Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (26/10/2019)

MANCHETES

O Globo

Marcha reúne 1,2 milhão para reivindicar mudanças no Chile
Segunda instância: STF tem disputa pelo voto de Toffoli
Meio Ambiente recebeu alerta para criar comitês
‘Em 50 anos, nunca vi um momento assim no continente’
Concentração fundiária cresce no país
Crivella quer atendimento à distância

O Estado de S. Paulo

Novos servidores podem ter estabilidade só após 10 anos
Bolsonaro se diz ‘afinado’ com a China no campo econômico
1 milhão de pessoas nas ruas de Santiago
Pobreza que afeta 52% dos jovens argentinos desafia candidatos
Após acordo com Doria, União vai fechar a Ceagesp
Óleo em praias saiu de 3 campos da Venezuela
Ofertas de ações no País no ano atingem R$ 70 bi
Protestos contra reeleição de Evo deixam 29 feridos

Folha de S. Paulo

Decisão de Toffoli trava ao menos 700 investigações
Registros de estupro em SP atingem 22º pior marca
Doria e Bolsonaro vão fechar Ceagesp em até cinco anos
Manual mostra que governo demorou a agir em conter óleo
AB InBev reduz lucro após alta no preço da cerveja
Cade aciona Itaú e Rede por prática com maquininhas
Assessora de Eduardo atuou em ataques apócrifos
Depreciar com fake news é crime, diz presidente de CPI
‘Posso ser um presidente sem partido’, afirma Bolsonaro na China
Bruno Covas recebe diagnóstico de trombose e continuar internado
Com 1 milhão, marcha marca 8º dia de protestos no Chile

EDITORIAIS

O Globo

Segunda instância já é divisor de águas para Justiça

A execução antecipada da pena revigorou o respeito não só ao Judiciário, mas às instituições

Suspenso no final da tarde de quinta para ser retomado no início de novembro, o julgamento da possibilidade de prisão ao ser confirmada a sentença em segunda instância tem seu desfecho praticamente definido — de que cairá a execução antecipada da pena seguida pela maioria da Corte desde 2016.

Pelos votos já lidos, e considerando-se as tendências expressas por ministros, o 4 a 3 de quinta-feira pela prisão na segunda instância se transformará em 6 a 5 pela posição contrária. Mas não convém considerar o resultado garantido, porque ministros podem mudar o voto a qualquer momento, antes de promulgado o resultado. Mas será difícil acontecer.

Porém, há ainda a possibilidade de o presidente da Corte, Dias Toffoli, que se converteu à tese de que pena só pode ser cumprida depois do “transitado em julgado”, ficar numa posição “média” e formular, como já mencionara, a proposta de que o condenado em segunda instância possa recorrer uma vez à instância seguinte, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), antes de ser preso. Não é inédita a busca pelo presidente da Corte de veredictos intermediários em temas polêmicos.

Depois de mencionar esta possibilidade há algum tempo, Dias Toffoli mergulhou no silêncio. Na quinta, saiu-se com uma frase enigmática: “Muitas vezes o voto nosso na presidência não é o mesmo voto (como ministro).” Se confirmada esta alternativa, surgirá um espaço para que o Supremo construa uma outra jurisprudência.

Dois dos votos dados contra a mudança, dos ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, discorrem de maneira fundamentada sobre como o “trânsito em julgado” reabrirá uma porta para que réus com recursos financeiros possam contratar bons advogados, a fim de jamais cumprirem a pena, porque os crimes prescrevem antes de confirmada a sentença.

Serão beneficiados os que desde o mensalão, chegando à Lava-Jato, passaram a frequentar cárceres, espaço exclusivo dos pobres. A imagem da Justiça e das instituições republicanas foi fortalecida.

O conceito da República de que todos são iguais perante a lei chega a ser revolucionário no Brasil. Entende-se o porquê de tão poderoso e amplo movimento para conter o enfrentamento da corrupção.

Há boas razões técnicas para se defender a aplicação do “trânsito em julgado” de forma literal e do início do cumprimento de pena depois da condenação em segunda instância. Os placares apertados em julgamentos atestam isso.

