Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (29/11/2019)

MANCHETES

O Globo

Decisão do STF libera uso de dados de órgãos de controle e mais de 900 investigações
Limite a juros do cheque especial pode reduzir oferta
Justiça manda soltar brigadistas de Alter do Chão
Prefeitura do Rio tirou R$ 2,2 bi da Saúde em 3 anos
Justiça manda soltar brigadistas de Alter do Chão
Presidente tira “Folha” de licitação
Projeto pioneiro dá a leitor do Globo conteúdo personalizado
Frente Ampla reconhece derrota no Uruguai após 15 anos no poder

O Estado de S. Paulo

STF libera repasse de dados sigilosos em investigações
Após cheque, governo mira cartão de crédito
Economia da reforma cai R$ 43 bi com PEC paralela
Exportação sobe e preço da carne não cairá, diz ministra
Brigadistas são soltos no Pará e investigação tem novo chefe
Fãs homenageiam Gugu Liberato

Folha de S. Paulo

STF libera repasse de dados sigilosos em invetigações
Juiz volta atrás e solta brigadistas de Alter do Chão
Ele é guardião da floresta, diz mãe de voluntário solto
Bolsonaro exclui Folha de licitação da Presidência
Justiça determina que laranja do PSL devolva R$ 380 mil
Desmatamento ilegal zero não deve acontecer, declara Ricardo Salles
Fãs ficam três horas na fila de velório de Gugu
Ex-treinador Cilinho, campeão pelo São Paulo morre aos 80 anos
Máfia das creches em SP negociava ONGs a R$ 8.000
Compulsório, saque tira do FGTS R$ 500 por seis meses
Senador paraguaio é cassado após pedir morte de brasileiro
Uruguai confirma triunfo de opositor Luis Lacalle Pou
Foi vitória de Pirro, afirma líder de atos em Hong Kong

Valor Econômico

BC avança no aperto para baixar juros dos bancos
Taxas de 300% eram pesadelo para Campos
Telefónica une operações na América Latina
Por que a Paraíba está no topo das patentes
Laboratórios expandem atuação com aquisições

EDITORIAIS

O Globo

Supremo impede retrocesso na luta contra a corrupção

Julgamento sobre o alcance do sigilo financeiro de pessoas físicas e jurídicas resguarda investigações

Os seis votos a zero favoráveis ao compartilhamento de dados da Unidade de Inteligência Financeira (UIF), ex-Coaf, pelo Supremo, obtidos até a terceira sessão de julgamento das regras e limites dos fluxos de dados entre organismos de Estado, na quarta-feira, já garantiam uma vitória no Judiciário do combate à corrupção como há algum tempo não ocorria.

Infelizmente, movimentos no Congresso, na Justiça e no Executivo de resistência ao avanço de investigações — seguidas de denúncias e punições contra a corrupção sistêmica — acumularam êxitos na contenção deste avanço. Que foi iniciado, para se estabelecer um marco de tempo, nas condenações do processo do mensalão do PT — também haveria o do PSDB —, em 2012, até chegar-se à criação da força-tarefa da Lava-Jato, em Curitiba, em 2014.

Os desdobramentos penais da Lava-Jato e de suas ramificações têm sido um acontecimento inédito na história penal brasileira, em que apenas ricos e pobres iam presos.

O placar de seis a zero, em um colegiado de 11 ministros, já dava maioria ao entendimento de que a UIF pode compartilhar informações sobre fluxos entre contas bancárias e remessas e recebimentos diversos por pessoas físicas e jurídicas, sem a necessidade de autorização judicial. Entende-se que ao passar para o Ministério Público movimentações consideradas atípicas, o organismo de inteligência financeira remete o sigilo bancário junto. Ou seja, ele não é quebrado, apenas o MP também passa a ser responsável pela sua preservação.

Ao fim da sessão de ontem, com a conclusão da apresentação dos votos dos 11 ministros da Corte, contabilizou-se o resultado final de nove votos a dois pelo compartilhamento de dados também da Receita Federal, sem a necessidade de autorização judicial.

