Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (28/11/2019)

MANCHETES

O Globo

STF tem maioria para envio de dados a investigações
TRF-4 amplia pena de Lula no caso do sítio de Atibaia
Reformas, até a PEC Emergencial, ficam para 2020
Dólar tem terceiro recorde em sequência
Empresas investem em políticas para a primeira infância
Em 3 meses, óleo já atingiu 779 praias
MP e ONGs reagem à prisão de brigadistas
Prefeitura, sem caixa, tenta criar mais despesas
Cresce a tensão política no Chile

O Estado de S. Paulo

Governo limita juro do cheque especial em 8% ao mês
TRF-4 sobe pena de Lula no caso do sítio para 17 anos
STF sinaliza que pode permitir envio de dados
Veto cai e fundo eleitoral pode crescer de valor
HIV cai em SP, mas avança entre idosos
Chefe da Fundação Palmares vê lado bom em escravidão

Folha de S. Paulo

TRF condena Lula por sítio, amplia pena e pressiona STF
Governo dá guinada conservadora na Cultura
Trabalhador pode ter que arcar com ação contra INSS
Governo trava juro do cheque especial em até 8% ao mês
Chefe do TJ do Acre e promotor levam multa por desmate
Bolsonaro é alvo de denúncia em corte internacional
Julgamento no Supremo tende a liberar repasse de dados da Receita
Investigação federal aponta para grileiros, e não brigadistas
Câmara aprova projeto de lei que incentiva clube a se tornar empresa
Justiça ordena que artista retire grafite feito sem aval de prédio no centro de São Paulo
Sob pressão das ruas, Chile reduz salário de políticos

Valor Econômico

Juro do cheque especial terá teto de 8% ao mês
O sucesso do baixo custo
Governo sofre derrotas no Congresso
Elas têm risco menor que o do Brasil
Ex-alunos criam fundo na PUC-Rio
TRF-4 ignora STF e eleva a pena de Lula

EDITORIAIS

O Globo

As barreiras institucionais contra o autoritarismo

Apesar da solidez das instituições, acenos ao AI-5 e avanços sobre leis têm de ser criticados com vigor

A referência feita ao AI-5 pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, estava dentro do mesmo contexto em que o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, inaugurou este tipo de declaração. Os dois casos ecoam manifestações violentas na América Latina, e, no de Guedes, exaltações feitas por Lula, depois de sair da prisão, para que exemplos desses atos no continente sejam seguidos no Brasil. Mesmo que saiam da boca de pessoas do círculo de poder em Brasília e de um líder da oposição, e por isso devam ser levadas em conta e rebatidas, não passam de balelas.

Na justa repercussão negativa do descontrole verbal de Guedes — que precisa conter os improvisos sobre assuntos fora de sua área, em que trafega com desenvoltura —, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, foi ao ponto: “então, se tiver manifestações de rua, a gente fecha instituições democráticas?” Caso haja atos de vandalismo, já ocorridos no Rio e São Paulo na esteira das manifestações de meados de 2013, fecha-se o Congresso e cassam-se direitos constitucionais como habeas corpus, liberdade de expressão, de reunião, de imprensa?

Não faz sentido, já tendo o país navegado 31 anos consecutivos na institucionalidade democrática, o mais longo período na República. O Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968, é de outro tempo, de um país e um mundo diferentes. Mas as ideologias autoritárias — à direita, caso de Bolsonaro, e à esquerda, de Lula — estão aí na disputa por votos, usando o devido espaço que a democracia abre para se fazer política de forma legítima.

A qualquer deslize, os freios e contrapesos da democracia representativa são acionados. Na maior democracia do mundo, é visível que Donald Trump, líder de uma extrema direita do Partido Republicano, não se sente bem dentro de um figurino democrático. Procura rompê-lo — na busca de verbas para construir o muro na fronteira do México, na tentativa de intervenção em organismos independentes, por exemplo —, e o sistema democrático o enquadra. Agora, enfrenta um processo de impeachment, acusado de pressionar um governo estrangeiro a ajudá-lo na campanha política à reeleição. É assim que deve funcionar, sem crises institucionais.

