MANCHETES
O Globo
Senado desiste de afrouxar regras para os partidos
De saída da PGR: Raquel Dodge denuncia Brazão e pede federalização do caso Marielle
Ida de Bolsonaro à assembleia da ONU corre risco
Guedes reafirma independência da Petrobras
Toffoli: STF vai garantir liberdade de expressão
Integrantes do PSL resistem a fazer oposição ao governo Witzel
Angolano e filho bebê morrem em incêndio na Zona Norte
Boca de urna em Israel: empate entre oposição e Netanyahu
O Estado de S. Paulo
Senado corta benesses a partidos, mas fundo eleitoral pode crescer
PGR cita político como suspeito de mandar matar Marielle
MP do Rio defende foro especial para Flávio Bolsonaro
Raquel contesta Bolsonaro
Redução do IR pode não sair
Imóveis de Lisboa leiloados no Brasil
Arena Itaquera vai para o Seras
Agressor terá de ressarcir o SUS
Eleição apertada aproxima Israel de novo impasse
Sauditas voltam a produzir e preço do petróleo cai 6,5%
Folha de S. Paulo
Sob pressão, Senado recua e não muda regra eleitoral
Orçamento prevê R$ 4,7 bi de vantagens para militares
SP vende área de 112 shoppings via outorga onerosa
Doria quer reduzir valor do precatório de liberação rápida
Preço do etanol sobe a reboque de ataque a refinarias
Feirão de emprego na capital atrai centenas para fila
Eleição não forma maioria em Israel, indica boca de urna
Anistia a Maduro e cúpula une núcleos militar e olavista
Garimpeiros do PA pressionam por punição a fiscais
Juiz põe Itaquerão no Serasa por dívida com a Caixa
Léo Pinheiro, da OAS, deixa prisão e passa a usar tornozeleira
Para Collor, Bolsonaro ganharia muito ao tirar ideologia do governo
Presidente sanciona lei que amplia posse de arma em zona rural
Premiê falha em formar governo, e Espanha terá 4ª eleição em 4 anos
Líder supremo do Irã descarta dialogar com EUA
Valor Econômico
Desindexação do salário mínimo sofre resistências
‘IVA é uma tempestade perfeita”
Fed injeta US$ 53 bi para conter juros
CMV põe recompra de debêntures em debate
Brasil rejeita ação da França sobre Amazônia
Sauditas ‘apagam incêndio’
Sob pressão, senadores derrubam proposta que afrouxava regras e elevava gastos eleitorais
EDITORIAIS
O Globo
A crise silenciosa dos projetos das Forças Armadas
Sem defensores, planos estratégicos são travados por um Orçamento público engessado
Os 31 anos de ditadura militar deixaram incontornáveis marcas na percepção que a sociedade tem das Forças Armadas, e contaminada por incompreensões. É provável que investimentos em projetos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica sejam vistos como de prioridade secundária, nesta fase de crítica falta de dinheiro público, quase todo ele crescentemente desviado, por força de lei, para despesas obrigatórias de custeio — salários do funcionalismo, Previdência e gastos ditos sociais, por exemplo.
Não que haja alguma intenção de prejudicar as Forças Armadas, o que não faria sentido, pois, com Bolsonaro no Planalto, diversos generais assumiram espaço no primeiro escalão do governo. O paradoxo é que neste momento define-se que o Ministério da Defesa terá, no ano que vem, o menor orçamento em 15 anos. Como mostrou reportagem do GLOBO no domingo, as verbas reservadas no Orçamento da União de 2020 para os principais projetos das Forças Armadas sofrerão um corte de 36,5% em relação a este ano, passando de R$ 4,1 bilhões para R$ 2,6 bilhões.
Continuarão em processo de desaceleração os projetos do cargueiro, em fase de lançamento, pela Embraer (KC-390); do submarino nuclear, incluindo, antes, unidades convencionais (Prosub); do blindado que substituirá o Urutu (Guarani), da troca dos caças obsoletos de interceptação (F-X), do monitoramento das fronteiras (Sisfron) e o de vigilância e defesa da infraestrutura do país. Não se deve menosprezar a capacidade de cada um desses projetos absorver e irradiar conhecimentos no país.