Um julgamento complexo, baseado em um recurso extraordinário impetrado por um posto de combustíveis paulista contra a Receita, teve seu campo estendido para tratar da margem de manobra legal que têm organismos de inteligência financeira, como a UIF, ex-Coaf, e não só a Receita, para repassar dados sigilosos ao MP, sem autorização judicial.

Os ministros ainda deliberarão, para levar em conta todos os aspectos levantados pelos votos, considerando o efeito da “repercussão geral” do julgamento. Ou seja, de servir de referência a todos os tribunais.

Seja como for, a vitória da tese de que o conceito constitucional de sigilo não pode servir de obstáculo a ações do Estado contra o crime organizado e, em particular, a corrupção, pode representar a interrupção de uma sequência de fatos negativos para o enfrentamento de criminosos de colarinho branco.

Um desses retrocessos foi o fim da prisão em segunda instância, decidido por diferença de apenas um voto pelo Supremo. Espera-se que a jurisprudência seja restabelecida por ato do Congresso, o que reforçaria esta reação das instituições indicada neste julgamento do próprio STF.

O Globo

Lacalle Pou precisa unir o Uruguai e negociar cada decisão no Legislativo

Futuro presidente terá de lidar com superficialidade dos compromissos de sua coalizão

Começa na segunda-feira a transição para o governo dos próximos cinco anos no Uruguai.

Ontem, confirmou-se a eleição de Luis Alberto Lacalle Pou, do Partido Nacional. A vitória por margem estreita (1,2% dos votos) indica que o primeiro desafio do futuro presidente será unir os 3,4 milhões de uruguaios.

Lacalle Pou liderou uma inédita coalizão de centro-direita. Com ela isolou adversários de centro-esquerda agrupados em torno de Daniel Martínez, candidato derrotado. Pôs fim a um ciclo de década e meia de governos da Frente Ampla, que o havia derrotado na eleição presidencial de 2014.

Lacalle Pou, de 46 anos, advogado, está longe de ser um outsider. Foi deputado, presidiu a Câmara e desde 2015 ocupa uma cadeira no Senado. É o terceiro presidente eleito numa família de longa tradição na política uruguaia: seu bisavô Luis Alberto de Herrera, o caudilho “blanco”, ocupou o poder entre 1925 e 1927 e foi candidato à presidência nas cinco eleições sucessivas; já o seu pai, Luis Alberto Lacalle Herrera, presidiu o país de 1990 a 1995.

No Uruguai o embate sempre foi vigoroso, mas líderes e partidos têm procurado manter a sobriedade típica da maturidade democrática. Se preservado, esse clima tende a favorecer o início de uma governança que se anuncia complexa.

Principalmente, porque o eleitorado uruguaio decidiu conferir ao Legislativo uma posição de predominância em relação ao governo, obrigando-o a negociar toda e qualquer medida num Congresso onde nenhum partido possui maioria — como ocorreu no Brasil no ano passado.

Os adversários de Lacalle Pou, por exemplo, ficaram limitados a 40% dos votos no Parlamento. Para enfrentá-los, o futuro presidente vai precisar assegurar plena harmonia entre os conservadores do seu Partido Nacional e os liberais do Partido Colorado. Ainda assim, para assegurar maioria no plenário dependerá de outras forças, como o recém-fundado Cabildo Abierto, o Independente e o Partido da Gente.

Em posição minoritária no Congresso, o futuro presidente também terá de lidar com a superficialidade dos compromissos da coalizão que o elegeu. Definiu-se, por exemplo, o “combate ao déficit fiscal”como meta fundamental de governo. No entanto, não se indicou como será feita a redução do desequilíbrio nas contas públicas, que já beira 5% do Produto Interno Bruto. Lacalle Pou terá três meses para escolher alternativas e negociá-las com o Congresso que irá acompanhá-lo no próximo quinquênio.

