Veja as manchetes e editoriais dos principais jornais hoje (29/12/2020)

MANCHETES DA CAPA

O Globo

Rio autoriza concessão de áreas atendidas pela Cedae
Confiança da indústria é a maior em dez anos
Sob investigação, Alibaba perde US$ 116 bi em dois anos
Réveillon mínimo, multidão máxima
Bloco de Maia deve dominar principais postos na Câmara
Alexandre Lopes – ‘Jamais cogitamos não realizar o Enem’
Bolsonaro cobra laboratórios mesmo sem acordo com Pfizer
Sonhos para uma cidade possível
Críticas à festa abalam ano de brilho de Neymar
Pacote de ajuda nos EUA anima mercados

O Estado de S. Paulo

Covid deve fazer expectativa de vida cair até 2 anos no País
Registro da vacina de Oxford
Litoral norte de SP libera comércio e praias na virada
Jorge Oliveira – ‘Não fingirei que não sou amigo do presidente’
Pressionadas pelo dólar, empresas acumulam endividamento recorde
Desmatamento no Cerrado sobe

Folha de S. Paulo

Em 2 anos, governo esvaziou órgãos de defesa ambiental
Vacinas não significam fim da pandemia já em 2021
Laboratórios é que deveriam procurar o Brasil, diz presidente
Pfizer adia entrega de doses para Espanha e outros 7 europeus
Fux exonera servidor que pediu prioridade de imunização ao STF
Bloco de sucessão na Câmara é ensaio para 2022, afirma Maia
Bolsonaro lidera popularidade digital em 2020
China condena jornalista que divulgou epidemia

Valor Econômico

Varejo tem pior Natal desde a recessão de 2015 e 2016
Mercado pode triplicar no país, diz Mapfre
Licitações de rodovias congestionam agenda de 2021
Fintechs preparam “Netflix” dos seguros
AG negocia pagamento de juro em atraso
Huawei ganha novos aliados na luta pelo 5G

EDITORIAIS

O Globo

Violência contra mulher persiste, apesar de avanços na legislação

Feminicídio brutal contra juíza demonstra que questão transcende as conquistas legais ou jurídicas

O assassinato brutal da juíza Viviane Vieira do Amaral pelo ex-marido, o engenheiro Paulo José Arronenzi, chamou atenção pela brutalidade: inconformado com o divórcio, Arronenzi desferiu 16 facadas nela diante das três filhas que vinham passar com ele a noite de Natal. Tristemente, não se trata de caso isolado.

Tipificado como crime por uma lei de 2015, o feminicídio registra mais casos a cada ano: 929 em 2016, 1.075 em 2017, 1.229 em 2018 e 1.326 no ano passado, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. De 13,5% do total de homicídios cujas vítimas são mulheres, passaram a 35,5%.

É verdade que há um tanto de ilusão estatística nesses números, pois o número total de homicídios de mulheres caiu em proporção à população (entre 2015 e 2019, de 4,6 para 3,5 por 100 mil). Mesmo assim, ainda que os crimes tenham apenas passado a ser classificados corretamente, os dados revelam uma realidade inaceitável, tornada ainda mais grave pela pandemia.

Neste ano, simultaneamente a um aumento nas ligações telefônicas denunciando violência doméstica, houve queda nos registros policiais de ameaças, lesões corporais e estupros. É como se, nas quarentenas, muitas mulheres tivessem passado a viver como reféns daqueles com quem se viram forçadas a conviver. Sofrem a violência, mas se veem impossibilitadas de recorrer aos mecanismos para coibi-la.

Em comparação com outros países, o Brasil dispõe de legislação avançada no tocante à violência contra mulheres. As delegacias especiais (1985), a Lei Maria da Penha (2006) e a própria tipificação do feminicídio (2015) demonstram que muita coisa mudou desde o infame caso em que Doca Street foi absolvido do assassinato da socialite Ângela Diniz sob o argumento estapafúrdio da “legítima defesa da honra”.