Foi por sinal o “projeto paralelo” da Marinha que garantiu o domínio da tecnologia de enriquecimento do urânio, depois do fracasso do acordo feito pelo país com a Alemanha, no governo Geisel, com este objetivo.
O centro da questão é a rigidez dos gastos públicos. Mesmo que haja intenção de serem retomados estes e outros investimentos públicos, não será possível, porque existe um necessário teto constitucional para conter as despesas do Estado, sem o qual a economia sairá do prumo.
O grande problema é que despesas obrigatórias por lei, corrigidas pela inflação ou pelo salário mínimo, forçam o corte de gastos livres, “discricionários”, em que se incluem os investimentos. A óbvia e única alternativa sensata é quebrar o engessamento destes gastos.
Este é objetivo da Proposta de Emenda Constitucional (PEC), do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), a ser relatada por Felipe Rigoni (PSB-ES). Ela estabelece “gatilhos” que, disparados quando gastos subirem além de certos limites, acionarão medidas de cortes. Simples, mas vital para o equilíbrio das finanças públicas e recuperação da capacidade de investimento do Estado.
No caso dos projetos das Forças Armadas, em recente artigo na “Folha de S.Paulo”, o professor de Harvard e ex-ministro Roberto Mangabeira Unger alertou: “Nenhum país se desenvolveu com Defesa fraca”.
O Globo
Não há saída para o Rio fora do Regime de Recuperação Fiscal
Classe política precisa se empenhar para manter acordo, sem o qual estado quebrará
Os sinais de alerta reverberam por todo o Palácio Guanabara, mas, ainda assim, parecem passar despercebidos. Porém, não deveriam ser desprezados. Um relatório do Conselho de Supervisão Fiscal, grupo técnico que analisa as contas do estado e o cumprimento do Regime de Recuperação Fiscal — acordo ao qual o Rio aderiu em setembro de 2017 —, mostra que o governador Wilson Witzel tem descumprido exigências previstas no pacto. O que em outras palavras significa que o Rio pode ser excluído do programa de socorro financeiro.
Motivos para isso não faltam. O principal deles é o silêncio do governo sobre como pretende compensar a reestruturação de carreiras na Uerj, autorizada por lei sancionada em dezembro do ano passado. O acordo proíbe a alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesas. Desde janeiro, o conselho tem cobrado do estado as medidas de compensação, sem retorno. Daí o ultimato. Se as respostas não forem dadas até 3 de outubro, o órgão recomendará a extinção do plano.
Embora seja essa a principal pedra no sapato de Witzel para manter o acordo, não é a única. O relatório aponta que o Rio tem R$ 7,63 bilhões em restos a pagar (dívidas não quitadas de anos anteriores), o que é vedado pela legislação.
Se o Rio for excluído do Regime de Recuperação Fiscal, terá de desembolsar R$ 30 bilhões para quitar dívidas não pagas à União durante a vigência do plano. Desastre iminente.
Wilson Witzel, tal qual seu antecessor, Luiz Fernando Pezão, não tem se empenhado pelo ajuste fiscal. Da mesma forma, a Assembleia Legislativa parece viver num mundo à parte, que ignora as regras pactuadas para tirar o estado da maior crise financeira de sua história. Se a classe política apostava que o apoio do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, serviria de tábua de salvação contra medidas mais drásticas, errou. A legenda acaba de abandonar o barco de Witzel.
A verdade é que não há saída para o Rio fora do Regime de Recuperação Fiscal. Basta lembrar a situação de penúria antes do acordo. Servidores com salários atrasados enfrentando filas para receber cestas básicas, polícias desmanteladas, índices de violência nas alturas, universidades fechadas, hospitais e UPAs agonizando, obras paradas etc. Não havia dinheiro sequer para abastecer viaturas ou pagar contas de luz e telefone de órgãos da administração pública. É claro que o socorro da União não transformou o Rio num estado superavitário, mas o alívio nas contas é inquestionável.
Portanto, governador, secretários e parlamentares precisam ter em mente que, desta vez, o desastre que espreita a população fluminense não será igual ao anterior. Será pior. O ajuste precisa ser feito.