O ideal é que desempatasse este jogo o resultado da aplicação prática de uma Justiça mais ágil no Brasil. Sem significar desrespeito a direitos.

É por isso que esta decisão sobre a segunda instância já estabelece um marco de antes e depois sobre como é visto o Poder Judiciário no país.

O Globo

Aumentam incertezas na Argentina com a disputa de poder na oposição

Há contradições entre Cristina Kirchner e Alberto Fernández sobre condução da economia

Cristina Fernández de Kirchner tem sido personagem influente, mas de pouca visibilidade, na disputa presidencial que mobiliza 33 milhões de argentinos às urnas no domingo. Tendo sido presidente por duas vezes (de 2007 a 2015), a senadora peronista agora é candidata a vice na chapa de Alberto Fernández, seu antigo chefe de gabinete na presidência.

Os Fernández, que não são parentes, despontam como favoritos no embate com o presidente Mauricio Macri, cujas chances de reeleição minguaram com a rejeição ao seu programa gradualista de ajuste fiscal.

A campanha termina sem que a dupla tenha elucidado uma questão-chave para a parte do eleitorado argentino que lhes promete o voto: em qual dos Fernández estarão votando para exercer o poder real da presidência, caso sejam eleitos?

A dúvida se fundamenta na personalidade de Cristina, de carisma e ambição de poder reconhecidos desde 2003, quando o marido, Néstor Kirchner, se elegeu presidente. Além disso, emergem contradições entre os Fernández sobre como seria a condução da política econômica, impulsionadas pela clara disposição da ala liderada pelos filhos de Cristina — o grupo La Cámpora — para disputar espaço nas decisões de um eventual governo.

Alberto tem se esforçado para demonstrar que, se eleito, exercerá efetivamente o poder presidencial. No entanto, às vezes deixa entrever a fragilidade da aliança com Cristina — para muitos, resultante de conversas dele com Jorge Mario Bergoglio, antigo arcebispo metropolitano de Buenos Aires e hoje Papa Francisco. Em recente reunião com investidores americanos, em Buenos Aires, o candidato sugeriu, por exemplo, que Cristina prepara a retirada da vida política argentina, e relegou à periferia do peronismo o movimento La Cámpora.

Certo é que proliferam dúvidas sobre qual dos Fernández prevaleceria no poder, se vencedores. Temores se materializam no mercado financeiro, onde crescem as apostas contra o combalido peso argentino. O cenário eleitoral favorável aos Fernández, apesar dos esforços de Macri para garantir um segundo turno, impele a cotação do dólar no mercado futuro.

Depois de subir mais de 60% nos últimos 12 meses, a moeda americana chegou ao patamar de 75 pesos. Nesta semana, aumentou para 95 pesos nos contratos financeiros com liquidação prevista para março do ano que vem. É o custo da incerteza sobre o rumo do país, caso os Fernández vençam a disputa com Macri amanhã.

O Estado de S. Paulo

Piora no ‘Doing Business’

O caminho para a construção de um ambiente favorável aos negócios será menos acidentado se Jair Bolsonaro aprumar a condução política de seu governo

O Brasil caiu da 109.ª para a 124.ª posição no ranking Doing Business, relatório elaborado pelo Banco Mundial que afere a facilidade de fazer negócios em 190 países de acordo com dez indicadores. Em 2018, a nota final do País foi 58,6. Na avaliação deste ano, o Brasil obteve nota 59,1. A expressiva queda de 15 posições no ranking, a despeito do aumento da nota final, revela que outros países têm sido mais ágeis do que o Brasil na implementação de reformas econômicas que visam a tornar o ambiente de negócios mais atrativo aos investidores.

O Brasil melhorou em 3 dos 10 indicadores avaliados pelo Banco Mundial: facilidade para obtenção de alvará de construção, registro de propriedade e abertura de empresas. O País ficou estável em relação à capacidade de resolução de insolvência e de pagamento de impostos e piorou nos quesitos facilidade do comércio internacional, obtenção de crédito, execução de contratos, proteção de investidores minoritários e obtenção de eletricidade.