Também no Brasil os pendores e instintos antidemocráticos do presidente são escancarados. Tenta legislar por decretos, defende políticas de força desmedida a serem executadas pelo Estado, procura revogar leis numa penada. E as instituições — Congresso, Judiciário, Ministério Público — reagem no script da lei.

A democracia dá amplo espaço à sociedade, mas cobra responsabilidades. Tem sido assim desde a redemocratização, há 31 anos. Sem maiores abalos, dois presidentes foram afastados do Planalto por impeachment. Os vices assumiram, e a vida seguiu. O Judiciário e o MP desbarataram um sistema de corrupção enraizado desde o Executivo ao Congresso, mandando para a prisão muitas autoridades dos dois poderes, entre eles, Lula. Grupos reagem a este avanço no enfrentamento à corrupção, mas novamente os debates, as idas e vindas, ocorrem dentro dos marcos das instituições.

Mesmo que não se possam transpor para o Brasil realidades muito específicas de Chile, Bolívia, Colômbia e outros, não se deve desconhecer a situação do país e o risco de manipulações populistas. Para lidar com este quadro, existem as instituições, a serem sempre defendidas com vigor. Instrumentos legais para isso existem.

O Globo

Violência contra mulheres exige ampliação de políticas públicas

Estado tem se mostrado incapaz de conter aumento do número de feminicídios

Adriana Valéria foi enforcada pelo namorado, no dia 21, quando comemorava o aniversário de 33 anos com os filhos, em Belford Roxo. Na mesma cidade e no mesmo dia, Jéssica da Silva Salles, de 31 anos, foi morta pelo ex-namorado durante uma discussão. Em Volta Redonda, também no dia 21, Sirlene Ferreira de Lacerda, de 38 anos, foi assassinada quando ia de carro para o trabalho — o suspeito é o ex-namorado, que está preso. Em São Gonçalo, Maria Eduarda Alves Lima, de 17 anos, morreu no dia 20, dois dias depois de baleada pelo companheiro.

Adriana, Jéssica, Sirlene e Maria Eduarda, mortas num intervalo de 48 horas, são faces de uma tragédia que tem alarmado o país, mas que, apesar de esforços pontuais, continua produzindo vítimas em série, desafiando governos. Essa sucessão de crimes com perfis semelhantes mostra que iniciativas importantes, como delegacias especializadas, centros de atendimento à mulher e Lei Maria da Penha, sancionada em 2006, ainda não são suficientes para conter a onda de feminicídios.

Em São Paulo, os casos no primeiro semestre deste ano aumentaram 44% (de 57 para 82) em relação ao mesmo período do ano passado, de acordo com levantamento do site G1 e da GloboNews. No Rio, também houve crescimento dos feminicídios, segundo dados do ISP. De janeiro a outubro deste ano, foram contabilizados 63 casos, contra 55 no mesmo período de 2018. Somados os incontáveis episódios de agressões contra mulheres, o problema toma dimensão dramática.

Parece evidente que o combate a esse tipo de crime exige esforço interdisciplinar, integrado e sistemático. Obviamente, os homicídios precisam ser investigados, e os autores, punidos. A Polícia Civil de Goiás, por exemplo, prendeu nos últimos dias 73 homens acusados de feminicídio e agressões contra mulheres — alguns condenados há mais de dez anos. Mas é preciso ir além, para impedir que os crimes aconteçam. E aí entram as políticas públicas.

Há exemplos bem-sucedidos, como as patrulhas Maria da Penha, que fiscalizam se medidas protetivas estão sendo cumpridas. Estatísticas mostram que os agressores quase sempre estão perto de suas vítimas, às vezes dentro de casa. Isso deveria facilitar o trabalho para conter esses crimes. Mas, infelizmente, o Estado sempre chega tarde.

O Estado de S. Paulo

As reformas e as ruas

Um chefe de Estado deve ser capaz de convencer seus concidadãos da necessidade de adotar reformas duras, mesmo ao custo de abalo em sua popularidade. Não pode hesitar

Um chefe de Estado consciente de suas responsabilidades deve ser capaz de convencer seus concidadãos da necessidade de adotar reformas duras, mesmo ao custo de abalo em sua popularidade. Não pode, ao primeiro sinal de descontentamento, hesitar. Deve, ao contrário, mostrar convicção de que as reformas são necessárias não apenas para resolver problemas imediatos, mas para garantir um futuro melhor. Um verdadeiro estadista governa também para as gerações seguintes, enquanto o populista só se ocupa do presente e de circunstâncias efêmeras, principalmente as relacionadas com sua manutenção no poder.

