Andrea Jubé: No Congresso, ao centro, volver!

“A política trabalha com a percepção, não com os fatos; importa a percepção do real, não a realidade”, ensina um influente líder de um dos partidos de centro, empenhado em descolar a sigla do rótulo de Centrão para garantir a sobrevivência eleitoral.

A inflexão não é isolada, segue uma reação em cadeia da maioria dos partidos de centro que hoje se veem direta ou indiretamente associados ao bloco suprapartidário que carrega a alcunha e se tornou alvo preferencial dos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

Na definição desse líder, o Centrão é um movimento que se iniciou com o ex-deputado Eduardo Cunha, que comandou com mão de ferro um bloco com mais de 200 deputados de diferentes partidos de centro. O time jogava para ocupar cargos no primeiro escalão de “porteira fechada”, garantir nomeações estratégicas nos Estados, a liberação do maior volume de emendas e dava as cartas na Câmara.

Mas Cunha acabou cassado, preso e condenado por lavagem de dinheiro e corrupção. Outros integrantes do grupo também se tornaram alvos de investigações, e todos receberam de Bolsonaro a pecha de “velha política”.

Este líder de bancada de centro argumenta que o resultado das urnas em 2018 e a expressiva adesão aos protestos pró- governo do último dia 26 atestam que o cidadão rejeita a “política antiga”, do toma-lá-dá-cá, que associa ao estilo de Eduardo Cunha.

“Criou-se no imaginário das pessoas que os partidos de centro são aqueles que querem cargos. O Centrão ocupou espaço nas manifestações de rua porque atribuem a ele práticas fisiológicas, como se houvesse resistência às reformas de Bolsonaro, e por isso, todos querem fugir desse estigma”, justifica.

O contraponto entre “percepção” e realidade, segundo este líder, ficou claro na controvertida votação do realojamento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) no Ministério da Justiça. Tecnicamente, ambas as posições tinham consistência: o Coaf teria estrutura e autonomia na Justiça ou no da Economia. Este era o dado de realidade.

Contudo, o debate acabou amplificado nas ruas e nas redes sociais, adquirindo uma conotação passional. Os parlamentares receberam e-mails e mensagens no celular com xingamentos de “canalha”, “patife”, entre outros, caso votassem contra Sergio Moro.

Como resultado dessa pressão, os partidos de centro se dividiram, e Moro perdeu o Coaf por uma diferença mínima de 18 votos. A “percepção” correta, neste caso, era de que votar contra o desejo de Sergio Moro nessas circunstâncias seria “jogar contra a sociedade”.

É com esse instinto, na avaliação desta liderança, que o seu partido e outras siglas de centro começam a se movimentar para se afastar da pecha de Centrão.

O presidente do PRB e 1º vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira, enfatiza que o partido “não é e não será do Centrão”. O dirigente argumenta que o Centrão não é um bloco partidário formal nem informal, mas, sim, uma “expressão que nasceu do imaginário de alguns formadores de opinião a partir do intangível”. Pereira é veemente ao afirmar que “erra e desinforma quem persiste em colocar o PRB e demais partidos no mesmo balaio”.

Desde que comandou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), o partido agiu para se descolar da Igreja Universal. Aproximou-se de empresários, adotou uma postura liberal e mudou o nome para Republicanos. O partido apoia as reformas, indicou o relator da reforma tributária (o deputado João Roma), defende um Estado enxuto, a desestatização de empresas e a redução de impostos para a atração de investimentos.

Na mesma diretriz, os líderes do DEM, Elmar Nascimento (BA), e do PP, Arthur Lira (AL), são veementes na afirmação de que “não existe Centrão”. Lira diz que o papel dos partidos de centro é estimular o diálogo, buscar o equilíbrio e esgotar o contraditório.

Lira compartilhou em suas redes sociais, recentemente, uma declaração de Bolsonaro para o “Jornal do SBT”, afirmando que os “parlamentares do dito Centrão” nunca o procuraram para “discutir partilha de ministérios estatais ou bancos oficiais”.

Elmar Nascimento argumenta que o DEM esteve na oposição nos últimos anos, e não poderia ser identificado com o Centrão. Relembra que Maia derrotou na eleição para a presidência da Casa os candidatos ligados ao bloco: os ex-deputados Jovair Arantes (PTB-GO) e Rogério Rosso (PSD-DF). Projetou-se no início do ano como fiador das reformas e defensor de uma agenda liberal, mas ainda assim, é alvo de bolsonaristas que tentam lhe infligir o rótulo de adversário do governo. Nas manifestações, virou boneco inflável, carimbado de fisiológico e corrupto.

Embora tenha a origem associada à era Eduardo Cunha, a criação do Centrão remonta à Assembleia Constituinte. Desde então, negociar com o bloco majoritário de partidos de centro foi essencial porque sua hegemonia o transforma em avalista da estabilidade de qualquer governo.

O Centrão é uma instituição histórica tão emblemática que mereceu verbete no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getulio Vargas (Cpdoc-FGV). Pela definição desses pesquisadores, foi um grupo suprapartidário com perfil de centro e direita, que deu ar sustentação ao presidente José Sarney (PMDB).

O bloco era formado, principalmente, por lideranças conservadoras de orientação liberal, como os deputados Ricardo Fiúza (PFL-PE) e Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA). Com a nomeação do deputado Roberto Cardoso Alves (PMDB, e depois PTB) para o ministério, a imagem do grupo acabou vinculada ao fisiologismo e à corrupção. “Robertão” é lembrado pelas declarações de que “é dando que se recebe”, e “cargo dá voto para diabo”. O grupo garantiu a Sarney o mandato de cinco anos.

Independentemente da denominação, o bloco de mais de 200 deputados continuará sendo hegemônico na Câmara, e determinante para a aprovação das matérias de interesse do governo. O grupo já impôs, na reforma da Previdência, a exclusão das mudanças na aposentadoria rural, no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e vetou a inclusão dos Estados e municípios. Se o governo não caprichar no diálogo e na articulação, arrisca-se a não aprovar nada. (Valor Econômico – 04/06/2019)

Andrea Jubé é repórter de Política em Brasília – E-mail: andrea.jube@valor.com.br

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