O dado de crescimento de 7,7% no terceiro trimestre é bom, mas veio abaixo do esperado por bancos, consultorias e até pelo governo. Houve um aumento forte da poupança e isso pode ajudar a recuperação nos próximos meses. O problema da economia é que neste quarto trimestre aumentou a intensidade da pandemia, foi reduzido o valor do auxílio emergencial e ele vai desaparecer no fim do ano. Outro problema é que não voltamos ao ponto de antes da queda. O PIB ainda ficou devendo.
Apesar de o dado ter vindo abaixo do esperado, quase nada mudou na visão dos economistas. Como houve a revisão para melhor na série pelo IBGE, o entendimento é que tudo veio de acordo com as projeções. Até no governo eu ouvi isso. “Como o IBGE melhorou os dados do segundo trimestre, de queda de 11,4% para queda de 10,9%, então no combinado nada muda e continuamos prevendo recessão de 4,5% em 2020”. O Itaú Unibanco espera que o quarto trimestre ainda tenha um crescimento de 2,9% sobre o trimestre anterior. Com isso, o carregamento estatístico para 2021 ficaria em 3,4%. Ou seja, mesmo que a economia fique parada ao longo de todo o ano que vem, estatisticamente, haveria essa alta forte sobre 2020. Já o Ibre FGV tem uma leitura mais conservadora, e acha que esse efeito será de 2%, porque o quarto trimestre será pior do que se previa , com o aumento das medidas de isolamento social.
Uma das apostas da equipe econômica é que a alta da poupança durante a pandemia sirva agora como um estímulo ao consumo. No terceiro trimestre, a taxa de poupança subiu a 17,3% do PIB, o maior percentual desde o terceiro trimestre de 2013. Esses recursos agora podem ser usados para a compra de bens e serviços, mantendo a atividade econômica aquecida. O governo acha que parte disso é poupança dos pobres que economizaram alguma coisa do auxilio emergencial, por outro lado, na classe média o medo do futuro, o risco do desemprego elevaram a propensão a poupar. Esse dinheiro poupado pode sustentar a demanda por bens e serviços e manter parte do crescimento futuro.
Mas não se pode subestimar a dimensão da crise econômica. O país acumula queda de 5%, a alta do terceiro tri atenua a queda da economia, mas os fatos recentes aumentam as dúvidas sobre o futuro.
O setor agropecuário é o único que fechará o ano positivo, mas teve uma queda no terceiro trimestre comparado ao segundo. “A expectativa é de um crescimento da agropecuária de 2,3%, muito abaixo dos 14,2% de 2017”, lembra a MB Associados. Mas, explica a consultoria, “o resultado efetivo do setor em 2020 é muito melhor do que o de 2017, com crescimento de mais de 20% na renda da agropecuária”.
Houve uma queda na construção civil, mas o setor está num bom momento, com produção de tijolos e cimento apresentando resultados positivos. Todos os segmentos do setor de serviço cresceram, mas, em parte, porque haviam caído demais. Destaque para o comércio, que cresceu 15,9%, um setor que no distanciamento social teve que inventar o caminho digital até o consumidor, apressando uma transição que pensou que teria tempo para fazer.
Os números parecem todos desencontrados, como a de uma economia que foi chacoalhada. A disparidade entre os setores é muito grande nesta recuperação, o que já havia sido alertado por vários economistas. Se a indústria cresceu 14,8% no terceiro trimestre, os serviços subiram bem menos, 6,3%, enquanto a agricultura surpreendeu negativamente, com uma queda de 0,5%. Até mesmo dentro de um mesmo setor, as velocidades foram muito diferentes. A indústria de transformação cresceu 23,7%, já a extrativa teve alta menor, de 2,5%. O comércio cresceu 15,9%, mas depois de três trimestres de queda. Os serviços financeiros subiram 1,1%, mas não tiveram recuo durante a pandemia.
Na equipe econômica trabalha-se com o cenário de que o distanciamento social está no fim e que isso permitirá a retomada da economia. Por isso, na visão da equipe, o auxílio não seria mais necessário. Mas o cenário que parece mais provável é o de que o novo crescimento dos casos de Covid-19 manterá a economia travada, e a oferta de emprego, muito abaixo do necessário. A taxa de desemprego deve subir até mais fortemente no começo do próximo ano.
O erro inicial do governo na economia foi não se preparar para o pior cenário. E o pior aconteceu. A resposta foi improvisada, com erros e atrasos. É fundamental que a área econômica saia desta segunda onda de negação. O Brasil está num momento de agravamento da doença e essa variável precisa entrar na equação do Ministério da Economia. (Com Alvaro Gribel, de São Paulo/O Globo – 04/12/2020)