Infelizmente, o presidente Jair Bolsonaro tem vacilado quando se trata de defender as mudanças estruturais de que o País tanto precisa. Há alguns dias, Bolsonaro disse que a reforma administrativa, por exemplo, “vai aparecer por aí, mas vai demorar um pouco”. Também informou que essa reforma “será a mais suave possível”. Tal cautela, disse recentemente o ministro da Economia, Paulo Guedes, deriva da preocupação do presidente de que as reformas possam causar agitação social, como a que o Chile enfrenta. “É verdade que (o processo de reformas) desacelerou”, disse Guedes. “Quando começa todo mundo a ir para a rua por nenhuma razão aparente, você fala: ‘Não, para tudo, para que a gente não dê nenhum pretexto (para violência), vamos ver o que está acontecendo primeiro”, declarou o ministro, que disse respeitar o “ótimo instinto político” de Bolsonaro.

Ou seja, Bolsonaro, segundo o ministro da Economia, decidiu “desacelerar” as reformas como reação a protestos que, por motivos que não nos dizem respeito, aconteceram em países amigos, não aconteceram aqui e talvez nem venham a acontecer, a julgar pela normalidade que se verifica hoje no País. Tal excesso de zelo soa mais como pretexto para justificar uma condução errática e titubeante das reformas – contra as quais, é bom enfatizar, o atual presidente da República lutou bravamente como deputado federal. Basta lembrar que, a certa altura da tramitação da reforma da Previdência, Bolsonaro manifestou dúvidas a respeito da proposta e chegou a interceder em favor da manutenção de regalias de algumas categorias profissionais – contrariando o espírito de uma reforma cujo propósito era justamente acabar com privilégios.

À primeira vista, o governo agora está empenhado em apresentar novas reformas ao Congresso com vista à modernização do Estado, a mudanças no sistema tributário e ao aperfeiçoamento da distribuição de recursos e tarefas para os entes da Federação. Conta-se quase uma dezena de iniciativas que, se implementadas, teriam impacto considerável e benéfico sobre a economia do País. Contudo, ao inundar o Congresso de projetos, entre os quais três emendas constitucionais, sem estabelecer prioridades e sem organizar uma base que lidere o processo em nome do presidente da República, o que o governo faz, na prática, é dispersar esforços que deveriam estar concentrados para sua aprovação. Mais uma vez, deixou ao Congresso a tarefa de determinar o ritmo da agenda política – um absurdo num regime presidencialista.

Quando os parlamentares tinham apenas a reforma da Previdência para discutir, tal comportamento, embora tenha atrapalhado em muitos momentos, não impediu a aprovação da matéria; agora, diante da profusão de projetos encaminhados pelo governo, provavelmente haverá dispersão de energias e não se sabe o que será aprovado, se é que algo será. Tal incerteza já se reflete nos humores do mercado financeiro, sendo um dos fatores da recente alta do dólar.

Como 2020 será ano eleitoral, muito provavelmente o Congresso será refratário à discussão de temas espinhosos, capazes de tirar votos. Então, pode-se presumir que muitos dos projetos do governo tendem a ficar para as calendas – e a culpa por isso será descaradamente atribuída ao Congresso, quando, de fato, as responsabilidades não ultrapassam as paredes do Palácio do Planalto.

Afinal, não se pode culpar os parlamentares por perseguirem interesses eleitorais imediatos, já que o exemplo vem de cima e não é bom. Pois, ao empurrar as reformas com a barriga sob o pretexto de evitar “agitação social”, o presidente Bolsonaro nada mais faz do que cuidar de não perder preciosos votos na próxima eleição. E as gerações futuras que se virem.

