvi-lo, que aceitava, mas não de bom grado: “Eu estava propenso a não comparecer. Não posso ir ser moldura de uma fotografia. Não vou para lá sorrir, apertar a mão e aparecer em foto, vou para resolver assuntos”. Aproveitou para reclamar que Biden fingiu que nem o viu no G-20 e tascou: “Talvez seja coisa da idade”.

É de uma grosseria inominável, mas não inédita. Bolsonaro já endossou piadas bolsonaristas com a primeira-dama da França, Brigitte Macron, bem mais velha do que o marido, e já atacou a ex-presidente do Chile Michelle Bachelet: “Se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 1973, entre eles o teu pai, o Chile seria uma Cuba. Quando tem gente que não tem o que fazer, vai lá para a cadeira de Direitos Humanos da ONU (que ela ocupa)”.

E que “assuntos” ele quer resolver, depois de chorar a derrota de Donald Trump e ser o último presidente do G-20 a reconhecer a vitória de Biden? Bem, assunto não falta: Defesa, armamento, agricultura, tecnologia… Mas também, por exemplo, Amazônia, Ucrânia, ataques às urnas eletrônicas, fake news e crimes digitais.

Mais do que acordos e assinaturas, a curiosidade, lá nos EUA e aqui no Brasil, é em relação à cara de Bolsonaro e Biden nas fotos do encontro e do fim da cúpula. Sabem aquela história de que “uma imagem vale mais do que mil palavras”? Pois é…. (O Estado de S. Paulo – 07/06/2022)

Eliane Cantanhêde, comentarista da Rádio Eldorado, Rádio Jornal (PE) e do telejornal GloboNews em Pauta

Leia também

Lula rouba a cena e faz do 1º de Maio um palanque eleitoral

NAS ENTRELINHASAs centrais sindicais nem se deram conta dos...

O padrão a ser buscado

É preciso ampliar e replicar o sucesso das escolas...

Parados no tempo

Não avançaremos se a lógica política continuar a ser...

Vamos valorizar a sociedade civil

Os recentes cortes promovidos pelo Governo Federal, atingindo em...

Petrobrás na contramão do futuro do planeta

Na contramão do compromisso firmado pelo Brasil na COP...

Informativo

Receba as notícias do Cidadania no seu celular!