O governo brasileiro contestará a nota final obtida neste ano. O Brasil caiu da 40.ª para a 98.ª colocação no indicador de obtenção de eletricidade. O secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa, acredita ter havido um erro no cálculo do Banco Mundial que apontou aumento “inexplicável”, segundo ele, no custo de novas instalações elétricas no País. De todo modo, a revisão da metodologia e o eventual ganho de algumas posições no ranking não escondem o enorme desafio que o País tem pela frente para ser reconhecido como um bom lugar para fazer negócios.

A avaliação do Banco Mundial foi feita entre fevereiro e março deste ano. Portanto, ainda não reflete os resultados de medidas implementadas no governo do presidente Jair Bolsonaro, como a Lei da Liberdade Econômica, a aprovação do cadastro positivo e a aprovação da reforma da Previdência. Não se pode desconsiderar ainda que nesse período houve uma queda recorde na taxa básica de juros. “O resultado não foi nada bom para o Brasil. É algo para se lamentar e trabalhar para reverter. (Mas) Se o Doing Business fosse feito hoje, já teríamos mudança significativa no ranking”, disse Carlos da Costa.

Uma das metas do ministro da Economia, Paulo Guedes, é colocar o Brasil entre as 50 primeiras posições do ranking Doing Business até o final do mandato de Jair Bolsonaro, em 2022. O próprio presidente da República endossou a promessa durante a participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, no início do ano. Não é uma meta impossível de ser atingida, haja vista que a Índia, um dos países que, assim como o Brasil, compõem o Brics, galgou nada menos do que 60 posições nos últimos três anos.

No entanto, um salto qualitativo dessa magnitude exigirá do governo um foco que, até o momento, não mostrou ter. Não se sabe, por exemplo, qual é a proposta de reforma tributária defendida por Jair Bolsonaro e que será apresentada ao Congresso Nacional. Não há dúvida de que sem a eliminação da complexidade tributária do País, a arrojada pretensão de estar entre as 50 nações mais atrativas para os negócios não passará de desejo, muito longe de ser um plano.

A reforma tributária talvez seja a principal medida para fazer o País galgar posições no ranking Doing Business, mas não é a única. Carlos da Costa cita medidas como a revisão da lei de falências, o novo marco para recuperação judicial de pequenas empresas e mudanças para acelerar o processo de importação e abertura de empresas entre as ações do governo para melhorar a posição do Brasil no ranking do Banco Mundial.

O caminho para a construção de um ambiente favorável aos negócios – condição básica para o desenvolvimento econômico e a geração de riqueza, emprego e renda – será bem menos acidentado se o presidente Jair Bolsonaro aprumar a condução política de seu governo, deixando de lado o ultrapassado papel de candidato e exercendo o de presidente da República. É o foco nas ações para destravar o crescimento do País tomadas pelo presidente que beneficiará o eventual candidato Bolsonaro, não o contrário.

O Estado de S. Paulo

O mal das notícias fabricadas

Para metade dos norte-americanos, os problemas ocasionados pelas chamadas fake news são mais graves do que crimes violentos, as mudanças climáticas, o racismo, a imigração ilegal, o terrorismo e questões relativas a gênero

Pesquisa realizada pelo Pew Research Center revelou que, atualmente, uma das maiores inquietações dos norte-americanos são as notícias fabricadas. Após ouvir mais de 6 mil pessoas nos Estados Unidos acerca das questões que mais as afligem, o instituto de análise e pesquisa identificou que 50% dos entrevistados veem a fabricação de notícias como um problema mais preocupante do que os crimes violentos (49%), as mudanças climáticas (46%), o racismo (40%), a imigração ilegal (38%), o terrorismo (34%) e questões relativas a gênero (26%).

Para metade dos norte-americanos, os problemas ocasionados pelas chamadas fake news só não são mais graves do que o vício em drogas (70%), as condições de custeio dos planos de saúde (67%), as distorções do sistema político dos Estados Unidos (52%) e a desigualdade entre ricos e pobres (51%).