O Estado de S. Paulo

Alerta nas contas externas

O buraco nas transações correntes chegou a US$ 7,9 bilhões em outubro, atingindo em 12 meses a soma de US$ 54,8 bilhões, equivalente a 3% do Produto Interno Bruto

Com exportações em queda e saldo comercial minguante, o alarme soa mais forte no setor externo, até há pouco tempo o lado mais firme e mais seguro da economia brasileira. O alerta é especialmente relevante num momento de grande incerteza no mercado internacional. O buraco nas transações correntes chegou a US$ 7,9 bilhões em outubro, atingindo em 12 meses a soma de US$ 54,8 bilhões, equivalente a 3% do Produto Interno Bruto (PIB). Nos 12 meses até setembro, o resultado negativo havia alcançado US$ 48,9 bilhões (2,67% do PIB).

Esses dados mostram se os negócios externos são saudáveis e sustentáveis em caso de choques provenientes de fora. As transações correntes são a medida mais ampla do intercâmbio com o exterior. Por isso a sua evolução é acompanhada com atenção. Essa conta inclui a balança comercial de bens, a balança de serviços (como viagens, fretes e assistência técnica) e as balanças de rendas primárias (como lucros, dividendos e juros) e secundárias (como remessas de trabalhadores no exterior).

Quando os dólares se tornam escassos, o País pode ser forçado a enfrentar ajustes dolorosos, como já ocorreu em outros tempos. A crise argentina é um exemplo instrutivo de como o desequilíbrio externo, traduzido em crise cambial, pode impor ajustes econômicos duros e socialmente penosos. Não há risco imediato de uma situação parecida no Brasil, mas é preciso dar atenção à piora dos indicadores.

A cobertura do buraco, ainda realizada graças ao investimento direto estrangeiro, está ocorrendo com menor folga. No mês passado, entraram US$ 6,8 bilhões sob essa rubrica, valor insuficiente para financiar o déficit de outubro. Em 12 meses, houve ingresso líquido de US$ 79,5 bilhões, equivalentes a 4,35% do PIB estimado para o período. No período até setembro, o País havia absorvido US$ 81,1 bilhões (4,43% do PIB). Esse tipo de investimento é o mais útil para a economia, porque reforça a atividade empresarial e é muito menos volátil que as aplicações financeiras.

O País pode ganhar com um déficit moderado em transações correntes. Quando esse déficit é coberto com financiamento estrangeiro – por meio de investimento direto -, absorve-se poupança externa e se pode investir mais em obras, máquinas e equipamentos. O resultado é um aumento do potencial produtivo.

Uma dívida externa moderada e administrada sem dificuldade é um componente importante desse quadro. O País dispõe de reservas internacionais de US$ 369,8 bilhões, mais que suficientes para cobrir a dívida bruta. Mas o quadro tem ficado menos confortável. O saldo do comércio de bens, principal fator de segurança das transações correntes brasileiras, continuou encolhendo em outubro. O superávit comercial acumulado em dez meses ficou em US$ 29,1 bilhões pelas contas do Banco Central (BC), bem menos que o contabilizado um ano antes (US$ 43,5 bilhões). Na comparação anual, as exportações diminuíram 6,7% e as importações aumentaram 0,7%.

A diminuição das vendas foi significativa em outubro, quando o valor faturado, de US$ 18,3 bilhões, foi 16,5% inferior ao de igual mês de 2018. E o resultado continuou piorando. Nas três primeiras semanas de novembro houve déficit de US$ 430 milhões, segundo relatório do Ministério da Economia. Como complicador adicional, continuaram as saídas de recursos investidos em papéis no mercado financeiro. Com juros menores e crescimento econômico próximo de 1%, o Brasil tem-se tornado menos atrativo para os investidores financeiros.

A crise argentina explica em parte a piora do saldo comercial do Brasil. Mas nem por isso o alerta deixa de merecer atenção – até porque a excessiva dependência de um mercado é um risco importante para a indústria e para a economia do Brasil. Não se trata de negligenciar os negócios no Mercosul. Ao contrário, é preciso dinamizar o bloco. Mas é indispensável cuidar da inserção mais ampla nas cadeias internacionais de produção e comércio.

O Estado de S. Paulo

A liberdade e a advertência

O Conselho Nacional do Ministério Público agiu corretamente ao aplicar advertência ao procurador Dallagnol

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) agiu corretamente, dentro de suas funções constitucionais, ao aplicar uma advertência ao procurador da República e coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, em razão de comentário ofensivo contra três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Se algo merece reparo na punição foi a demora em aplicá-la, já que o comentário desrespeitoso foi feito em agosto do ano passado.