O Estado de S. Paulo

Populismo com cheque especial

Tabelar juros do cheque especial pode ser medida politicamente útil ao presidente Jair Bolsonaro, mas do ponto de vista econômico é injustificável e até perigosa

Tabelar juros do cheque especial é medida populista indisfarçável, incompatível com o discurso liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Pode ser politicamente útil ao presidente Jair Bolsonaro, mas do ponto de vista econômico é injustificável e até perigosa. “Se fosse tabelamento, não tinha tarifa”, disse o presidente do BC, Campos Neto, respondendo às primeiras críticas. É um argumento pobre e ineficiente. Os bancos poderão cobrar a tarifa de quem pedir cheque especial com limite superior a R$ 500. A cobrança será de até 0,25% sobre o valor acima daquele limite. Com isso haverá um ganho adicional para as instituições financeiras e muitos de seus clientes terão um custo a mais, mesmo sem fazer um saque ou pagamento além do saldo normal.

O teto de juros, decidido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), pode parecer perfeitamente razoável diante do custo até agora imposto a quem se endivida no cheque especial. Em outubro, a taxa média para esse tipo de cobrança ficou em 305,9% ao ano, segundo o BC. Se os juros de 8% ao mês forem aplicados, o custo anual será de 151,8%. Ainda será enorme, mas a redução será considerável. A medida entrará em vigor em 6 de janeiro, segundo a resolução do CMN. Que ocorrerá a partir daí?

Os correntistas em apuros poderão resolver seu problema com menor dificuldade. Isso será positivo, mas o ganho social será muito limitado, se os clientes continuarem a endividar-se como até agora. É essa a questão essencial. Os juros do cheque especial podem parecer uma aberração, mas aberração igualmente notável é o uso desse tipo de conta como canal de financiamento.

O cheque especial, assim como o cartão de crédito, pode ser muito útil, mas ninguém deveria usar qualquer desses instrumentos como substituto das formas tradicionais de empréstimo. O cartão de crédito foi criado para facilitar a realização de despesas no dia a dia. Não foi concebido para funcionar, de fato, como instrumento de crédito. Pessoas informadas e prudentes limitam-se a aproveitar essa vantagem, na vida cotidiana, e procuram liquidar normalmente as faturas mensais. Usam o cartão, portanto, dentro de suas possibilidades normais. Quando se dispõem a fazer operações mais custosas, como compras de veículos, de imóveis ou de equipamentos domésticos mais caros, procuram empréstimos bancários ou financiamentos concedidos pelo comércio.

Deve-se entender o cheque especial, da mesma forma, como um instrumento para facilitar a vida normal, jamais como substituto das formas convencionais de financiamento. Qualquer cidadão pode precisar, de vez em quando, realizar um saque ou um pagamento além do saldo básico da conta bancária. É bom, portanto, dispor de um limite de tolerância. Mas é preciso usar esse limite de forma compatível com a capacidade financeira normal de cada um. Para outras finalidades há outros meios – ou deve haver, se os bancos estiverem de fato interessados em atender mais que uma elite.

Há um evidente problema de educação financeira. Além disso, bancos e operadores de cartões de crédito pouco ou nada têm feito para orientar os clientes quanto ao uso dos cheques especiais e dos cartões. De imediato, renegociações de dívidas podem ser um modo eficiente de tirar milhões de pessoas do aperto e, como subproduto dessa iniciativa, normalizar a vida financeira de um grande número de consumidores.

O BC já se interessou pelo assunto e poderá haver efeitos benéficos para a economia. Tabelar juros do cheque especial poderá até produzir algum resultado positivo a curto prazo, mas, na pior hipótese, será um estímulo a mais para um comportamento inadequado, desastroso para muita gente e muito ruim para a economia.

É um tanto surpreendente ver o presidente do BC render-se em tão pouco tempo às conveniências político-eleitorais do populismo. Medidas como o tabelamento de juros podem proporcionar votos a quem ambiciona uma eleição ou reeleição, mas acabam sendo econômica e socialmente nocivas. Os líderes da equipe econômica devem saber disso. Então, por que aceitam esse jogo?

O Estado de S. Paulo

Medida temerária

Governo estuda a possibilidade de liberar a exportação de troncos de árvores nativas da Amazônia, por sugestão de empresários do setor

O Estado apurou que o governo estuda a possibilidade de liberar a exportação de troncos de árvores nativas da Amazônia, por sugestão de empresários do setor. O quão temerária e inoportuna seria a medida, não só do ponto de vista ambiental, mas econômico, fica evidenciado pelos dados recentes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) – agora reconhecidos pelo próprio governo – que apontam em 2019 crescimento de 84% na devastação de florestas protegidas e também que nos últimos três meses a extração de madeira foi 35% maior do que nos 12 meses anteriores.