O Estado de S. Paulo
O avanço do gasto obrigatório
Sem uma urgente revisão das despesas obrigatórias, a margem do governo para investimentos públicos tende a simplesmente desaparecer em poucos anos
Um estudo da equipe econômica do governo federal obtido pelo Estado indica que as despesas obrigatórias vão crescer R$ 266,2 bilhões entre 2016 até o ano que vem, um ritmo mais acelerado do que o avanço do teto de gastos, corrigido pela inflação. Com isso, essas despesas atingirão 93% do total do Orçamento de 2020, comprimindo ainda mais as despesas discricionárias, isto é, relativas a custeio e investimento. Esse cenário reitera a necessidade urgente de revisão das despesas que o governo é obrigado a honrar, muitas das quais resultantes de determinações constitucionais. Sem essa mudança, a margem orçamentária do Estado para os tão necessários investimentos públicos tende a simplesmente desaparecer em poucos anos, condenando o País, na melhor hipótese, a uma prolongada estagnação econômica.
Mesmo que a reforma da Previdência seja aprovada neste ano, como se espera, a despesa com benefícios previdenciários, principal item entre os gastos obrigatórios, continuará a apresentar expansão significativa. Conforme o relatório do governo, esses benefícios, que em 2016 representavam 40,7% do Orçamento, passarão a consumir 46,1% em 2020.
O mesmo acontece, mas em menor proporção, com a despesa obrigatória que envolve folha de pagamento do serviço público e encargos sociais. Esse tipo de despesa, que consumiu 20,6% do Orçamento em 2016, representará 22,8% do total em 2020.
Considerando-se que o crescimento econômico do País, que mal se recuperou da recessão de 2015-16, não deve superar 1% e que a inflação prevista para este ano – que reajustará o teto – deverá ficar abaixo de 4%, observa-se com facilidade que o ritmo da expansão dessas despesas obrigatórias tem superado em muito o aumento da riqueza nacional.
Sem uma reforma ampla para reduzir as demandas orçamentárias inscritas na Constituição, a tendência é a deterioração acelerada da capacidade do Estado de realizar obras de infraestrutura e saneamento básico e de oferecer serviços de saúde e educação adequados para a população. Esse aspecto também aparece no estudo do governo. A despesa discricionária, isto é, o gasto que o governo pode fazer indiscriminadamente, cairá de 11,3% do total do Orçamento em 2016 para 7,1% em 2020.
É preciso considerar, ainda, que os gastos discricionários incluem as despesas de custeio, que se prestam basicamente à manutenção do funcionamento da máquina do Estado. A redução dos recursos disponíveis para os gastos discricionários, portanto, ameaça interromper os serviços do governo – o chamado shutdown. O cenário já é crítico em pelo menos 13 Ministérios e órgãos do governo federal, que podem vir a encurtar o expediente e suspender alguns de seus trabalhos, conforme mostrou recente reportagem do Estado. Em diversos órgãos, não há dinheiro sequer para pagar a conta de luz.
Essa situação tem servido para que a ideia de “flexibilizar” o teto de gastos ganhe ares de solução. Tal tese geralmente é esposada por aqueles que julgam que “gasto é vida”, conforme defendeu a petista Dilma Rousseff em sua ruinosa Presidência. Foi com base na ideia de que o governo pode gastar de forma ilimitada, na presunção de que esse gasto estimula o crescimento, que o País mergulhou na recessão e viu a renda nacional ser corroída – o exato oposto do paraíso de prosperidade que os advogados da irresponsabilidade fiscal prometem.
O teto de gastos, aprovado no governo de Michel Temer justamente como parte do esforço para reorganizar as contas públicas depois do cataclismo dilmista, visa a demonstrar quais são os limites orçamentários do Estado e, por conseguinte, a necessidade de o governo ser mais seletivo na escolha das prioridades nacionais. Trata-se de um avanço civilizatório para um País que foi levado por seus dirigentes políticos a imaginar que o dinheiro público é infinito – e as diversas vinculações orçamentárias determinadas pela Constituição são prova dessa mentalidade.
Um momento de crise como este é uma boa oportunidade para uma discussão adulta sobre os gastos públicos. A evolução vegetativa das despesas obrigatórias, já fartamente demonstrada, está no centro dos problemas fiscais do País, e já passou da hora de tratar desse problema sem demagogia.