Em entrevista à rádio CBN, Dallagnol disse: “É triste ver (…) os três mesmos de sempre do Supremo Tribunal Federal que tiram tudo de Curitiba e que mandam tudo para a Justiça Eleitoral e que dão sempre os habeas corpus, que estão sempre formando uma panelinha, assim que manda uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”. Referia-se aos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, atualmente presidente do STF.

Não cabe a um membro do Ministério Público, por discordar do voto de três integrantes do Supremo, dizer que os três “estão sempre formando uma panelinha” e que enviam “uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”. Cabe, por óbvio, discordar da decisão ou da fundamentação de um magistrado, mas não foi o que fez Deltan Dallagnol. Ele agrediu moralmente três ministros, afirmando que atuavam em conluio contra o combate à corrupção.

Sempre, mas especialmente em tempos de extremado acirramento em questões políticas e ideológicas, o Ministério Público (MP), como instituição responsável pela defesa da ordem jurídica e do regime democrático, deve ser exemplar no respeito às instituições. E não há respeito às instituições quando se desautoriza sua atuação simplesmente porque se discorda da posição adotada por seus integrantes.

O MP também deve ser exemplar na defesa das liberdades e do pluralismo. O fato de um de seus integrantes discordar do voto de algum juiz não o autoriza a dizer, em entrevista a rádio, que tal magistrado passa, com o exercício de suas atribuições constitucionais, “mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”. É preciso mais respeito e consideração com a posição divergente.

Após a advertência, em vez de pedir desculpas pelo comentário desrespeitoso, Dallagnol contestou via Twitter a decisão do CNMP, mostrando não ter captado a razão da punição e tampouco seu equívoco. Não se arrependeu nem se desculpou. Em suma, não aprendeu com seu erro. Ele se referiu à “advertência aplicada a mim pelo CNMP hoje por ter criticado decisões de ministros do Supremo”. Ora, a punição não se deu em razão de crítica a uma decisão judicial. Houve advertência por ele – um funcionário público – ter feito um juízo depreciativo e incabível sobre três ministros do STF.

No Twitter, Dallagnol mencionou ainda que apenas exerceu “o direito à liberdade de expressão e crítica”. Há aqui uma grave confusão, incompatível com o saber jurídico que se espera de um membro do MP. Vige no País um regime de liberdade, no qual todos têm direito à liberdade de expressão, aí incluído o exercício da crítica. Mas tal liberdade não autoriza ofender outrem. No mesmo artigo, a Constituição assegura que “é livre a manifestação do pensamento” e que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. O coordenador da Lava Jato teve total liberdade para dizer o que bem queria na rádio. Nada mais natural que assuma as consequências. Há liberdade e deve haver, portanto, responsabilidade, especialmente se o autor do comentário tem um ofício público.

A reação de Dallagnol à advertência do CNMP revela também sua dificuldade para se submeter ao órgão que, por força da Constituição, deve exercer “o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros”. Submeter-se a quem tem, por direito, competência disciplinar e correicional não é um favor. É um dever.

Folha de S. Paulo

Aposta na força

Bolsonaro insiste em incentivo à violência; felizmente, agenda para no Congresso

Encontra-se em fase de estudo na Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ) da Secretaria Geral da Presidência da República —de onde, diga-se, seria melhor que não saísse— uma proposta para permitir a intervenção federal em ocupações de terras nas áreas rurais, com o uso das Forças Armadas.

Como explicou o presidente Jair Bolsonaro, a intenção é utilizar militares para expulsar “marginais” da propriedade alheia, evitando, assim, que governadores eventualmente protelem decisões judiciais de integração de posse.

Não se esclareceu se o uso do aparato militar seria também utilizado, por exemplo, para banir invasores de reservas indígenas —hipótese pouco provável, dada a conhecida animosidade do governo contra a integridade desses territórios. Em qualquer hipótese, é melhor, repita-se, que o plano não vá adiante.

A regra constitucional é que as Forças Armadas se atenham à defesa nacional. A possibilidade de convocá-las para assegurar a lei e a ordem, em substituição ou apoio às polícias, deve ser sempre cogitada em última instância, esgotados todos os recursos antecedentes.