A exportação de madeira in natura, ou seja, dos troncos sem qualquer processamento, só é permitida para as chamadas “madeiras exóticas”, como o eucalipto e o pinus. No caso das árvores nativas, aquelas cortadas legalmente só podem ser vendidas a outros países após serem processadas no Brasil. Apesar disso, o mercado nacional é historicamente marcado pela ilegalidade. Estima-se que até 90% das madeiras que vão para fora do País são fruto de extração irregular.

A ideia aventada pelo Ibama seria liberar a extração apenas de árvores nativas que estejam nos chamados “planos de manejo”, ou seja, áreas de reservas florestais teoricamente protegidas e fiscalizadas pelo governo federal. É nessas áreas que está a maior parte das árvores mais nobres, como o jatobá ou o ipê – o “ouro” da floresta. Na prática a situação está descontrolada. Justamente nessas áreas a devastação cresceu 84% em um ano. Essas condições se repetem nas reservas estaduais e terras indígenas. Enquanto isso, entre janeiro e setembro, as autuações de crimes florestais na Amazônia Legal caíram 40% em comparação com o mesmo período de 2018.

“Na Amazônia, quase toda a produção de madeira é ilegal. Liberar a exportação em tora é um presente ao crime, às máfias do desmatamento, aos que invadem áreas protegidas e roubam o patrimônio dos brasileiros, um absurdo que vai resultar em mais destruição, violência e mortes”, disse o coordenador de políticas públicas do Greenpeace, Marcio Astrini.

Como apontou o próprio Ibama, diversos países, como Tailândia, Camarões e Rússia, proibiram a exportação de troncos de árvores nativas, não só em razão de preocupações ambientais, mas da proteção da indústria madeireira local e do suprimento do mercado doméstico. “Faz parte de uma política de estímulo ao desenvolvimento local, ou seja, gerar empregos e receitas pelo processamento das toras”, aponta o pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, Paulo Barreto. Além de agregar valor ao produto exportado, o processamento cria mais etapas passíveis de fiscalização, facilitando o combate ao tráfico.

Como disse o diretor executivo do WWF-Brasil, Maurício Voivodic, a proposta de exportação de toras nativas “é um retrocesso que nos leva de volta à década de 50, quando a visão do país para a região Amazônica era puramente de provedora de matéria-prima bruta”, sem qualquer proteção ou produção local. “A Amazônia precisa de políticas públicas diametralmente opostas a essa proposta. Precisamos estimular o uso da biodiversidade e sua agregação de valor na região, para que a atividade gere empregos locais e mantenha na região a riqueza gerada.”

Para Paulo Hartung, presidente da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), que representa a cadeia produtiva de árvores plantadas, “essas mudanças podem pressionar ainda mais a imagem internacional do Brasil, em um momento em que deveríamos somar forças para reverter este cenário”.

Ironicamente, há poucos dias o presidente Jair Bolsonaro bravateou: “O que não quero é política de vender a Amazônia em troca de migalhas ou grandes fortunas”. Referia-se, como se sabe, aos predadores imaginários da “soberania nacional”. Enquanto isso, faz manobras para retroceder à época do pau-brasil e rifar as árvores nativas, ameaçando não só o bioma amazônico e os produtores locais, como os contratos de exportação da agropecuária, o setor mais potente da economia nacional.

O Estado de S. Paulo

Lula sob a lei

Decisão do TRF-4 é a segunda condenação de Lula da Silva em segunda instância, o que ratifica sua inelegibilidade

Andou bem a 8.ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4.ª Região ao confirmar a condenação do ex-presidente Lula da Silva pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no processo relativo ao sítio de Atibaia. Como expôs detalhadamente o relator do caso, desembargador João Pedro Gebran Neto, a defesa do ex-presidente não provou qualquer prejuízo processual capaz de fundamentar uma suposta nulidade da decisão de primeira instância, proferida em fevereiro pela juíza Gabriela Hardt. Os desembargadores confirmaram a condenação e aumentaram a pena de 12 anos e 11 meses de prisão para 17 anos e 1 mês. Segundo o relator, a juíza Hardt “fez um minucioso trabalho de exame de fatos, provas e das questões jurídicas”.