Mesmo assim, o machismo persiste. Dias atrás um juiz de família afirmou não estar “nem aí” para a Lei Maria da Penha. Mais que as estatísticas, esse tipo de atitude demonstra não se tratar de uma batalha legal ou jurídica. A violência contra a mulher é a expressão de uma estrutura desigual há gerações.

O desafio de reeducar homens e mulheres criados na cultura machista não será vencido apenas por meio da revolta nas redes sociais ou da ação militante. É preciso, antes de tudo, fazer cumprir a lei: quem mata uma mãe diante das filhas deve ser punido com rigor, ao mesmo tempo que se trata da saúde psíquica das meninas.

Além disso, é necessário criar mecanismos que respondam com rapidez às denúncias, amparem as mulheres na necessidade e detenham homens violentos antes dos crimes. Por fim, é essencial promover a cultura de igualdade para que, quando não houver amor, prevaleça o convívio civilizado.

O Estado de S. Paulo

Populismo e democracia na pandemia

Na pandemia, o presidente Jair Bolsonaro fez o oposto do que lhe cabia fazer. Esse modo de agir suscitou a reação da sociedade

A edição brasileira de novembro do Journal of Democracy publica o artigo A cartilha populista brasileira, de Amy Erica Smith. Ao analisar os efeitos da pandemia e a reação do governo Bolsonaro sobre o funcionamento das instituições democráticas, a professora de ciência política da Universidade Estadual de Iowa apresenta reflexões pertinentes. A resposta do presidente Jair Bolsonaro à crise sanitária deixou muito a desejar, mas suas evidentes deficiências parecem ter contribuído para uma maior resistência de outras lideranças e para uma reação da sociedade civil.

“Apesar das consequências humanas trágicas e incomensuráveis da covid-19 no Brasil, a doença está provocando um impacto mais ambíguo na saúde da democracia do País”, diz Amy Erica Smith. “Ao evidenciar as fraquezas de Bolsonaro, a pandemia parece ter favorecido um movimento de resistência por parte de outros representantes eleitos.”

Segundo o artigo, “não é simplesmente que a incapacidade de Bolsonaro de conter o coronavírus fortalece o sistema de freios e contrapesos. Os acontecimentos dos últimos meses parecem ter revelado que algumas das ameaças de Bolsonaro eram vazias. (…) À luz desses não acontecimentos, o golpismo de Bolsonaro – ou seja, seu apoio ideológico aberto à intervenção militar – parece cada vez mais ser apenas jogo de cena, uma ameaça que ele faz como aceno a parte de sua base e intimidação da oposição”.

A respeito do comportamento de Bolsonaro na pandemia, a professora de Iowa diz: “Em vez de repressão autoritária, Bolsonaro escolheu uma estratégia mediada que acentua a polarização política e a ‘guerra cultural’ nas redes sociais. Seus objetivos são controlar a informação e promover uma narrativa alternativa da pandemia”.

Como exemplo, Amy Erica Smith cita a defesa que Jair Bolsonaro fez da hidroxicloroquina. “O objetivo de sua gestão ao promover o remédio não parece ser melhorar a saúde pública, mas encorajar os cidadãos a associar suas lealdades afetivas e identidades políticas ao processamento de informações, transformando o julgamento de fatos em questão de intuições e desejos subjetivos.”

Em vez de informar e oferecer orientações seguras para a população, o presidente Bolsonaro optou pela desinformação, politizando as questões. Até mesmo a competência constitucional relativa à saúde pública, compartilhada entre os entes da Federação, foi transformada por Jair Bolsonaro em embate de forças políticas. “Bolsonaro tratou a pandemia menos como uma crise de saúde pública e mais como um desafio de relações públicas”, diz o artigo.

Ao comentar a hostilidade presidencial às medidas de prevenção, que levou a um “tipo peculiar de crise de governança”, a professora de Iowa recorre ao conceito “carências do Executivo”, de David Pozen e Kim Lane Scheppele, em contraste com os “excessos do Executivo”, quando o presidente excede os limites legais às atribuições de seu cargo. Segundo o artigo, “no longo prazo, essa tendência poderá não prejudicar as eleições democráticas, mas afetará a capacidade dos cidadãos de monitorar e responsabilizar seus representantes eleitos”.