Ainda assim, seria mais adequado que a União possa dispor de uma Força Nacional de Segurança Pública, composta por policiais cedidos pelos estados, bem equipada e bem treinada para intervir nessas situações excepcionais.

A ideia de operações que se sobreponham ao poder estadual para decidir “manu militari” conflitos agrários traz em si riscos evidentes e explosivos, com a possibilidade real de alimentar tumultos e devaneios autoritários —como os que costumam acometer, aliás, o próprio presidente Bolsonaro.

Juntamente com o projeto voltado às intervenções rurais, o mandatário também deseja estender aos proprietários urbanos proteção total para que possam expulsar invasores de suas casas, não importa o método utilizado. “Queremos [dar a] garantia absoluta de que dentro da sua casa você pode tudo contra um invasor”, conforme declarou o chefe do Executivo.

Não constituem novidade as inclinações um tanto truculentas de Bolsonaro em assuntos de segurança pública e quando se trata de eliminar mediações institucionais para a solução de conflitos.

A insistência do governante nesses temas é uma péssima sinalização para a sociedade, a favorecer iniciativas violentas e, na pior das hipóteses, antidemocráticas.

Até aqui, felizmente, o Congresso e o debate público têm conseguido, de uma forma ou de outra, conter parte relevante dessas investidas —o que é digno de nota.

Folha de S. Paulo

Tensão sul-americana

Colômbia é o 4º país do continente sob onda de protesto e frustrações populares

Com o jovem Dilan Cruz, já são quatro as mortes na série de protestos que tem lugar na Colômbia desde o dia 21, fora o saldo de centenas de feridos e presos. Trata-se do quarto país sul-americano —na sequência de Equador, Chile e Bolívia—a ser afetado neste ano por uma onda de manifestações, grande parte delas violentas.

A pauta de reivindicações dos que vão às ruas é difusa, e os eventos que deflagraram os movimentos, variados. No Equador foi o aumento do preço da gasolina; no Chile, o da tarifa do metrô; na Bolívia, a evidência de fraude eleitoral seguida pela deposição de Evo Morales; na Colômbia, uma greve geral.

A ciência política tem particular dificuldade em explicar a eclosão de manifestações populares, que não raro aparentam surgir espontaneamente, por motivos banais e sem lideranças claras. Quando ocorrem simultaneamente numa região ou continente, não é incomum que se fale em contágio.

As imprecisões da análise desses fenômenos não significam que inexistam causas, ou, pelo menos, substratos comuns. Os estudiosos Daniela Campello e Cesar Zucco, da Fundação Getulio Vargas, apresentaram uma hipótese plausível em artigo publicado no caderno Ilustríssima desta Folha.

Resumidamente, Campello e Zucco dizem que, entre 2003 e 2011, os países da região experimentaram um forte ciclo de crescimento, que ampliou a oferta de empregos, elevou salários e permitiu a seus dirigentes, de orientações ideológicas variadas, promover políticas de inclusão social e redução da pobreza que lhes rendeu popularidade.

A partir de então, com mudanças nos termos de troca do comércio internacional, as commodities perderam valor, encerrando a bonança. As vistosas taxas de crescimento deram lugar a expansões bem mais modestas.

A reversão do cenário de melhora contínua frustraria as expectativas das populações e acirraria o conflito distributivo e a polarização, tornando os países latino-americanos mais vulneráveis a protestos e até mesmo a convulsões sociais.

A hipótese ajuda a entender não apenas as manifestações de rua —o Brasil já viveu as suas em 2013— mas também outras mudanças no quadro político, como a alternância de poder em diversas nações.

Segundo os pesquisadores, a ligação entre ciclos econômicos e grandes mudanças na política regional não é inédita. A primeira queda importante nos termos de troca, nos anos 1960, trouxe ditaduras ao continente. A segunda, nos 1980, redundou na redemocratização. A ver o que ocorre na terceira.