No julgamento, a defesa de Lula tentou usar uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a um réu delatado a possibilidade de apresentar suas alegações finais após o prazo dado aos réus delatores, para justificar a suposta nulidade processual. A 8.ª Turma do TRF-4 soube, porém, reconhecer a distinção entre os casos. Eram situações diferentes, não havendo motivo para aplicar ao processo de Lula a orientação dada pelo Supremo ao outro caso.

Ao contrário do que afirmou a defesa de Lula após o julgamento, a decisão do TRF-4 não afrontou o STF. Como escreveu no Estado o professor de Direito Processual Penal da Universidade de São Paulo (USP) Gustavo Badaró, “eles (os desembargadores do TRF-4) seguiram a linha do que o Supremo decidiu no sentido de que, para se reconhecer a nulidade, são necessários dois requisitos. Em primeiro lugar, seria necessário que o delatado tivesse protestado no momento em que as alegações finais foram apresentadas”.

Na ação julgada pelo STF, o réu delatado pediu ao juiz para apresentar depois suas alegações finais. No caso de Lula, isso não ocorreu. A própria defesa do ex-presidente não viu nenhuma necessidade, no momento concreto da realização do ato processual, de apresentar depois dos réus delatores suas alegações finais.

“Além disso, toda nulidade de sentença necessita da comprovação de um prejuízo ao réu, e caberia à defesa de Lula comprová-lo”, escreveu Badaró. Em relação ao segundo requisito, o STF aplicou a norma do Código de Processo Penal. “Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”, diz o art. 563.

Também aqui a defesa não provou nenhum prejuízo que teria sido causado pelo prazo simultâneo na apresentação das alegações finais. Por exemplo, poderia haver prejuízo se o réu colaborador tivesse apresentado, em suas alegações finais, argumentos novos sobre os quais o réu delatado não teve oportunidade de se manifestar. O ex-presidente não mostrou nenhum elemento acusatório oriundo das delações sobre o qual ele não pôde se manifestar. Ao longo de todo o processo, o que se viu foi o contrário, com Lula exercendo amplamente seu direito de defesa.

A decisão do TRF-4 é a segunda condenação de Lula por lavagem de dinheiro em segunda instância, o que ratifica sua inelegibilidade. Lula já estava inelegível por força da condenação no caso do triplex do Guarujá. “São inelegíveis para qualquer cargo os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena, pelos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores”, diz a Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010).

Tal previsão legal fundamenta-se na própria Constituição, que prevê a existência de inelegibilidades “a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”. Com toda razão, o Direito quer afastar do processo eleitoral quem esteve tão próximo do crime. Que a lei valha para todos, sem exceção.

Folha de S. Paulo

A brecha

Cabe ao STF dar fim à indefinição sobre a situação de condenados como Lula

O novo revés imposto pela Justiça ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostra que a vida do petista pode ter melhorado fora da cela, mas está longe de ser fácil.

Nesta quarta (27), três juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região mantiveram a condenação dele pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do sítio de Atibaia (SP). A pena foi aumentada, de 12 anos e 11 meses para pouco mais de 17 anos de prisão.

Graças à recente mudança na posição do Supremo Tribunal Federal sobre o encarceramento de condenados em segunda instância, o líder petista poderá recorrer da sentença em liberdade e continuará solto até que se esgotem as possibilidades de recurso.

Mas a hipótese de um dia voltar a disputar eleições ficou mais remota para Lula, porque a Lei da Ficha Limpa impede que condenados por órgãos colegiados concorram, e agora ele só poderá superar essa barreira se conseguir reverter as duas condenações que sofreu.

Frustrou-se a expectativa da sua defesa de que o TRF-4 anularia a sentença da primeira instância por causa do outro entendimento estabelecido pelo Supremo neste ano —sobre a ordem de apresentação dos argumentos finais dos acusados em ações penais.

