A partir da década de 1940, o processo histórico brasileiro passou a ser pensado e orientado por economistas. Graças ao pensamento e à influência deles, a mente brasileira adquiriu paixão pelo crescimento econômico. O resultado é a transformação radical da vida e da paisagem da sociedade brasileira, decorrente da modernidade técnica. Mas não conseguimos implantar uma modernidade ética: a pobreza persistiu, apesar do crescimento; o PIB per capita continuou perto do 80º lugar no mundo, porque a produtividade não cresceu; cidades se tornaram monstrópolis; a renda continuou concentrada; e o crescimento econômico estacionou.
Nos anos 1960, ao perceber as dificuldades para seguir adiante naquela marcha, o país optou pela ditadura, que impôs o caminho, mesmo ao custo de concentrar renda para vender produtos caros, destruir florestas, jogar resíduos em rios, fazer grandes represas com desequilíbrio ao meio ambiente, substituir hidrovias e ferrovias por rodovias. Embora, por razões morais, alguns economistas se opuseram ao rumo imposto pelos economistas da ditadura, mas o modelo seguia basicamente o rumo definido anteriormente. Não demorou para que a modernidade apressada voltasse a estancar.
Mas o regime democrático e seus economistas não conseguiram superar as barreiras que impedem o progresso, mesmo quando alcançaram o crescimento econômico. Isso tem levado a um debate sobre onde os economistas erraram: fazer o Estado gastar mais ou gastar menos, elevar ou baixar a taxa de juros, controlar ou liberar o câmbio e os preços. E não se percebe que o problema não está na velocidade baixa, mas no caminho errado. O Brasil se mantém na mesma linha de trem, o condutor pensando onde buscar combustível, sem preocupação em mudar de trilho e superar os descuidos que não foram percebidos no momento certo.
No final dos anos 1960 e início dos 1970, bastaria olhar para Coreia do Sul, Irlanda ou Finlândia para perceber que o vetor do progresso estava na educação de base com qualidade para todos. Nossos economistas ignoraram esse papel dinamizador da educação. Continuaram tratando a educação de base como um problema social, e não como parte da infraestrutura necessária ao progresso. Alguns até consideraram a necessidade de promover os ensinos superior e profissionalizante, sem entender o impacto de um povo educado sobre a economia. O resultado é que o aumento na produção ocorreu pelo crescimento da população, não por aumento na produtividade. A economia do país cresceu, mas a renda média de cada brasileiro trabalhador ficou estável. A renda continuou concentrada, porque os economistas não perceberam que a distribuição decorre do acesso de todos à educação.
A pobreza foi vista como questão moral decorrente da falta de crescimento e renda, e não como resultado do caminho errado. Não perceberam que, além da imoralidade da pobreza ao lado da riqueza, ela é também entrave à continuação do crescimento. A persistência da pobreza, depois de quase um século de crescimento econômico, além de imoral, é também estúpida, porque barra o aumento da riqueza social no longo prazo. A população com esgoto tratado produz mais. Não perceberam que o problema da pobreza não estava na velocidade do crescimento, mas no caminho escolhido, ao deixar a redução da pobreza como consequência, e não como propósito e necessidade do crescimento da economia. Erradicar a pobreza deveria ter sido propósito técnico da economia, não apenas compromisso ético de alguns políticos.
Os economistas não se preocuparam com o problema dos limites ecológicos que já surgiam nos anos 1960 e 1970. Muitos dos nossos economistas leram o livro ‘O mito do desenvolvimento econômico’ de Celso Furtado, mas não incorporaram o pensamento e o alerta dele; foram alunos de Georgescu-Roegen, mas não quiseram ou não conseguiram colocar o problema ambiental na formulação de nossas políticas de desenvolvimento. Fizemos o Proálcool para enfrentar a crise cambial provocada pelo aumento de preços de petróleo, não por causa da crise ambiental. O Proálcool e a Rio 92 poderiam ter colocado o Brasil na vanguarda do desenvolvimento verde e sustentável.
Não viram que o problema não estava no ritmo, mas no rumo. Nem que, embora os políticos escolham os economistas, são estes que orientam os políticos e fazem a mente coletiva da população. Nós, economistas, conseguimos manter a velocidade da modernização técnica, mas no caminho errado, por não escolhermos uma modernização ética, eficiente, justa e sustentável. (Correio Braziliense – 04/05/2021)
Cristovam Buarque, professor emérito da UnB (Universidade de Brasília)