Valor Econômico

Desvalorização do real tende a ser um ajuste passageiro

Não há qualquer sinal de problemas sérios nas contas externas e sim um ajuste do câmbio a um mix diferente de política econômica

Há em todo movimento de grande volatilidade na taxa de câmbio elementos especulativos, que se apoiam em tendências reais para exacerbá-las em uma direção ou outra. Na desvalorização acentuada do real em curso, a razão básica é a maior saída e o menor ingresso de dólares do país. Essa escassez, relativa ao momento anterior, pode ou não ser compensada pela atuação do Banco Central, com instrumentos variados – e há dúvidas, como sempre, se a autoridade monetária usou-os corretamente e na hora certa, ou não. E há também o imponderável. Todos os ministros da área econômica queimaram a língua falando sobre a taxa de câmbio. Paulo Guedes não foi o primeiro, nem será o último. Sua fala em Washington alimentou apostas contra o real e forçou o BC a agir mais intensamente do que possivelmente teria agido na ausência de suas elucubrações.

Como o câmbio no Brasil nunca flutuou livremente, os investidores costumam testar o BC para saber os limites de sua atuação, isto é, descobrir a taxa de câmbio a partir da qual a autoridade monetária se imporia a obrigação de agir. Na atual onda baixista do real, ao contrário das demais, isso não ocorreu, o que pode indicar que há um consenso implícito de que o dólar tem naturalmente de se valorizar. Discute-se, porém, a adequação da disponibilidade da moeda americana nos mercados à vista e de derivativos – o último muito maior que o primeiro.

Nesse ponto, há aspectos técnicos relevantes, como foi apontado pelo economista-chefe do UBS Brasil, Tony Volpon (Valor, 26 de novembro). As posições vendidas, amparadas pelos swaps do BC, estão se tornando inferiores às compradas, o que tende a puxar o dólar para cima. Os investidores divergem sobre a eficácia das intervenções do BC nos dois mercados e a prova do acerto ou do erro será afinal a da moderação das variações e, talvez, algum recuo das cotações do dólar. A favor do BC há o fato de que ele deixou claro que não pretende mudar a direção da tendência, mas sua intensidade.

O pano de fundo é uma mudança na disponibilidade de dólares a partir da guinada na política econômica, da posição da moeda americana em um cenário de desaceleração global no qual os EUA ainda crescem mais do que os demais países desenvolvidos, e dos efeitos da guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo. Pelos dois últimos aspectos, o Brasil foi bastante atingido. A balança comercial deve ter em novembro o primeiro déficit desde fevereiro de 2015. No ano até a quarta semana de novembro, o saldo foi de US$ 33,8 bilhões, 33,6% menor do que os US$ 50,9 bi do mesmo período de 2018. Há redução do comércio mundial nestes números e há também a crise da América Latina. A redução do superávit com Argentina, Paraguai e Uruguai explica um terço da diminuição de US$ 17 bilhões no resultado global. O restante fica por conta dos Brics (US$ 3,5 bilhões), EUA e países europeus, em especial Alemanha.

O ingresso de recursos pelo câmbio comercial caiu US$ 26 bilhões até outubro ante os dez meses de 2018. O câmbio financeiro teve déficit de US$ 14 bilhões, totalizando US$ 40 bilhões que poderiam estar por aqui e não estão. Não é pouco dinheiro. O déficit em transações correntes subiu a 3% do PIB no mês passado, ante 2% um ano atrás. Outros fatores interagiram nesta conta, além do apontado pelo BC, de troca de dívida externa por interna, mais barata.

Assim como este fator, vários têm relação direta com a queda forte dos juros reais no país. O Brasil deixou de ser aposta segura e lucrativa para o carry trade, com os ganhos se reduzindo à medida do encolhimento da Selic. O investimento direto no país não caiu, mas mudou de qualidade. Os empréstimos intercompanhia diminuíram US$ 15 bilhões em relação ao período janeiro-outubro de 2018. Parte dele, antes, aproveitava-se do diferencial de juros absurdo entre Brasil e os vigentes na zona do euro e EUA. O custo muito menor dos empréstimos de matrizes para filial, também para baratear a produção, deixa aos poucos de existir.

Não há qualquer sinal sério de problemas nas contas externas e sim um ajuste do câmbio a um mix diferente de política econômica. Mas há sinais ruins. O déficit em conta corrente aumentou, mesmo com a economia se arrastando lentamente em direção a um crescimento de 1%, pelo terceiro ano consecutivo. A corrida do câmbio pode interromper a correção baixista dos juros em 2020. Nada, porém, que fuja à possibilidade de controle pelos instrumentos de que dispõem o BC – fora de controle estão os ruídos causados por membros do governo.

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