Em agosto, a corte decidiu que réus como Lula têm direito a falar por último no processo, depois dos que tiverem cooperado com a Justiça como os delatores da Lava Jato. A nova orientação já provocou a anulação de duas sentenças em ações da operação no Paraná.

Se é certo que os juízes do TRF-4 contrariaram essa diretriz ao manter a condenação do ex-presidente, cumpre apontar que o fizeram por razões bem fundamentadas, aproveitando uma brecha que o próprio Supremo deixara aberta.

Os ministros ainda não decidiram em quais situações a nova ordem deve ser aplicada, mas alguns já indicaram que são contra a anulação de processos em que o prejuízo causado às defesas não seja demonstrado —como é o caso de Lula, para os magistrados do TRF-4.

Pelo calendário do Supremo, a definição do alcance dessa decisão ocorrerá no próximo ano. A corte faria bem em tratar do tema com celeridade, evitando que a incerteza dessa situação jurídica se prolongue e provoque tensões.

É fácil perceber nos votos dos juízes do TRF-4, que incluíram enfática defesa da Lava Jato, a intenção de oferecer um contraponto às críticas que a operação tem recebido —inclusive no plenário do STF.

Cabe aos magistrados fixar as balizas que devem ser respeitadas no combate ao corrupção, evitando que a indecisão alimente a insegurança jurídica e a impunidade.

Folha de S. Paulo

Dilema chinês

Pequim precisa equilibrar seus interesses e resposta ao eleitorado em Hong Kong

Eleições para Câmaras Municipais costumam ser relegadas ao segundo plano no mundo todo, dados o caráter paroquial e a multiplicidade dos temas em pauta.

Em outro cenário não seria diferente em Hong Kong, no domingo (24), mas os quase seis meses de protestos que chacoalharam a região tornaram o pleito local um referendo sobre o jugo de Pequim.

Há 22 anos, a China comunista recebeu de volta o território que havia sido do Reino Unido desde 1842. Comprometeu-se a preservar o regime liberal na cidade por ao menos 50 anos; a partir daí, poderá ou não alterar tal status.

O modelo de “um país, dois sistemas” serviu bem aos novos mestres. Se o peso de Hong Kong na economia chinesa decresceu desde então, de 18% para 3% de seu Produto Interno Bruto, a região se mantém como a janela da ditadura para o mundo das finanças.

Cerca de 65% dos investimentos estrangeiros que entram e saem da China passam pelo território. Isso explica a cautela com que Pequim trata a atual onda de protestos ali, evitando repetir o massacre de estudantes de 1989.

Os atos foram disparados pela proposta de uma lei que facilitava a extradição de cidadãos para encarar o sistema judicial chinês, e não o modelo ocidental local.

A lei foi arquivada, mas as manifestações continuaram. Na votação do domingo, os democratas levaram 17 de 18 conselhos locais, com cerca de 57% da votação total.

O número, que trouxe um arrefecimento temporário dos protestos, escamoteia os 43% que permanecem fiéis a Pequim —e não significa uma reviravolta, o que estaria configurado em vitórias no Parlamento e no Executivo.

Ocorre que a votação para o Legislativo, em 2020, só elege 35 dos 70 deputados. O restante vem de um arranjo em que setores profissionais escolhem representantes.

O regime comunista influencia essas postulações. Nada sugere que os comunistas permitirão mudanças como eleições universais, que possibilitem risco de separatismo e estimulem outras regiões.

O dilema do líder Xi Jinping é como equilibrar a necessidade de controlar o ex-território britânico e dar alguma satisfação aos eleitores, como apurações de abusos policiais.

Em meio a duras negociações comerciais com Pequim, os EUA aprovaram lei que prevê punições a autoridades chinesas e honconguesas por excessos durante os protestos. Isso pode afetar negócios americanos em Hong Kong, e é no bolso que a crise se faz sentir mais.

Valor Econômico

Fernández indica que repetirá políticas fracassadas do passado

Não há espaço nem tempo para improvisações e Fernández parece ensaiar o retorno de uma política que já se mostrou fracassada

A 12 dias da posse de Alberto Fernández na Presidência da Argentina, reina o mistério sobre a equipe econômica e as diretrizes gerais do novo governo. A falta de sinalização seria um detalhe sem importância se este fosse um período normal de troca de presidentes na Casa Rosada. A sucessão argentina, porém, ocorre diante de nova e grande crise e Fernández terá de renegociar dívidas de US$ 101 bilhões, domar uma inflação de 55% e retirar o país de forte recessão. Os peronistas voltam ao poder após o fracasso da política liberal de Mauricio Macri.

