publicado no site contraponto em 19 de maio de 2025 16:46
Em junho de 2021 ajuizei ação contra um indivíduo que me insultou numa rede social. Senti-me ofendido pelos ataques genéricos ali feitos, típicos da canalhice que campeia impune no ambiente digital, e particularmente pela acusação ignóbil que me fez de “vendedor de sigla”.
Em mais de 40 anos de vida pública, exercendo diversos mandatos eletivos e funções de Estado, sempre me senti à vontade sob o escrutínio do eleitorado.
Jamais me furtei à crítica de minhas ações, votos e posturas. Acredito que o questionamento permanente do homem público é inerente à democracia e à vida pública, mesmo no caso da crítica mais severa.
Nos últimos 25 anos, exerci por um bom tempo as funções de presidente do diretório estadual do Cidadania (ex-PPS) no Paraná e de membro da executiva nacional do partido. Em todo esse período, sempre estive aberto ao julgamento de minhas ações como dirigente partidário, pronto para ouvir até a avaliação mais implacável.
Aceito a crítica nos limites da lei, mas não posso aceitar o ataque leviano que, a meu ver, configura calúnia. E me senti caluniado ao ser chamado de “vendedor de sigla”, por isso movi ação indenizatória contra o sujeito citado acima.
A agressão contra mim foi cometida logo depois que votei, como deputado federal, contra a restauração do voto impresso e pela urna eletrônica, mecanismo que, sabidamente, tornou a apuração das eleições brasileiras uma das mais ágeis, modernas e limpas em todo o mundo.
Quem já acompanhou a apuração de votações pelo modelo antigo – voto no papel -, vigente no Brasil até 1996, sabe do que estou falando. O voto impresso dava margem a todo tipo de fraude, muitas das vezes até distorcendo a vontade do eleitor, quase sempre facilitando a eleição de candidatos associados ao poder econômico e político.
A urna eletrônica foi um dos maiores avanços institucionais do País nos últimos anos, infelizmente não acompanhado por progresso semelhante no combate à crônica desigualdade social e, pasme, contrastado nos últimos anos por gravíssima ameaça golpista à democracia brasileira e às suas instituições.
Acredito que a citação do contexto em que fui atacado deve esclarecer as coisas para o leitor.
Mas a ação foi considerada improcedente em primeiro grau. O juiz entendeu que não houve ataque direto à minha pessoa e que, como figura pública, eu estava sujeito a críticas.
Este entendimento foi mantido nas cortes superiores, embora haja grande dissonância entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento de crimes contra a honra cometidos contra funcionários públicos em razão de suas funções.
Em sessão ocorrida no último dia 7 de maio, em que o STF analisou ação que questiona o aumento da pena para crimes contra a honra de servidores, o ministro Luis Roberto Barroso afirmou que quando alguém diz que você é ladrão, está implícito que se trata de um crime.
Mas o ministro André Mendonça se contrapôs a Barroso, ao afirmar: “Ladrão é uma opinião, não é fato específico”. Flávio Dino interveio: “Para mim, é uma ofensa grave. Não admito que ninguém me chame de ladrão. Essa tese da moral flexível que inventaram desmoraliza o Estado. Por favor, não admito, é uma ofensa gravíssima e não crítica”.
Mendonça disse: “Se o cidadão não puder chamar um político de ladrão…” Dino o questionou: “E ministro do Supremo pode?”
Esse debate extraordinário no Supremo levantou o gancho para meu questionamento sobre a decisão judicial que julgou improcedente minha ação. O juiz argumenta que, ao me chamar de “vendedor de sigla”, o cidadão está apenas exercendo seu direito de crítica, sem me atacar.
Pois bem, e guardadas as devidas proporções: se alguém usar as redes sociais para chamar um juiz seu desafeto de “vendedor de sentença”, será que o magistrado vai encarar esse ataque como apenas uma crítica, que ele deve acatar serenamente como personalidade pública, e não como calúnia, um ataque direto à sua honra pessoal?
*Ex-deputado estadual (dois mandatos), ex-prefeito de Campo Mourão e cinco vezes deputado federal pelo Estado do Paraná.