O Estado de S. Paulo
Os cartórios e o interesse público
Órgãos pressionam o presidente Jair Bolsonaro a vetar o dispositivo que dispensa os fundos de investimento de fazer o registro de seus regulamentos
Desde que a Medida Provisória (MP) 881 foi aprovada pelo Legislativo, em agosto, os cartórios não estão medindo esforços para pressionar o presidente Jair Bolsonaro a vetar o dispositivo que dispensa os fundos de investimento de fazer o registro de seus regulamentos. O objetivo da MP foi, entre outros, desburocratizar a economia, reduzir os custos de transação e desonerar as empresas de exigências regulatórias inúteis, que as obrigam a gastar com atividades-meio recursos que poderiam gerar maior retorno, em termos de lucro e geração de emprego, se fossem aplicados nas atividades-fim.
A dispensa de registro em cartório dos regulamentos dos fundos de investimento foi proposta pela Secretaria de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia e endossada pelo relator da MP, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Pelo texto aprovado, os fundos de investimento terão de fazer o registro de seus regulamentos somente na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Criada em 1976 e vinculada ao Ministério da Economia, a CVM é a autarquia responsável por fiscalizar as bolsas de valores, disciplinar o mercado de ações, proteger os investidores contra emissões irregulares de valores mobiliários e coibir atos ilegais de administradores de fundos de investimento. Por isso, num período em que o mercado financeiro está interconectado pela internet, o registro dos regulamentos nessa autarquia é suficiente para proteger os investidores.
O problema é que, se para as instituições financeiras e para os investidores as inovações da chamada Medida Provisória da Liberdade Econômica foram positivas, pois o custo dos registros varia de R$ 93 a R$ 18 mil, para os cartórios que atuam nessa área elas acarretarão queda em seu faturamento, por eles estimada entre 25% e 40%. É justamente por isso que as entidades que representam os cartórios de registro de títulos, de documentos e de pessoas jurídicas estão invocando os mais absurdos argumentos para tentar manter a entrada em seu caixa de um dinheiro até aqui fácil.
Essas entidades estão recorrendo, por exemplo, ao argumento da segurança do direito. Alegam que a desburocratização pode gerar incerteza jurídica, esquecendo-se de que os meios eletrônicos proporcionam mais segurança do que selos e carimbos. Também afirmam que, ao dispensar os serviços cartoriais, a MP da Liberdade Econômica deu um cheque em branco à CVM, uma vez que a MP não estabeleceu diretrizes sobre seu modo de atuação. Relegam para segundo plano, assim, o fato de que essa autarquia conhece profundamente o funcionamento do mercado de valores mobiliários, por causa de suas atribuições fiscalizadoras. Ela tem muito mais expertise do que os cartórios e não terá dificuldades para garantir que os contratos tenham segurança jurídica.
As entidades que defendem os interesses dos cartórios dizem ainda que, para fazer o registro dos regulamentos dos fundos de investimento, a CVM terá de contratar mais funcionários ou, então, terceirizar esse trabalho. Ou seja, em vez de desburocratização, o que haverá nada mais é do que a passagem da prestação dos serviços dos cartórios para outro órgão. Por fim, as entidades lembram que, pelas suas regras, a Receita Federal só faz inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) com base em documentos registrados em cartório. Como a dispensa de registro dos regulamentos em cartório foi feita por um órgão do Ministério da Economia, ao qual a Receita Federal também está vinculada, esse é um problema fácil de ser resolvido.
Delegados pelo Estado a particulares, os cartórios – setor que movimenta mais de R$ 4 bilhões por ano – sempre exploraram a sociedade, prestando serviços caros e de duvidosa utilidade. Ao pressionar o presidente da República a vetar a dispensa de registro cartorial dos fundos de investimento, os cartórios dão mais uma demonstração de que o interesse de seus donos conflitam abertamente com o interesse público.
O Estado de S. Paulo
Apoio para quê?
Bolsonaro recorre à ‘velha política’ na relação com Congresso para obter apoio em iniciativas de caráter pessoal
O Estado informa que o governo federal quer receber apoio firme no Congresso em troca de cargos nos Estados e da liberação de verbas para o pagamento de emendas parlamentares. O ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, negou que essas negociações sejam uma reedição do conhecido “toma lá dá cá” que marcou a relação do Executivo com o Congresso nos últimos governos. Ramos pediu aos parlamentares que evitassem cobrar publicamente a liberação de emendas, para não “pautar” a imprensa sobre as suspeitas de fisiologismo.
