MANCHETES DA CAPA
O Globo
Governo precisa justificar ‘estatística macabra’, diz chefe da Anvisa
Brasil registra maior inflação desde 2015
Bolsonaro promete sancionar desoneração da folha
Começa amanhã a odisseia espacial do James Webb
O mal dos acumuladores
Obituário – Joan Didion, aos 87 anos
Réveillon em Copacabana não terá metrô nem ônibus
Fim da URSS 30 anos – A era da ‘esportokratura’
O Estado de S. Paulo
Desmonte no Ipahan abre brecha para loteamento político
Incra libera obra de energia e mineração em assentamento
Bahia cancela carnaval; em SP, blocos decidem não sair
Ricardo Nunes bate recorde de projetos aprovados em SP
Interior e litoral têm aumento de casos e Ilhabela exige máscaras
Lições que os Beatles podem ensinar ao mundo corporativo
Natal da informalidade
Alta dos preços na Europa atinge até baguete francesa
Folha de S. Paulo
Metade dos projetos no Congresso sobre Covid está parada
Imigração ilegal para os EUA volta a subir em 2021
Brasileiros acham que economia vai melhorar em 2022
Morte de criança ainda é baixa, diz Queiroga sobre vacina
Orçamento não prevê recursos para desoneração
Auditores fiscais aprovam greve e entrega de cargos
EDITORIAIS
O Globo
Manifestações bolsonaristas são reflexo de tendência internacional
A maioria dos protestos no período (54%) está na categoria difusa da demanda por maior representatividade política
Era clara a intenção do presidente Jair Bolsonaro nos comícios golpistas do 7 de Setembro: dar uma demonstração de força diante da queda na popularidade. A oposição não reagiu com manifestações na mesma proporção, e a acomodação que se sucedeu mostra que Bolsonaro logrou seu objetivo imediato, afastando o fantasma do impeachment que pairava no ar. Ele terminou o ano tendo obtido do Congresso tudo o que queria para a campanha eleitoral de 2022, algo que teria sido impossível sem as multidões que mobilizou. O episódio demonstra a importância inegável — e crescente — das manifestações de rua na política.
Tal constatação é corroborada por um estudo que analisou protestos entre 2006 e 2020 no mundo todo, patrocinado pela fundação alemã Friedrich Ebert, em parceria com a Iniciativa para Diálogo Político da Universidade Columbia. Em mobilização, o período é comparável a 1848, 1917 ou 1968. Em 2006, houve 73 protestos notáveis. Em 2020, 251. Os 2.809 compilados entre esses dois anos incluem toda a sorte de movimento: da Primavera Árabe aos Indignados na Espanha, dos coletes amarelos na França às revoltas chilenas, do Occupy Wall Street ao Black Lives Matter nos Estados Unidos, dos protestos de junho de 2013 no Brasil aos comícios anticorrupção, pelo impeachment de Dilma Rousseff e contra Bolsonaro no início da pandemia (ambos entre os dez maiores).
A maioria dos protestos no período (54%) está na categoria difusa da demanda por maior representatividade política (ou “democracia real”). “O número de manifestações cresceu ininterruptamente e os protestos se tornaram mais políticos em virtude da decepção com o funcionamento da democracia, da frustração com os políticos e da falta de confiança nos governos”, escrevem os autores, Isabel Ortiz, Sara Burke, Mohamed Berrada e Hernán Saenz Cortés. Em segundo lugar estão as manifestações de cunho econômico, por emprego, condições de trabalho, contra privatizações etc. Em terceiro, as em defesa de minorias como imigrantes, gays ou negros. Parcela pequena, mas relevante (7%), teve vínculo com a extrema direita.