A pesquisa também mostrou que os norte-americanos percebem as notícias fabricadas como um importante fator de desagregação da sociedade, seja o desvirtuamento da relação entre esta e o Estado, seja da relação entre os cidadãos. Para 68% dos entrevistados pelo Pew Research Center, a fabricação de notícias tem grande impacto sobre a confiança que os norte-americanos têm em seu governo. Para 54%, ela também afeta a confiança entre as pessoas. E para 51%, as notícias falsas comprometem a habilidade de lideranças políticas lidarem com temas vitais para a sociedade.

Embora tenha sido realizada com cidadãos norte-americanos, a pesquisa do Pew Research Center pode servir como base para reflexão em outros países além dos Estados Unidos, especialmente o Brasil. De acordo com pesquisa do Instituto Ipsos realizada no ano passado, os brasileiros são os que mais acreditam em notícias falsas (62%), uma posição de liderança global que não nos envaidece.

A fabricação e difusão de informações falsas, até pouco tempo atrás, era um problema que afetava mais fortemente os países sob governos totalitários, que criam suas próprias versões dos fatos – quando não inventam “fatos” – e as difundem como verdade absoluta por meio de um forte aparato estatal de comunicação. Além de disseminar informações enviesadas por seus interesses, independentemente de sua veracidade, governos totalitários exercem forte controle sobre o que pode e o que não pode ser levado ao conhecimento dos cidadãos.

O desenvolvimento tecnológico e a massificação do acesso à internet – em especial às redes sociais – representaram um estupendo avanço para a circulação de informações, elevando o grau de instrução dos povos, tanto do ponto de vista formal como institucional, em termos de educação cívica e controle do poder público. Mas, igualmente, impuseram o desafio permanente de separar verdades e mentiras como poucas vezes se viu na história da comunicação. Tão preocupante quanto a fabricação de notícias é a permissividade de alguns meios digitais para sua circulação.

A maioria dos entrevistados pelo Pew Research Center atribuiu maior parcela de responsabilidade sobre a fabricação e circulação de notícias falsas às lideranças políticas (57%) e aos grupos de ativistas (53%). Já para 36%, essa responsabilidade é dos jornalistas.

Sempre haverá um olhar crítico sobre a atividade jornalística e é bom que assim seja. A força do jornalismo profissional vem, entre outras razões, dessa disposição de estar sob permanente escrutínio do público ao qual serve. Este compromisso inarredável com a verdade factual, aliado aos deveres éticos e funcionais da profissão, confere aos jornalistas a responsabilidade, se não de eliminar, de reduzir substancialmente o alcance das notícias fabricadas e seus efeitos perniciosos sobre a vida social, econômica e política de uma nação.

Os cidadãos em geral, por sua vez, também não estão isentos de responsabilidade pela saúde do debate público. Hoje, mais do que nunca, toma a forma de um dever cívico discernir sobre a qualidade das informações absorvidas e, sobretudo, compartilhadas.

O Estado de S. Paulo

A criação do juiz de garantias

Câmara e Senado agilizam tramitação de projetos que criam essa figura jurídica

Desde o vazamento das conversas entre o então juiz da 13.ª Vara Criminal de Curitiba Sérgio Moro e o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, a Câmara e o Senado vêm agilizando a tramitação dos projetos que criam a figura jurídica do juiz de garantias, que ficaria encarregado de conduzir a fase inicial das ações criminais.

Essa é a etapa de produção de provas, de controle da constitucionalidade das investigações e de expedição de mandados de busca e apreensão. Cabe ao juiz de garantias determinar o trancamento ou a prorrogação do inquérito criminal e decidir, por exemplo, sobre os pedidos de interceptação telefônica, quebra de sigilo e arquivamento. Também cabe ao juiz de garantias a incumbência de determinar medidas cautelares restritivas ao ir e vir do acusado. Terminada a etapa de instrução e aceita a denúncia do Ministério Público, o processo é transferido para outro juiz, que será o responsável pelo julgamento do mérito.