Entre os efeitos da pandemia, Amy Erica Smith destaca a reação da sociedade civil. “Sem apoio governamental efetivo, grupos locais em comunidades pobres tiveram que desenvolver redes de auxílio mútuo e regras informais sobre máscaras e isolamento social. A imprensa registrou um florescimento desse tipo de atividade entre associações de bairro, movimentos sociais, igrejas e até mesmo gangues”, diz. Mesmo rejeitando a ideia de uma idealização das instituições comunitárias, a professora de Iowa reconhece que “tais movimentos podem servir de apoio a uma forma de democracia local, participativa e não oficial”.

Na pandemia, Jair Bolsonaro fez o oposto do que lhe cabia fazer. Esse modo de agir suscitou a reação da sociedade. Melhor seria que o governo cumprisse seu papel, mas isso não impede de reconhecer que a sociedade reagiu. E essa reação, mesmo com todas as limitações, é sempre um óbice aos populismos e autoritarismos.

Folha de S. Paulo

Soberba tucana

Doria, com ida a Miami, e Covas, com alta salarial, não atentam para simbolismo

Descaso e soberba uniram os tucanos João Doria, governador de São Paulo, e Bruno Covas, prefeito da capital paulista, em erros políticos cometidos nos últimos dias.

Doria frustrou expectativas que ele próprio criara ao adiar a divulgação de dados relativos à eficácia da Coronavac, o imunizante contra a Covid-19 produzido em parceira com a chinesa Sinovac. Descobriu-se, ademais, que o governador havia viajado a Miami, com a mulher, para alguns dias de lazer.

Na mesma semana de Natal, Covas deu-se de presente um reajuste salarial de 46,8%, ao sancionar texto aprovado pela Câmara Municipal que beneficia ainda o vice-prefeito e os secretários municipais, além de elevar o teto para os vencimentos do funcionalismo.

É o governador quem tem mais a perder, sem dúvida, com a desatenção arrogante ao impacto simbólico de seus atos. Afinal, no afã de se fortalecer como postulante ao Planalto em 2022, ele busca se diferenciar do padrão de irresponsabilidade, despreparo e ausência de empatia de Jair Bolsonaro.

Ganhou valiosa oportunidade de assumir o papel de protagonista e equiparar-se aos governantes internacionais que agiram com presteza para dar início à vacinação —e também a chance de desfazer as impressões de oportunismo e individualismo que deixou em sua ainda curta trajetória na vida pública.

O empresário que abraçou a política já havia se desgastado ao abandonar o mandato de prefeito para concorrer ao governo do estado. Na campanha, em que pese a vitória, acumulou desconfianças sobre a retidão de suas convicções ao associar-se à maré bolsonarista.

A viagem desastrada a Miami foi devidamente explorada por Bolsonaro e repudiada até mesmo por correligionários. Na tentativa de minimizar os danos, o tucano divulgou um vídeo com um pedido pouco convincente de desculpas.

Sucessor de Doria no governo municipal, Covas tem decerto ambições menores —o que não autoriza a ligeireza com que tratou do próprio contracheque num cenário de pandemia, desemprego elevado e contas públicas em frangalhos.

Em outro momento poderiam soar razoáveis argumentos como a defasagem salarial acumulada desde 2012 e o reajuste ter sido inferior à inflação acumulada. Agora, a medida reduz a credibilidade de um prefeito que precisa pedir sacrifícios à população.

Elitismo e imodéstia são defeitos desde muito apontados pelos críticos do PSDB, nem sempre justamente. Desta vez, de fato, nomes que encabeçam a renovação do partido não se ajudaram.

Valor Econômico

Acordo amigável do Brexit terá um alto custo para britânicos

A queda de Trump tende a restringir experiências separatistas como esta

O Brexit foi finalizado no apagar das luzes de 2020, quatro anos e meio depois da histórica votação que encerrou a participação do Reino Unido de mais de quatro décadas na União Europeia. Simbolicamente, foi o primeiro divórcio formal a desmentir a presunção otimista de que as relações econômicas internacionais seriam orientadas por acordos de comércio amplos, marcantes da globalização.