Ainda que de forma simples, os argentinos e os investidores internacionais aguardam a definição de rumos econômicos. Fernández terá de assumir com ações rápidas, à altura da crise. Quase nada foi ventilado até agora e o pouco que se sabe não inspira confiança. A escolha do nome para comandar a Economia indicará o rumo, mas essa escolha aparentemente ainda não foi feita. Fernández prometeu divulgar sua equipe na próxima semana.

A ausência de sinalização pode responder à necessidade política de um governo no qual a vice-presidente, Cristina, é mais conhecida e influente que o presidente, com quem já teve relação conflituosa. O poder que cada um deterá deve ser um dos primeiros segredos a se desvendar. Fernández esperou Cristina voltar de Cuba, onde uma de suas filhas faz tratamento médico, para delinear seu gabinete. Pode ser mera deferência à política mais popular do país ou então refletir a obrigação de escolher em comum acordo as pessoas que comporão o novo governo – nesse caso, Cristina seria quase tão “presidente” quanto Fernández, ou mais.

Durante a campanha eleitoral, Alberto Fernández não destoou de retórica populista que agradou aos kirchneristas. Fez as críticas esperadas à política “neoliberal” Macri. Deixou claro que vai rever o acordo de US$ 57 bilhões com o Fundo Monetário Internacional, recusou os US$ 11 bilhões que faltam e avisou que o pagamento dos recursos terá de ser reescalonado. Ao FMI e credores privados, sugeriu na quarta, em reunião com empresários, que só pagará a dívida “quando estivermos crescendo e tenhamos os dólares”.

Agora que terá de governar, a conversa de Fernández pode ser outra, mas não se sabe qual. Os indícios dados pelas declarações não indicam mudança substantiva alguma em relação às políticas dos governos de Néstor e Cristina Kirchner. A Argentina tem sido, por décadas o campo da experimentação de políticas fracassas, tanto ultraortodoxas quanto heterodoxas.

As receitas esboçadas são mais do mesmo. Fernández parece determinado a ressuscitar o pacto social com empresários e trabalhadores, para congelar preço da cesta básica – e reajustes salariais, embora não se fale nisso ainda – e manter o congelamento de tarifas públicas, decretado por Macri como última esperança de reação nas urnas. No início, Macri recompôs tarifas, muito represadas por Cristina, e reduziu seu peso no orçamento, chegando com seu ajuste fiscal bem perto de obter um superávit primário. Na quarta, Fernández disse que as “contas fiscais estão em estado deplorável”, apesar de serem bem melhores do que as que Cristina legou.

O pacto social foi repetidas vezes tentado na Argentina e nunca funcionou. A inflação foi nutrida também por megadesvalorização cambial de 40% no ano e só foi contida após acordo entre o governo que sai e o que entra para impedir que os argentinos tenham acesso ao dólar – hoje só é permitido o saque mensal em moeda de US$ 100, ou US$ 200 por transação bancária.

O governo cogita ampliar a emissão monetária para financiar o déficit público, aumentar tarifas sobre exportações do agronegócio, elevar o imposto de renda, além de dobrar a indenização por demissão sem justa causa, para evitar o aumento do desemprego (10,6%). A Argentina jogará novamente na retranca das importações. Em discurso, disse que “não queria trazer camisetas chinesas ou sapatos do Brasil”. O pressuposto da política é relaxar a parte fiscal e aumentar o consumo – um flerte com a hiperinflação.

Algumas dessas prescrições deram certo por algum tempo no primeiro mandato de Néstor Kirchner, do qual Fernández foi chefe de gabinete. Mas então o país tinha dado o maior calote da história, suprimindo US$ 100 bilhões de seu passivo e deixado de pagar dívidas. Não é a situação de agora. Fernández parece ensaiar o retorno de uma fracassada política populista, que produziu desastres.

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