Já aprovado no Senado há dez anos, um dos projetos tramita na Câmara desde 2010 e faz parte do substitutivo do novo Código de Processo Penal. A pedido de algumas lideranças partidárias, o presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), já mandou desengavetá-lo. Também anunciou que pretende enviá-lo diretamente para o plenário. Ainda na Câmara, o grupo de trabalho criado para apreciar o pacote anticrime enviado pelo Executivo também aprovou uma proposta semelhante, preparada em conjunto pela deputada Margarete Coelho (PP-PI) e Paulo Teixeira (PT-SP). No Senado, o senador Cid Gomes (PDT-CE) apresentou outro projeto com a mesma finalidade. O apoio a todas essas iniciativas só não é maior por causa dos deputados da base do governo Jair Bolsonaro filiados ao Partido Social Liberal (PSL). Segundo os líderes da agremiação, a criação do juiz de garantias seria uma forma de desfigurar o pacote anticrime e enfraquecer politicamente seu autor, o ministro Sérgio Moro.

A proposta de criação do juiz de garantias, que foi adotado há várias décadas em vários países europeus, com o objetivo de assegurar a isenção da magistratura criminal, preservar o equilíbrio nas ações penais e garantir a segurança do direito positivo, vem sendo objeto de discussões na magistratura e na advocacia. Para entidades de advogados, pela sistemática atual o juiz criminal tem pouca motivação para revisar eventuais erros cometidos no inquérito criminal e, na maioria das vezes, atribui excessiva credibilidade aos resultados da investigação criminal em que atuou.

Já a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) manifestou-se contrária à separação das funções entre dois juízes com base em dois argumentos. O primeiro é de natureza estrutural: 40% das comarcas judiciais contam apenas com um magistrado. Portanto, se a proposta for aprovada, o Poder Judiciário terá de fazer concursos e contratar servidores num período em que, por causa da crise fiscal, os poderes públicos estão sem recursos para pagar despesas de custeio, como contas de água e de luz. O segundo argumento é de natureza histórica. No Brasil, sempre um mesmo magistrado conduziu a fase de instrução e prolatou a sentença. Ou seja, sempre foi responsável pela condução das diligências, pela salvaguarda dos direitos fundamentais dos acusados e pelo julgamento do mérito. Em que medida a divisão dessas tarefas entre dois juízes não poderia acarretar problemas, resultando em insegurança jurídica? De quanto tempo as Escolas de Magistratura precisariam para requalificar os juízes criminais? A direção da Ajufe afirmou que, quando suas indagações forem respondidas, ela estará aberta à discussão.

Pela relevância do tema e por sua importância para o funcionamento do Estado de Direito, é necessário que as discussões sobre a criação do juiz de garantias sejam baseadas em critérios técnicos, e não políticos ou corporativos.

Folha de S. Paulo

Simples e erradas

Preocupa que Bolsonaro namore teses que liguem atos em países latino-americanos

Para um observador distante, o noticiário da América do Sul nas últimas semanas talvez inspire a suspeita de que o subcontinente está imerso em um transe coletivo.

É tentador, numa era de comunicação instantânea que gera respostas rápidas, buscar enxergar um fio narrativo invisível a unir as massas que foram às ruas em países vizinhos como Peru, Equador, Chile e, agora, a Bolívia.

Isso para não falar na perene crise venezuelana ou na iminente troca de comando da Argentina.
Se é fato que os atos têm em comum a oposição às forças no poder, isso também é um truísmo que costuma ser ignorado por comentaristas de rede social —que já querem colocar os manifestantes libaneses, quiçá os de Hong Kong, no mesmo pacote sul-americano.

Sobre Peru, Equador e Chile, fala alto o oportunismo político. Representantes da esquerda continental apontam que há em curso um levante popular contra as mazelas do liberalismo econômico.

Na mão inversa, políticos à direita enxergam um complô marxista visando reinstalar governos de esquerda naquelas nações andinas.

Foi o caso do filho presidencial Eduardo Bolsonaro, que foi além e insinuou que o vazamento de petróleo presumivelmente de origem venezuelana que atinge a costa nordestina do Brasil integra uma ação concertada do Foro de São Paulo.

