“Oi zum zum zum zum zum zum zum, tá faltando um.” Quando leio sobre o encontro do G7, sobretudo sobre a agenda, lembro-me dessa antiga canção. O Brasil está à deriva nas relações internacionais, mas teria muito a contribuir neste momento da história da humanidade.
Bolsonaro jamais seria convidado para um encontro desse tipo, pois, em qualquer parte do mundo, atrairia grandes manifestações de protesto.
Um dos pontos da agenda foi a crise ambiental. O Brasil teria muito a dizer sobre isso, embora as decisões tenham se concentrado na produção carvoeira, que está com os dias contados.
O Brasil teria muito a falar sobre a importância do comércio de carbono, uma vez que suas florestas mantêm toneladas de CO2 sepultadas sob as árvores. Estamos tanto à deriva que nem nos damos conta disso. Nem sequer nos damos conta de que a crise hídrica que se aproxima, com reflexos no consumo de energia, resulta parcialmente das queimadas e do desmatamento na Amazônia.
Se depender do primeiro tópico da agenda, Bolsonaro seria justamente vaiado, e o Brasil perdeu seu discurso, não consegue nem estabelecer mais conexões entre os elos de sua crise ambiental.
O segundo ponto é a importância das vacinas no combate à pandemia. Há uma tendência a acreditar que, enquanto todos não forem salvos, ninguém estará a salvo. Daí a necessidade de vacinar o mundo inteiro, o mais rapidamente possível.
Se não tivéssemos um presidente obtuso, também nesse campo o Brasil desempenharia um papel importante. Em primeiro lugar, já teríamos nossa população vacinada, pois construímos um bom sistema de imunização.
Além disso, poderíamos ser um centro regional de produção de vacinas, atendendo não apenas aos vizinhos da América do Sul, como também aos africanos que, como nós, falam o português.
O G7 discutiu também a taxação de grandes empresas, como Amazon e Google. Na verdade, é uma espécie de reforma tributária da era digital, que poderá canalizar bilhões não só para o combate à pandemia, mas também para, no nosso caso, o combate à pobreza.
Nesse ponto, estamos ainda mais perdidos. Paulo Guedes fala em taxação, mas visa aos usuários, e não às grandes plataformas digitais. E Bolsonaro não tem condições morais de enquadrar gigantes como Google, Facebook etc., porque, na verdade, é um transgressor sempre ameaçado de ser enquadrado por elas, por disseminar fake news e manter um gabinete do ódio.
Quando reflito sobre a reunião do G7 e o Brasil, constato este vazio singular: estamos e não estamos no mundo. Todos os problemas importantes nos dizem respeito também, mas em todos nos ausentamos oficialmente, porque o governo vive noutra galáxia.
Bolsonaro é um adepto da retropia. Seu sonho é nos fazer voltar ao tempo da ditadura militar, com a derrubada das matas em nome da chegada da civilização.
Algumas pessoas se conformam com essa marginalização do Brasil: afinal, o país é irrelevante, dizem. É um equívoco. A irrelevância é uma escolha.
A tragédia sanitária e a destruição ambiental são a marca internacional do Brasil no momento. Em muitos países, nem com quarentena podemos entrar.
Nem sempre foi assim. E nem sempre será. Para mim, ler sobre a reunião do G7 trouxe saudades do potencial do Brasil. Um potencial que não desapareceu. Está apenas momentaneamente sepultado por um governo de extrema-direita, uma concepção de mundo que nos isola e faz com que amigos do Brasil se compadeçam de nós.
Nada mais desconfortável. Um país dessa grandeza não pode se deixar sepultar pelo atraso, não tem o direito de se tornar apenas aquele que poderia ter sido.
No mundo de hoje, está faltando um. Acontece às vezes uma espécie de apagão nacional. Mas sempre num prazo mais curto. O perigo não é apenas o mundo se esquecer de nós, mas nós mesmos nos esquecermos do que fomos e podemos ser. (O Globo – 21/06/2021)
Fernando Gabeira, jornalista