Noves fora o contorcionismo retórico, o fato é que o presidente Bolsonaro avalizou uma prática que muito se assemelha às da “velha política”, que ele havia prometido encerrar. Diante das notórias dificuldades para arregimentar votos, Bolsonaro decidiu, digamos, “premiar” os parlamentares mais fiéis, que demonstrarem disposição de apoiá-lo em todas as suas iniciativas.
A falta de uma base governista é, há muito tempo, o principal problema de Bolsonaro em sua relação com o Congresso. Ao confundir qualquer negociação política com corrupção, o presidente reduziu substancialmente sua capacidade de influenciar a agenda parlamentar e o ritmo das votações importantes no Congresso.
Como resultado, o governo tornou-se espectador do processo legislativo, tocado exclusivamente pelos líderes do Congresso. Assim é que as principais reformas em tramitação no Congresso estão sendo formuladas praticamente sem participação do presidente.
Por esse motivo, é pelo menos alentador que o governo tenha percebido a necessidade de construir uma base mais firme no Congresso para restabelecer o peso do Executivo no debate político, ainda que o meio escolhido para fazê-lo seja moralmente questionável. No entanto, a julgar pelas movimentações políticas dos últimos dias, Bolsonaro está recorrendo à “velha política” não porque esteja interessado em formar uma base para aprovar as reformas de que o Brasil precisa, e sim para ter apoio em iniciativas de caráter pessoal.
Como se sabe, Bolsonaro não está medindo esforços para obter o aval de senadores à indicação de seu filho Eduardo para o cargo de embaixador nos Estados Unidos. Nesse caso, a fatura deverá ser alta, porque é de conhecimento de todos que o deputado Eduardo Bolsonaro não tem o menor preparo para ser embaixador, muito menos nos Estados Unidos, principal posto da diplomacia brasileira. Os senadores que decidirem aprovar o nome do deputado sabem que estarão ignorando seu papel institucional – o de barrar a nomeação de embaixadores despreparados – e serão cobrados por isso.
O governo também está bastante empenhado em impedir a instalação de uma CPI no Senado para investigar o suposto ativismo judicial de ministros de tribunais superiores. Parlamentares que defendem a CPI – inclusive do próprio partido do presidente, o PSL – dizem que o governo quer poupar o Supremo Tribunal Federal depois que este, por iniciativa do ministro Dias Toffoli, suspendeu investigações sobre o caso de movimentações financeiras suspeitas envolvendo o senador Flávio Bolsonaro, outro filho do presidente.
Foram essas pautas sem importância para o País que fizeram Bolsonaro contrariar promessas de campanha e dar sinal verde para negociações fisiológicas com parlamentares. O esforço para resolver assuntos de interesse familiar é tanto que Bolsonaro cobra não apenas o voto, mas lealdade: os deputados e senadores foram advertidos de que haverá retaliação contra aqueles que falarem mal do governo nas redes sociais. “Creio que o parlamentar tem de ser coerente. Ou está alinhado com o governo ou é contra”, explicou o ministro Luiz Eduardo Ramos. “Inicia-se agora uma nova fase de articulação do governo, que não quer mais namorico. Quer casamento de papel passado”, disse o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (MG). Nesse “matrimônio”, os filhos dos cônjuges vêm em primeiro lugar. Enquanto isso, os demais brasileiros, à espera das reformas tão urgentes, permanecem órfãos.
Folha de S. Paulo
Pregação de Maduro
À Folha, ditador constrói fantasias para dissimular as ruínas do chavismo
Se nações fracassam, está aí a Venezuela chavista a reforçar a hipótese.
De 2014 para cá, a economia do país encolheu 60%. Se a derrocada continuar, o que é provável, chegará a 2022 reduzida a um terço do que era uma década antes. A inflação anual atinge 10 milhões por cento: os preços dobram ao ritmo das epidemias, a cada 22 dias.
Espalham-se doenças que se julgavam controladas, como a difteria. Nos hospitais, as faltas de energia matam pacientes. Outros, como portadores do HIV, morrem porque não há medicamentos.
Pessoas pobres passam dez horas por dia na fila para obter alimento, e a subnutrição campeia. Meninas trocam sexo por comida, e a gravidez juvenil dispara. Quatro milhões de venezuelanos, quase 15% da população, já fugiram do país, segundo estimativas.