É nessa categoria que entrariam as manifestações do 7 de Setembro, que reuniram características como “gritos por liberdade individual (portar armas, não usar máscaras, não fazer quarentena)” e “o ressentimento contra oligarquias e elites”. Entre os exemplos, os autores incluem “o nacionalismo muçulmano de Erdogan na Turquia”, o “conservadorismo nacional” de Bolsonaro no Brasil ou Viktor Orbán na Hungria e “o movimento QAnon, que abraça teorias da conspiração sobre a invasão do Capitólio”.
A recomendação para deter a extrema direita não é trivial: “O mundo não verá reversão da tendência (…) a não ser que haja esforços significativos para combater polarização, desigualdade e desinformação. Tais esforços endereçariam muitos ressentimentos subjacentes dos manifestantes que, se ignorados, continuarão a chamar a atenção para os líderes da direita radical que buscam dividir para conquistar”.
O Estado de S. Paulo
Um país capaz das reformas
Muitas reformas foram feitas desde a redemocratização. Olhar em perspectiva sua trajetória pode fornecer lições importantes para os tempos atuais
A destacar as várias reformas feitas no País desde a redemocratização, o conjunto de podcasts A Arte da Política Econômica – uma iniciativa do Instituto de Estudos de Política Econômica/Casa das Garças – mostra que houve um considerável avanço no ambiente institucional e econômico do País. Não condiz com a realidade, portanto, a ideia de que nada foi feito ou de que as coisas só pioram. Muito se fez ao longo dessas três décadas e meia, e olhar em perspectiva a trajetória das reformas pode fornecer lições importantes para os tempos atuais, tão desafiadores.
Em primeiro lugar, ao considerar o que foi aprovado desde o governo de José Sarney, percebe-se que muita coisa foi feita. E ainda mais significativo: muitas reformas foram aprovadas em situações políticas e econômicas dificílimas. Elas não são uma utopia, tampouco exigem circunstâncias excepcionalíssimas. Demandam, isso sim, diagnóstico qualificado do problema, proposta séria e liderança e coordenação políticas.
Não se trata de otimismo ingênuo. Levantamento do Estado, realizado a partir dos podcasts da Casa das Garças, contabilizou 28 reformas aprovadas desde 1986, começando pela extinção da chamada “conta movimento” do Banco do Brasil, que fazia com que a instituição recebesse um fluxo automático e ilimitado de recursos do Banco Central, como forma de viabilizar operações de interesse do governo federal (por exemplo, compra de produtos agrícolas e concessão de crédito rural). Na prática, a conta transformava o Banco do Brasil em autoridade monetária paralela.
Ao olhar as reformas em perspectiva, fica evidente também a disparidade entre os diferentes governos. Muitas reformas foram realizadas, mas elas não aconteceram por uma espécie de impulso histórico incontornável. Houve períodos com aprovação de medidas estruturantes em ritmo intenso, como os governos de Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, e outros em que nenhuma reforma foi aprovada. Não é exagero: durante o período em que Dilma Rousseff esteve na Presidência da República, nenhuma medida de modernização do País foi implementada.
A escandalosa omissão petista revela a responsabilidade do cidadão na escolha de seu voto. Dilma Rousseff não aprovou nenhuma reforma não porque não contasse com apoio político. Em seu primeiro mandato, tinha ampla maioria no Congresso. O ponto é que ela não queria nenhuma reforma. Sua agenda era intervencionista, em irracional adesão ao retrocesso.
Caso peculiar é o governo de Jair Bolsonaro. O Congresso, quando ainda Rodrigo Maia ocupava a presidência da Câmara dos Deputados, aprovou reformas significativas, como a da Previdência e o novo marco do saneamento básico. No entanto, em vez de representar mérito para o presidente Bolsonaro, a aprovação das duas medidas revela, sobretudo, o influxo positivo, ao longo do tempo, de um governo verdadeiramente reformista. Previdência e saneamento foram objeto de intenso estudo, debate e amadurecimento no governo de Michel Temer.