A separação marca também, com alguma esperança, o fim do populismo que levou os britânicos a optarem contra sua própria economia. Donald Trump foi mandado embora do comando da maior economia do mundo e talvez não haja mais espaço para outros que tentaram segui-lo, como Boris Johnson, o premiê do Reino Unido.

O Brexit é uma experiência reveladora sobre o que se pode ganhar ou perder pondo fim à tendência de globalização e formação de blocos político-econômicos. É prematuro fazer um balanço final, apenas desenhar tendências. O cálculo simples de que o PIB do Reino Unido encolherá 4% e a renda per capita um pouco mais, é um ponto de partida de que o Reino Unido ficará pior do que antes. E caso não houvesse um acordo de saída, a queda seria de 6%. Sintomaticamente, não há qualquer estimativa que aponte os ganhos do rompimento, em qualquer prazo.

Demagogos como Johnson e Nigel Farage prometeram ganhos com a reconquista da soberania inglesa. O principal deles seria o controle total sobre a migração, sobre a qual os tratados da UE previam mobilidade total entre europeus. O país ganhou controle sobre fluxos migratórios, mas a União Europeia tem idêntico poder do outro lado do Canal. Sem contar os passaportes, que serão reinstituídos para os cidadãos do Reino Unido, nenhum profissional especializado britânico – médicos, engenheiros, arquitetos etc – poderá exercer seu ofício na Europa sem se habilitar e se enquadrar nos requisitos nacionais do país em que escolher atuar. Não se pode chamar isso de progresso, e menos ainda de trunfo.

Em grandes linhas, o acordo com a UE afastou dois fantasmas. O primeiro, o de uma separação sem acordo, catastrófica para o lado mais fraco, o Reino Unido. O segundo, a possibilidade de radicalismo do bloco europeu no tratamento de um trânsfuga. Na maior parte dos casos, os britânicos asseguraram o mesmo tratamento tarifário que tinham antes, mas com condicionantes que podem se voltar contra eles no futuro, dependendo do grau que darão à “independência” que almejam.

Pelo acerto, o Reino Unido poderá determinar regras ambientais, sanitárias, trabalhistas, regulatórias que quiserem. Mas enfrentarão a discordância dos países do continente se procurarem obter inadequadas vantagens competitivas. Os britânicos conseguiram impedir que a corte de Justiça do bloco julgue contenciosos, porém não escaparão de árbitros independentes que ditarão retaliações e limites ao que a legislação britânica possa determinar. A ausência de tarifas foi um ganho.

Mesmo esse ganho é relativo, no entanto. O serviços – de cargas transcontinentais por vias aéreas e terrestres, até o principal, os financeiros que dão lugar mundial à City – mal foram contemplados, ou o foram de maneira desvantajosa aos britânicos. Ainda não há entendimento sobre a equivalência das regras normativas de instituições financeiras entre a ilha e o continente. É possível que bancos ingleses tenham de se adequar às leis de cada país em que decidirem operar, assim como os profissionais liberais terão de fazer.

Custos e dificuldades aumentarão também na agricultura. O Reino Unido importa 75% dos alimentos que consome e o sistema de vigilância sanitário e alfandegário trará mais restrições do que antes. No caso da indústria farmacêutica, testes de segurança e qualidade terão de ser validados no país e na UE.

O acordo foi feito sem animosidades, no final, embora seu resultado seja em grande parte o perseguido pelos líderes europeus: criar fortes desincentivos para quem resolvesse abandonar o bloco. Isso segue a lógica do poder econômico: o Reino Unido depende mais da UE, que consome 40% de suas exportações, do que o contrário – apenas 15% das vendas da UE vão para lá.

Em balanço do acordo, Martin Wolf, principal comentarista econômico do Financial Times, disse que o desenlace foi relativamente favorável no caso das manufaturas, no qual o Reino Unido tem desvantagem competitiva, e bem pior no caso dos serviços, onde tem vantagens competitivas. Cabe aos populistas dourar a pílula. A queda de Trump tende a restringir experiências separatistas como esta.

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