Adversários do regime são detidos às centenas, impedidos de competir nas urnas ou forçados ao exílio. De acordo com Michelle Bachelet, alta comissária para direitos humanos da ONU, nas prisões opositores são submetidos a tortura. Nas ruas, operam esquadrões da morte a mando do governo.
Ao receber a Folha para entrevista, o ditador Nicolás Maduro dispôs-se a enfrentar perguntas incômodas, embora as respostas tenham vindo banhadas no cinismo e no falseamento da realidade habituais nos autocratas.
Para Maduro, herdeiro de um regime que completou 20 anos concentrando poder, todas as acusações de violações a direitos civis e às regras democráticas não passam de complô estrangeiro, sob o comando dos EUA, para destruir o legado heroico da “revolução”.
Na visão do sucessor de Hugo Chávez, também é dos gringos, que boicotam os interesses venezuelanos, a culpa pelas privações atravessadas pela população.
A parte lúcida da esquerda sul-americana, que passou a criticar a bizarrice autoritária do chavismo, foi tachada de estúpida e traidora —no Brasil, Maduro há de estar contente com o servilismo do PT.
O presidente Jair Bolsonaro (PSL), que à diferença do dirigente chavista foi eleito num processo legítimo, não seria tão nefasto quanto a oposição venezuelana, provocou o ditador. Deve ser prazeroso para um sádico fazer brincadeiras com quem pode perseguir e neutralizar, como é o caso dos seus adversários internos.
Há pessoas sem trabalho na Venezuela? Nada disso. Vigora o pleno emprego na fantasia de Caracas.
Despotismos se parecem quando têm de enfrentar as consequências da ruína que causaram. Inventam uma matemática revolucionária em que a soma das desgraças resulta em maravilhas que só os convertidos enxergam. Maduro prega para sua banda de fanáticos.
Folha de S. Paulo
Susto com o petróleo
Ataque leva a salto inicial da cotação; por ora não se vê risco de dano grave
O ataque sofisticado e de autoria ainda não confirmada a duas refinarias da Arábia Saudita já se configura como a maior interrupção de oferta de petróleo da história, superando outros eventos marcantes como o embargo de 1973, a revolução iraniana de 1979 e as inúmeras guerras no Oriente Médio.
De imediato, estimou-se que a produção do reino seria reduzida em quase metade, numa perda de 5,7 milhões de barris diários —cerca de 6% da oferta mundial.
Em qualquer lista de potenciais conflitos geopolíticos sempre figurará em destaque a interrupção do fornecimento de petróleo da Arábia Saudita, que poderia também estar associada a conflitos no Golfo Pérsico, principal canal de escoamento de óleo para o mundo.
Até recentemente o maior produtor do mundo, antes de superado pelos Estados Unidos, o país retém a condição de principal estabilizador no mercado. Permanece como o fornecedor de menor custo e com maior capacidade de elevar a oferta em tempo curto.
Daí o salto de até 20% no preço do barril no dia seguinte ao evento. Passadas 48 horas, o impacto nas cotações já havia caído à metade, após recados das autoridades sauditas de que a produção estaria sendo normalizada.
Outras medidas paliativas poderiam ser adotadas, como a liberação de reservas estratégicas americanas e algum aumento coordenado de produção por parte de outros membros da Opep.
Atribuir responsabilidades é sempre difícil, ainda mais no Oriente Médio. Evidências concretas de atuação iraniana tornariam uma reação americana mais provável, mas até agora os mercados parecem não contar com isso.
Não houve oscilações marcantes nas Bolsas e nos mercados de moedas. A alta na cotação do petróleo, embora importante, ainda não se mostra suficiente para provocar dano severo à economia mundial.
Para o Brasil, o encarecimento, se persistente, traria complicadores. Seria difícil evitar repasses para o consumidor, o que poderia também implicar o risco de novas paralisações de caminhoneiros.
Por ora cumpre evitar alarmismo, embora não se possa descartar a escalada do conflito. Mesmo nesse caso, contudo, o ataque à Arábia, ao mostrar a vulnerabilidade do país, deve ter consequências estratégicas duradouras.
Uma delas, possivelmente, é o interesse por novas fontes de produção, incluindo o pré-sal brasileiro.