O presidente que um terço do Brasil elegeu – num país dividido e polarizado – é um completo alienado, imprudente, desajuizado, inconsequente, despreparado, insano, destrambelhado, insensato, destemperado, transtornado, indecoroso, inapto e inepto. A mais recente ignomínia (perdão pelo termo difícil, mas é o adequado) foi defender o trabalho infantil.
Usou o próprio exemplo para garantir que “não foi prejudicado em nada” por ter trabalhado colhendo milho aos “nove, dez anos de idade” em uma fazenda de São Paulo. Porém, fica a dúvida: será que não foi prejudicado em nada mesmo? Ao juízo de quem? Esses traços tão característicos da personalidade e do caráter bolsonarista seriam os mesmos hoje se ele tivesse sido devidamente tratado como criança? Não seria um pai diferente? Não seria um homem melhor?
Talvez não precisasse fazer arminha com os dedos para se autoafirmar, nem enxergasse inimigos imaginários em todo canto, nem agisse como neurótico de uma interminável guerra ideológica, nem fosse criticado por condenáveis comportamentos autoritários, violentos, machistas, racistas, homofóbicos, misóginos, nem acabasse tutelado por auxiliares débeis ou gurus charlatães.
Eu não votei nele, mas respeito a escolha democrática de um terço da população (e explico abaixo esse “um terço”, antes que me acusem de fake news por não reconhecer o voto da maioria absoluta dos eleitores). Respeitem, portanto, o meu direito de fazer oposição. Tenho de aturar a escolha resultante da maioria dos votos válidos, ou de um terço dos brasileiros. Aturem também a minha indignação com este aparvalhado retrógrado e sua turminha mentecapta.
Somos 210 milhões de brasileiros, segundo os dados oficiais. Destes, 147,3 milhões estávamos habilitados a votar para presidente em 2018. Os que escolheram Jair Bolsonarono 1º turno somaram pouco mais de 49,2 milhões (46,03% dos votos válidos, ou 33,4% do total de eleitores, ou ainda cerca de 23% da população). Então, um terço dos votos foram para o candidato do PSL.
Outros 57,7 milhões de eleitores optamos por algum dos demais candidatos. Eram 12 (sendo Fernando Haddad, Ciro Gomes, Geraldo Alckmin e João Amoedo os mais votados). Sem contar os 3,1 milhões de votos em branco e os 7,2 milhões de nulos. E tivemos ainda um índice recorde de abstenções: 29,9 milhões de pessoas, ou 20,3% do eleitorado. No 1º turno, dois terços dos eleitores não votamos neste presidente.
No 2º turno, Bolsonaro teve 57,7 milhões de votos (55,13% dos votos válidos, ou 39,2% dos eleitores, ou ainda cerca de 27,5% da população). Outros 47 milhões optaram por votar em Haddad. Os votos em branco caíram para 2,4 milhões e os nulos subiram para 8,6 milhões. As abstenções aumentaram em 1,4 milhão: foram 31,3 milhões de ausentes (ou 21,3% do eleitorado).
Conclusão matemática (e política) óbvia: dois terços dos brasileiros não escolheram Bolsonaro. Mais da metade do povo não votou nele nem em ninguém. É assim que funciona nosso sistema eleitoral. Não chega a ser novidade, mas às vezes é bom reforçar os números, principalmente diante dos fatos que nos assombram diariamente e dos índices das mais recentes pesquisas sobre a aceitação do governo.
Em geral, um terço da população apóia o presidente. É basicamente a repetição do resultado das eleições. Entretanto, como vivemos num estado democrático de direito, esperamos que o presidente governe também para os dois terços que – se ainda não o reprovam categoricamente (os tais “ruim/péssimo” das pesquisas), também não o aprovam abertamente (afinal, “regular” é uma avaliação positiva ou negativa após seis meses de gestão?).
Maiorias e minorias são circunstanciais. Direitos são permanentes, constantes e universais. Um terço dos brasileiros escolheram Bolsonaro. Dois terços, não. Um terço ainda o qualifica positivamente. Dois terços, não exatamente. Conclusão: o Brasil segue dividido. Eu sei qual é a minha metade, qual é o meu terço, mas o governo parece seguir à deriva.
Não pertenço ao terço bolsonarista, nem ao terço lulista. Sou oposição a ambos. Prefiro uma terceira opção. E você? Apesar de tudo, torcemos todos pelo bem geral da Nação! Mas se nada der certo, encontre o seu terço e… reze! Oremos pela salvação!
Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do #Cidadania23 em São Paulo, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do #BlogCidadania23 e apresentador do #ProgramaDiferente.