As “reformas” do governo Bolsonaro – entre aspas, porque carecem de elementos mínimos para se qualificarem como medidas estruturantes – nunca foram prioridade do Palácio do Planalto. Basta ver as PECs apresentadas, em fins de 2019, sob o rótulo de “Plano Mais Brasil” ou a proposta de reforma administrativa. O governo as esqueceu.
O diagnóstico em perspectiva das reformas deixa o presidente Jair Bolsonaro em situação delicada. O bolsonarismo travou a tramitação no Congresso de dois projetos de reforma tributária (de longe, os textos mais maduros sobre o tema que apareceram em anos) e trabalhou para aprovar a PEC do Calote, paradigma de retrocesso na política fiscal.
Seria equivocado, portanto, ignorar que, ao lado das reformas e avanços, também houve, ao longo do tempo, retrocessos e paralisias. A modernização do Estado e do ambiente econômico não é uma utopia, mas requer responsabilidade do eleitor e das lideranças políticas. O obstáculo não é uma eventual impopularidade do governante, e sim o populismo, seja qual for sua cor ideológica.
Folha de S. Paulo
Cruzada insana
Bolsonaro agora sabota a vacinação de crianças e incentiva ataque a servidores
Em novo capítulo da sabotagem à gestão da pandemia, Jair Bolsonaro quer promover uma cruzada das crianças, ao custo de expor meninas e meninos ao risco de morte por Covid-19. A campanha perversa, além do mais, facilita a disseminação do vírus entre aqueles que se ocupam de cuidados infantis, de parentes a professores.
Bolsonaro faz o que pode para dificultar a vacinação infantil, autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Difunde o medo, pretende criar empecilhos burocráticos e incentiva a perseguição de técnicos que aprovaram a medida sanitária. É secundado pelo bajulador Marcelo Queiroga, que ocupa a cadeira de ministro da Saúde.
Depois que a Anvisa aprovou o uso do imunizante em crianças de 5 a 11 anos, providência que chamou de “inacreditável”, o mandatário disse que a aplicação das injeções requereria receita médica.
Queiroga determinou que a vacinação será objeto de consulta e audiência públicas até 4 de janeiro, com decisão no dia seguinte. A tentativa de sabotagem é óbvia.
Quanto mais atrasar a campanha, mais estudantes voltarão às escolas sem suas doses de proteção. Bolsonaro assume o risco de disseminar a doença entre cerca de 20,5 milhões de crianças, mais suas famílias e próximos.
Técnicos do comitê de imunização da Saúde, médicos e cientistas apoiaram a decisão da Anvisa. Agências similares nos Estados Unidos e na União Europeia aprovaram a providência em outubro e novembro, respectivamente. Os brasileiros são adeptos da imunização; levaram seus adolescentes em massa aos postos de saúde.
Como se não bastasse, Bolsonaro anunciou que pediu, “extraoficialmente”, o nome de quem aprovou a vacina para crianças, “para que todo mundo tome conhecimento [de] quem são essas pessoas e obviamente forme seu juízo”.
Foi como se convocasse suas milícias para uma campanha de difamação. Mas houve mais, como era fácil prever —uma torrente de ameaças de morte contra servidores. A Anvisa pediu à Polícia Federal, ao Gabinete de Segurança Institucional e à Procuradoria-Geral que investiguem esses criminosos.
O Brasil e o mundo correm o risco de uma nova onda de Covid-19, causada pela variante ômicron, de potencial nocivo ainda pouco conhecido. Recomenda-se prudência e disciplina para abater a epidemia ou conter seus repiques.
A doença Bolsonaro, entretanto, não tem cura. A propaganda da morte continua, agora sob a pose farisaica de defesa do bem-estar das crianças contra efeitos adversos do imunizante. Pior, o mandatário convoca suas falanges para atacar funcionários de Estado que conseguem ainda realizar suas tarefas de modo racional.
Trata-se de aversão ao trabalho, ojeriza à razão e desprezo pela vida.