Cairia tal formulação no vazio não estivesse ele à frente da Comissão de Defesa Nacional e Relações Exteriores da Câmara. Pior, a fala encontrou eco na voz de seu pai.

O presidente Jair Bolsonaro disse que os protestos chilenos poderiam chegar às ruas brasileiras. Sugeriu um alerta militar e evocou o artigo da Constituição que prevê o uso das Forças Armadas para manutenção da lei e da ordem.

Se parece exagero antever algum pendor golpista na frase, é alarmante que o mandatário máximo abrace a hipótese com tal ligeireza.

O que ocorre no Chile tem um paralelo próximo com o junho de 2013 brasileiro, por seu grau de inexplicabilidade. Nada sugere um padrão de contágio possível no momento, o que naturalmente não torna o Brasil imune a protestos.

Cada uma das crises tem um estopim próprio, que vai de aumento de tarifa do metrô de Santiago ao reajuste da gasolina equatoriana.

Já Peru e Bolívia vivem algo mais próximo de uma crise institucional envolvendo seus presidentes —o caso de Evo Morales atrapalha a narrativa direitista, uma vez que ele integra o lado adversário.

O mais saudável é, na hora de namorar teses sobre o que está ocorrendo, ficar com o conselho clássico do jornalista americano H.L. Mencken: “Sempre há uma solução simples para todo problema humano —elegante, plausível e errada”.

Folha de S. Paulo

O destino do Pacaembu

Concessão quer shopping no estádio em SP, mas dúvidas sobre vocação se mantêm

O que é um estádio, se não tiver as arquibancadas lotadas de torcedores com as camisas de seu time, a gritar e cantar? Para que serve um campo de futebol se não houver nele 22 jogadores e uma bola?

Inaugurado em 1940, o estádio Paulo Machado de Carvalho —conhecido, em razão do bairro que o hospeda, como o Pacaembu— faz parte da memória afetiva dos paulistanos; lá jogou Pelé, com o Santos; lá o Corinthians conquistou o título da Libertadores em 2012, entre outros momentos históricos.

Quem hoje vai lá assistir a uma partida possivelmente ficará em arquibancadas onde não há cadeiras nem lugar marcado; poderá se aborrecer com o jogo paralisado devido à queda de energia; enfrentará banheiros precários.

Uma experiência certamente distante da vivida nas arenas de padrão Fifa, tão civilizadas e tão homogêneas ao redor do mundo —e sem alma, dirão alguns.

Saudosistas verão elitização e o fim da experiência do estádio tradicional, mas é inevitável que o Pacaembu, agora concedido à iniciativa privada, mude. O consórcio Allegra Pacaembu pagará à prefeitura uma outorga fixa total de R$ 115 milhões e mais 1% da receita bruta anual para administrar o complexo ao longo de 35 anos.

Reformas necessárias serão feitas: todo o estádio terá cadeiras; a capacidade será reduzida dos atuais 40 mil lugares para 26 mil; um shopping tomará o lugar do chamado tobogã —e a estrutura, que não é tombada, será demolida.

Se é positivo que a prefeitura deixe de ter gastos para operar o Pacaembu, a concessão não responde a uma pergunta que se impõe desde que cada time de São Paulo passou a ter sua própria arena: qual a vocação do estádio municipal?

Não sendo a casa de um clube, nem mesmo destino mais frequente de nenhuma agremiação desde que o Corinthians passou a ter seu Itaquerão, em 2014, o Paulo Machado de Carvalho cada vez mais abriga um gramado sem futebol.

A Allegra Pacaembu fez sua proposta: transformá-lo em centro comercial, gastronômico e de eventos. É duvidoso que a capital paulista precise de mais um shopping center, mas ao menos há o mérito de oferecer atrativos para que o paulistano frequente o local.

Quais serão os torcedores a frequentarem o novo Pacaembu, agora com camarote, área VIP, “hospitality”? Os gritos dos fãs ecoarão apenas nos vídeos do Museu do Futebol, ali abrigado?

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