NAS ENTRELINHAS
Muitos são os sinais de que um conflito maior do que o que de Gaza se avizinha
É iminente uma escalada do conflito no Oriente Médio, em razão do confronto direto entre Israel e o Irã, que pode ter desdobramentos como a alta do petróleo e uma nova invasão do Líbano, e/ou uma guerra de proporções imprevisíveis entre os dois países. O Irã lançou seu primeiro ataque direto ao território israelense na noite de sábado, em retaliação ao ataque mortal ao consulado de Teerã em Damasco, na Síria, em 1º de abril, que atribui a Israel.
Muitos são os sinais de que um conflito maior do que o que de Gaza se avizinha: intensificam-se região os confrontos entre Israel e Hezbollah, no Líbano; sucedem-se ataques entre forças ocidentais e rebeldes houthi, no Iêmen, que se tornaram uma força militar não desprezível; e o Irã já opera no Iraque, na Síria e no Paquistão, não apenas por meio das milícias.
Entretanto, no ataque pré-anunciado do Irã a Israel, no qual foram disparados mais de 300 mísseis, foguetes e drones, houve uma inédita, efetiva e bem-sucedida coordenação militar entre os Estados Unidos e o Reino Unido com a Arábia Saudita, o Egito e a Jordânia, para abater os drones que cruzaram esses países árabes. Isso possibilitou à defesa de Israel neutralizar mais de 90% dos artefatos lançados contra seu território, com danos mínimos.
Tanto do ponto de vista militar como geopolítico, Israel levou a melhor, quando nada porque saiu do isolamento internacional em que estava, em razão do massacre de mulheres, crianças e idosos palestinos em Gaza. O confronto direto entre Israel e o Irã também expôs a divisão entre xiitas, tradicionalmente representados pelo Irã, e os sunitas, cujo eixo de gravidade é a Arábia Saudita.
A guerra de Gaza havia interrompido a aproximação entre a monarquia saudita e Israel, uma vez que o Hamas é uma organização sunita. O confronto direto de Irã e Israel, porém, promoveu uma reaproximação. De igual maneira, Egito e Jordânia, que têm tratados de paz com Israel, também colaboraram com a defesa israelense, o que nunca havia acontecido.
O Irã havia demonstrado capacidade de intervenções diretas em janeiro deste ano, quando, em 72 horas, atacou alvos no Iraque, na Síria e no Paquistão. Os EUA não querem uma escalada da crise no Oriente Médio, mas não podem largar a mão de Israel nem controlar o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, cuja política para sobreviver no cargo é uma espécie de quanto mais guerra, melhor.
O presidente Joe Biden é pressionado por democratas, que querem a paz em Gaza, e pela oposição republicana. Disse a Netanyahu que se opõe a um contra-ataque israelense direto contra o Irã. Donald Trump, porém, acusou-o de frouxo. Eixo de resistência As ações do Irã contra uma suposta base de inteligência israelense no Iraque e a grupos islâmicos rivais, na Síria e no Paquistão, desenham a área de influência que o regime de Teerã pretende manter no Oriente Médio. Para isso, financia o que denomina de “Eixo de resistência”, formado pelos seguintes grupos: Hezbollah, no Líbano; milícias xiitas no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão; rebeldes houthi, no Iêmen; o Hamas e outras milícias nos territórios palestinos. Todos os grupos recebem apoio logístico, político, financeiro e armas, muitas armas, do Irã. Essas alianças foram tecidas contra os EUA após a revolução iraniana de 1979.
O objetivo principal, hoje, é impedir a normalização das relações dos demais países árabes com Israel. Para muitos analistas, a causa do brutal ataque terrorista do Hamas ao território de Israel, em 7 de outubro de 2023, foi a aproximação entre o governo de extrema direita de Netanyahu e a monarquia absolutista saudita.
Os fundamentos da revolução iraniana, um Estado teológico com um regime parlamentarista, são vistos como uma ameaça pelos países árabes com monarquias cujo poder é ameaçado por essas alianças xiitas. Cultural e etnicamente, o Irã é a Pérsia, uma das nações mais antigas do mundo. Tem fronteiras ao norte com Armênia, Azerbaijão e Turcomenistão, e com o Cazaquistão e a Rússia pelo Mar Cáspio; a leste, com Afeganistão e Paquistão; ao sul com o Golfo Pérsico e o Golfo de Omã; a oeste com o Iraque; e a noroeste com a Turquia. Segundo maior país do Oriente Médio, tem 1,648 milhão de km² e 77 milhões de habitantes.
No “grande jogo” entre as potências, com os EUA e o Reino Unido, de um lado, e a Rússia e a China, de outro, o Irã é uma peça importante do xadrez geopolítico, pois liga o centro, o sul e o oeste da Ásia. Tem um papel estratégico na segurança energética de muitos países e na economia mundial, devido à maior oferta de gás natural do mundo e à quarta maior reserva comprovada de petróleo.
A China havia promovido um acordo entre o Irã e a Arábia Saudita, que realizou muitas ações nos últimos anos para se estabelecer como líder no mundo árabe, ocupando o lugar do Egito. Os Emirados Árabes Unidos ou o Catar, que se destacaram como polos de poder financeiro graças ao petróleo, inspiraram o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, que assumiu o poder em 2017, a buscar mais protagonismo, com apoio do governo Trump. Hoje, a Arábia Saudita lidera a Liga Árabe, uma organização de 22 países. (Correio Braziliense – 16/04/2024)